8 de Março:

A origem revisitada do Dia Internacional da Mulher

Mulheres samurais

no Japão medieval

Quando Deus era mulher:

sociedades mais pacíficas e participativas

Aserá,

a esposa de Deus que foi apagada da História

terça-feira, 21 de julho de 2015

Recesso de julho. De volta em 03/08


Aprovação de Dilma despenca para 7,7%


segunda-feira, 20 de julho de 2015

A amizade é o amor que nunca morre. Feliz dia dos amigos!

Hoje, no Brasil, é dia do mais nobre dos sentimentos humanos: a amizade, aquela que, nas palavras do poeta Mário Quintana, é o amor que nunca morre. Hoje também a humanidade aportou na lua 46 anos atrás (20/07/1969), quase no fim do dia. Um feito memorável.

Um bom dia para nascer, portanto, o que me aconteceu há 61 anos. Quem diria. Ainda estou por aqui firme e forte. Por isso, para homenagear o dia em que nasci, dia da amizade, deixo abaixo vídeo com Elis Regina cantando Canção da América. Deixo também de comentar sobre a corrupção nossa de cada dia,  pois nada é mais incompatível com a amizade do que a sordidez da desonestidade pessoal ou política.

sexta-feira, 17 de julho de 2015

Marxistas sempre erram. Mas por que não desistem de insistir nos erros?

Os textos de Jabor sobre sua época de crença na esquerda socialista, comunista, etc. sempre me fazem lembrar da minha própria trajetória também marcada pela influência de esquerda (ainda que da esquerda libertária) e cheia de ilusões. Dar adeus às ilusões não é fácil, mas imprescindível para o crescimento pessoal e político. Muitos caminhos levam a Roma, portanto, insistir em um que sempre só deu becos sem saída é meio patológico. Impressiona que a esquerda fóssil brasileira insista numa ideologia que não passou no test drive da História e segue criando destruição por onde passa. Se eles não aceitam virar essa página da História, precisamos virá-la por eles.

Destaque:

Nunca me esqueço de um debate do grande intelectual “aroniano” José Guilherme Merquior com dois marxistas na TV. Os dois falavam sempre dos erros da esquerda, mas considerados apenas como “percalços” de uma marcha triunfal para o futuro. Eles diziam, batendo no peito: “Erramos no stalinismo, na Hungria, em Praga, aqui erramos em 1935, 1964, em 1968, mas continuaremos lutando.” Merquior respondeu na lata: “Por que vocês não desistem?”
O volume morto
A palavra de ordem não era derrotar o capitalismo? Pois agora estão conseguindo cumprir

No Brasil, qual a diferença entre o comunismo de antigamente e o comunismo de hoje? Só uma: hoje eles estão no poder. Essa é a diferença principal. Na oposição são ardorosos sabotadores, no poder são um desastre administrativo. E se dedicam a sabotar o capitalismo mesmo dentro do poder capitalista. Como eles costumavam dizer, essa é a “contradição principal” deles: como ser contra o regime e governá-lo ao mesmo tempo?

A outra diferença entre ontem e hoje é de sentimentos: antes havia sim uma esquerda romântica, como vi e vivi nos tempos de estudante na UNE. A esquerda não era corrupta. Hoje a esquerda é só um pretexto para o petismo, o lulismo e o banditismo.

Naquela época, não. Nosso romantismo era meio babaca, mas era a única porta para entender o mundo.

Nós éramos mais “puros”, mais poéticos, mais heroicos que os meus colegas de PUC, todos já de gravatinhas adultas. Como era bom se sentir acima dos outros, não por competência ou cultura, mas por superioridade ética. Os operários eram nossa meta existencial. Para nós eles eram o futuro da Humanidade. Nas oficinas do jornal estudantil que eu fazia, crivavam-nos de perguntas e agrados, sendo que os ditos operários ficavam desconfiados e pensavam que nós éramos veados e não fervorosos “revolucionários”.

Naquele tempo não era possível pensar de outro jeito. De Sartre a Brizola, não havia outra ideologia disponível. A guerra fria dividia o mundo em duas facções, e a tomada do poder de Fidel Castro inebriou nossos desejos. Mesmo delirando em utopias, queríamos verdadeiramente, romanticamente salvar o país, contra o “imperialismo americano, o latifúndio e a direita espoliadora”. Não havia espaço para outras ideias, e quem ousasse pensar diferente era canalha, lacaio dos americanos. Por exemplo, Raymond Aron era de “direita” porque discordou do Sartre, pois esse incitava seus leitores para agir; Aron ensinava-os a pensar. Como acreditávamos nessa dualidade, ela virou uma verdade incontestável. E essas “verdades” criaram uma nova linguagem que praticávamos com fé e determinação. Em vez dos fatos, a linguagem bastava e nos movia. A linguagem ignorava o mundo real, chato e complexo demais para a mutação histórica que faríamos pois, afinal, éramos os “sujeitos da história”. Só as palavras simplistas explicavam nossa visão de mundo: alienação, massa atrasada, massa avançada, conscientização, sectarismo, aventureirismo, reacionarismo, entreguismo, proletariado, democracia burguesa e a palavra sagrada que tudo justificava: o “povo”.

E é impressionante a manutenção das mesmas ideias de 50 anos atrás. Éramos implacáveis com as tentativas de conciliação; um dia, o próprio Costa e Silva aceitou receber uma delegação de estudantes. Nada aconteceu porque nós, na porta do Planalto, nos recusamos a vestir paletós. Nossas certezas eram tão sólidas que me lembro de dizer, no dia 31 de março de 1964: “Oba! Já derrotamos o imperialismo americano; agora só falta a burguesia nacional!” No dia seguinte, a UNE pegava fogo e surgia o anão verde-oliva Castelo Branco, o novo ditador.

Como era fácil ignorar a realidade quando se é da oposição, como era (e é) moleza tramar um programa político sem ter de administrar nada. Os românticos esquerdistas achavam que administrar era coisa de capitalistas (e ainda acham) pois, no desespero da zona geral, tiveram agora de contratar um “neoliberal” para tentar salvar um país quase em “perda total”.

Na época, tudo fazia sentido para nós, sentido calcado em palavras-chaves que descreviam a vida, o país, as tragédias mundiais, a subestimação da resistência daquele mal chamado “capitalismo” que tudo descrevia. O capitalismo era tratado como uma pessoa: “capitalismo hoje acordou de mau humor, o capitalismo tentou nos enganar outro dia, o capitalismo está mentindo etc.” Nunca entenderam (como hoje) que o capitalismo não é um regime político, mas um modo de produção — mal ou bem, o único que ainda funciona nesse mercado devastado por crises.

O socialismo utópico ou não era a única ideologia que movia o mundo e que agora justifica a destruição do Estado e do país que os petistas estão perpetrando. De certa forma, essa cagada que aprontaram (perdoem a vulgaridade) foi uma vitória.

A palavra de ordem não era derrotar o capitalismo? Pois agora estão conseguindo cumprir sua utopia: derrotá-lo (e o Brasil junto) sem terem nada para botar no lugar. É espantosa a capacidade de errar dessa gente. Mas para eles, na pior tradição hegeliana, o “erro” é apenas um acidente de percurso. O erro é apenas uma contradição negativa e passageira. Nesse tempo, as reuniões eram incessantes e insuportavelmente longas. E era o mesmo papo de agora no PT: precisamos falar com o povo, com movimentos sociais, sindicatos e (uma palavra que me deprimia) “associações de bairro”. Eu pensava: “Que será isso? Será que querem conscientizar minhas tias?”. Nas infinitas reuniões todos falavam inflados de certezas e ao final se perguntavam: o que fazer? Ninguém sabia. Mas continuávamos firmes militantes do nada, sem saber para onde ir, porque ter dúvidas era “revisionismo”. É como hoje; ver o Rui Falcão falando até me emociona, pois é uma viagem no tempo. Não havia espaço para os males internos e seculares do Brasil; tudo era culpa dos inimigos externos (como hoje — não é, Dilma?).

Hoje já estão no “volume morto”, como definiu o Lula num raro acesso de autocrítica, mas continuarão persistindo na marcha da insensatez. Eles não mudam nunca.

Nunca me esqueço de um debate do grande intelectual “aroniano” José Guilherme Merquior com dois marxistas na TV. Os dois falavam sempre dos erros da esquerda, mas considerados apenas como “percalços” de uma marcha triunfal para o futuro. Eles diziam, batendo no peito: “Erramos no stalinismo, na Hungria, em Praga, aqui erramos em 1935, 1964, em 1968, mas continuaremos lutando.” Merquior respondeu na lata: “Por que vocês não desistem?”

Fonte: O Globo, 14/07/2015

quinta-feira, 16 de julho de 2015

Como diria minha avó: não quer ajudar, não atrapalha.

Não costumo curtir o Gregório Duvivier e praticamente desconheço o Porta dos Fundos. Costuma ser bobo da corte esquerdista assim como o Danilo Gentili é da corte direitista, mas, no texto abaixo, sem dúvida acertou em cheio. Quem coloriu sua foto de perfil do facebook, por ocasião da aprovação do casamento LGBT nos EUA, viu bem o que ele descreve abaixo. Gente sem noção dizendo que não ia colorir sua foto porque tinha criança morrendo de fome na África, bicho morrendo no Brasil, ou seja, coisas mais importantes na qual se engajar. E até gente desfazendo amizade porque uns amigos coloriram suas fotos e outros não coloriram. Tudo muito antidemocrático e estúpido. Como ele bem diz, "o problema é exatamente esse: alguém fazendo alguma coisa lembra a gente de que a gente não está fazendo nada." "...melhor seria se se usasse essa energia para tentar mudar, de fato, alguma coisa. Como diria minha avó: não quer ajudar, não atrapalha." 
Todo vegetariano diz que a parte difícil de não comer carne não é não comer carne. Chato mesmo é aguentar a reação dos carnívoros: "De onde você tira a proteína? Você tem pena de bicho? Mas de rúcula você não tem pena? E das pessoas que colhem a rúcula, você não tem pena? E dos peruanos que não podem mais comprar quinoa e estão morrendo de fome?" 
O estranho é que, independentemente da sua orientação em relação à carne, não há quem não concorde que o vegetarianismo seria melhor para o mundo, seja do ponto de vista dos animais, ou do meio ambiente, ou da saúde, ou de tudo junto. O problema é exatamente esse: alguém fazendo alguma coisa lembra a gente de que a gente não está fazendo nada. Quando o vizinho separa o lixo, você se sente mal por não separar. A solução? Xingar o vizinho, esse hipócrita que separa o lixo, mas fuma cigarro. Assim é fácil, vizinho.
Quem não faz nada pra mudar o mundo está sempre muito empenhado em provar que a pessoa que faz alguma coisa está errada —melhor seria se usasse essa energia para tentar mudar, de fato, alguma coisa. Como diria minha avó: não quer ajudar, não atrapalha. 
É sempre a mesma coisa. Primeiro todo o mundo põe um filtro arco-íris no avatar. Depois vem uma onda de gente criticando quem trocou o avatar. Depois vem a onda criticando quem criticou. Em seguida começam a criticar quem criticou os que criticaram. Nesse momento já começaram as ofensas pessoais e já se esqueceu o porquê de ter trocado o avatar, ou trocado o nome para guarani kayowá, ou abraçado qualquer outra causa.

Toda batalha pode ser ridicularizada. Você é contra a homofobia: essa bandeira é fácil, quero ver levantar bandeira contra a transfobia. Você é contra a transfobia: estatisticamente a transfobia afeta muito pouca gente se comparada ao machismo. Você é contra o machismo: mas a mulher está muito mais incluída na sociedade do que os negros. E por aí vai. Você é de esquerda, mas não doa pros pobres? Hipócrita. Ah, você doa pros pobres? Populista. Culpado. Assistencialista.

Cintia Suzuki resumiu bem: "Você coloca um avatar coloridinho, aí não pode porque tem gente passando fome. Aí o governo faz um programa pras pessoas não passarem mais fome, e aí não pode porque é sustentar vagabundo (...). Moral da história: deixa os outros ajudarem quem bem entenderem, já que você não vai ajudar ninguém".

Todo vegetariano diz que a parte difícil de não comer carne não é não comer carne. Chato mesmo é aguentar a reação dos carnívoros: "De onde você tira a proteína? Você tem pena de bicho? Mas de rúcula você não tem pena? E das pessoas que colhem a rúcula, você não tem pena? E dos peruanos que não podem mais comprar quinoa e estão morrendo de fome?"

O estranho é que, independentemente da sua orientação em relação à carne, não há quem não concorde que o vegetarianismo seria melhor para o mundo, seja do ponto de vista dos animais, ou do meio ambiente, ou da saúde, ou de tudo junto. O problema é exatamente esse: alguém fazendo alguma coisa lembra a gente de que a gente não está fazendo nada. Quando o vizinho separa o lixo, você se sente mal por não separar. A solução? Xingar o vizinho, esse hipócrita que separa o lixo, mas fuma cigarro. Assim é fácil, vizinho.

Quem não faz nada pra mudar o mundo está sempre muito empenhado em provar que a pessoa que faz alguma coisa está errada —melhor seria se usasse essa energia para tentar mudar, de fato, alguma coisa. Como diria minha avó: não quer ajudar, não atrapalha.

Fonte:  FSP, 13/07/2015

quarta-feira, 15 de julho de 2015

Na reforma política, os parlamentares, à revelia dos anseios da população, continuam legislando em causa própria

A gente nem pode ficar contente com a decadência do PT porque outras forças igualmente corruptas e patrimonialistas já irrompem no cenário político para tomar o seu lugar como protagonistas do roubo do erário público e degeneradores das instituições. No texto abaixo, editorial do Estadão (14/07), vê-se bem que suas excrescências do legislativo, na contramão dos anseios populares, estão trabalhando para minar os órgãos destinados exatamente a coibir a corrupção parlamentar.

Com a mesma perspectiva, o presidente da Câmara, muito comemorado pela direitosa (ontem Reacionaldo Azedo postou vários vídeos de entrevista que fez com o fulano) por marcar a independência do legislativo frente ao executivo (leia-se "governos petistas) e ser conservador, trabalha pela nomeação de executivo amigo em posto estratégico na Caixa, hoje ocupado por dirigente da confiança de Dilma. Em outras palavras, é apenas o roto buscando substituir o rasgado. O problema do Brasil não é de esquerda ou de direita. É de falta de consciência democrática, de cultura democrática. Todo o mundo só pensa em mamar nas tetas do Estado e enriquecer às custas da população que trabalha e sustenta esses parasitas de cores várias.

Reformando em causa própria

Do ponto de vista do desejável equilíbrio entre os Poderes da República, a queda de braço entre o Congresso e o Planalto que se observa desde a posse de Dilma Rousseff em seu segundo mandato tem resultado na crescente conquista, pelos parlamentares, de uma autonomia que se contrapõe à hegemonia política do Executivo que vigorou por mais de uma década de lulopetismo no poder. O reequilíbrio de um dos fundamentos do sistema democrático garante o cumprimento, em sua plenitude, das funções legislativas e fiscalizadoras do Parlamento. Mas, em vez de aplicar seu revigorado poder exclusivamente em benefício do País, os parlamentares passaram a legislar em causa própria. A reforma política em pauta no Congresso é um exemplo. Demonstra como os nobres parlamentares se têm dedicado à prática vergonhosa de atender a seus próprios interesses.

Na semana passada, a Câmara dos Deputados aprovou o texto básico da reforma política no qual, em vez de aprimorar e endurecer a fiscalização da atividade político-partidária, torna mais difícil a apuração de irregularidades pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), exatamente no momento em que o País manifesta indignação com a malversação de recursos públicos entranhada nos desvãos do poder público.

Em outro plano, mas ainda focados prioritariamente nas vantagens políticas de que se podem beneficiar, os parlamentares têm-se prevalecido da debilidade política do Planalto para lhe impor derrotas significativas na votação de medidas como as do ajuste fiscal necessário ao saneamento das contas do governo. Até mesmo a oposição – no caso, o PSDB –, pensando apenas em fazer Dilma Rousseff sangrar, tem contrariado o indiscutível interesse público, como o fez ao votar contra o fator previdenciário criado por iniciativa dos tucanos na administração FHC.

O golpe dos deputados contra o poder de fiscalização do TSE é um escândalo que favorece a falta de probidade e de transparência na manipulação dos recursos financeiros que alimentam a organização partidária e as campanhas eleitorais. Por exemplo, o prazo que hoje o Ministério Público tem para representar contra os suspeitos de cometer irregularidades é substancialmente reduzido: de até junho do ano seguinte à eleição foi antecipado para 19 de dezembro do ano eleitoral. Isso praticamente inviabiliza investigações mais complexas. O projeto reduz as multas por irregularidades praticadas e acaba com a punição mais pesada imposta hoje aos partidos cujas contas são rejeitadas: o bloqueio das cotas do Fundo Partidário.

Fontes do TSE ouvidas pelo jornal O Globo entendem que a iniciativa dos deputados criará enormes obstáculos para o cumprimento da função fiscalizadora do tribunal e ainda minimizará o efeito inibidor que a imposição de multas pesadas tem sobre a prática de irregularidades relacionadas com o financiamento eleitoral. Ou seja, é uma reforma feita rigorosamente na contramão do clamor popular – e dos imperativos éticos – contra a corrupção que se tornou endêmica na relação dos gestores públicos com os fornecedores do governo, como tem sido fartamente comprovado pela Operação Lava Jato e seus desdobramentos.

Outro efeito do crescente sentimento de poder dos parlamentares é a tendência de exercer controle sobre os órgãos de fiscalização do Estado, inclusive o Tribunal de Contas da União (TCU), que apesar do nome não é parte do Poder Judiciário, mas apenas um órgão auxiliar do próprio Congresso que, como diz o nome, tem a missão de fiscalizar as contas da União. Há vários exemplos desse surto de onipotência dos congressistas. Um deles é o projeto que está pronto para ser votado na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara que autoriza fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial no TCU, realizada pelo Congresso com apoio da Controladoria-Geral da União (CGU). Quer dizer: o Congresso quer o apoio de um órgão de apoio do Executivo – a CGU – para controlar um órgão de apoio do Legislativo – ou seja, dele mesmo, o Congresso.

Na verdade, trata-se de uma artimanha para alertar os ministros do TCU – que em dias divulgarão sua decisão sobre as contas públicas do ano findo comprometedoras do comportamento da presidente – que eles podem passar de pedra a vidraça. Trata-se de desavergonhada manobra de intimidação, com a qual a maioria dos parlamentares certamente não concordará.

terça-feira, 14 de julho de 2015

Visão de mundo antimercado vigora nos cursos de humanas das universidades e nas redações do ENEM



Destaque: 
É um discurso de quem se alinha mais ao mundo socialista que ao capitalista e hoje sente saudades daquela "alternativa". Nesse pensamento, pouco se busca entender do funcionamento normal do mercado, com propriedade privada, sistema de preços, empreendedorismo, publicidade, risco, consumo, lucro e especulação. A isso tudo reserva-se a condenação. É compreensível que esse tipo de pensamento tenha se difundido quando lembramos que ele foi também uma reação à ditadura militar censora, violenta e autoritária que se colocava como radicalmente antisocialista. Só que os tempos mudaram, e os conteúdos não.
Nota máxima para o clichê ideológico
Por Joel Pinheiro da Fonseca


Vendo as redações com nota máxima do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) de 2014 que começaram a ser veiculadas na mídia em maio, quando o MEC liberou a consulta aos espelhos da correção oficial, penso não na publicidade infantil, tema da prova, mas na propaganda ideológica juvenil, também presente nos textos.

Essa modalidade de propaganda é transmitida principalmente nas disciplinas de humanas do ensino médio a jovens que estão engatinhando na vida intelectual. Ainda despreparados para formular suas próprias ideias, matam essa capacidade no berço e compram com facilidade os discursos e as formas de pensar a eles vendidas.

Faz mais de uma década que terminei o ensino médio e constato que nada mudou.

O fim da Guerra Fria continua sendo o mais importante referencial histórico; o mundo desde então estacionou sob o jugo do capitalismo. O capitalismo, por sua vez, gera intencionalmente a doença do consumismo para que as pessoas comprem sempre mais, caso contrário o sistema ruiria sob o excesso de produção. A mídia exerce o papel de controladora quase onipotente dos desejos humanos, incitando-os ao consumo desmedido. As crianças são especialmente indefesas. E o Estado é a principal ou mesmo a única instância que visa nosso bem e que pode nos proteger.

Partindo desse esquema básico, praticamente todas as redações chegam à mesma conclusão: a publicidade infantil deve ser proibida ou sofrer pesadas restrições.

É curioso que, na era da internet, dos smartphones, do YouTube, tablets e redes sociais, nada disso sequer seja mencionado em redações sobre a relação das crianças com a comunicação eletrônica. A vida mudou, os hábitos são outros, mas o discurso sobre o tema continua preso à imagem da criança sozinha em casa na frente da televisão sem qualquer outro contato com o mundo externo.

Da mesma forma, ninguém menciona a queda histórica da receita com publicidade, seja televisiva, impressa ou mesmo online. Simplesmente atribuem poderes imensos a uma indústria em processo de fragmentação e cujos principais atores passam por uma crise profunda.

É interessante notar que se a propaganda fosse realmente a todo-poderosa, seria muito fácil reverter, por exemplo, a má alimentação infantil: bastaria fazer publicidade de vegetais e comidas mais saudáveis, coisa que as marcas infantis até tentam –vide as maçãs da Turma da Mônica–, com sucesso limitado. Ao mesmo tempo, impérios outrora imbatíveis como o McDonald's têm vendas em queda livre no mundo inteiro, inclusive nos Estados Unidos, a despeito de seu pesado investimento em publicidade. Não se menciona, ademais, que a publicidade infantil de hoje é mais comedida do que a de décadas passadas, quando a televisão tinha alcance muito maior.

As práticas da indústria também mudaram: já faz anos que as lanchonetes vendem brinquedos separados de lanches e oferecem frutas na sobremesa, que biscoitos recebem doses extras de vitaminas e que mascotes foram banidas da propaganda de cerveja. E, no entanto, a revolta com as práticas comerciais nunca foi tão forte.

Por fim, apesar de tanto se falar em capitalismo, ninguém se preocupa em imaginar as consequências econômicas de uma possível proibição. É como se a produção e a oferta de produtos infantis e de espaços destinados ao público mirim fossem completamente independentes da publicidade que garante vendas e receitas.

Todas essas considerações poderiam figurar na educação que os jovens recebem, ainda que como contraponto. E, no entanto, não figuram. A narrativa básica já está formatada e é vendida pronta para que milhões de jovens a reproduzam nas provas. Uma visão de mundo antimercado e anticonsumo vigora nos cursos de humanas de nossas universidades, inclusive nos de pedagogia.

É um discurso de quem se alinha mais ao mundo socialista que ao capitalista e hoje sente saudades daquela "alternativa". Nesse pensamento, pouco se busca entender do funcionamento normal do mercado, com propriedade privada, sistema de preços, empreendedorismo, publicidade, risco, consumo, lucro e especulação. A isso tudo reserva-se a condenação. É compreensível que esse tipo de pensamento tenha se difundido quando lembramos que ele foi também uma reação à ditadura militar censora, violenta e autoritária que se colocava como radicalmente antisocialista. Só que os tempos mudaram, e os conteúdos não.

BAGAGEM

É natural que a formação dos professores se reflita nas salas de aula e mesmo na já previsível escolha de temas do Enem. Um professor, falando de questões sociais e econômicas, traz sua própria bagagem. O que não é intelectualmente saudável é que ela seja a referência única, sem alternativas, e que tenha parado no tempo, ficando alheia à revolução tecnológica e às tendências atuais da sociedade.

Adolescentes terminam o ensino médio sem nem mesmo terem noções rudimentares de oferta e demanda, mas familiarizados com o conceito de mais-valia e cheios de certezas sobre os males do sistema econômico "neoliberal" e com ojeriza à ideia de lucro.

E não é apenas uma questão de conteúdo. Há uma notável semelhança também na forma de pensar e de escrever. Os estudantes usam e abusam de citações –Marx, Foucault, Sérgio Buarque de Holanda, Gilberto Freyre, Freud, Gandhi, Platão, Bourdieu; além do vilão Adam Smith– e nenhum deles faz referência à própria experiência de ter sido criança há não mais do que sete anos e, portanto, julgar se, em seu próprio caso, a publicidade infantil era tão poderosa assim.

Nossos estudantes aprendem que a menção a medalhões do pensamento –muitas vezes mal colocada– é preferível às suas próprias ideias e pensamentos. A supressão da primeira pessoa é, diga-se de passagem, uma exigência rígida de estilo nas redações, ensinada em colégios e cursinhos e observada por todos.

A criança –creio que ninguém discorde– não tem maturidade para tomar decisões de consumo por conta própria. Por isso mesmo não controla o dinheiro da casa. Aos poucos, amparada por pais e escola, aprende a lidar com os apelos do mundo e da mídia.

O adolescente também vive uma imaturidade: a intelectual. Inicialmente indefeso frente a apelos ideológicos, vai aos poucos aprendendo a pensar por conta própria. Para isso, ao invés de ensinado a repetir dogmaticamente o "discurso crítico" de gerações passadas, poderia ser estimulado a procurar novas ideias, a comparar posições conflitantes, a articular suas experiências e a fomentar debates. Assim teríamos mais diversidade de opinião no Enem e, quem sabe, as sementes de uma renovação intelectual do país.

JOEL PINHEIRO DA FONSECA, 30, é economista, mestre em filosofia e escreve para o site spotniks.com.

Fonte: Folha de SP, Ilustríssima, 12/07/2015

segunda-feira, 13 de julho de 2015

Pega em reunião secreta com o presidente do STF, Ricardo Lewandowski, em Portugal, Dilma diz que encontro foi "casual"

Livrandowski e Dilma 
No dia 10, o pessoal do site O Antagonista, soltava a nota abaixo sobre o furo de outro jornalista, Gerson Camarotti, que revelou o encontro, pensado para ser secreto, de Dilma com o presidente do STF, Ricardo Lewandowski, na cidade do Porto, em Portugal. O encontro suspeitíssimo foi no dia 07/07. Agora, no sábado, 11/07, o próprio Camarotti comentou a resposta atrasada de Dilma sobre o assunto (ver depois da nota).

Considerando a situação periclitante de Dilma no governo, com os escândalos de corrupção do Petrolão e agora também do Eletrolão cada vez mais perto da presidanta, acreditar que o encontro dela com o conhecido Ministro Livrandowski tenha sido casual é um atestado de estupidez. Falar da falta de vergonha na cara dessa senhora e de seus cúmplices já virou clichê, né mesmo?

Os verdadeiros golpistas

O Brasil apodreceu completamente.

Gerson Camarotti:

"Na escala técnica que fez na cidade do Porto, em Portugal, antes de seguir para Rússia, Dilma Rousseff teve um encontro reservado com o presidente do STF, Ricardo Lewandowski. A reunião não foi incluída na agenda oficial. Também participou do encontro José Eduardo Cardozo".

Qual foi o assunto?

"A conversa foi ampla e incluiu entre os temas a Operação Lava Jato".

Vocês leram direito: a presidente da República se reuniu secretamente com o presidente do STF, num país estrangeiro, para tentar melar a Lava Jato, salvando-a do impeachment e livrando os criminosos de seu partido da cadeia.

Isso é mais grave do que os 19 bilhões de reais roubados da Petrobras. Dilma Rousseff e seus comparsas são os verdadeiros golpistas do Brasil.


Governo admite erro ao omitir de agenda encontro de Dilma e presidente do STF

Só neste sábado (11) a presidente Dilma Rousseff falou em Milão, na Itália, do tema de um encontro reservado com o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Ricardo Lewandowski, que aconteceu na terça-feira (7), quando fez uma escala técnica na cidade do Porto, em Portugal. Na reunião, que ficou fora da agenda oficial, os dois discutiram o projeto que reajusta o salário dos servidores do Judiciário.

O encontro, que foi mantido em segredo pelo Palácio do Planalto, repercutiu aqui em Brasília. A oposição questionou o fato de Dilma ter discutido fora do Brasil temas mais sigilosos com o presidente do STF, como a avaliação do Judiciário sobre o ambiente político e os desdobramentos da Operação Lava Jato. 

Cheguei a perguntar isso ao ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, assim que ele retornou de Portugal. Ele confirmou o encontro no Porto, mas negou que a operação Lava Jato tenha sido a pauta da reunião. Disse que foi um encontro casual.

O ministro contou ainda que participava com Lewandowski de uma cimeira na cidade de Coimbra com juristas portugueses e brasileiros. E que, ao ser informado da escala de Dilma, o presidente do STF foi até o Porto. Segundo Cardozo, o assunto do encontro foi o aumento do Judiciário.

No Palácio do Planalto, a ordem é minimizar o episódio. Mas interlocutores da presidente Dilma reconhecem de forma reservada que foi um erro omitir uma agenda tão importante. E que, para evitar especulações, o mais correto teria sido fazer o encontro com o presidente do STF, no Brasil, dentro do Palácio da Alvorada.

Fonte: G1, Blog do Camarotti, 11/07/2015

sexta-feira, 10 de julho de 2015

Impeachment de Dilma cada vez mais provável

Matéria da IstoÉ, de 03/07, sintetiza a lista de irregularidades que podem tirar Dilma do poder. Vale a leitura.

Começam a se desenhar as condições para o impeachment

Pedaladas fiscais, contribuições ilegais para a campanha e pressões indevidas ao Judiciário podem levar ao processo de afastamento da presidente da República

Sérgio Pardellas, Claudio Dantas Sequeira e Josie Jeronimo
A luz vermelha de alerta foi acesa no Planalto. Pela primeira vez, desde o início da crise política, o governo admite que a situação da presidente Dilma Rousseff beira o insustentável. Ninguém mais esconde a gravidade do momento. Isolada, registrando o pior índice de popularidade da redemocratização - míseros 9% -, com sua base política e social em frangalhos, e sob o risco de ser abandonada pelo próprio vice-presidente e por ministros estratégicos do governo, Dilma se depara com o caos à sua volta. Percebe-se fragilizada em quase todas as frentes políticas. Nunca, como agora, as condições para um possível impeachment da presidente da República estiveram tão nitidamente postas. No TCU, encerra-se na próxima semana o prazo para a presidente se explicar no episódio conhecido como pedaladas fiscais, artifício usado pelo governo para maquiar as contas públicas e simular um resultado fiscal diferente da realidade. O entendimento no tribunal é que dificilmente as contas de 2014 de Dilma serão aprovadas dado o grau de devastação da contabilidade do governo. Fatalmente a presidente será responsabilizada num processo que pode, se avalizado pelo Congresso, culminar com o seu afastamento por 180 dias para responder por crime de responsabilidade.

No TSE, o cenário é ainda mais sombrio para Dilma, o PT e o Planalto. O tribunal investiga a existência de irregularidades na campanha cujo desfecho pode ser a cassação do diploma de Dilma por abuso de poder político e econômico. Na última semana, os ministros do TSE impuseram uma derrota ao governo por unanimidade numa ação em que o PT tentava barrar a convocação do empreiteiro Ricardo Pessoa, dono da UTC, pedida pelo PSDB. Graças a esse infortúnio que expõe a fraqueza do governo num foro decisivo para o destino da presidente da República, no dia 14 de julho, Pessoa irá repetir no TSE o explosivo depoimento dado à Justiça em regime de delação premiada. Aos procuradores da Lava Jato, Pessoa revelou ter doado à campanha de Dilma à reeleição R$ 7,5 milhões em dinheiro desviado de contratos da Petrobras, depois de pressionado pelo então tesoureiro Edinho Silva, hoje ministro da Comunicação Social. O empreiteiro ainda entregou aos procuradores uma planilha com título autoexplicativo: “Pagamentos ao PT por caixa dois”, numa referência ao repasse ilegal de R$ 15 milhões ao então tesoureiro petista, João Vaccari Neto, e de R$ 750 mil a José Filippi, responsável pelas contas de campanha da presidente em 2010. Em reuniões internas do PMDB, José Sarney, experiente cacique político e interlocutor de Lula durante seus dois mandatos, avaliou, sem meias palavras: “A possibilidade da queda de Dilma é cada vez mais real”. Para Sarney, a escalada de más notícias para o governo não cessa e o cerco se fecha no momento em que a base de sustentação de Dilma no Congresso desaba como um castelo de cartas. O temor no Planalto é reforçado pelo fato de o doleiro Alberto Yousseff ter feito uma revelação tão grave quanto a de Ricardo Pessoa no mesmo processo no TSE, onde o governo demonstra não dispor de apoios sólidos. Yousseff disse ter sido procurado por um emissário da campanha da presidente Dilma no ano passado para repatriar cerca de R$ 20 milhões depositados no exterior. Ele só não executou a operação porque foi preso em março com a eclosão da Operação Lava Jato. “Uma pessoa de nome Felipe me procurou para trazer um dinheiro de fora e depois não me procurou mais. Aí aconteceu a questão de prisão e eu nunca mais o vi. Se não me engano, o pai dele tinha uma empreiteira”, disse o doleiro. Questionado se o dinheiro teria como destino a campanha de Dilma, Yousseff foi taxativo: “Sim, mas não aconteceu”. A conversa teria ocorrido 60 dias antes de sua prisão.

Além de Yousseff, foi ouvido pelo ministro-relator João Otávio Noronha do TSE o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, e um personagem pouco conhecido do grande público, mas com potencial para levar ainda mais complicações a presidente. Segundo apurou ISTOÉ, em depoimento sigiloso à Justiça Eleitoral, o ex-diretor de estudos e políticas sociais do IPEA Herton Ellery Araújo contou que foi pressionado pelo governo para não divulgar, durante a campanha, dados que pudessem prejudicar a reeleição da petista. Um desses dados dizia que o número de miseráveis no Brasil havia aumentado entre 2012 e 2013, contrastando com o discurso entoado por Dilma em peças publicitárias na TV e no rádio, e em comícios País afora. Araújo não suportou a interferência e pediu exoneração do cargo. “Nós não pudemos divulgar os dados da extrema pobreza da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios”, confirmou o ex-diretor em entrevista à ISTOÉ. Para ele, o “governo errou a mão, fez besteira”. “A pessoa não pode fazer o que quer para ganhar eleição”, disse. Além de abuso de poder político, ao impedir a divulgação de dados oficiais negativos, Dilma pode responder por falsidade ideológica. O depoimento de Araújo levou o TSE a convocar Marcelo Neri, da Secretaria de Assuntos Estratégicos, a prestar esclarecimentos. O ex-ministro terá de dizer de quem partiu a ordem no Palácio do Planalto para impedir a divulgação da pesquisa.

De acordo com assessores palacianos, Dilma reage mal ao isolamento imposto por antigos parceiros e aliados e às pressões as quais está submetida. Em vez de ampliar a interlocução, fecha-se em copas. Isso explica a escalada de declarações estapafúrdias dos últimos dias.
Na semana passada, somou-se à trapalhada das citações de termos como “mulher sapiens” e à “saudação da mandioca”, a inacreditável tentativa de desqualificar o depoimento de Ricardo Pessoa, comparando o papel do colaborador da Justiça ao de delatores torturados pelo regime militar e ao do traidor da Inconfidência, Silvério dos Reis. “Eu não respeito delator”, disse Dilma (leia mais em box à pág. 33). Em conversas reservadas, a presidente chegou ao despautério de dizer que poderia anular os benefícios concedidos ao empreiteiro. A atitude desastrosa da presidente gerou reações inflamadas no meio jurídico. O ex-presidente do Supremo, Joaquim Barbosa acusou Dilma de incorrer em crime de responsabilidade. “A Constituição não autoriza o presidente a investir politicamente contra as leis vigentes, minando-lhes as bases. Atentar contra o bom funcionamento do Poder Judiciário é crime de responsabilidade. Colaboração ou delação premiada é um instituto penal-processual previsto em lei no Brasil”, criticou Barbosa. O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, tentou defender a chefe, atribuindo sua fala a um arroubo de “honestidade intrínseca”. A emenda ficou pior que o soneto. Os elementos trazidos por Ricardo Pessoa também motivaram uma nova representação da oposição, liderada pelo senador Aécio Neves (PSDB), na Procuradoria- Geral da República (PGR), pedindo a abertura de investigação contra Dilma por crime de extorsão. Para juristas, a delação reforçou a tese do impeachment. O o episódio relatado pelo dono da UTC ajudaria a explicar a omissão de Dilma diante do Petrolão. Para o advogado Eduardo Nobre, especialista em direito eleitoral, as novas denúncias reforçam os indícios contra Dilma e o PT. “É preciso levantar o quanto o valor arrecadado ilicitamente para a campanha interferiu no resultado das eleições. Se as investigações puderem mostrar isso, reforça o pedido de afastamento”.

Em 2005, auge do escândalo do mensalão, o governo petista contava com a liderança e o carisma de Lula, sua capacidade de mobilização e, principalmente, com a sustentação do Congresso. É tudo o que o atual governo não dispõe hoje. O retrato do esfacelamento da base governista no Congresso foi a aprovação, na semana passada, do aumento de 78% para os servidores do Judiciário – medida inviável economicamente para País às voltas com um necessário ajuste fiscal para disciplinar as contas públicas. Se no Congresso, uma das principais arenas de batalha de um presidente ameaçado de afastamento, o governo demonstra estar anêmico, no próprio Palácio do Planalto a situação não é muito diferente. A interlocutores, o vice-presidente Michel Temer ameaçou abandonar o barco da articulação política com o Legislativo. A atribuição coube a Temer no início do ano, quando a presidente percebeu que o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, havia perdido as rédeas da negociação com os partidos aliados. A saída de Temer da articulação, neste momento, representaria o abandono da presidente pelo seu próprio vice-presidente. Além dos significado político do gesto, Dilma perderia o principal elo entre o PMDB, maior partido da base, e o Planalto. Assim sendo, a fagulha detonadora do processo de afastamento da presidente ficaria muito próxima de ser acesa. Na semana passada, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, tornou público o desejo de ver Temer fora da negociação com o Congresso, jogando mais combustível na crise.

Em 1992, quando o ex-presidente Fernando Collor foi apeado do poder, o estopim foram as revelações do motorista da Presidência, Eriberto França, publicadas por ISTOÉ. Em reportagem exclusiva, depois reafirmada na CPI, Eriberto revelou que PC bancava as despesas da família do presidente, como a compra de um Fiat Elba e a famosa reforma na Casa da Dinda, um imóvel particular transformado em residência oficial. Hoje setores do PT classificam a movimentação pelo impeachment da presidente de golpe. Em 1992, Collor repetia a mesma ladainha: “Uma minoria quer realizar o terceiro turno das eleições. Vou defender a Constituição, doa a quem doer. Os que conspiram contra mim são golpistas e formam o sindicato do golpe”. Então na oposição, os petistas, os mesmos que hoje bradam contra o que chamam de forças golpistas, atestavam a constitucionalidade do processo. “Não há mais condições éticas e políticas para governar. O impeachment é uma solução constitucional”, disse José Dirceu, deputado do PT, em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, em junho daquele ano.

Remontar àquela época ajuda a desnudar a maleável ética do petismo, com a sua retórica que oscila ao sabor de sua conveniência. Mas expõe, principalmente, a surpreendente similaridade entre os dois momentos decisivos para a história do Brasil. Como há 23 anos, com Collor, o índice de rejeição do governo Dilma beira os 70%. A presidente da República não consegue mais ir à rua sem se defrontar com um cartaz pedindo a sua saída. Seus ministros não têm paz sequer para comer fora de casa. Dona Leda Collor, mãe do ex-presidente, também enfrentou a ira dos manifestantes no auge do processo de impeachment contra o filho, quando foi internada num hospital em Botafogo, no Rio. A mais importante das correspondências entre os dois episódios, porém, é que, também a exemplo de julho de 1992, neste julho de 2015 começam a se desenhar as condições para o afastamento da presidente da República.
 
 O impeachment à brasileira pode ter vícios de origem. É mais político do que jurídico. Desde sempre. Afastado pelo Congresso, Collor foi absolvido no STF. Mas o impeachment é constitucional. Está disciplinado em lei. No artigo 85 e na Lei 1.079, de abril de 1950. Não se pode reduzir a discussão, como fazem cabeças coroadas do PT, ao questionamento da índole e dos reais propósitos de alguns dos defensores da saída da presidente. Até porque os petistas, hoje associados a toda sorte de desvios e práticas de corrupção, não reúnem mais condições de fazê-lo. Dizer que os adversários cometem exatamente os mesmos malfeitos que lhe estão sendo atribuídos não anula a questão central: quem está no poder é Dilma, o esquema em investigação ocorreu no seio da maior estatal brasileira, a Petrobras, durante a gestão petista e é isso que está em julgamento agora. Ademais, todos sabiam que, entre os que defensores do impeachment de Collor, havia políticos oportunistas. O que não se sabia, na ocasião, é que os maiores oportunistas eram os que estavam na linha de frente daquele processo e seriam os que mais se beneficiariam dele anos depois – os petistas.


Foto: Alan Marques/Folha Press, Paulo Lisboa/Brasil Photo Press/Folha Press; Kena Betancur/AFP; Jorge William/Ag. o Globo; Ailton de Freitas/Ag. o Globo, George Gianni; Sergio Lima/Folha Press; Adriano Machado/Ag. Istoé

terça-feira, 7 de julho de 2015

FHC apontando rumos para a oposição

FHC durante a convenção nacional do PSDB, em Brasília.
(Foto: André Dusek/ Estadão Conteúdo)
A responsabilidade das oposições
Anotada e registrada a responsabilidade política do petismo, as oposições, em particular o PSDB, têm compromissos com a nação

Diante da paralisia governamental, da expansão incontrolada da ação legislativa, da recessão econômica e do ativismo da Justiça, vê-se muita cobrança: e as oposições e o PSDB? Sumiram? Que farão com os mais de cinquenta milhões de votos que receberam? Compreende-se a angústia, mas é preciso distinguir os papéis da oposição e os do Governo.

Como no jogo de xadrez, o Governo joga com as pedras brancas, as iniciativas têm que partir dele. Tomou algumas no desespero, para enfrentar as agruras financeiras. Ao tomá-las foi buscar quadros e medidas no arsenal da oposição. Quer isso dizer que a oposição deve ficar paralisada? Não.

Política econômica é questão de dosagem e de credibilidade. A dose parece excessiva e todo esforço fiscal pode se esvair na falta de atividade econômica que encolhe a arrecadação. Segundo, sem um horizonte de esperança, qualquer ajuste pode ser letal.

Com este Governo não há recuperação de credibilidade à vista, pois o cristal se quebrou. E os escândalos de corrupção revelados diariamente se encarregam de corroer qualquer elo de confiança que o Governo queira tecer.

Cabe às oposições mostrar no dia a dia, e não só no Congresso, que o sofrimento do povo é consequência da ação desatinada dos governos de Lula e Dilma – da dupla e não só da última – que desdenharam das boas práticas de gestão do Estado. Só na Petrobras, os prejuízos causados por decisões erradas para atender a pressões políticas chegam a 34 bilhões de reais, fora os seis bilhões de propinas! Que dizer do desrespeito sistemático da Lei de Responsabilidade Fiscal. É prova de imprudência no uso do dinheiro público.

É preciso reavivar a memória do povo, a cada instante, para mostrar que este ajuste violento não corresponde ao que foi pregado pelo PSDB, não é “o que o Aécio faria”. O ajuste vai cair nos ombros da população. O aumento de impostos pega todos, empresários e consumidores, desemprego e reajustes salariais abaixo da inflação pegam os trabalhadores. A alta das taxas de juros em doses excessivas aumenta a dívida pública e dificulta o próprio ajuste. Estas medidas podem eventualmente controlar a inflação, mas reduzem a massa salarial e diminuem o consumo. Como o Governo não corta despesas, a retomada do crescimento – se houver – terá sido conseguida a enorme custo para o povo.

O refrão das oposições deve ser: chegamos a tais medidas e ao descalabro atual porque os governos lulo-petistas foram irresponsáveis, não se preocuparam em controlar o gasto público e enganaram o povo, enveredando pela megalomania. Os royalties do pré-sal, diziam, vão resolver os problemas da educação, faremos ao mesmo tempo o trem bala, a transposição do São Francisco, a Norte-sul e a Transnordestina, sem falar nos 800 aeroportos! Concessão de serviço público é coisa de vende-pátria neoliberal. Daremos empréstimos no FIES e no Minha Casa Minha Vida, as bolsas acomodarão os miseráveis e o BNDES dará subsídios em abundância aos empresários. O Tesouro pagará a farra.

Tanto pior, melhor? Não. Anotada e registrada a responsabilidade política do petismo, as oposições, em particular o PSDB, têm compromissos com a nação. Nada justifica arruinar ainda mais o futuro, votando pela derrubada do fator previdenciário. Nada explica apoiar aumentos de gasto que no futuro serão pagos com mais impostos, mais inflação e mais ajustes. Em suma, a oposição deve criticar as políticas petistas e não se confundir com elas. Não deve, porém, votar contra os interesses da nação.

Espera-se mais das oposições. Espera-se que apresentem sua visão de futuro, apontando um rumo ao país. Espera-se que se comprometam com a construção de uma economia de baixo carbono, impulsionada pela inovação, regida por regras claras e estáveis, com agências regulatórias independentes, mais e melhor integrada ao mundo e às cadeias globais de valor.

Espera-se que defendam a re-industrialização do país, sem hesitar na crítica a políticas canhestras de conteúdo nacional que, sob a pretensão enganosa de estimular a produção local, acabam por isolar o Brasil e condená-lo à obsolescência tecnológica.

Espera-se que façam da educação não um slogan, mas de fato uma prioridade do Estado e da sociedade, que tenham a coragem de dizer que, embora avançando, o Brasil está ficando para trás em relação a países comparáveis ao nosso, que, frente à sombra que esse quadro projeta sobre o futuro do país, não receiem enfrentar dogmas e pressões corporativas que dificultam reformas e inovações indispensáveis a um salto de qualidade em matéria de educação.
Espera-se das oposições que sejam progressistas também no campo comportamental: que não defendam a redução da maioridade penal, mas sim a extensão da pena dos menores infratores em dependências que sejam condizentes com a dignidade humana; que apoiem como legítimo e justo o casamento entre pessoas do mesmo sexo; que não fujam ao debate sobre as drogas, que não temam proclamar que o encarceramento dos usuários é parte do problema e não da solução; que sejam assertivas na luta pela igualdade de gênero e contra o preconceito e a discriminação racial, com o uso adequado de cotas e demais medidas compensatórias; e que não aceitem retrocessos legais na questão das terras indígenas.
Espera-se das oposições, sobretudo, que reafirmem seus valores democráticos. Que digam, em alto e bom som, ser possível e necessário atuar contra a deliberada violação de direitos humanos, principalmente em países vizinhos, sem com isso ferir o princípio da não intervenção.

Da mesma maneira, espera-se que reiterem não ter o propósito antidemocrático de derrubar governos, mas tampouco o temor de cumprir seus deveres constitucionais, se os fatos e a lei assim o impuserem.

Fonte: El País, 05/07/2015

FHC: "Lulopetismo quebrou o Brasil"
Discurso de Fernando Henrique Cardoso na 12ª Convenção Nacional do PSDB.
Posted by PSDB on Domingo, 5 de julho de 2015

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