8 de Março:

A origem revisitada do Dia Internacional da Mulher

Mulheres samurais

no Japão medieval

Quando Deus era mulher:

sociedades mais pacíficas e participativas

Aserá,

a esposa de Deus que foi apagada da História

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terça-feira, 11 de janeiro de 2022

Nara Leão: a tímida revolucionária da Bossa Nova que marcou toda a música brasileira.

Nara e seu violão

A série O Canto Livre de Nara Leão ficou bem legal. A Nara era de uma geração anterior a minha. Quando estava inaugurando a Bossa Nova, eu era uma menina, mas como ela percorreu várias décadas de cantorias, acabou sendo minha contemporânea também.

O que não sabia sobre ela - e aprendi com a série - é que, por trás da aparência frágil e tímida - Nara era cheia de personalidade e pioneirismo. Era eclética e furava as bolhas dos movimentos musicais, sendo considerada traíra de muitos. Largou a Bossa Nova pra ir cantar música de protesto e dos cantores do morro. Depois, pra horror dos nacionalistas puristas da MPB, se aproximou da Jovem Guarda e gravou disco com músicas do Roberto e do Erasmo Carlos. Em seguida desembocou na Tropicália, ostentando seu lado disruptor. E no fim da vida voltou à Bossa Nova, fechando um ciclo. Revelou inúmeros cantores, cantoras e compositores importantes para a cultura brasileira.

A série é uma aula de História não só da MPB mas também do Brasil através da trajetória artística e pessoal de uma mulher notável. Foi feita com colaboração do neto dela, José Bial, filho da cineasta Isabel Diegues, filha de Nara, com o jornalista Pedro Bial. Isabel também colaborou com a produção que ficou a cargo do Conversa.Doc e teve a direção do Renato Terra.

Me emocionei bastante principalmente pelo canto da Nara ser em boa parte trilha sonora da minha própria vida. Mas as novas gerações também precisam conhecer a Nara e sua importância para nossa música, hoje em dia tão avacalhada (como tudo o mais neste país aliás). Certamente vão gostar dela e saber que o Brasil já foi bem mais criativo e inteligente. A discografia e mais informações sobre a cantora podem ser acessados em seu site oficial (aqui).

A série está no Globoplay.


quinta-feira, 24 de setembro de 2020

Contracultura brasileira: o desbunde que desafiou a esquerda e os militares


 Gal Costa, Os Mutantes, Jards Macalé, Gilberto Gil (com Torquato Neto), Novos Baianos, Caetano Veloso, Jorge Mautner, Luiz Melodia, Rogério Duprat, Sérgio Sampaio, Tom Zé e Walter Franco 

A música Sangue Latino é de 73. Os Secos e Molhados existiram de 71 a 74 em sua formação original. Os Dzi Croquettes de 1972 a 1976. O musical Hair foi encenado de 69 a 71. Andróginos e libertários. Em pleno período do regime de exceção. Foram filhos da contracultura que os militares não reprimiram com a contundência que reprimiram a esquerda ortodoxa, mesmo porque a consideravam meio alienada, visão compartilhada pela esquerda da época. Segundo consta, foi a esquerda da luta armada que apelidou os contraculturais no Brasil de desbundados. A contracultura no BR foi o desbunde. 



E a geração que prevalece no país na década de 70 foi exatamente a do desbunde, a do "sexo, drogas e rock'n'roll", da "minha casa no campo, meus amigos, meus discos, meus livros e nada mais" e não a da esquerda que queria nos transformar num Cubão. Aliás, a matriz do movimento homossexual no Brasil e no mundo foi a contracultura, não a esquerda tradicional que era tão homofóbica e machista quanto os conservadores. Ainda hoje, vejo muito mais em comum entre eles do que sonham as vãs filosofias. 

Lembrei disso porque, desde que lançaram uma tese pra lá de discutível que afirma ter o regime militar instituído uma política de Estado contra pessoas homossexuais, volta e meia vem alguém me perguntar dos sofrimentos que passei por ser lésbica sob a ditadura. 

Então, vamos esclarecer, o período 64-84 se deu de fato sob um regime de exceção, mas não sob um regime totalitário. Nós não vivemos uma espécie de Gilead como no "O Conto da Aia," pra citar uma referência atual. Os agentes da repressão não estavam visíveis a cada esquina, não ficavam acompanhando as pessoas até o supermercado, não havia corpos de subversivos pendurados nos muros das cidades ou na frente das casas, não se executava gente a sangue frio em ruas de bairros de classe média. A abdução dos ditos subversivos se dava mais na surdina, na calada da noite ou em blitz pontuais durante o dia. Nós outros vivíamos uma aparente normalidade, com as pessoas levando suas vidas de forma não muito diferente da de hoje.


A juventude daquele período, no Brasil, gastava seu tempo tomando todas e transando muito, indo a teatros (onde se faziam críticas veladas ao regime), aos cinemas (ver Bergman, Pasolini, Fellini, Polansky, Woody Allen) e a Salvador (que virou a Meca dos desbundados). Também gastava seu tempo lendo livros, jornais (cheios de mensagens cifradas) e a imprensa alternativa, assistindo os festivais de música popular e as novelas na TV. Indo ainda a musicais e, no final da década, entre 78 e 79, acabando-se nas baladas dos dancing days.
++++++++

Enfim, esse era o meu cotidiano naquele período. Não sofri repressão da ditadura por ser lésbica. Da ditadura, sofri repressão como estudante, quando fui às ruas em 1977 participar das manifestações promovidas pela UNE que se rearticulava. Fui inclusive presa na tristemente célebre invasão da PUC pelas forças do famigerado coronel Erasmo Dias. Porque manifestação de rua não podia mesmo acontecer, ainda mais contra o governo. 

Como lésbica, a repressão que sofri foi da sociedade ultraconservadora da época, tão vigente aqui, sob um regime de exceção, quanto nos EUA, a democracia mais estável da História. Naquele período, a homossexualidade ainda era considerada doença ou crime (nos EUA, a homossexualidade só deixou de ser crime na década de 70), as pessoas homossexuais eram totalmente marginalizadas, como se fossem realmente criminosas, aparecendo na imprensa somente nas páginas policiais. Provavelmente a invasão que promovi, com outras ativistas, em 19 de agosto de 1983, no antológico Ferro's Bar de São Paulo, foi a primeira a inaugurar uma nova abordagem da imprensa sobre o assunto, com artigo da Folha de SP nos tratando de forma positiva. 

Em outras palavras, não vão comprando acriticamente qualquer tese que aparece. Busquem sobre a contracultura no Brasil no oráculo do Google. Há teses e livros sobre o tema que, sem dúvida, vão lhes ampliar o horizonte, abrir uma nova perspectiva sobre a realidade sócio-cultural daquele período paradoxalmente de repressão mas também de grandes mudanças políticas e comportamentais. Aqui uma dica: Contracultura – Alternative Arts and Social Transformation in Authoritarian Brazil, de autoria de Christopher Dunn. Liberdade cabeluda:  O  inusitado caráter político da contracultura brasileira

Por último, naqueles conturbados anos do regime militar e da Guerra Fria (com a bomba atômica pairando sobre nossas cabeças), nós vivemos a contracultura (considerada por muitos como a última grande utopia) e tínhamos aquela coisinha verde que, hoje, a gente procura à esquerda, à direita, no centro, em cima e embaixo, e não encontra. Nós tínhamos esperança. Ao contrário, atualmente, vivemos num clima distópico que parece sobretudo uma mistura do 1984 com O Conto da Aia mas também conta com pitadas do Admirável Mundo Novo e do Fahrenheit 451. Sinto muito!
 😓

terça-feira, 5 de março de 2019

O frevo mais popular do Brasil foi composto por Joana Batista Ramos em 1909

Joana Batista Ramos
Compositora da marchinha mais popular do Carnaval pernambucano foi apagada da história
Documentaristas buscam informações para construir biografia de Joana Batista Ramos

​Há 110 anos, uma mulher negra e pobre, possivelmente filha de escravos, compôs a letra do mais popular frevo do Carnaval de Pernambuco, a "Marcha Número 1 do Vassourinhas". Mas a história oficial, moldada em território masculino, tratou de apagá-la.

Na terra do frevo, Joana Batista Ramos ainda é apenas um conjunto de indícios. As informações sobre ela são bastante escassas, quase inexistentes. Resumem-se a poucos parágrafos de jornais do início do século passado. Não há nem sequer certidões de nascimento ou de óbito.
O único documento público que comprova a sua existência é o recibo de venda por 3.000 réis dos direitos autorais da música para o tradicional Clube Vassourinhas, fundado em 1889, um ano após a assinatura da Lei Áurea. 
Escrita em 1909, a música virou uma espécie de hino popular de Pernambuco.

Ela foi gravada pela primeira vez, porém, em 1945, pela Continental, interpretada por Deo e Castro Barbosa. Na versão, a letra original acabou sendo alterada com a inserção do verso de domínio público "se essa rua, se essa rua fosse minha", cantiga popular rearranjada pelo maestro Heitor Villa-Lobos na década de 1930.

Nascido como uma marcha, o frevo de Vassourinhas foi sofrendo outras modificações ao longo do tempo, até que teve a letra suprimida. O garimpo mostra que a música era executada quando o Vassourinhas estava retornando para a sua sede, na chamada marcha de regresso.

Hoje, no Carnaval, o frevo funciona como uma espécie de "acorda povo", aquele momento em que os músicos estão cansados e precisam retomar a animação dos foliões.

O maior mistério do frevo
Partitura mostra os verdadeiros autores do famoso frevo:
 Matias da Rocha e Joana Batista
Uma equipe pernambucana de documentaristas iniciou um trabalho de investigação para contar quem foi Joana Batista Ramos. A produtora cultural Tactiana Braga e os jornalistas Camerino Neto e Maíra Brandão dirigem o documentário "Joana: Se essa Marcha Fosse Minha", ainda sem data para lançamento.

Uma campanha na internet também foi lançada na tentativa de encontrar parentes da compositora ou qualquer informação que contribua para construir a sua biografia.

Até agora, além de testemunhos e escassos relatos em jornais da época, conseguiram encontrar uma única imagem do rosto dela, provavelmente uma pintura, que consta no documentário "Cem Anos de Vassourinhas" (1989), pertencente ao acervo da Fundação Joaquim Nabuco.
Estamos falando do território da cana-de-açúcar, do senhor de engenho, da casa grande e da senzala, demarcado pela violência do poder. Joana é um grito neste momento em que o Brasil ameaça a fala e o direito da mulher", diz Tactiana Braga.
Camerino Neto conta que, nos antigos bailes de Carnaval, com várias orquestras, a introdução de Vassourinhas era o alerta para que os próximos instrumentistas subissem ao palco e pudessem substituir aqueles que já estavam tocando.
Isso talvez explique porque ela se popularizou tanto. Era executada várias vezes durante a mesma noite", diz.
Algumas peças do quebra-cabeça histórico estão sendo descobertas aos poucos.
Joana era possivelmente empregada doméstica, ex-escrava ou descendente de escravos", lembra Brandão.
Mas ainda não se sabe onde exatamente ela nasceu.
O próximo passo é fazer o caminho contrário. Estamos tentando localizar a certidão de óbito", aponta.
O governo de Pernambuco afirma que a Secretaria da Mulher se prontificou a acionar a estrutura de informações oficiais para encontrar qualquer documento sobre Joana.
Há o entendimento de que essa invisibilidade não é um ato falho. É um ato de machismo. É preciso reconhecer sua contribuição a partir da história de Joana", afirma Braga.
Nas pesquisas, há relatos da presença dela e de Mathias da Rocha, que também assina a música por possivelmente ter criado a melodia, num lugar em que os negros costumavam realizar celebrações, no Porto da Madeira, na zona norte do Recife. A composição teria nascido num dos mocambos do bairro.

A busca documental já chegou a algumas conclusões. Joana tinha três filhos e, provavelmente, morreu aos 74 anos, em 1952. Os registros em cartório da venda da música ao Clube Vassourinhas são de 1910, enquanto o documento de autoria é de 1949.

A pesquisadora Carmem Lelis informa que, em 1951, a marcha passou ser reproduzida também no Carnaval carioca. "Mas as informações são precárias e sem fontes para se constatar a veracidade."

O filme será composto por entrevistas com pesquisadores, maestros renomados do frevo e compositoras e cantoras pernambucanas.

Entre os entrevistados está a cantora, compositora e dançarina Flaira Ferro.
Há cem anos, a realidade era pior para as mulheres. Ainda mais sendo negra. Ela estava na margem da margem da margem", afirma ela.
Quem foi Joana Batista Ramos?
Mulher negra, compôs, junto de Mathias da Rocha, em 1909, o frevo 'Marcha Número 1 do Vassourinhas', um dos mais famosos de Pernambuco. Tudo o que se sabe sobre ela é que tinha três filhos e, provavelmente, morreu aos 74 anos, em 1952

 Fonte: Folha de SP, João Valadares, Recife, 01/03/2019

segunda-feira, 24 de setembro de 2018

Perséfone volta aos braços da mãe: é primavera!

Perséfone volta aos braços da mãe: é primavera!
Boa primavera para vocês!

A mitologia grega descreve a chegada da Primavera com uma historinha bem legal. Zeus era o Don Juan do Olimpo e ficava com muitas deusas, embora fosse oficialmente casado com a Hera. Uma de suas ficantes, Deméter, a deusa da Terra, da agricultura, teve uma filha com ele chamada Perséfone. Perséfone cresceu para ser deslumbrante de tão linda. Numa bela tarde, estava a bela passeando num bosque colhendo flores quando, ao arrancar um narciso pela raiz, o solo se abre e Hades, o deus do subterrâneo, encantado com o visual da moça, a sequestra pras profundas do inferno.

Sua mãe, Deméter, a procura por todos os cantos em vão, por fim obtendo a informação do deus do Sol, Hélio, que tudo vê durante o dia, de que Perséfone fora sequestrada por Hades. Devastada com a perda da filha, Deméter foge e se refugia em Elêusis. Sua fuga provoca a desertificação e infertilidade da Terra, e os humanos começam a morrer de fome. Vendo a penúria dos humanos, dos quais os deuses também dependem para existir, Zeus vai ter com Deméter e pede que volte a fertilizar a Terra. Deméter diz que só volta com o retorno da filha ao seu convívio.

Zeus manda então o carteiro dos deuses, Hermes, ao submundo, com uma cartinha exigindo que o deus das trevas devolvesse sua filha à mãe. Hades, não querendo confronto com o irmão (sim, eram irmãos) mas também não querendo perder Perséfone, devolve a bela, mas apronta uma armação. Dá a ela uma romã, colhida nas profundas do inferno, e a moça a come no caminho de volta à superfície da Terra, sem saber que quem comesse qualquer fruto do reino de Hades, deveria retornar posteriormente a ele.

Criou-se então um impasse, que Zeus resolveu decidindo que Perséfone ficaria parte do ano com Hades e a outra com sua mãe (9 meses). Assim, durante o período em que Perséfone fica com Hades, em cárcere privado (não havia delegacia da mulher naquela época), Deméter se retira, de luto, trazendo novamente infertilidade à terra. É o inverno. E quando Perséfone retorna aos braços da mãe, traz consigo a fertilidade dos campos, o retorno da vida, a primavera.

Então, celebremos a volta de Perséfone ao convívio de sua mãe, encontro que nos brinda com as flores, as cores e a fertilidade da primavera. 🐦🐝🦋💐🌸💮🏵️🌹🌺🌻🌼🌷🌱🌲🌳🌾🌿☘️🍀🍁
Ver também: Bem-vinda Primavera

segunda-feira, 23 de outubro de 2017

Tropicália, 50 anos: um divisor de águas na cultura brasileira


TROPICÁLIA, 50 ANOS:
A História do Movimento que Marcou a Cultura Nacional

O movimento artístico que ficou conhecido como Tropicália completa 50 anos. A apresentação das músicas Alegria, Alegria e Domingo no Parque, em 21 de outubro, durante a final do III Festival Record em 1967, marcaram o início de uma série de experimentações que permitiriam uma nova forma de compreender a música brasileira. Essas inovações estéticas continuam nos discos seguintes dos músicos Gilberto Gil e Caetano Veloso e no LP coletivo Tropicália ou Panis Et Circencis, o disco manifesto lançados no ano seguinte às apresentações no Festival da Record.

O clima tropicalista contagiou o Brasil e a efervescência se estendeu até dezembro de 1968, quando Caetano e Gil foram presos e, meses depois, obrigados a se exilar do país. A ditadura militar (1964-1985) acabava de iniciar a fase mais dura com o decreto do AI-5. A repressão não deixou passar o trabalho dos tropicalistas que, naquele momento, tinham sua máxima expressão em um programa semanal exibido na TV Tupi, emissora extinta no ano de 1980.

O pesquisador Frederico Coelho, professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio (PUC-Rio) e especialista em Tropicália, relembra o que foi o movimento e a obra:


TROPICÁLIA OU PANIS ET CIRCENCIS

Após a explosão das músicas Alegria, Alegria e Domingo no Parqueno Festival da Canção de 1967, diversos artistas se reuniram, capitaneados por Caetano Veloso e Gilberto Gil, para a concepção de Tropicália ou Panis Et Circencis, disco-manifesto coletivo gravado em São Paulo, no decorrer do mês de maio de 1968.

São 12 faixas de canções inéditas de Gil, Caetano, Torquato Neto, Capinan e Tom Zé. Marco da Música Popular Brasileira, o disco traz uma capa icônica que, apesar de provocar análises, não teve um conceito definido ao ser elaborada. A foto foi feita por Olivier Perroy, a convite do arranjador Rogério Duprat, e nela, como em uma foto de família, os tropicalistas se posicionam à frente de um vitral que fazia parte do jardim de inverno da casa do próprio fotógrafo, em São Paulo.


Paulo Roberto Pires – Professor, pesquisador, escritor. Organizador dos dois volumes de Torquatália sobre Torquato Neto.

Capa
Para a sessão de fotos que originou a capa, Rita Lee e Guilherme Araújo deram palpites sobre as roupas que todos usaram. O curto prazo para finalizar a o disco impediu que Nara Leão e Capinan fossem até a capital paulista para participar do registro, por isso, eles aparecem em retratos nas mãos de Caetano Veloso e Gilberto Gil, respectivamente.



Contra-capa

A icônica capa de Tropicália ou Panis Et Circencis é uma das mais reconhecidas da MPB, mas na época do lançamento do disco-manifesto, a contracapa também passou por um trabalho minucioso, resultado da preocupação de Caetano Veloso e Torquato Neto. De acordo com Torquato, a contracapa de um álbum é uma forma de valorizar o trabalho apresentado pelo artista. “O disco será comentado e elogiado (naturalmente) faixa por faixa, música por música [...]. Com isso o público terá as informações que deseja, os cronistas idem e o artista, certamente, se sentirá melhor promovido”, afirmou, em coluna publicada em maio de 1967.

Sobre as faixas do disco, Torquato ressaltou, em entrevista à Rádio Cultura em 1968, que havia ali um trabalho único, que valorizava a diversidade cultural brasileira e regionalismos. "A gente não teria condição de ter feito, de estar fazendo um trabalho assim, se a gente não tivesse antes trabalhado com folclore, trabalhado com tudo. Eu acho que enfim, não estamos mais folclorizando o folclore", refletiu.

O texto da contracapa do álbum foi escrito por Caetano, com ajuda de Torquato, e é uma espécie de roteiro de um filme onde os personagens são os próprios tropicalistas. De acordo com Carlos Calado, autor de Tropicália: A história de uma revolução musical, o enredo continha doses de ironia e deboche que às vezes beiram o nonsense.

Entre as várias falas dos personagens, Torquato gozava os puristas, referindo-se ao refrão de ‘Geleia Geral’ (‘ será que o Câmara Cascudo vai pensar que nós estamos querendo dizer que bumba meu boi e iê-iê-iê são a mesma dança?’); Duprat dessacralizava o lado artístico da música (‘como receberão a notícia de que um disco é feito pra vender?’); e Caetano fazia piada com a canção de Vicente Celestino (‘vocês são contra ou a favor do transplante de coração materno?’).

A contracapa do disco tem também uma homenagem a João Gilberto, grande nome da Bossa Nova que era ídolo dos tropicalistas. Como paráfrase a um recado que o músico havia enviado a Caetano (“diga que vou ficar olhando pra ele”), o roteiro se encerra com o personagem chamado João falando “Diga que estou daqui olhando pra eles”.

A contracapa do Manifesto em forma de roteiro cinematográfico. 



Música (Compositores) Intérpretes 

Lado A

1) Miserere Nobis (Capinam, Gilberto Gil) Gil
2) Coração Materno (Vicente Celestino) Caetano
3) Panis et Circencis (Caetano Veloso, Gilberto Gil) Mutantes
4) Lindonéia (Caetano Veloso) Nara
5) Parque Industrial (Tom Zé) Gil, Caetano, Gal, Mutantes e Tom Zé
6) Geléia Geral (Gilberto Gil, Torquato Neto) Gil

Lado B

1) Baby (Caetano Veloso) Gal e Caetano
2) Três Caravelas (Las Tres Carabelas) (Algueró Jr., Moreau. Versão: João de Barro) Caetano e Gil
3) Enquanto Seu Lobo Não Vem (Caetano Veloso) Caetano, Gil e Rita Lee
4) Mamãe, Coragem (Caetano Veloso, Torquato Neto) Gal
5) Bat Macumba (Caetano Veloso, Gilberto Gil) Caetano, Gal, Gil e Mutantes
6) Hino ao Senhor do Bonfim (Artur de Sales, João Antônio Wanderley) Caetano, Gal, Gil e Mutantes

Fontes: Patricia Finotti, Agência Brasil, 21/10/2017

sexta-feira, 20 de outubro de 2017

50 Anos de Tropicália

Reunião tropicalista. No alto, Caetano, Torquato Neto e Rita Lee; no meio, Tom Zé,
Glauber Rocha, Rogério Duprat e Gil - Arte de André Melo
Tropicália comemora 50 anos: relembre
Movimento rompeu os limites entre vanguarda e tradição, samba e iê-iê-iê, Brasil profundo e superficial

RIO - Quando Caetano Veloso apresentou “Alegria, alegria” e Gilberto Gil cantou “Domingo no parque” no III Festival de Música Popular Brasileira, estavam quebrados para sempre os limites entre vanguarda e tradição, entre samba e iê-iê-iê, entre o Brasil profundo e o superficial. Ainda não existia um nome para o que se viu ali, mas hoje sabemos que aquele festival — cuja grande final completa 50 anos no próximo dia 21 — é um dos principais marcos do nascimento da Tropicália.

Até ali, o cenário da música brasileira era assim:

1) Havia a vanguarda da bossa nova — percebida tanto no choque da gravação de João Gilberto para “Chega de saudade” quanto em sua aceitação internacional (o concerto do Carnegie Hall em 1962, o disco de Sinatra cantando Jobim em 1967, a experiência americana de Sérgio Mendes a partir de 1964).

2) Havia as tradições do samba de morro e da música nordestina, vistos como portadores das verdades de um Brasil profundo.

3) Havia a invasão anglosaxônica do rock, capitaneada pelos Beatles, aportando no Brasil pelos subúrbios como iê-iê-iê.

4) E havia jovens de classe média nos palcos dos festivais assumindo a canção como o território privilegiado para pensar seu tempo — um tempo de profundas transformações. Na política, a ditadura instaurada em 1964 e a polarização entre a esquerda e a direita. Nos costumes, a liberação sexual, os questionamentos à sociedade de consumo.

Aí veio aquela noite em 67. E, no ano seguinte, o álbum-manifesto “Tropicália ou panis et circensis” chegaria para explicar — ou para confundir, como escreveu Tom Zé anos e Chacrinha incorporou em seu programa de TV, que virou modelo da estética tropicalista, num jogo de espelhos típico do movimento.

Na capa do disco, além de Caetano, Gil e Tom Zé, estavam, em carne e osso, Gal Costa, Mutantes, Torquato Neto e Rogério Duprat. Representados em retratos, apareciam Nara Leão e Capinam. O álbum era um desfile alegórico e violento das cores e dores de um Brasil em convulsão: sofisticado e kitsch, litorâneo e interiorano. O painel incluía ainda o cantor Vicente Celestino (“Coração materno”) e o artista plástico Rubens Gerchman (sua tela “Lindoneia” inspirou a canção homônima), jornais populares e Mangueira, “Hino ao Senhor do Bonfim” e “aquela canção do Roberto”, Caribe e concretismo.

Os antecedentes do tropicalismo remontam a Oswald de Andrade (e ao “Rei da vela”, relido pelo Teatro Oficina), ao Cinema Novo, a Hélio Oiticica (sua obra “Tropicália” batizou o movimento), a João Gilberto. E as ondas que se espalharam a partir dele atingiram de volta não só a canção brasileira, mas o cinema, as artes visuais, o teatro — e até a moda e a publicidade. Mas, num país de ânimos quentes, marcado por tensões políticas agravadas pela repressão oficial, a repercussão não foi pacífica. Provocaram reações episódios como o discurso em que Caetano confrontou a plateia do Festival Internacional da Canção de 1968, o tom desafiador do espetáculo que eles montaram na Boate Sucata e a cena do programa “Divino maravilhoso” com Caetano cantando “Boas festas” enquanto apontava uma arma para a cabeça.

Por um lado, parte da esquerda via o grupo como alienado. Por outro, a direita se sentia ameaçada pelo que não entendia ali. Caetano e Gil acabaram na cadeia e, em seguida, no exílio. Para muitos, a aventura tropicalista terminava ali, sob a repressão. Mas os ecos dela se fazem presentes até hoje na música — de forma direta ou indireta — em exemplos como Nação Zumbi e BaianaSystem. Além disso, o pensamento sobre o Brasil hoje é em grande medida influenciado pela leitura que os tropicalistas estabeleceram então.

ARTIGOS E FRAGMENTOS

Essa história de rupturas e embates celebra 50 anos logo agora, quando o Brasil se vê novamente ameaçado pela censura às artes e rediscute questões que pareciam superadas. De olho na construção do futuro sem esquecer as lições do passado, o Segundo Caderno revê o movimento, em artigos e fragmentos, aos moldes das canções “Geleia geral”, “Miserere nobis” e “Tropicália”. Nas páginas seguintes, há tigres e leões soltos nos quintais, apesar das pessoas da sala de jantar, ocupadas em nascer e morrer.

Fonte: O Globo, por Leonardo Lichote, 15/10/2017


sábado, 6 de agosto de 2016

Aniversário de Adoniran Barbosa, o poeta do Bexiga!


Filho de imigrantes italianos, o jovem João Rubinato foi office-boy, carregador, faxineiro, encanador, pintor de paredes, garçom e caixeiro em loja de tecidos antes de se tornar o sambista nacionalmente conhecido como Adoniran Barbosa. João Rubinato tirou o nome Adoniran Barbosa da junção do nome de um amigo, chamado Adoniran Alves, com o sobrenome do compositor e cantor de sambas de breque Luís Barbosa (1910/1938).

Apaixonado pelo samba carioca que ouvia no rádio, iniciou a carreira artística, em 1934, vencendo um concurso de música de Carnaval, realizado pela prefeitura de São Paulo, com a marcha Dona Boa, e nunca mais parou. Com a persona artística de Adoniran Barbosa, desenvolveu um estilo próprio de samba, utilizando o dialeto dos paulistanos descendentes de italianos, que ocupavam os cortiços da região central da cidade, mesclado com muito humor. Trabalhou também no rádio e no cinema, mas foi realmente a música que o consagrou.

Hoje, Adoniran Barbosa faria 110 anos, se estivesse aqui presente em carne e osso. Já que isso não é mais possível que esteja em espírito com sua música tão especial, seu samba italianado que é a cara de São Paulo.
 
Abaixo, alguns de seus clássicos, como Saudosa Maloca, as Mariposa, Trem das Onze, Iracema (com a imensa Elis Regina que também faz sua versão de Saudosa Maloca), Samba no Bexiga e Bom dia, Tristeza, esta última uma curiosidade, já que se trata de uma música de fossa (como se dizia na época) cantada por outra ilustre finada, a gata nada mansa Maysa. Na verdade, Adoniran musicou uma letra que lhe foi passada por Vinícius de Morais, o que mostra também o ecletismo do poeta do Bexiga.

Meu humilde tributo ao grande João Rubinato Adoniran Barbosa e sua música maravilhosa que sempre me divertiu e emocionou.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

São Paulo, amada, feliz aniversário!

91 mil ruas e avenidas, 15 mil bares, 12,5 mil restaurantes, 410 hotéis, 110 museus, 260 salas de cinema, 88 bibliotecas, 78 parques e 600 espetáculos teatrais por ano. Minha amada superlativa, cosmopolita, empreendedora, libertária, sem você o meu dono é a solidão.

Quem é seu dono? Ninguém, São Paulo. Desperta, desperta. Deixe de ser Atlas e vire nação!

Da banda 365, São Paulo, uma homenagem em música e letra nos seus 470 anos!

Tem dias que eu digo "não" /Inverno no meu coração/Meu mundo está em tua mão/Frio e garoa na escuridão...
Sem São Paulo/O meu dono é a solidão/Diga "sim"/Que eu digo "não"...(2x)
Tem dias que eu digo "não"/Inverno no meu coração/Meu mundo está em tua mão/Frio e garoa na escuridão...
Sem São Paulo/Oh! Oh! Oh!/O meu dono é a solidão/Diga "sim"/Que eu digo "não"(2x)
Quem é seu dono?/Ninguém, São Paulo/Quem é seu dono?/Ninguém, São Paulo...
Tem dias que eu digo "não"/Inverno no meu coração/Meu mundo está em tua mão/Frio e garoa na escuridão...
Sem São Paulo/O meu dono é a solidão/Diga "sim"/Que eu digo "não"(2x)
Desperta São Paulo!/Desperta São Paulo!

terça-feira, 25 de agosto de 2015

Tecnicolor, o disco dos Mutantes pra inglês ouvir, que virou referência de produção experimental


Eles escondiam um fabuloso tesouro que só viria ao mundo quase 30 anos depois do lançamento de Jardim Eletrico:

Tecnicolor.

A história é simples: a Polydor inglesa queria editar um disco dos Mutantes, todo cantado em inglês, com a produção de Carlos Olmes.

O trabalho, cantado em inglês, francês, espanhol e português chegou a ser gravado e, infelizmente, engavetado até 2000.

Tecnicolor teve uma edição luxuosa com desenhos do encarte feitos por Sean Lennon, filho do eterno líder dos Beatles, John, e grande fã dos Mutantes.

Algumas faixas chegam a impressionar mais do que as originais como a versão, em inglês, para "Ando Meio Desligado", "I Feel a Little Spaced Out". Se em português o vocal era quase sussurrante, agora a voz de Rita era amplificada e o final ainda mais sensacional, com uma bela demonstração do apuro de Serginho na guitarra.

Algumas faixas ganharam versões hilárias, como "A Minha Menina", de Jorge Ben e que aparece no primeiro disco Os Mutantes, transformada em "She's My Shoo Shoo".

Ao ser lançado, o CD recebeu elogios nos quatro cantos do planeta, sendo uma das molas propulsoras para a volta do grupo no Século XXI.

À convite do produtor Carl Holmes, aproveitaram para gravar algumas canções no estúdio Des Dames, com a intenção era lançar um álbum principalmente em inglês para atrair público internacional. Mas a Polydor desistiria do projeto mesmo com um álbum inteiro já gravado. Somente em 1999, o disco seria lançado, chamado Tecnicolor.

No ano 1999 a gravadora Universal, dona do catálogo da extinta Polydor, finalmente resolveu lançar Tecnicolor, o álbum gravado pela banda durante sua passagem pela França em 1970. A ilustração e a caligrafia do álbum, na versão editada no ano de 1999, são da autoria de Sean Lennon. Na época, em 1970, a Polygram inglesa convidou o grupo a morar em Londres e pediu para que eles gravassem um álbum com canções em língua inglesa. Apenas Arnaldo Baptista sabia desse convite e só contou aos outros integrantes após regressaram ao Brasil.

Em fevereiro de 2005 a revista britânica Mojo incluiu o álbum Os Mutantes em sua lista de "50 Most Out There Albums of All Time" (algo como os "50 Discos Mais Experimentais de Todos os Tempos"). Eles obtiveram a 12ª posição na lista, à frente de nomes como Beatles, Pink Floyd e Frank Zappa. Ainda em 2005, a também britânica Q Magazine igualmente colocou o álbum em 12º lugar, em sua lista dos "40 greatest psychedelic albums of all time" ("Os 40 maiores discos psicodélicos de todos os tempos).

Faixas

Panis Et Circenses
Bat Macumba
Virginia
She's My Shoo Shoo (A Minha Menina)
I Feel A Little Spaced Out (Ando Meio Desligado)
Baby
Tecnicolor
El Justiciero
I'm Sorry Baby (Desculpe, Babe)
Adeus Maria Fulô
Le Premier Bonheur Du Jour
Saravah Panis Et Circenses (Reprise)

Fonte: Youtube

segunda-feira, 20 de julho de 2015

A amizade é o amor que nunca morre. Feliz dia dos amigos!

Hoje, no Brasil, é dia do mais nobre dos sentimentos humanos: a amizade, aquela que, nas palavras do poeta Mário Quintana, é o amor que nunca morre. Hoje também a humanidade aportou na lua 46 anos atrás (20/07/1969), quase no fim do dia. Um feito memorável.

Um bom dia para nascer, portanto, o que me aconteceu há 61 anos. Quem diria. Ainda estou por aqui firme e forte. Por isso, para homenagear o dia em que nasci, dia da amizade, deixo abaixo vídeo com Elis Regina cantando Canção da América. Deixo também de comentar sobre a corrupção nossa de cada dia,  pois nada é mais incompatível com a amizade do que a sordidez da desonestidade pessoal ou política.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Pra Rua me levar com Ana Carolina e Maria Bethânia














Pra Rua me Levar


Ana Carolina

Não vou viver, como alguém que só espera um novo amor
Há outras coisas no caminho aonde eu vou
As vezes ando só, trocando passos com a solidão
Momentos que são meus e que não abro mão

Já sei olhar o rio por onde a vida passa
Sem me precipitar e nem perder a hora
Escuto no silêncio que há em mim e basta
Outro tempo começou pra mim agora

Vou deixar a rua me levar
Ver a cidade se acender
A lua vai banhar esse lugar
E eu vou lembrar você

É... mas tenho ainda muita coisa pra arrumar
Promessas que me fiz e que ainda não cumpri
Palavras me aguardam o tempo exato pra falar
Coisas minhas, talvez você nem queira ouvir

Já sei olhar o rio por onde a vida passa
Sem me precipitar e nem perder a hora
Escuto no silêncio que há em mim e basta
Outro tempo começou pra mim agora

Vou deixar a rua me levar
Ver a cidade se acender
A lua vai banhar esse lugar
E eu vou lembrar você...

Publicado originalmente em 03/11/08

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

"Não enche": trilha sonora para fins de caso mal resolvidos


Comecei a fazer uma revisão do blog que, embora tenha começado com a predisposição de desafinar do coro dos contentes desde o princípio, configurava-se, num primeiro momento, como um projeto mais pessoal a ser compartilhado entre conhecidos. Mas a vida, como sempre nos levando por mares nunca dantes navegados, mudou a perspectiva do blog que se tornou mais público e com temática mais política.

Nesse processo revisor, contudo, estou mantendo a maioria das postagens iniciais, checando links e imagens e atualizando as postagens no geral. Neste sentido, segue o post com a letra e a música de Não Enche, do Caetano Veloso, uma daquelas músicas atemporais para fins de caso mal resolvidos.
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Caetano sempre me traduzindo. Pelo direito de xingar as quadradas, as dementes, as peruas, as piranhas, as sanguessugas, as vagabas, as à-toas, as vadias, as mesquinhas, as manipuladoras, as canalhas. Pelo livre delito de dizer a verdade.

Não enche

Me larga, não enche
Você não entende nada
E eu não vou te fazer entender...

Me encara, de frente
É que você nunca quis ver
Não vai querer, nem vai ver
Meu lado, meu jeito
O que eu herdei de minha gente
Eu nunca posso perder
Me larga, não enche
Me deixa viver, me deixa viver
Me deixa viver, me deixa viver...

Cuidado, oxente!
Está no meu querer
Poder fazer você desabar
Do salto, nem tente
Manter as coisas como estão
Porque não dá, não vai dá...

Quadrada! Demente!
A melodia do meu samba
Põe você no lugar
Me larga, não enche
Me deixa cantar, me deixa cantar
Me deixa cantar, me deixa cantar...

Eu vou
Clarificar
A minha voz
Gritando
Nada, mais de nós!
Mando meu bando anunciar
Vou me livrar de você...

Harpia! Aranha!Sabedoria de rapina
E de enredar, de enredar
Perua! Piranha!Minha energia é que
Mantém você suspensa no ar
Prá rua! se manda!
Sai do meu sangue
Sanguessuga
Que só sabe sugar
Pirata! Malandra!
Me deixa gozar, me deixa gozar
Me deixa gozar, me deixa gozar...

Vagaba! Vampira!
O velho esquema desmorona
Desta vez prá valer
Tarada! Mesquinha!
Pensa que é a dona
E eu lhe pergunto
Quem lhe deu tanto axé?

À-toa! Vadia!
Começa uma outra história
Aqui na luz deste dia "D"
Na boa, na minha
Eu vou viver dez
Eu vou viver cem
Eu vou vou viver mil
Eu vou viver sem você...(2x)

Eu vou viver sem você
Na luz desse dia "D"
Eu vou viver sem você...



Publicado originalmente em 03/09/08

segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Cotidiano Petista ou Zoando Chico Buarque


Tucanos gravam vídeo em resposta a apoio de Chico Buarque à campanha de Dilma Rousseff
Turma do Chapéu fez versão de “Cotidiano”, clássico da MPB

BRASÍLIA - Para responder ao apoio de Chico Buarque, os integrantes do grupo Turma do Chapéu distribuíram hoje na internet e em grupos de Whatsapp um clipe com a paródia de um dos sucessos do compositor “Cotidiano”. Na versão tucana, a letra da música trata dos quatro anos da administração da presidente Dilma Rousseff e do embate com seu adversário Aécio Neves, do PSDB.

Citando a letra do clássico da MPB, os músicos dizem que todo dia Dilma faz tudo sempre igual. “Como pode errar tanto a cidadã? Presidir dando perda total, essa dona não pode estar sã”. Fala também que a presidente tem 39 ministros pra governar, mas não conhece nenhum. Ainda ironiza a declaração do secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Márcio Holland, que sugeriu a troca de carne e ovos na dieta do brasileiro.

O clipe foi gravado com o criador do grupo Gabriel Azevedo nos vocais e por os outros integrantes, Marcel Beghni, Sam Joavana, Alberto Lage e Guilherme Henrique nos instrumentos. O coordenador de web da campanha, Xico Graziano faz participação especial na banda.

O cantor e compositor Guarabyra, da dupla Sá e Guarabyra, também fez um clipe para “pacificar” a guerra entre petistas e tucanos. A música se chama “O Brasil te chama”. O clipe foi postado pelo compositor e é encerrado com discurso de Aécio no dia do lançamento de sua candidatura, em São Paulo, dizendo que vai governar para todos os brasileiros.


Cotidiano Petista - Turma do Chapéu from Turma do Chapéu on Vimeo. Fonte: O Globo, por Maria Lima, 19/10/2014

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Mulheres no samba!

Nove de fevereiro de 2009 marcou o centenário de Carmen Miranda, a portuguesa que, exportada para nosso país, incorporou como ninguém o espírito brasileiro da ginga e da alegria juvenil que hoje parece coisa rara.

Carismática, Carmen também incorporou posteriormente a versão americana da baiana, tornando-se, mais do que uma cantora, um verdadeiro ícone não só da música brasileira mas do imaginário internacional.

Até hoje, vê-la em sua esfuziante baiana-americanizada é um prazer raro que só os artistas de alta qualidade conseguem provocar, como se pode verificar no vídeo abaixo.



E, para saber mais sobre a pequena notável, vale a pena visitar o site sobre a diva, Museu Virtual Carmen Miranda , de onde copiei a foto que abre essa postagem.

Mas, embora Carmen mereça não só um post, mas vários, este a cita apenas para introduzir o tema dos grupos de samba femininos que se espalharam pelo país nos últimos anos. Se Carmen estivesse viva hoje, bem poderia, em vez de aparecer acompanhada do masculino Bando da Lua, vir circundada dos femininos Samba de Rainha ou Samba de Comadre, por exemplo. Sem falar no Samba de Moças, Samba de Meninas, Toke Feminino, Toque de Salto, Razão Feminina, Entre Elas e vários outros mais amadores ou mais profissionais, iguais, no entanto, na demonstração de que mais um feudo masculino foi pro brejo.

Cantando samba de raiz, pagode, samba-rock, samba de roda, samba de escola de samba e assim por diante, as moças pegaram do cavaquinho, do pandeiro, do batuque, do violão e deram um lifting nesse ritmo que, apesar de tão brasileiro, apanha da música eletrônica importada, onipresente nas rádios e nas pistas de dança de norte a sul.

No feminino, o samba ganha sangue novo, um novo colorido, e recupera sua função de "levar a alegria a milhões de corações brasileiros." No vídeo abaixo, o mais conhecido entre os grupos de samba feminino, o Samba de Rainha, apesar de filho do outrora denominado "túmulo do samba", São Paulo, arrasa no batuque e na sonoridade. As meninas do SR também são mesmo a cara multi-étnica de Sampa (uma das integrantes é inclusive japonesa), demonstrando que o samba, mais do que negro, é simplesmente brasileiro, e que, nós, brasileiros, somos mesmo assim misturados de corpo e alma. Fora isso, não que eu queira assumir ninguém, mas tá na cara que muitas das moças do samba são também exímias sapateadoras.

Enfim, os grupos de samba femininos são legítimos herdeiros de Carmen Miranda e de tantas outras sambistas geniais que agora, além de cantar e encantar, também dispensam os homens nos instrumentos (hum, acho que produzi um duplo sentido).

Reedição de postagem de 12/03/09

terça-feira, 15 de julho de 2014

Ainda sobre o dia do rock: E a esquerda fez passeata contra as guitarras elétricas na MPB

Passeata contra a guitarra elétrica em 17 de junho de 1967 (SP)
Há muito mais mistérios entre conservadores e esquerdistas socialistas do que sonham as vãs filosofias. Mudam os deuses, os profetas e os dogmas, mas o autoritarismo é o mesmo, a mania de querer impor seus credos e crenças pela goela da sociedade abaixo idem. E isso não é de hoje. No período do regime militar, antes do AI-5 (1968), a fase mais repressora da ditadura, havia até espaço para a liberdade criativa, e a juventude se dividia entre engajada e desbundada. 

A engajada representava a esquerda ortodoxa com suas canções de protesto, seu nacionalismo (tão parecido com o dos militares), seu moralismo (tão parecido com o da direita) e sua breguice generalizada. A juventude desbundada era filha da contracultura, da revolução sexual, da política do corpo, do hippismo e sonhava em dormir no sleeping bag, fumar um baseado, enfim, seu negócio era apenas sexo, drogas e rock'n'roll. Se a engajada queria a ditadura do proletariado, a desbundada queria somente cair na estrada, morar em comunidade, pôr flores nos cabelos, e acreditar que a política podia ser feita com atos cotidianos e não com palavras de ordem e fuzis.

Essas duas juventudes passaram a se confrontar mais claramente na época dos festivais de música popular brasileira e internacionais durante a segunda metade da década de sessenta. Para a esquerda engajada, a música tinha que ser puramente brasileira, falar de temas sociais e promover a "revolução". Já tinha sido demais para ela o aparecimento da bossa-nova, no final da década de cinquenta, do pessoal da classe média carioca que misturava samba com  jazz, aquela música imperialista americana.  

Imagine só como não se sentiram quando aparece a Jovem Guarda, confirmando a chegada do fenômeno internacional do rock ao Brasil que já tinha começado a dar as caras, também em meados dos anos 50, com Celly Campello!! Aí foi demais. Letras ingênuas, alienadas e, ainda por cima, acompanhadas de guitarras elétricas? Passeta neles. E falo sério.

Jair Rodrigues, Elis Regina e Edu Lobo na passeta contra as guitarras elétricas
No dia 17 de junho de 1967, manifestantes da "verdadeira" MPB saíram em passeata contra a guitarra elétrica num percurso que se iniciou no Largo São Francisco e terminou no antigo Teatro Paramount, na avenida Brigadeiro Luís Antônio, onde se realizaria o programa Frente Única da MPB. Entre os manifestantes, Geraldo Vandré, Elis Regina, Jair Rodrigues, Zé Keti, Edu Lobo, MPB4, Gilberto Gil (pois, é!) e universitários em defesa da música de 'raiz' brasileira, contra os ritmos estrangeiros imperialistas da cultura norte-americana e inglesa. 

Dizem que houve também interesses mercadológicos no meio dessa passeata purista, pois o programa Jovem Guarda andava tirando audiência do programa Fino da Bossa, da Elis Regina, ambos da Rede Record (nada a ver com a Record de hoje).  Dizem que Gilberto Gil participou dessa passeata por amizade a Elis (ver depoimento de Gil no vídeo abaixo), o que parece conferir com os fatos posteriores, pois pouco depois participaria dos festivais de música popular brasileira acompanhado das guitarras elétricas dos Mutantes, dando início ao Tropicalismo, movimento onde não faltaram cabeludos e aquele instrumento imperialista dos diabos. E aí foi a vez dos tropicalistas enfrentarem também a sanha anti-imperalista da esquerda que era tão ruim de estética quanto de política tanto ontem quanto hoje.

Naturalmente, com o passar do tempo, todos os artistas incorporariam a guitarra elétrica, inclusive Elis Regina. De qualquer forma, o certo é que de todas as passeatas bizarras já feitas pela esquerda política ou cultural, hoje viúva do Muro de Berlim, essa foi sem dúvida uma das mais esdrúxulas.

Fica aqui registrado, portanto, em homenagem atrasada ao dia do Rock, que foi em 13 de julho, esse evento que marcou o início do roque tupiniquim. E para ilustrar musicalmente a postagem, alguns hits da Jovem Guarda, na voz de seu principal intérprete, Roberto Carlos, com aquelas adoráveis letras ingênuas e alienadas que tanta leveza e juventude trouxeram ao ambiente anquilosado do Brasil daqueles tempos.  Além do que, neste inverno congelante, só quero que você me aqueça e que tudo o mais vá para o inferno. 








segunda-feira, 12 de maio de 2014

Em entrevista ao programa Grande Entrevista, do canal de televisão português RTP Informação, o cantor Ney Matogrosso apresenta a realidade brasileira sem retoques

Ney Matogrosso lavando nossa alma
Em entrevista ao programa Grande Entrevista, do canal de televisão português RTP Informação, o cantor Ney Matogrosso apresenta a realidade brasileira atual sem retoques e critica com veemência nossos políticos e governantes, em particular o PT. Diz ele, entre outras verdades que nós, brasileiros conscientes, estamos carecas de saber: "No PT, é muito mais visível a corrupção. Bem mais visível."

Sempre gostei do Ney como artista, mas não sabia que tinha essa consciência política e a coragem de dizer a verdade a respeito do país e de nossa malfadada classe política, em particular sobre a máfia fascista do PT. E ninguém vai poder dizer que ele disse o que disse porque é de direita, conservador, blá-blá-blá, porque sempre foi uma figura tida como progressista. Aliás, ninguém precisa ser conservador(a) para criticar o atual estado de coisas no Brasil. Qualquer um(a) que tenha - como se diz popularmente - um pouco de vergonha na cara não pode estar contente com nossa realidade nem pode aprovar o presente governo.


Abaixo a entrevista de Ney e - para lembrar de sua bela voz - a música O Patrão Nosso de Cada Dia que hoje virou tema da minissérie O Caçador.

quarta-feira, 23 de abril de 2014

Pelo 117º aniversário de Pixinguinha, um doodle e muito Choro

Doodle do Google homenageia o grande mestre do choro Pixinguinha (Foto: Reprodução/Google)
O 117º aniversário de Pixinguinha, se ainda estivesse vivo, é o tema do Doodle do Google desta quarta-feira (23). Batizado como Alfredo da Rocha Vianna Filho, o músico nasceu em 23 de abril de 1897, no Rio de Janeiro. O famoso flautista, saxofonista, compositor e arranjador morreu em 17 de fevereiro de 1973 e é considerado um dos maiores nomes da música popular brasileira e do choro.

Em vida, contribuiu para a popularização do choro, cujo dia nacional é celebrado também no seu aniversário, no Brasil. No Doodle desta quarta-feira (23), a página principal do site de buscas mostra uma ilustração do artista tocando sax. Ao clicar nela, o usuário recebe uma série de resultados sobre suas músicas e obra. Ouça duas de suas obras mais famosas, Carinhoso e Rosa, nos vídeos abaixo. 

Carreira marcante desde menino

Alfredo da Rocha Viana Filho revolucionou o choro desde garoto. Logo aos 13 anos, em 1911, o jovem, filho de músico, entrou para a orquestra do rancho carnavalesco Filhas de Jardineira, e também estreou nos discos. Em paralelo, estudava no rigoroso Colégio São Bento e trabalhava em uma choperia na Lapa, bairro boêmio do Rio.

Em 1914, assinou sua primeira composição, Dominante, e entrou para o grupo Caxangá, com Donga e João Pernambuco. Três anos depois, gravou um disco do chamado Grupo do Pechinguinha, no Odeon. Em 1918, sua carreira decolou com o Oito Batutas, que tinha ele na flauta, Donga no violão, Nélson Alves no cavaquinho, entre outros.

Viajaram pelo Brasil, fizeram uma temporada em Paris, para a Argentina, e tornaram-se referência. Nos anos 30, Pixinguinha ainda gravou diversos discos como instrumentista, assinou arranjos expressivos para outros cantores e tornou-se ainda mais celebrado no cenário musical nacional por seu talento.

Mas, em 1942, decidiu abandonar a flauta e passou a investir no sax, instrumento com que lançou álbuns históricos com o flautista Benedito Lacerda. Funcionário da prefeitura do Rio de Janeiro desde a década de 30, ganhou o cargo de professor de música e canto orfeônico em 1951, honra concedida pelo então prefeito carioca João Carlos Vital.

Isso não acabou com sua carreira musical, que seguiu um sucesso nos anos 50. Em 54, fez história no Festival da Velha Guarda, em comemoração aos 400 anos de São Paulo, em 1954. Reuniu os amigos e fez apresentações antológicas à época. No ano seguinte, gravou seu primeiro long-play (LP).

Entretanto, os problemas de saúde começaram a afetá-lo por volta do ano de 58, quando sofreu um mal súbito. Em 63, teve um enfarto. Em fevereiro de 1973, veio a falecer, com outro enfarto, quando se preparava para um batizado na Igreja Nossa Senhora da Paz, em Ipanema. A Banda de Ipanema, bloco tradicional do Carnaval, interrompeu o desfile quando soube da notícia.

O apelido Pixinguinha e os grandes parceiros

Seu primeiro apelido era Pinzidim, dado pela avó africana. Há duas interpretações para o "verbete" que são bem famosas: segundo o pesquisador e radialista Almirante, significava "menino bom" em um dialeto africano. Já o pesquisador e compositor Nei Lopes diz que, em Moçambique, a palavra "psi-di" significava algo como "comilão".

No entanto, ainda não havia uma grafia para o apelido, justamente por ser uma palavra de origem africana e não usada no Brasil, que se tornou "Pechinguinha" no disco que gravou em 1917, com o "Grupo do Pechinguinha". Foi só nos anos 20, quando realizou sua turnê internacional com o grupo Oito Batutas que definiu o nome que o consagrou: Pixinguinha.

Entre seus principais parceiros, pode-se citar o irmão China (Otávio Vianna), Donga, João Pernambuco, Nélson Alves e Vinícius de Morais. Os sucessos são muitos, como "Sofro porque queres", "Lamentos", "Vou vivendo", "1x0" e "Naquele tempo", além das já citadas "Rosa" e "Carinhoso".

Em 2005, a obra do artista foi tombada pela Prefeitura do Rio de Janeiro. Fotografias, partituras, documentos e textos pertencentes ao músico passaram a ser parte do patrimônio cultural carioca, e muitos itens são exibidos até hoje na Cidade Maravilhosa, no Instituto Moreira Salles e no Museu da Imagem e do Som.

Legado para o choro e a música brasileira

Pixinguinha marcou época como flautista, compositor, saxofonista e arranjador. Desde muito menino, já participava das históricas rodas de choro da famosa casa da Tia Ciata, onde nasceu o primeiro samba gravado, "Pelo telefone", composto por Donga e Mauro de Almeida.

Pode ser considerado o primeiro maestro-arranjador contratado por uma gravadora no Brasil, a RCA Victor, nos anos 30. Tornou-se referência não só pelo talento como por sua polivalência, já que ele começou tocando cavaquinho, aos 12 anos, passou para a flauta e o bombardino aos 13, e encerrou a carreira como saxofonista.

Como músico, popularizou o choro para toda a população. O que era um tipo de música quase clássico, com Ernesto Nazareh, Chiquinha Gonzaga e os primeiros chorões, teve um novo sopro de vida misturado com ritmos africanos, europeus e americanos, fazendo surgir um novo estilo, com a cara do Brasil.

A sua importância foi tanta para o choro que coincide com o aniversário de Pixinguinha o Dia Nacional do Choro, homenagem pensada pelo bandolinista Hamilton de Holanda e os alunos da Escola Brasileira de Choro Raphael Rabello. A lei aprovando a data foi sancionada em 4 de setembro de 2000 e até hoje a data é um marco para os amantes deste estilo musical.

Fonte: O Globo, Techtudo, Thiago Barros, 23/04/2014

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