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Quando Deus era mulher:

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Aserá,

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sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Formadores de opinião da esquerda brasileira são financiados por grandes capitalistas

Leonardo Sakamoto faz parte do conselho editorial da Agência Pública
Reproduzo o texto abaixo do site Spotniks porque achei interesse apontar a contradição do pessoal que vive clamando contra o capitalismo enquanto é financiado por bilionários capitalistas. Deixando claro que o problema não é o financiamento em si das entidades (não se trata de uma novidade), mas sim as causas financiadas muitas vezes incompatíveis com sociedades democráticas e as liberdades individuais. Vale a leitura também para refletir sobre as razões dos próprios financiadores (!?)

Eles formam a opinião da esquerda brasileira. E são financiados por esses grandes capitalistas.

por Felippe Hermes

Permitir a todo cidadão comum americano viver a noite foi motivo para fazer de John D. Rockefeller o homem mais abonado de seu tempo e um dos mais ricos da história. Seu produto revolucionário, o querosene, fez com que todo lar americano pudesse ter acesso a um espaço do dia antes muitas vezes restrito a uma pequena elite, capaz de pagar pelo óleo de baleia ou pelas velas comuns. A marca de Rockefeller entretanto vai muito além dessa empreitada. Sua guerra pessoal com Andrew Carnegie em torno da filantropia é uma herança americana presente ainda nos dias atuais.

Nenhum país do mundo realiza tantas doações como os americanos. São US$ 358 bilhões apenas em 2014 (cerca de 15% do PIB brasileiro doado para a caridade). A exemplo de Rockefeller, criar uma fundação e legar seu nome às mais variadas obras tornou-se uma obsessão de quase todo bilionário americano. Prédios de universidades quase sempre carregam o nome de ex-alunos ricos – alguns foram até mesmo construídos por meio de doações, como a Universidade de Chicago, criada por Rockefeller.

Para além de prédios e bibliotecas (como as 3 mil bibliotecas construídas por Andrew Carnegie), os bilionários americanos empenham-se em questões de cunho social e engajamento político. Dentre as mais de 1,52 milhão de entidades de caridade americanas, algumas merecem destaque exatamente pelo ativismo a que se propõem. Dentre elas, a Fundação Ford, criada em 1936 pelo bilionário Henry Ford, a Open Society, do bilionário George Soros, e a própria Fundação Rockefeller, cujos interesses hoje vão bem além da educação.

Com patrimônio bilionário, tais fundações não poupam recursos em defender suas agendas. Enquanto a Fundação Ford doa US$ 560 milhões anuais, a Fundação Open Society prevê doar US$ 960 milhões em 2016. Tantos recursos acabam parando também no Brasil e na América Latina, onde a Fundação Ford doa em média US$ 25 milhões anuais, contra US$ 37 milhões da fundação de Soros. Abaixo, algumas das causas beneficiadas por tais fundações – e que, não sem motivo, ajudam a formar a opinião da esquerda tupiniquim.

1. CENTRAL ÚNICA DOS TRABALHADORES


Maior das centrais sindicais brasileiras, a CUT (Central Única dos Trabalhadores) é responsável por representar cerca de 1 em cada 3 trabalhadores filiados a sindicatos no país. Seus 7,5 milhões de filiados fazem da CUT a maior entidade recebedora do imposto sindical no país. A despeito de fazer campanha contra o imposto (que obriga cada trabalhador com carteira assinada no país a repassar 1 dia de trabalho aos sindicatos), a entidade recebeaproximadamente R$ 51 milhões anuais, ou 1,6% do valor arrecadado com o imposto (de R$ 3,2 bilhões/ano). Os demais são distribuídos entre os 15,8 mil sindicatos brasileiros.

O imposto sindical obrigatório, no entanto, uma exclusividade brasileira não existente em nenhum outro país do mundo, não é a única forma de sustento da entidade presidida por Vagner Freitas (conhecido por sugerir em discurso no Palácio do Planalto que se preciso fosse, pegaria em armas para defender o governo Dilma – e claro, por seu cargo como conselheiro no BNDES, um trabalho cujo rendimento por participação em algumas poucas reuniões mensais pode remunerar até R$ 21 mil seu ocupante). A CUT complementa seu orçamento ainda com participação em ganhos de associados nas negociações sindicais e doações de fundações e organizações internacionais.

Firmado em 2014, o acordo entre a CUT e a Fundação Ford rendeu à entidade aproximadamente $150 mil (ou R$ 350 mil com o câmbio da época). Com contratos como este, além dos demais acordos com BNDES e Petrobras, a organização se destaca também na elaboração de premiações, como o Prêmio CUT: Democracia e Liberdade Sempre, que em 2011 laureou o ex-presidente Lula como o título de “personalidade de destaque na luta por Democracia e Liberdade” (na mesma edição, o MST ganhou como “instituição de destaque na luta por Democracia e Liberdade”).

2. INTERVOZES



Com slogans como ‘democratizar a mídia’, grupos de esquerda e políticos brasileiros insistem há algum tempo em impor um debate sobre o papel da mídia e o peso da regulação do Estado no setor. A exemplo do que fez a Argentina, tais movimentos lutam por uma limitação de grupos de mídia que torne a imprensa mais fragmentada, e consequentemente mais suscetível ao achacamento dos governos. Com participação do debate do Marco Civil da Internet às campanhas de Banda Larga Popular, grupos como o Intervozes se apresentam como os principais centros de produção de ideias para o debate da mídia no país.

O peso excessivo do capital no viés da informação é o alvo preferido neste debate. Se por um lado, a imprensa brasileira sofre de uma crise que se prolonga há anos, forçada a reinventar seu modelo de negócios para manter-se de pé e evitar demissões em massa de jornalistas, grupos como o Intervozes em nada são afetados por estes dessabores do mercado. E a razão para isso é fácil de explicar: seu financiamento é assegurado por organizações internacionais.

Para a Fundação Ford, financiar ideias de regulação da mídia em países emergentes é uma ideia relativamente antiga. A própria Intervozes consta na lista de doações da entidade há pelo menos 9 anos, com uma doação de US$ 160,7 mil em 2006 (a organização americana está no rodapé da página do movimento como “financiamento institucional”). De lá para cá foram US$ 2 milhões, ou quase R$ 15 milhões, quando considerada a inflação brasileira, para pautar o debate de mídia no Brasil.

Algumas das ideias defendidas pelo Intervozes são possíveis de conferir aqui, em seu blog na Carta Capital.

3. AGÊNCIA PÚBLICA



O empreendedorismo no setor de mídia tem ganhado força nos últimos anos, sob o manto da independência e da não participação de grandes grupos de mídia. Sites como a Agência Pública ganharam destaque ao produzir reportagens-denúncia a respeito dos mais diversos temas. Aos mais esquecidos, a agência é responsável pela matéria “A nova roupa da direita”, que trata exatamente do financiamento americano a grupos da “Nova direita” no Brasil e na América Latina.

Em tom de denúncia, o site, que é mantido por organizações como a Open Society (do bilionário húngaro-americano George Soros) e a Fundação Ford – demonstra como organizações brasileiras estariam recebendo financiamento americano para defender suas ideias. Uma doação de US$ 25 mil à rede americana Students For Liberty feita pelos bilionários Charles & David Koch (controladores da Koch Industries, ambos entre os 10 mais ricos do mundo, segundo a Bloomberg), torna-se prova cabal de que a sua filial brasileira, a rede Estudantes Pela Liberdade, faria parte do chamado ‘Kochtopus’ (a rede de entidades que recebe doações dos irmãos Koch). Como já defendeu a revista Carta Capital, os irmãos teriam supostamente doado estes valores à organização americana para que fosse feita no Brasil a defesa de ideias como a privatização da Petrobras (uma vez que ambos possuem empresas em oleodutos e petroquímica).

Além dos US$ 500 mil recebidos da Fundação Ford desde sua criação, e de valores desconhecidos da Open Society, de Soros, a Pública, como é conhecida, conta ainda com extensas campanhas de financiamento coletivo para bancar seu modelo de negócio sem fins lucrativos. Em determinada campanha, por exemplo, a agência arrecada verbas para bancar bolsas de estudo para jornalistas (com remunerações que chegam a R$5 mil mensais). Contando com o blogueiro do Grupo UOL/Folha, Leonardo Sakamoto, em seu conselho editorial, a Pública presta ainda alguns serviços de produção de conteúdo para organizações como a ClimateWorks (fundação americana voltada para o meio ambiente), que já doou cerca de US$ 200 mil (ou R$800 mil em valores atualizados) desde 2012, quando iniciou a parceria. O foco, segundo a ClimateWork, é garantir a cobertura independente de políticas públicas na Amazônia.

4. CUNHÃ – COLETIVO FEMINISTA



Um dos mais conhecidos coletivos feministas brasileiros, o Cunhã, entende sua atuação como algo muito além da própria luta feminista contra projetos de leis considerados ofensivos às mulheres e aos constantes atos de violência de gênero. Sua atuação é também política – especificamente como base de apoio ao governo Dilma.

Organizador dos atos contra o impeachment na Paraíba e da Marcha das Margaridas (o evento financiado pelo BNDES e Petrobras que leva anualmente milhares de mulheres a Brasília por meio de coletivos feministas, CUT e MST), o coletivo Cunhã tem por objetivo defender direitos reprodutivos, enfrentar a violência doméstica, garantir trabalho, autonomia e maior participação política das mulheres. Dentre os principais financiadores da organização, encontra-se a Brazil Foundation, organização com sede nos Estados Unidos que atua buscando doações para projetos no Brasil. Dentre os doadores da Brazil Foundation, destaca-se o ex-presidente do Banco Central e assessor do candidato Aécio Neves, Armínio Fraga, além do banco de investimentos Goldman Sachs e da Vanguard Capital, gestora de ativos norte-americana.

Financiar o movimento feminista é uma tradição de longa data da Fundação Ford. Além do coletivo Cunhã, que recebeu US$ 450 mil, a organização Themis (US$ 360 mil), SOS Corpo(US$ 750 mil) e a organização “Católicas Pelo Direito de Decidir” (US$ 200 mil) também estão na lista de doações da entidade. No geral, para financiadores do coletivo Cunhã, como a Fundação McArthur, a International Women’s Health Coalition e a própria Fundação Ford, tais financiamentos possuem como ideia central apoiar projetos de planejamento familiar e organizações favoráveis a direitos como o aborto. Para organizações como o coletivo Cunhã, entretanto, tais fontes de financiamento servem também ao interesse político-partidário.

5. VIVA RIO E SOU DA PAZ



O referendo do desarmamento completou em 2015 seus 10 anos. A despeito da vitória do NÃO, com 63,94% dos votos, as duas principais organizações por trás da defesa do desarmanento mantém sua atuação e contam com verbas cada vez maiores.

Com receitas de R$ 450 milhões em 2014 (sendo R$ 440 milhões em contratos de prestação de serviço na área de saúde), a ONG Viva Rio ainda mantém uma forte atuação como defensora do desarmanento, posição também mantida e ampliada pela ONG Sou da Paz – cuja receita, apesar de mais modestas (R$ 15,2 milhões em 2014), também financia majoritariamente campanhas pelo desarmamento (a fundação Sou da Paz foi fundada como uma campanha pró-desarmamento em 1997). A Viva Rio, mais antiga, de 1993, possui dentre seus fundadores José Roberto Marinho, além de ter João Roberto Marinho em conselho (ambos herdeiros do Grupo Globo, que consta na lista de apoios da fundação).

Dentre os financiadores, porém, as organizações internacionais ganham destaque, junto de instituições financeiras como Credit Suisse e Santander. A Open Society, de George Soros, consta como apoiadora da Sou da Paz (sem valores declarados), além da fundação holandesa Bernard Van Leer, que contribuiu com 57 mil euros em 2014. A Fundação Ford, por exemplo, doou mais de US$ 600 mil para o Instituto Sou da Paz. Uma das doações, realizada em 2005, fez com que o Tribunal Superior Eleitoral proibisse o instituto de participar da campanha do referendo do desarmamento (segundo a lei brasileira, organizações com financiamento estrangeiro não podem participar de campanhas políticas). Por parte da ONG Viva Rio os nomes se repetem, além de consulados de países como França e Suécia, organizações não-governamentais europeias, da Polícia Militar do Rio de Janeiro, das Organizações Globo, a ONG é também beneficiária de doações por parte das Fundações Ford e da Open Society, de Soros.

O Instituto Sou da Paz é também o realizador de uma pesquisa a respeito de doações da indústria armamentista a políticos brasileiros. Segundo a denúncia, cerca de 21 parlamentares eleitos, que comporiam a bancada da bala, receberam R$ 2 milhões em doações nas eleições de 2014. O valor, de forma irônica, é aproximadamente 10% do orçamento do próprio instituto.

Fonte: Spotniks, 01/02/2016

quarta-feira, 3 de junho de 2015

Na polêmica questão da redução penal, a proposta do senador Aloysio Nunes pode ser uma alternativa aos radicalismos


Punição mais rigorosa para a múltipla reincidência

por Aloysio Nunes Ferreira
No último dia 31, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), afirmou que vai colocar na pauta de votação da Casa, ainda neste mês, a proposta de emenda constitucional que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos. A decisão do deputado traz novamente à tona um debate necessário: a estratégia de punição para delitos cometidos por jovens na idade entre 16 e 18 anos deve se restringir apenas às medidas socioeducativas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)?

Esse caso reforça a necessidade de uma legislação atenta ao cenário atual. Sou autor da PEC 33/2012, que permite a redução da maioridade em casos específicos. Desde fevereiro de 2014, a proposta está pronta para deliberação em plenário do Senado e aguarda para ser colocada na ordem do dia.

Nos termos da minha proposta, é mantida a responsabilidade penal aos 18 anos como regra geral. Em casos excepcionais, entretanto, torna o adolescente maior de 16 anos passível de ser julgado como adulto, sendo-lhe aplicada a lei penal em vez da ECA.

São os casos para os quais a própria Constituição reclama uma punição particularmente rigorosa: os crimes chamados hediondos. E também quando o adolescente apresenta um histórico de múltipla reincidência em crimes de violência contra a pessoa.

No último dia 31, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), afirmou que vai colocar na pauta de votação da Casa, ainda neste mês, a proposta de emenda constitucional que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos. A decisão do deputado traz novamente à tona um debate necessário: a estratégia de punição para delitos cometidos por jovens na idade entre 16 e 18 anos deve se restringir apenas às medidas socioeducativas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)?

Esse caso reforça a necessidade de uma legislação atenta ao cenário atual. Sou autor da PEC 33/2012, que permite a redução da maioridade em casos específicos. Desde fevereiro de 2014, a proposta está pronta para deliberação em plenário do Senado e aguarda para ser colocada na ordem do dia.

Nos termos da minha proposta, é mantida a responsabilidade penal aos 18 anos como regra geral. Em casos excepcionais, entretanto, torna o adolescente maior de 16 anos passível de ser julgado como adulto, sendo-lhe aplicada a lei penal em vez da ECA.

São os casos para os quais a própria Constituição reclama uma punição particularmente rigorosa: os crimes chamados hediondos. E também quando o adolescente apresenta um histórico de múltipla reincidência em crimes de violência contra a pessoa.

Estando diante de fatos como esses, o promotor que atua na apuração do ato infracional irá requerer ao juiz do feito, de vara especializada, a instauração de um procedimento prévio ao julgamento. O objetivo é apurar a capacidade do adolescente infrator de compreender o caráter ilícito do seu ato. Caso a condução desse procedimento gere uma resposta positiva, o juiz aplica a lei penal, e, havendo condenação à pena privativa de liberdade, ela será cumprida em estabelecimento especializado.

Por que 16 anos? Porque o Direito brasileiro já reconhece que o adolescente tem condições de assumir responsabilidades jurídicas muito relevantes: se deseja votar, tem o testemunho válido em juízo e, possuindo renda própria, pode emancipar-se sem o consentimento dos pais.

* Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) é senador

Fonte: Extra, 03/06/2015

segunda-feira, 18 de maio de 2015

Fachin acredita que os juízes têm a prerrogativa de inventar a lei e podem substituir o mandato dos deputados e senadores.

Fachin expoente radical do neoconstitucionalismo,
a árvore teórica de um ativismo judicial ilimitado
Rendição
por Demétrio Magnoli

Max Weber distinguiu a "ética da convicção" da "ética da responsabilidade". Na sabatina de terça, Luiz Edson Fachin invocou a segunda para envernizar uma peculiar "ética da conveniência" –e passou 11 horas declarando sua adoração pelo que criticou ao longo da vida. O jurista atacou o direito de propriedade em 1986. Mas vale a pena discutir 1986? O jurista não aprecia a proteção especial à família nuclear. E daí? A diversidade de opiniões informadas enriquece o STF. Conversa inútil. Nenhum senador desviou-se dos rumos óbvios para inquiri-lo sobre o que interessa: a fonte das leis. Fachin acredita que os juízes têm a prerrogativa de inventar a lei. Se seu nome for aprovado em plenário, os senadores estarão assinando um termo de rendição do Poder Legislativo.

Fachin é da corrente de pensamento de outro Luís, Roberto Barroso, que já está no STF. Eles são expoentes da vertente radical do neoconstitucionalismo, a árvore teórica de um ativismo judicial ilimitado. Nesse campo ideológico, a norma formal deve ceder lugar à norma axiológica, isto é, a valores morais genéricos que serviriam de régua na interpretação dos códigos legais. A Constituição proclama as metas da igualdade, do bem-estar e da justiça? Sob a ótica deles, é o suficiente para varrer a letra das leis pelo sopro purificador do juiz-ativista.

Tudo que está escrito pode ser lido pelo avesso –eis a mensagem de Luís e Luiz. Na "nova dogmática da interpretação constitucional" de Barroso, a filtragem do Direito escorrega da norma objetiva para o terreno do arbítrio subjetivo. A Constituição abriga o princípio da igualdade perante a lei? Basta reinterpretá-la à luz do imperativo de justiça histórica –e concluir pela recepção de leis raciais na ordem jurídica nacional. A letra constitucional proíbe a discriminação de cor no acesso à educação superior? Basta atribuir um significado paradoxal à palavra –e explicar que a meta axiológica da igualdade demanda a "discriminação positiva".

O neoconstitucionalismo nasceu no pós-guerra como reação progressista ao formalismo excludente da ordem liberal. "A lei tem que ser legítima, alinhando-se aos princípios constitucionais!", gritaram os juristas indignados com o novelo de artimanhas de uma legalidade meticulosamente construída para negar direitos. Contudo, nas margens dessa revolta modernizante, surgiu uma escola jacobina que prega a reforma social pelo Direito e, não por acaso, repete incessantemente o mantra da "carência de legitimidade" dos atuais parlamentos.

Os fundadores da arquitetura moderna queriam "mudar a cidade para transformar a sociedade". Os juristas jacobinos cultivam o mesmo sonho exagerado, mas escolheram a ferramenta do Direito, o que os coloca em rota de colisão com o poder encarregado de fazer as leis. Fachin não é petista, a não ser num sentido puramente circunstancial. Mais que um partido, precisa de alianças com o "povo organizado": movimentos sociais, entidades corporativas, ONGs. A reengenharia da ordem jurídica, por cima dos representantes eleitos, deve ser vista como produto da vontade da sociedade civil. Fachin compartilha com o PT o objetivo de anular os direitos do Congresso, isto é, do "povo desorganizado".

"Uma Constituição se faz Constituição no desenrolar de um processo constituinte material de índole permanente", pelo recurso a "ações afirmativas" e pelo "resgate de dívidas históricas", escreveu Fachin em 2011. A "revolução permanente" do Direito, pelo ativismo do jurista iluminado –eis o núcleo do seu pensamento. Numa sabatina intelectualmente preguiçosa, os senadores nem mesmo roçaram no tema relevante. Família? Propriedade? Não: Fachin quer transferir para "os juristas que têm lado" o mandato dos deputados e senadores. Alvaro Dias tem razão numa coisa: essa decisão "não é uma questão partidária".

Fonte: Folha de São Paulo, 16/05/2015

quinta-feira, 14 de maio de 2015

A princesa Isabel foi ovacionada por brasileiros de todas as cores e classes pela assinatura da Lei Áurea

Princesa Isabel: Abolição que lhe custou o trono

Destaque:
Na Corte, esperavam o casal de príncipes, mais de dez mil pessoas. Delírio na praça em frente ao paço imperial. Uma explosão de alegria sacudiu a multidão quando a princesa recebeu a legação para a assinatura. Vestida de branco pérola e rendas valencianas, ela assinou a lei com uma caneta cravejada de brilhantes. José do Patrocínio, ajoelhado, beijou-lhe as mãos e foi seguido por outros membros da Confederação Abolicionista. Nabuco discursou, enquanto parte do público dançava. “Tão bom como tão bom” era o grito de guerra dos emancipados, embriagados de liberdade. Isabel ganhou um buquê de camélias e violetas. Depois, foi para o balcão apoiada pelo antigo ministro Cotegipe. Ao perguntar-lhe o que achava do gesto, o velho político respondeu: “Redimiste, sim, Alteza, uma raça; mas perdeste vosso trono…”. Eram cerca de 15 horas.
O troco foi uma ovação. Eram as vozes dos zungús, dos quilombos, das senzalas, dos cafés e redações de jornais da Rua do Ouvidor, da boemia literária. De velhos e jovens, homens e mulheres de todas as classes e condições. A popularidade da família imperial bateu todas as expectativas. Anos mais tarde, o escritor Lima Barreto que tinha sete anos, lembraria das palmas, dos acenos com lenços e vivas. Em todo o império, comoção. “Aclamações populares”, no Maranhão. “Delírio”, no Recife. “Estrondosas manifestações de regozijo popular” em Fortaleza.

A princesa Isabel e a Lei Áurea

A assinatura da Lei Áurea, em 13 de maio de 1888, se deu durante a regência da princesa Isabel, enquanto seu pai, D. Pedro II, estava ausente do país para cuidar da saúde na Europa. A princesa tinha razões políticas e religiosas que a aproximaram do movimento abolicionista. Passado o entusiasmo inicial, entretanto, a resistência a um terceiro reinado, com Isabel como imperatriz, voltou. O império cairia pouco tempo depois, perdendo os seus últimos apoiadores – o senhores de escravos. Acompanhe a narrativa dos acontecimentos de Mary del Priore, em “O Castelo de Papel”.

Junto com a opinião pública, Isabel já estava convencida: “Deus me ajude e que a questão da emancipação dê breve o último passo que tanto desejo ver chegar! Há muito a fazer. Mas isto antes de tudo”, escreveu ao pai. Como de praxe, o Barão de Cotegipe (presidente do Conselho de Ministros) perguntou a Regente a quem devia chamar para substituí-lo. Tinha esperanças de indicar um sucessor. Mas ela não lhe deu tempo. Pediu que João Alfredo, conservador e senador por Pernambuco, que apoiava a causa abolicionista, tomasse seu lugar. A escolha foi interpretada como um sinal verde para a causa. Cauteloso, antes de aceitar o cargo, João Alfredo foi pedir a benção a Cotegipe que lhe prometeu: “conte com os meus amigos”.

11 de Março de 1888: o novo gabinete foi acolhido com manifestações de alegria em toda a parte. Do Conselho dos Ministros fazia parte Antônio Prado, na pasta dos negócios Estrangeiros. Até a província do Rio de Janeiro, reduto dos mais influentes de senhores de escravos, dobrou-se. Alguns senhores alforriavam os seus, seguindo o exemplo dos paulistas. Em Minas Gerais, libertações voluntárias se juntaram à iniciativa dos cativos que deixavam pacificamente as fazendas.

A 17 do mesmo mês, Gastão (o conde D’Eu) escrevia à França comentando que a principal tarefa do novo gabinete seria “de votar, ao longo do ano, a abolição definitiva”. Afinal, os escravos por si sós ou por alforrias, iam abandonando senzalas. Faltando apenas três semanas para a assinatura da Lei Áurea, ele escreveu à tia Francisca, externando sentimentos contraditórios em relação ao assunto:

“Conta-se que, brevemente, será votada a abolição completa da escravidão, o que já é uma necessidade, pois quase ninguém a quer mais. E é de se esperar que a maior parte dos negros, apesar de libertos, continuem a trabalhar nas fazendas”.

Mas, abolição já? Segundo Gastão “só com medidas rigorosas e destinadas a satisfazer a lavoura, obrigando os libertos à residência fixa e a procurar ocupação”. Mas ele sabia também que isso seria difícil. Melhor “confiar na Providência que até hoje tem protegido o Brasil e na boa índole da gente”. Ninguém sabia o que ia acontecer menos ainda o novo ministro: haveria ou não indenização pelos libertos? A libertação seria imediata ou haveria um prazo, talvez dois anos? Afinal a colheita de café estava para começar no vale do Paraíba… E não faltava quem prognosticasse: “O que é a emancipação para o Brasil? É a Revolução!”.

Na Fala do Trono, proferida no dia 3 de maio, Isabel mencionou a “extinção do elemento servil pelo influxo do sentimento nacional [...] aspiração aclamada por todas as classes [...] para que o Brasil se desfaça da infeliz herança”. Aplausos e simpatia. Mas, não se falava em data. Porém magistratura, classes armadas, funcionalismo público, imprensa, mocidade das escolas, agricultores, todos se agitavam e cabalavam pela sorte dos cativos.

Em resposta à crescente pressão, almoçaram no palácio imperial, quatorze africanos fugidos de fazendas vizinhas em Petrópolis – anotou o abolicionista André Rebouças. E no mesmo diário, a 12 de maio, acrescentou: “Excedem a mais de mil os escravizados acolhidos a Petrópolis, hospedados pela Comissão Libertadora sob os auspícios de Isabel, a Redentora”. A comissão devia ter alguma relação com a Confederação Abolicionista. Quem a compunha? Pouco se sabe. Rebouças não esclarece e Gastão não a menciona nenhuma vez na abundante correspondência que mantém com a França.

Mal assumiu o governo, João Alfredo recebeu uma representação dos deputados de São Paulo: queriam abolição imediata, incondicional e sem cláusula de serviço. Nada de gradualismos para manter a quietação no país. Na abertura da nova sessão legislativa, o ministro da agricultura, Rodrigo Antonio da Silva, premido pelos paulistas apresentou um projeto de abolição incondicional. Nabuco exortou os parlamentares a esquecer as disputas partidárias diante da importância da questão. Importava conciliar liberais e conservadores contra o escravismo. Uma aliança, ainda que efêmera. Palmas dentro e fora da Câmara, cercada por cerca de cinco mil pessoas. O regime de urgência para a votação foi adotado. Os membros da casa votaram: 83 contra 9. Uma onda de entusiasmo garantiu sua assinatura em sete dias.

Isabel contribuiu. Veio de Petrópolis num domingo, 13 de maio, a fim de transformar, com sua assinatura, o projeto em lei. Exultava: seria aquele um dos mais belos dias de sua vida, se não fosse saber estar o pai doente. Mas, Deus permitiria que D. Pedro voltasse “para tornar-se, como sempre, tão útil à nossa pátria”. A ele, escreveu dizendo-lhe da alegria de “ter trabalhado para ideia tão humanitária e grandiosa”, apesar das noites curtas e excitações de todo o gênero. Estava cansada – rezingava.

Na Corte, esperavam o casal de príncipes, mais de dez mil pessoas. Delírio na praça em frente ao paço imperial. Uma explosão de alegria sacudiu a multidão quando a princesa recebeu a legação para a assinatura. Vestida de branco pérola e rendas valencianas, ela assinou a lei com uma caneta cravejada de brilhantes. José do Patrocínio, ajoelhado, beijou-lhe as mãos e foi seguido por outros membros da Confederação Abolicionista. Nabuco discursou, enquanto parte do público dançava. “Tão bom como tão bom” era o grito de guerra dos emancipados, embriagados de liberdade. Isabel ganhou um buquê de camélias e violetas. Depois, foi para o balcão apoiada pelo antigo ministro Cotegipe. Ao perguntar-lhe o que achava do gesto, o velho político respondeu: “Redimiste, sim, Alteza, uma raça; mas perdeste vosso trono…”. Eram cerca de 15 horas.

O troco foi uma ovação. Eram as vozes dos zungús, dos quilombos, das senzalas, dos cafés e redações de jornais da Rua do Ouvidor, da boemia literária. De velhos e jovens, homens e mulheres de todas as classes e condições. A popularidade da família imperial bateu todas as expectativas. Anos mais tarde, o escritor Lima Barreto que tinha sete anos, lembraria das palmas, dos acenos com lenços e vivas. Em todo o império, comoção. “Aclamações populares”, no Maranhão. “Delírio”, no Recife. “Estrondosas manifestações de regozijo popular” em Fortaleza.

Poetas declamavam em público versos que exaltavam o momento. Panfletos eram distribuídos entre a população: “Arcanjo da liberdade. Da pátria loura esperança. Mimosa flor de Bragança. Celeste núncio de amor [...] vê que os corações humanos, têm todos a mesma cor”, cantava Artur Azevedo. Nos versos de um, Isabel era “uma grande e santa mulher”. Outro celebrava “a era luminosa”. Outro ainda: “rasgou-se a folha negra”. E não faltava quem comemorasse, pedindo em rimas: “Deem-me ai um copo de cerveja”, bebida na moda que substituiu a cachaça. Vez por outra, ouviam-se gritos de “Viva a República”!

Sobre a data, Gastão diria que “o momento psicológico tinha chegado”. Que “a natureza impressionável das raças deste país dava lugar a um entusiasmo sem limites e tocante”. Segundo ele, o sucesso para a monarquia era colossal. Nela se reconhecia “o agente principal de transformação tão ardentemente reclamado”. Voltaram para casa por ruas atapetadas de flores. Em Petrópolis foram recebidos com lanternas chinesas, música, foguetes, um séquito de trinta ex-escravos e chuva. Todos direto para a igreja “rezar o mês de Maria”. Segundo um poético Rebouças, Deus teria visto tudo, “iluminando a cena com relâmpagos e derramando lágrimas de infinito júbilo”. No dia seguinte, “um dia tranquilo”, receberam apenas mais “visitas do que de costume”. Para Gastão, tudo ia bem, “salvo as espoliações tão inevitavelmente impostas aos proprietários retardatários”.

Nos dias subsequentes, houve missa na igreja do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos e o secretário da irmandade, um maçom, expressou sua vontade: “que ao lado de santa Isabel de Portugal, figurasse santa Isabel, a brasileira”.

Fonte: História Hoje, 13/05/2015, por Márcia Pinna Raspanti

terça-feira, 14 de abril de 2015

A criminalização do aborto é a medida pela qual os homens reafirmam seu poder sobre o corpo feminino.


Ótimos argumentos, justa empatia com as mulheres no artigo abaixo do André Coelho que reproduzo do site Contramuros. Os conservadores tratam processos de formação de uma vida (zigoto, embrião, feto) como se fossem um indivíduo, e a mulher, que é de fato um indivíduo, plenamente constituído, consciente, senciente, inteligente, eles tratam como se fosse um objeto. O discurso conservador sobre o aborto é pura misoginia, é a total desumanização da mulher, transformada em coisa. Não importa o que ela sente, pensa, nem sequer as condições objetivas que tem para manter ou não uma gravidez até sua resolução. Ela não é um ser humano, é apenas uma incubadeira que tem a obrigação de exercer sua função que é a de parir seus futuros algozes. E o pior é que esses cancervas não se contentam em expressar suas falácias sobre o assunto - e quem quiser que compre. Eles querem impor essas falácias pela goela de todos abaixo usando o Estado para isso.

Ver também:

Retrospectiva 2014: Conservadores e sua misoginia: contra a interrupção da gravidez até nos casos previstos em lei  
Para conferir quem de fato mata criancinhas: O macho, arma de destruição em massa.

O aborto deve ser descriminalizado

Um argumento em favor da liberalização do aborto, ou pró-escolha, precisa de dois passos: mostrar que o aborto não é moralmente errado, e mostrar que sua liberalização é desejável. 

Para provar que o aborto não é moralmente errado vou atacar três pressupostos comuns em argumentos pró-vida: que o feto é um ser humano, que ele tem direito à vida e que este direito prevalece sobre o direito de escolha da mãe.

Em primeiro lugar, não é óbvio que o feto seja um ser humano. Há que distinguir entre o sentido biológico e o sentido moral de ser um ser humano. Ser humano em sentido biológico é pertencer à espécie homo sapiens. Embriões humanos, comatosos irreversíveis e cadáveres são seres humanos neste sentido. O mesmo ocorre com o feto. Ele é, em sentido biológico, incontestavelmente humano.

Porém, além do sentido biológico, ser humano tem também um sentido moral. Em sentido moral, ser um ser humano é possuir as propriedades morais relevantes que justificam a deferência moral que se reserva a humanos. Essas propriedades incluem senciência, razão, liberdade, linguagem, agência, responsabilidade, perspectiva de futuro etc. Embriões, comatosos e cadáveres carecem de várias dessas. Assim também o feto. 

E mesmo que o feto seja, em algum sentido moral, um ser humano, isto não lhe garante automaticamente direito à vida. Veja: é possível formular um argumento em favor da humanidade moral do feto. Pode-se argumentar que a posse potencial das propriedades morais relevantes não iguala o feto ao ser humano pleno, mas o distingue de casos como o embrião, o comatoso e o cadáver. Nesta forma, o argumento é aceitável.

O que não é aceitável nele é que ele retire a consequência de que a diferença é tal que justifica conceder ao feto um direito inviolável à vida que prevalece sobre o direito de escolha de um ser cuja humanidade moral é plena: a mãe. Talvez seja possível reconhecer no feto uma propriedade moral relevante que outros casos não possuem. Mas daí a atribuir a ele um direito inviolável à vida vai uma grande ­ e injustificada ­ distância a ser coberta. A ideia de proteção de propriedades morais futuras, incapazes de produzir sofrimento, prevalecer sobre a proteção de propriedades morais presentes, capazes de produzir sofrimento, é pouco defensável do ponto de vista racional.

O direito à vida é ainda derrotável por outras considerações. A maioria dos ordenamentos jurídicos, por exemplo, reconhece a possibilidade de se tirar a vida por legítima defesa, por estado de necessidade ou em caso de guerra. Também no Brasil já se reconhece a possibilidade de aborto legítimo em caso de risco à vida da mãe, de gravidez por estupro e de anencefalia do feto. Poderia ser que todos estes fossem exemplos de ilícitos morais transformados em permissões jurídicas? Em tese, é uma possibilidade. Mas parece mais plausível que nossas intuições morais a respeito da vida não a tomem como um direito absoluto ou inviolável, nem para fetos, nem para humanos moralmente plenos. 

Assim, (a) pertencer à espécie humana não torna um feto automaticamente humano em sentido moral; (b) mesmo que ele tenha em potencial as propriedades morais relevantes, isto no máximo lhe garante uma proteção prima facie à vida; (c) esta proteção, contudo, não prevalece sobre os direitos de seres humanos moralmente plenos.

Agora vem a segunda parte, que é mostrar que ele é moral e/ou politicamente desejável.

Primeiro, o aborto é um problema de saúde pública. Sendo a moralidade do aborto um assunto controverso e sendo as consequências da gravidez onerosas para as mães, um grande número de mulheres se submeterão a abortos, quer legalizados, quer clandestinos. Estes últimos, contudo, são caros para as mulheres pobres e perigosos quando feitos sem condições de segurança.

Em vista disto, para dar às mulheres pobres a mesma segurança de saúde das ricas, a liberalização do aborto – com sua consequente oferta gratuita na rede pública hospitalar – seria moral e politicamente desejável como política de igualdade e de saúde. Se quem é contrário ao aborto está tentando salvar vidas, precisa saber que a liberalização salva mais vidas que a proibição. A proibição não impede que fetos morram, apenas aumenta as chances de que mães morram junto.

O fato de as mulheres terem que gestar, parir e cuidar dos filhos, mesmo contra a sua vontade, ajudou historicamente que fossem encaixadas em papeis subalternos. A proibição é a medida pela qual os homens reafirmam seu poder sobre o corpo feminino. A liberalização reverte esta lógica histórica e devolve à mulher a liberdade sexual e corporal que lhe pertence. Quem concebe, gesta, pare e nutre é quem decide: não apenas quem olha de fora e condena.

Por último, a liberalização do aborto é uma medida em prol de que toda criança nasça num lar que a deseja. Para garantir isto na maior medida possível, é preciso diminuir o número de gravidezes indesejadas. Assim como não se é a favor do casamento e da convivência compulsória entre marido e mulher, não se deve ser a favor da gravidez e maternidade compulsórias. Recuperar o sentido positivo da família passa também por diminuir o número delas que se forma por acidente e se torna motivo de infelicidade perpétua para todos os envolvidos.

Espero que estes argumentos ajudem a pensar a respeito da questão e façam com que os que têm inclinações pró-vida revejam seus pressupostos. 

André Coelho, 34, é mestre e doutorando em filosofia pela UFSC (com período sanduíche na Goethe Universität). É autor do blog Filósofo Grego.

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

As falácias do falo, exemplo de texto escrito por homem sobre mulheres sem ser mimizento

As falácias do falo
A exemplo do que disse em meu texto de segunda, Misandria: uma grande zoeira e o sempre renovado ataque à autonomia das mulheres, há homens que tentam desconstruir em si mesmos os condicionamentos machistas que receberam em vez de querer dizer a feministas o que o feminismo é ou não.

Idade não é documento, mas talvez a geração mais jovem de homens também esteja, como a das mulheres, mais propensa a questionar a (des)educação que recebeu desde o berço. O jovem que escreveu o texto abaixo, pelo menos nele, demonstra mais consciência do machismo do que muitas mulheres que conheço. Prova de que há esperanças para a humanidade.

Destaco algumas frases do artigo que vão ao encontro do que comentei sobre homens antipatriarcais. 
Ao decidir escrever esse texto, concluí que precisava ter uma dose razoável de humildade e outra de honestidade intelectual. Eu desejo que esse texto seja lido como o mais feminista possível para algo elaborado por um homem...
Essa minha preocupação também guiou a estrutura do texto: em vez de dizer "o feminismo é isso ou aquilo", vou focar meus esforços em desconstruir aquilo que podemos chamar de falácias do falo, ou seja, argumentos machistas que muitas vezes são naturalizados por nós e não são percebidos como a opressão que realmente são.
É comum dizerem que uma mulher reagiu "histericamente" em relação a alguma cantada de rua. Por outro lado, é raro chamarem um marido abusivo, violento, de irracional. Isso ilustra bem como as palavras podem ser usadas de forma a discriminar.
Por outro lado, as mulheres sempre foram ensinadas a competirem entre si para atraírem a atenção de algum pretendente. A falácia ignora que existiram numerosas instituições ou agremiações exclusivamente femininas, marcadas por fortes laços de solidariedade, no decorrer da história. A mulher não é dissimulada ou traiçoeira. Ela foi forçada, socialmente, a agir assim em relação às suas iguais.

As falácias do falo

por Daniel Murata

Estava faz tempo decidindo se escreveria ou não esse texto. Escrever sobre a luta das mulheres contra a opressão do machismo não é tarefa fácil. Em especial, se você é um homem tentando escrever sobre isso, pode incorrer em - no mínimo - uma grave miopia em relação às diversas formas de opressão que existem na sociedade.

Ao decidir escrever esse texto, concluí que precisava ter uma dose razoável de humildade e outra de honestidade intelectual. Eu desejo que esse texto seja lido como o mais feminista possível para algo elaborado por um homem, uma vez que há sempre a dúvida se é possível ao homem compreender de fato a extensão da opressão contra a mulher.

Essa minha preocupação também guiou a estrutura do texto: em vez de dizer "o feminismo é isso ou aquilo", vou focar meus esforços em desconstruir aquilo que podemos chamar de falácias do falo, ou seja, argumentos machistas que muitas vezes são naturalizados por nós e não são percebidos como a opressão que realmente são. Vamos então ver algumas dessas falácias.

Falácia nº1: "A mulher deve se dar ao respeito". Essa falácia é de longe uma das mais famosas. Esse argumento simplesmente não especifica o que é "se dar ao respeito" e nem por que motivo só mulheres devem fazer isso. No fundo, trata-se de mera discriminação disfarçada. Por que uma mulher ir à balada e ficar com quem ela bem entender é "não se dar ao respeito", enquanto para os homens isso é motivo de orgulho? Por acaso os homens tem mais direitos sexuais que as mulheres apenas porque são homens? Por que mulheres deveriam se vestir com recato, enquanto homens andam sem camisa e sem problemas?

Rebater essa primeira falácia nos leva a uma pergunta central: qual é - efetivamente - o mérito em ser homem ou mulher? Nascer com um sexo ou outro é tão somente uma questão de probabilidade. Se assim o é, não há mérito em ser de um sexo específico. Não há forma de se defender direitos de um gênero e não de outro sem ser injusto e arbitrário. Ser homem não é mérito algum, o mero fato de sê-lo não fundamenta direitos adicionais. Isso significa dizer, trocando em míudos, que não é a mulher que deve se dar ao respeito, mas o homem que deve respeitar a vontade da mulher, que pode tanto quanto ele.

"Pequena" ressalva: a mulher - por causa da biologia reprodutiva - acaba se valendo de direitos que não fazem sentido ao homem, ao menos não ao homem cisgênero. Direito à gestação e parto de qualidade e dignos e direito à amamentação são dois exemplos. Esses direitos fazem sentido para as mulheres porque integram sua dignidade enquanto seres humanos de igual valor a todos e cada um de nós. Expulsar uma mulher de um restaurante por ela ter amamentado em público é tão absurdo quanto expulsar um homem por ele ter um pênis.

Falácia nº2: "A mulher é naturalmente mais irracional que o homem". Essa costuma fazer dobradinha, em discussões, com frases do tipo "você está exagerando" ou "você é louca". Esse argumento tem dois pontos falhos. Primeiramente, a ideia de alguém ser "naturalmente" mais que outra pessoa. Isso é dar de barato que mulheres tem uma menor capacidade cognitiva que homens, algo que está longe de ser realidade.

O segundo ponto falho é a própria ideia de irracionalidade. Definir algo como racional é algo complexo, e usualmente usado como forma de discriminar entre entes superiores ou inferiores. A ideia de racionalidade é maleável, e no caso dessa falácia, é utilizada para dizer que determinadas formas de reação a xingamentos ou agressões são irracionais e outras não. É comum dizerem que uma mulher reagiu "histericamente" em relação a alguma cantada de rua. Por outro lado, é raro chamarem um marido abusivo, violento, de irracional. Isso ilustra bem como as palavras podem ser usadas de forma a discriminar.

Falácia nº3: "a mulher é dissimulada e traiçoeira, o homem é mais íntegro". O erro dessa falácia é parecido com o da anterior. Aqui, ocorre a naturalização de uma situação contingente. O que isso significa: historicamente, nossa sociedade sempre induziu homens a serem fraternais entre si. A ideia de "irmãos de armas" até hoje exerce fascínio sobre as pessoas. Por outro lado, as mulheres sempre foram ensinadas a competirem entre si para atraírem a atenção de algum pretendente. A falácia ignora que existiram numerosas instituições ou agremiações exclusivamente femininas, marcadas por fortes laços de solidariedade, no decorrer da história. A mulher não é dissimulada ou traiçoeira. Ela foi forçada, socialmente, a agir assim em relação às suas iguais.

Falácia nº4: "mulher que não se depila é anti-higiênica ou porca". Qual foi a última vez que você, leitor homem, depilou suas axilas ou seus genitais?
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PS: Agradeço minha colega e amiga, Bárbara Simão, pela leitura do texto e comentários valiosos. É sempre difícil para alguém com vocação para abstrações, como eu, escrever um texto sobre problemas muito reais enfrentados por pessoas no dia-a-dia.

Fonte: Brasil Post, 05/02/2015

terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Mude o mundo: seja amiga de uma mulher


7 razões para você empoderar uma garota ao invés de explicar feminismo para um cara

Destaque: As mulheres não têm obrigação de explicar o conceito de feminismo para os homens
"Para isso existe o Google, não é mesmo?", brinca. Não é que os homens não precisam ficar a par dessa luta, muito pelo contrário, mas eles jamais serão os protagonistas dessa batalha. Por isso, é preferível, de acordo com a idealizadora da campanha, perder energia e ganhar tempo dando força às garotas a gastar saliva explicando a um rapaz o porquê do movimento ser tão importante. "Enquanto isso, muitas mulheres também continuam sem entender o motivo e elas devem ser as principais impactadas", esclarece.

A CAPRICHO, em parceria com a idealizadora da campanha, listou 7 motivos para você empoderar duas amigas e contribuir com essa corrente do amor:

1. O empoderamento quebra barreiras
Quando você dá poder a uma amiga, você dá voz aos sentimentos dela. É como se você desse um voto de confiança e acreditasse nela para valer! Parece algo meio bobo, mas é desse jeitinho que você vai superando as barreiras pratriarcais que existem há séculos. "Empoderando você encoraja. Não existe corpo ideal ou garota ideal. Existe o que você quiser que exista", esclarece Maynara.

2. Empoderar é bem melhor que competir
Você já deve ter escutado um menino ou até mesmo uma colega de sala dizer que garotas não têm amigas, pois são muito competitivas e até se vestem para impressionar as rivais. Quando você dá poder a uma menina, você acaba com toda essa rivalidade e, acredite, vive mil vezes mais leve sem toda essa cobrança. Maynara explica o motivo: "ouvimos o tempo todo que mulher não pode ser isso e não pode fazer aquilo, para não ficar mal falada, e que deve cuidar do corpo de tal forma para deixá-lo de acordo com os padrões de beleza. O machismo faz com que as garotas vivam em constante competição, quando, na verdade, deveriam ser pura e simplesmente aliadas".

3. Apoiar outras garotas é o princípio básico do feminismo
"A troca de experiências conforta uma parte das mulheres que se sente incomodada com a opressão e faz com que a outra metade, que, eventualmente, ainda não consegue enxergar o quão machista é a nossa sociedade, sinta-se tocada", conta Maynara. Afinal, os homens não precisam lutar a favor do movimento. 

4. Compartilhar experiências te faz abrir os olhos
"Eu já tive meus 13, 15, 17 anos. Você precisa ser uma boa filha, estar dentro dos padrões, mas não exagerar para não ficar com má fama. Precisa agradar um namorado e trocar de roupa quando ele disser que aquela está muito curta. Conhecer seu corpo e se descobrir, pois dizem que é importante, mas fazer isso sem se sentir culpada depois. Não é fácil, mas quando você descobre que acontece igual com a amiga, fica menos aterrorizante", afirma May. A mesma coisa acontece quando você descobre que não foi a única assediada no metrô, que não foi a única que se sentiu invadida por uma cantada no meio da rua ou que foi agarrada por um menino sem noção na festa e ainda precisou sorrir para não parecer grossa. A troca de vivências, de conselhos, de amor, é a saída. 

5. As mulheres não têm obrigação de explicar o conceito de feminismo para os homens
"Para isso existe o Google, não é mesmo?", brinca. Não é que os homens não precisam ficar a par dessa luta, muito pelo contrário, mas eles jamais serão os protagonistas dessa batalha. Por isso, é preferível, de acordo com a idealizadora da campanha, perder energia e ganhar tempo dando força às garotas a gastar saliva explicando a um rapaz o porquê do movimento ser tão importante. "Enquanto isso, muitas mulheres também continuam sem entender o motivo e elas devem ser as principais impactadas", esclarece.

6. Opressor e oprimido nem sempre convivem em harmonia
Para não falar nunca! Isso é justificado por um simples fato: o privilegiado nunca quer abdicar de tudo aquilo que lhe favorece. Fica muito difícil incluir o opressor dentro de um movimento de oprimidos. É por isso que a campanha da Maynara é e sempre será de menina para menina. "Muitos caras se dizem feministas para agradar, mas, na prática, continuam fazendo tudo aquilo que os tornam machistas".

7. Você é a primeira pessoa que precisa se libertar de estereótipos
Quando alguém te coloca láááá em cima, você não fica com uma sensação de "eu posso, eu consigo"? É esse sentimento que, muitas vezes, te dá coragem para ir além, se abrir, se aceitar, lutar por um sonho. Teoricamente, você tem liberdade de se vestir do jeito que bem entender, ficar com quem quiser e quando sentir vontade, se depilar com cera, com lâmina ou até mesmo não depilar. Contudo, na prática, as coisas não são tão simples. Muitas vezes, a garota não se sente segura para tomar tal decisão. Autoestima é o primeiro passo para a quebra de paradigmas. Como já dizia Demi Lovato: "minha armadura é feita de aço. Você não pode entrar nela. Sou uma guerreira e você nunca poderá me machucar!"

Para curtir a página da campanha "Empodere Duas Mulheres" no Facebook e saber mais sobre ela, clique aqui.

Fonte: Capricho, por Isabella Otto, 25/01/2015

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Arnaldo Jabor vai direto ao âmago da crise brasileira

Jabor anda pessismista. Quem não? Mas seu texto toca nos pontos nevrálgicos que levaram o país a esse contexto de falta de luz no fim do túnel. Cita a covardia do PSDB que não combateu o petismo durante esses tristes anos de governos Lula e Dilma, sendo cúmplice da atual situação por omissão. E cita a estupidez da esquerda bolivariana brasileira, herdeira do comunismo, que não consegue fazer coisa alguma a não ser manter os pobres na pobreza assistida do bolsa-família para poder periodicamente colher-lhe os votos. Duro, mas necessário.

A derrota do óbvio

Arnaldo Jabor

A vitória da Dilma começou há dez anos, quando o PSDB preferiu não se defender dos ataques de Lula e do PT. Nunca entenderei como um partido que, no governo, acabou com a inflação, criou leis modernizantes, reformas fundamentais, se fechou, se "arregou, se encagaçou" diante das acusações mais infundadas, por preguiça e medo. Aí o PT deitou e rolou. E conseguiu transformar o social-democratas em "reacionários de direita", pecha que os jovens imbecis e intelectuais de hoje engoliram.

Ou seja, o melhor projeto para o País foi desmoralizado como "neoliberal", de "direita".

Os intelectuais que legitimaram o Lula /Dilma nos últimos 12 anos repetem os diagnósticos óbvios sobre o mundo capitalista, mas, na hora de traçar um programa para o Brasil, temos o "silêncio dos inocentes". Rejeitam o capitalismo, mas não têm nada para botar no lugar. Assim, em vez de construir, avacalham. Estamos no início de um grave desastre. E esses "revolucionários" de galinheiro não se preocupam com o detalhe de dizer "como" fazer suas mudanças no País.

Dizem que querem mudar a realidade brasileira, mas odeiam vê-la, como se a realidade fosse "reacionária". Isso me faz lembrar (para um breve refresco cômico) a frase de Woody Allen: "A 'realidade' é enigmática, mas ainda é o único lugar onde se pode comer um bom bife".

No Brasil, a palavra "esquerda" continua a ser o ópio dos "pequenos burgueses" (para usar um termo tão caro a eles). Pressupõe uma especialidade que ninguém mais sabe qual é, mas que "fortalece", enobrece qualquer discurso. O termo é esquivo, encobre erros pavorosos e até justifica massacres.

Nas rasas autocríticas que fazem, falam em "aventureirismo", "vacilações", "sectarismo" e outros vícios ideológicos; mas o que os define são conceitos como narcisismo, paranoia, onipotência, voracidade, ignorância. É impossível repensar uma "esquerda", mantendo velhas ideias como: "Democracia burguesa, fins justificam os meios, superioridade moral sobre os 'outros', luta de classes clássica". Uma "nova esquerda" teria de acabar com a fé e a esperança. Isso dói, eu sei; mas contar com essas duas antigas virtudes não cabe mais neste mundo de bosta de hoje.

As grandes soluções impossíveis amarram as possíveis. Temos de encerrar as macrossoluções e aceitar as "micro". O discurso épico tem de ser substituído por um discurso realista e até pessimista. O pensamento da "esquerda metafísica" tem de dar lugar a uma reflexão mais testada, mais sociológica, mais óbvia, mais cotidiana.

Não quero bancar o profeta, mas qualquer um que tenha conhecido a turminha que está no poder hoje, nos idos de 1963, poderia adivinhar o que estava para vir. E olhem que nos meus 20 anos era impossível não ser "de esquerda". Havia o espírito do tempo da guerra fria, uma onda de esperança misturada com falta de experiência. Nós queríamos ser como os homens maravilhosos que conquistaram Cuba, os longos cabelos louros de Camilo Cienfuegos, o charuto do Guevara, a "pachanga" dançada na chuva linda do dia em que entraram em Havana, exaustos, barbados, com fuzis na mão e embriagados de vitória.

A genialidade de Marx me fascinava. Um companheiro me disse uma vez: "Marx estudou economia, história e filosofia e, um dia, sentou na mesa e escreveu um programa para reorganizar a humanidade". Era a invencível beleza da Razão, o poder das ideias "justas", que me estimulava a largar qualquer profissão "burguesa". Meu avô dizia: "Cuidado, Arnaldinho, os comunistas se acham 'médiuns', parece tenda espírita...".

Eu não liguei e fui para os "aparelhos", as reuniões de "base" e, para meu desalento, me decepcionei.

Em vez do charme infinito dos heróis cubanos, comecei a ver o erro, plantado em duas raízes: ou uma patética tentativa de organização da sociedade que nunca se explicitava ou, de outro lado, um delírio radical utópico. Eu e outros "artistas" morávamos numa espécie de "terceira via" revolucionária e começamos a achar caretas ou malucos os nossos camaradas. Nas reuniões e assembleias, surgia sempre a presença rombuda da burrice. A burrice tem sido muito subestimada nas análises históricas. No entanto, ela é presença obrigatória, o convidado de honra: a burrice sólida, assentada em certezas. As discussões intermináveis acabavam diante do enigma: o que fazer? E ninguém sabia. Eu nunca vi gente tão incompetente como os "comunistas". São militantes cheios de fé como evangélicos, mas não sabem fazer porra nenhuma. E até hoje são fiéis a essa ignorância. Trata-se de um cinismo indestrutível em nome de um emaranhado de dogmas que eles chamam de "causas populares". E Lula montou nessa gente e essa gente no Lula.

A grande mentira está adoecendo os homens de bem que romanticamente achavam que o Brasil poderia se modernizar. Os safados atuais acreditam que o País não tem condições de suportar a "delicadeza" da democracia. E como o socialismo é impossível - eles remotamente suspeitam - partiram para o mais descarado populismo, que funciona num país de pobres analfabetos e famintos. E eles são mantidos "in vitro" para futuras eleições. E populismo dura muito. Destruirão a Venezuela e Argentina com a aprovação da população de enganados. É muito longa a "jornada dos imbecis até o entendimento".

Na situação atual, é um insulto vermos o regresso do Brasil a um passado pré-impeachment do Collor. Reaparecem todos os vícios que pareciam suprimidos pela consciência da sociedade. E para além das racionalizações, do "wishful thinking" dos derrotados (tucanos "fortalecidos", etc.), a oposição vai ter de lutar muito para impedir o desastre institucional que pode ser irreversível.

Nas últimas eleições, não houve uma disputa tipo FlaxFlu. É muito mais grave. Estamos descobrindo que temos poucos instrumentos para modernizar o País - tudo parece ter uma vocação para a marcha à ré em direção ao Atraso. O óbvio está berrando à nossa frente e os donos do poder fecham os olhos.

Esta crise não é só política; é psiquiátrica.

Fonte: O Estado de São Paulo, 11 de novembro de 2014

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Em Porto Alegre, manifestantes protestam contra memorial para o comunista Luiz Carlos Prestes

Ato ocorreu neste sábadoFoto: Rafael Camargo / Divulgação
Um verdadeiro mar ideológico me separa dos conservadores, de tantas são as diferenças que tenho com eles. Entretanto, considero a necessidade de uma oposição não só parlamentar mas sobretudo civil tão fundamental que sou obrigada a aplaudir a cara e a coragem que os conservas estão tendo de ir para as ruas desafiar a hegemonia esquerdista bolivariana bananeira. E essa esquerda jurássica, fóssil, que tem, em pleno século XXI, a relíquia comunista dos genocidas Castro como Meca, desacostumada com questionamentos, está meio perdidaça com a novidade de ver seus ídolos de pés de barro desafiados.

Não deixa de impressionar a brutal inversão de valores que fazem os jurássicos diante de uma manifestação pacífica, como pode se ver pelo vídeo abaixo sobre um protesto contra um memorial ao comunista Luiz Carlos Prestes.

Diz o presidente do Instituto Olga Benário Prestes, outra comunista, que a manifestação teve dizeres agressivos à democracia, contra o Foro de São Paulo, os comunistas, o Luiz Carlos Prestes, a libertação dos povos. É a novilíngua autoritária em ação. Protestar contra o comunismo é algo contra a democracia, contra a libertação dos povos (sic)? O comunismo é o exato oposto da democracia. O Foro de São Paulo, entidade fundada em 1990 por Lula e Fidel e outras viúvas do Muro de Berlim, é composto de gente com a mesma mentalidade autoritária que construiu os regimes mais assassinos e liberticidas da história da humanidade. E cá entre nós, o que o Luiz Carlos Prestes fez de bom pelo Brasil para ser homenageado com memorial em espaço público?

Parabéns pela manifestação aos organizadores do protesto. Abaixo mesmo os muros físicos e ideológicos com que esses pulhas querem cercear nossa liberdade. Tô me divertindo muito com essas manifestações. 

Memorial Luiz Carlos Prestes é alvo de protesto contra o comunismo

Em parte dos cartazes deixados pelos manifestantes, havia inscrições como "devemos derrubar o memorial"

O Memorial Luiz Carlos Prestes, prédio de Porto Alegre projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer, foi alvo de uma manifestação neste sábado. Cartazes, cruzes e coroa de flores foram fixados na grade da construção, situada à beira do Guaíba.

A data escolhida tem relação com os 25 anos da queda do Muro de Berlim, conforme o cientista político Paulo Moura, que ajudou a promover o ato.
Ele (Prestes) está sendo vendido como um herói da pátria, aquele local será objeto de visitação pública. As pessoas que estão promovendo o evento acham que aquilo é para idolatrar um líder comunista que tentou produzir um golpe em 1935 com a Coluna Prestes — afirma o coordenador do curso de Ciências Sociais da Ulbra.
Os cartazes e faixas fixados na grade do prédio iam de "abaixo ao comunismo" até "devemos derrubar o memorial ao comunista Prestes" e "tear down this wall (derrube este muro, em inglês)".
Era um ambiente raivoso de ódio. Constatei à tarde, fui chamado por quem passou por aqui e viu. Claramente, foi uma manifestação com dizeres agressivos à democracia, contra o Foro de São Paulo, os comunistas, o Luiz Carlos Prestes, a libertação dos povos — critica Edson Santos, presidente do Instituto Olga Benário Prestes, que não chegou a ver a movimentação de pessoas, apenas o material deixado por elas.
Santos diz que serão estudadas providências do ponto de vista jurídico e político para o que ele chamou de "ato fascista":
Foi uma manifestação de direita, com símbolos da suástica, do nazifascismo, da TFP (Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade).
Moura salienta que não tem como responder por quem fez esse tipo de cartaz e que, nas manifestações políticas atuais, cada um escreve o que quer.
Uma das características das manifestações hoje em dia é que as pessoas manifestam seu desejo individual. Você não controla o que cada um bota no seu cartaz. Ninguém é dono da verdade de ninguém — explica o cientista político, acrescentando sua contrariedade à aprovação da doação do terreno por parte da Câmara de Vereadores.
Rafael Bonfá, um dos participantes da manifestação, afirma, por e-mail, que a intenção dos cartazes não era enaltecer o nazismo:
Havia sim um cartaz com uma suástica, mas ela estava colocada ao lado da foice e martelo representando os regimes totalitários que tanto mal trouxeram ao mundo
Na página do Facebook criada para organizar o ato, havia o pedido para que não fossem levados cartazes e faixas pedindo intervenção militar. As sugestões eram para inscrições como "nossa homenagem às vítimas do comunismo", "fora Foro de São Paulo", "Prestes assassino", "queremos liberdade e democracia" e "fim do Muro de Berlim na Europa e no Brasil".

Quem foi Luiz Carlos Prestes

— Luiz Carlos Prestes nasceu em Porto Alegre no dia 3 de janeiro de 1898. Aos 26 anos, rebelou-se contra o governo de Arthur Bernardes e formou a Coluna Prestes, movimento que, a partir do Rio Grande do Sul, marchou por 25 mil quilômetros pelo Brasil e lutou 53 combates ao longo de dois anos e meio. Exilou-se na América Latina, quando teve contato com a doutrina marxista, e morou na União Soviética durante três anos, onde conheceu a militante alemã Olga Benário, com quem se casou.

— De volta ao Brasil e já integrante do Partido Comunista Brasileiro (PCB), foi preso com a mulher que, grávida, foi deportada para a Alemanha nazista. Cassado após o golpe de 1964, exilou-se na antiga União Soviética. Após a redemocratização, apoiou a candidatura de Brizola à presidência da República, em 1989. Morreu no ano seguinte.



Fonte: Zero Hora, por Eduardo Rosa, 08/11/2014

terça-feira, 28 de outubro de 2014

No Brasil de Dilma, a igualdade de gênero recuou 9 posições, mas "feministas" ajudaram a reelegê-la

Nada fiz pelas mulheres, mas "feministas" me amam
Brasil cai nove posições e fica em 71º entre 142 países em igualdade de gênero
País seria mais desigual na representação no Congresso, onde há quase uma parlamentar para cada 10 homens

RIO - O Brasil caiu nove posições em um ranking global de igualdade de gênero produzido anualmente pelo Fórum Econômico Mundial. De acordo com o estudo “Global Gender Report 2014”, o país ficou na 71ª posição em um total de 142 nações analisadas. 

O recuo interrompe uma escalada brasileira na tabela desde 2010, quando ocupávamos o 85º lugar dentre 135 países. O ranking procura avaliar como está a distribuição de riqueza e oportunidade para homens e mulheres de acordo com cada economia nacional.

Para isso, economistas observaram o país segundo quatro variáveis: participação econômica e oportunidades (questões salariais e condições trabalhistas); desempenho educacional (alfabetização, número de matrículas); saúde (taxa de natalidade por sexo e expectativa de vida) e poderio político (representatividade de homens e mulheres nas diferentes instituições públicas nacionais).

E foi justamente neste último quesito que o Brasil teve o pior desempenho no relatório de 2014, ocupando a 74ª posição. O país que reelegeu pela primeira vez uma mulher para a presidência da República tem uma das piores representações do gênero feminio no Congresso Nacional: uma parlamentar para cada 10 homens, aproximadamente. É uma das piores proporções nos 142 países analisados.

No geral, o Brasil recebeu 0,694 pontos numa escala em que o 1 é a igualdade máxima de gênero.

No ranking somente de questão de salários e trabalho, o país caiu para 81º lugar. No Brasil, segundo o estudo, a participação das mulheres em posições de chefia de administração é quase metade da masculina. Comparando apenas a diferença entre salários, nós ficamos lá embaixo da tabela, na 124ª posição.

Já nos itens “saúde” e 'educação”, o Fórum Econômico Mundial colocou o Brasil ao lado de outras nações desenvolvidas como absoluta igualdade de gênero.

Em geral, o relatório classificou a Islândia como o país mais "igual" do mundo, seguido de perto pela Finlândia, Noruega e Suécia. No outro extremo da escala, o Iêmen é o país menos igual, à frente do Paquistão e do Chade.

Os autores do estudo disseram que, na média global de 2014, mais de 96% da diferença de de saúde, 94% da diferença de escolaridade e 60% da diferença na participação econômica haviam sido superadas desde o primeiro gênero relatório, publicado em 2006. Mas o painel de especialistas advertiu: "nenhum país no mundo alcançou a plena igualdade de gênero."

De acordo com o relatório, vai levar 81 anos para a diferença de gênero em todo o mundo ser superada, se o progresso mantiver o ritmo atual. "O relatório continua a destacar a forte correlação entre a diferença de género de um país e seu desempenho econômico", escreveram eles.

"Como as mulheres representam metade da base potencial de talentos de um país, a competitividade de uma nação a longo prazo depende significativamente de como se educa e se utiliza a mão de obra feminia."

Confira os primeiros 20 países do ranking:

Islândia

Finlândia

Noruega

Suécia

Dinamarca

Nicarágua

Ruanda

Irlanda

Filipinas

Bélgica

Suíça

Alemanha

Nova Zelândia

Holanda

Látvia

França

Burundi

África do Sul

Canadá

Estados Unidos

Fonte: O Globo, 28/10/2014

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Rompendo a camisa de força dos gêneros: ‘homens, libertem-se’

Homens sempre usaram saias através da história
Essa história de hoje qualquer tipo de atividade social, cultural, política ter que vir com apoio governamental é realmente muito difícil de encarar.

Há duas, três décadas atrás, se faria a mesma coisa exclusivamente pela via voluntária, comunitária. Falar em liberdade de qualquer tipo com respaldo estatal sempre será meio contraditório, para dizer o mínimo, sobretudo considerando que o estatismo faz parte dessa mesma mentalidade patriarcal e autoritária que o movimento pela libertação dos homens diz combater.

Apesar desse porém, a ideia em si é boa. Vai ao encontro do que penso sobre a necessidade de acabar com a educação diferenciada que massacra a individualidade das pessoas, forçando meninas e meninos a se encaixarem  num modelito de mulher (hétero + feminino) ou  de homem (hétero + masculino) que não raro está em desacordo com a personalidade de cada criança. Esses modelitos mutilam sobretudo as potencialidades das mulheres, mas os homens também perdem na história. São criados para serem toscos, brutos, violentos, egoístas, parasitas. Felizmente, eles também estão se cansando dessa fórmula funesta e procurando outras maneiras de ser.

Particularmente, não acho que seja o caso de trocar de papéis, antes que alguém se confunda. O que nossa sociedade convencionou chamar de masculino e feminino conforma apenas características humanas que foram arbitrariamente separadas entre os sexos. Por exemplo, o "masculino" detém boa parte das qualidades humanas responsáveis por formar gente autônoma, independente, resiliente (capaz de absorver impactos sem se quebrar). São qualidades a ser cultivadas por ambos os sexos. Do mesmo modo, sensibilidade e delicadeza (que não são sinônimo de frouxidão) se configuram igualmente como qualidades a ser incorporadas por ambos os sexos. Um mundo com menos guerras e violência generalizada pode ser um dos bons resultados do fim dessa departamentação forçada. Outro bom resultado será sem dúvida a existência de um mundo onde cada pessoa possa ter a liberdade de definir como quer ser de acordo com sua individualidade e não como a sociedade exige que seja.

Seguem artigo do Globo sobre a libertação e dois vídeos do site da campanha (ver fontes ao final).

Ação ‘Homens, libertem-se’ lança manifesto pelo direito de brochar, falir e chorar
Movimento apoiado por artistas que pede fim do machismo tem autorização para captar R$ 400 mil via Lei Rouanet

RIO - Posso brochar. Posso falir. Posso ser frágil. Posso ser sensível. Posso ser cabeleireiro, decorador, artista e não gostar de futebol. Posso admirar uma mulher que eu ache bela com respeito. São esses e muitos outros os preceitos do movimento “Homens, libertem-se”, que estimula o macho (heterossexual) a romper estereótipos em que vivem aprisionados. O músico Paulinho Moska, os cartunistas Laerte e Miguel Paiva, os atores Lúcio Mauro Filho, Marcos Breda e Álamo Facó, o escritor Nelson Motta e a historiadora Mary Del Priore apoiam a ação.

A iniciativa é uma parceria entre o coletivo mo[vi]mento, de Rio e Minas, e o grupo teatral The Living Theatre, de Nova York. O projeto teve autorização de captação, por meio da Lei Rouanet, de até R$ 400 mil para intervenções artísticas que provoquem reflexão sobre a opressão masculina. Nos eventos, a cargo de grupos de teatro de vários estados, serão distribuídas as saias-cangas símbolo do movimento. Elas poderão ser trocadas por calças, que serão doadas a instituições de caridade.

‘Eles se impõem prisões’

A ideia para a ação, que começa a ganhar corpo pouco antes da comemoração do Dia Nacional do Homem (15 de julho), veio à cabeça da atriz Maíra Lana quando ela viu um homem usando saia em sua cidade, Ouro Preto.
Os homens ficaram desconcertados, e eu achei tão engraçado. Era só uma peça de roupa, mas revelava muito sobre as prisões que eles se impõem — lembra. — Faz 200 anos que as mulheres fizeram a primeira passeata pelo direito de usar calças. Então é um absurdo que meninos sejam punidos na escola por expressar sua subjetividade.
Maíra se refere a um estudante do tradicional Colégio Bandeirantes, de São Paulo, que, em junho de 2013, foi impedido de assistir a aulas usando saia, gerando protestos e angariando simpatias dos colegas, que fizeram “saiaços” em apoio.

A ideia de que “homem não chora” também foi fortemente confrontada, quando, após a derrota da seleção na Copa, alguns jogadores de futebol, como o novo ídolo David Luiz, desabaram em lágrimas.
É importante esses ídolos mostrarem quem são, sem filtros, extravasando o que sentem. Isso contribui para que outros homens se sintam confortáveis para expor emoções e angústias — comenta Maíra.
Uma das possíveis críticas ao manifesto do “Homens, libertem-se” é não mencionar a opressão sofrida pelos homossexuais. Segundo a criadora da ação, isso acontece porque “todos os homens estão incluídos no manifesto, sejam heterossexuais ou gays.”
Mas o nosso maior alvo é o homem hétero — admite. — Queremos que ele reveja seu conceito de masculinidade e identidade, como os homossexuais e as mulheres já fazem há décadas.
Em seu livro “Homem ainda não existe”, a psicóloga Christina Montenegro afirma que o grupo masculino é o único que não se organizou para discutir gênero.
É um absurdo que o comportamento dos homens ainda seja limitado. A opressão gera a violência com o outro e também consigo. Não é à toa que todas as estatística mostram que os homens são os que mais adoecem, os que mais se suicidam e conformam a maior parte da população presidiária e manicomial... Eles têm questões internas não resolvidas — afirma Christina.
As mulheres também ganham

O cantor e compositor Paulinho Moska, apoiador da ação, conta que se sentia oprimido pelo ideal de masculinidade na adolescência:
Eu era magrelo, usava pulseirinhas hippie e me identificava com Caetano, Gil e Bowie, que eram andróginos. Passei a ser chamado de bicha e viado de forma agressiva. Sofri até me ver livre da representação masculina clássica.
Nelson Motta ressalta que a reflexão pode causar um benefício não só para eles, mas também para elas, que vivem viveriam melhor num mundo com homens livres e menos violentos:
Participo do movimento porque amo as mulheres. Tenho três filhas e duas netas, que merecem amor, respeito e homens sensíveis e educados.


Fonte:
O Globo, por Marina Cohen,14/07/2014; site Porque Homens Libertem-se

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