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Mulheres samurais

no Japão medieval

Quando Deus era mulher:

sociedades mais pacíficas e participativas

Aserá,

a esposa de Deus que foi apagada da História

terça-feira, 18 de junho de 2019

Advogado de defesa de réus da Lava Jato sai em apoio à operação


Perplexa como o autor do texto abaixo quanto à inacreditável inversão de valores que estamos observando após mais uma armação ilimitada da corruptocracia brasileira contra a Lava Jato. Trata-se de uma campanha para desacreditar o ex-juiz Sérgio Moro e a operação que trouxe esperança aos brasileiros de estabelecer alguma moralidade no trato da coisa pública em nosso país. Contaminada por essa infame distorção, vemos uma parte da população brasileira querendo que o juiz se dê mal e o ladrão se dê bem.

Felizmente, alguns juristas e advogados começam a falar com mais veemência contra essa situação surreal que estamos vivendo novamente. É o caso do advogado Luís Carlos Dias Torres que defendeu réus em processos movidos no âmbito da operação Lava Jato. Embora advogado de réus acusados pela operação, o advogado empresta sua voz para defender a idoneidade do juiz e da operação e aponta a sinistra inversão de valores que se produziu no país por agentes contrários aos reais interesses da nação.

Destaco (o resto do texto vem depois):

"A inversão de valores que estamos vivendo é de deixar qualquer pessoa de bem completamente estarrecida. As pessoas que trabalham para fazer com que os criminosos paguem por seus crimes, são condenadas. Enquanto isso, o sigilo (da fonte) vale para proteger a identidade de criminosos audazes, mas o sigilo (das comunicações) pode ser atropelado se for para expor autoridades altamente respeitadas ao juízo (leigo) da opinião pública. É isso mesmo ou eu perdi alguma parte dessa história?!?

O que mais me deixa espantado nisso tudo é que a imprensa supostamente séria presta mais atenção no conteúdo das mensagens trocadas – que revelam nada mais do que a praxe forense de sempre – do que no crime praticado contra importantes autoridades da República.

No fim, realmente tem muita coisa surpreendente nesse episódio todo. A única coisa que não causa surpresa alguma é o teor das mensagens trocadas entre a força-tarefa da Lava Jato e o então juiz Sérgio Moro."


Brasil: futebol, carnaval, samba e inversão de valores
Luís Carlos Dias Torres*

Tenho acompanhado essa polêmica toda a respeito das mensagens trocadas entre a força-tarefa da Lava Jato com o então juiz e atual ministro da Justiça, Dr. Sérgio Moro. Estou absolutamente surpreso! Porém, a última coisa que me surpreende é o teor das mensagens trocadas entre o MPF e o juiz da causa.

Quem advoga na área criminal está mais do que acostumado com essa proximidade entre o juiz e o promotor. Ela é até natural. Afinal, ambos trabalham juntos, fazem audiências todos os dias, durante tardes inteiras. Tanto juiz como promotor são funcionários públicos. Normalmente são pessoas que optaram por essas carreiras com ideais de contribuir para um país e um mundo mais justo; que, em muitas vezes, se traduz em punir os culpados.

Aliás, isso não é de hoje. Desde muito existe esse tipo de entendimento entre o acusador e o julgador. Só que antes, ela acontecia presencialmente, na sala de audiências, no gabinete do juiz, no cafezinho do Fórum, etc. Hoje em dia, com os avanços da tecnologia, ela ocorre pelos aplicativos de mensagem.

O problema maior se dá quando essa proximidade e essa identidade de ideias e ideais contamina a imparcialidade do juiz. Novamente: quem advoga na área criminal está muito habituado a esse tipo de situação, onde a imparcialidade do juiz está totalmente comprometida por essa proximidade com o órgão da acusação, que é tão parte quanto a defesa no processo criminal.

Não é o caso do juiz Sérgio Moro. Tive a oportunidade de atuar em vários casos da chamada Operação Lava Jato, de casos relativamente comuns até casos mais sensíveis, como o do triplex e o do sítio de Atibaia.

Nosso primeiro cliente era uma pessoa ligada a uma das figuras centrais dessa história – o doleiro Alberto Youssef, velho conhecido da Justiça Criminal do Paraná.

O Ministério Público Federal denunciou e, nas alegações finais, pediu a condenação do nosso cliente. O Dr. Sérgio Moro, de forma independente e imparcial, absolveu nosso cliente.

Depois, representamos um importante executivo da OAS em vários processos.

No caso do triplex, mesmo sem acordo de colaboração firmado com o MPF, o Dr. Sérgio moro reconheceu a contribuição de nosso cliente para o esclarecimento da verdade e aplicou os benefícios da colaboração. O MPF teve de recorrer da decisão.

Mais para frente, foi a vez do processo que versava sobre as obras do Cenpes no RJ. Novamente, o Dr. Sérgio Moro, contrariando os pleitos da acusação, reduziu a pena de nosso cliente ante a sua contribuição para o esclarecimento da verdade, mesmo sem um acordo de colaboração firmado com o MPF. Novamente o MPF teve que recorrer dessa decisão.

Mudou o juiz, mas não mudou a independência e imparcialidade do Juízo da 13.ª Vara Federal de Curitiba. No caso do sítio de Atibaia, a Dra. Gabriela Hardt, inobstante o pedido de condenação formulado pelo MPF, absolveu nosso cliente de uma das acusações e extinguiu o processo em relação à outra acusação. Novamente o MPF recorreu da decisão. Lamentavelmente, vi pouca ou quase nenhuma repercussão dessa decisão na imprensa…

Assim, pelo menos na minha experiência, nunca houve comprometimento da imparcialidade do juiz nos casos da Lava Jato em que atuei. E toda vez que procurei o Dr. Sérgio Moro para despachar, sempre fui recebido com atenção e respeito. Nunca precisei do Telegram do juiz Sérgio Moro para poder falar com ele.

O que ficou muito evidente para mim na conduta do Dr. Sérgio Moro foi sua obsessão pela apuração da verdade. E, afinal de contas, é para isso que serve o processo penal.

Todo processualista sabe que a verdade real está acima da verdade formal. E foi por fazer essa leitura do juiz que definimos que a melhor tática de defesa seria contribuir para o esclarecimento da verdade, que, diga-se de passagem, veio à tona por muitos e muitos outros elementos de prova, tais como perícias, testemunhos, documentos, informações decorrentes de quebra de sigilo telemático, telefônico e bancário, etc.

Nessa história toda, me causa grande perplexidade ver que algum hacker tem a coragem e a petulância de invadir a privacidade do ministro da Justiça e de integrantes da força-tarefa da Lava Jato e que essa questão fique em segundo plano! Isso é gravíssimo! Autoridades da maior importância tiveram seus telefones invadidos e as pessoas parecem não se aperceber da seriedade disso. Trata-se de crime grave e a identificação e punição dos envolvidos deveria estar em primeiro lugar na ordem do dia.

Hoje, um site qualquer que tenha ligação com o mundo do crime – e hackers são criminosos, não nos esqueçamos disso – dá voz irrestrita àqueles que têm a audácia de hackear os celulares do ministro da Justiça e de procuradores da República da força-tarefa da Lava Jato.

Quem passou essas informações para o jornalista? Como ele teve acesso a elas? Se o jornalista for perguntado, certamente vai e deve alegar que tem direito ao sigilo da fonte.

A inversão de valores que estamos vivendo é de deixar qualquer pessoa de bem completamente estarrecida. As pessoas que trabalham para fazer com que os criminosos paguem por seus crimes, são condenadas. Enquanto isso, o sigilo (da fonte) vale para proteger a identidade de criminosos audazes, mas o sigilo (das comunicações) pode ser atropelado se for para expor autoridades altamente respeitadas ao juízo (leigo) da opinião pública. É isso mesmo ou eu perdi alguma parte dessa história?!?

O que mais me deixa espantado nisso tudo é que a imprensa supostamente séria presta mais atenção no conteúdo das mensagens trocadas – que revelam nada mais do que a praxe forense de sempre – do que no crime praticado contra importantes autoridades da República.

No fim, realmente tem muita coisa surpreendente nesse episódio todo. A única coisa que não causa surpresa alguma é o teor das mensagens trocadas entre a força-tarefa da Lava Jato e o então juiz Sérgio Moro.

*Luís Carlos Dias Torres é advogado do Torres Falavigna Advogados

Fonte: Estadão, 15/06/2019

terça-feira, 11 de junho de 2019

História do Futebol Feminino: superando pobreza, preconceito e descrença

Imagem: Ney Montes/Arquivo Pessoal

Copa de Futebol Feminino: trajetória de pobreza, preconceito e descrença


Mulheres chegaram a ser proibidas de jogar futebol no Brasil de 1941 a 1979.

Quando a seleção brasileira feminina de futebol estreou no dia 9 pelo mundial da categoria, com vitória sobre a Jamaica por 3 a 0, entrou em campo com ela a sombra das pioneiras do esporte no país, que enfrentaram pobreza, descrença, machismo, ofensas e altas doses de amadorismo para pavimentar a estrada que Formiga e Marta podem trilhar hoje em terras francesas.

Mulheres que foram tachadas de criminosas a atrações circenses exclusivamente pelo desejo de algo tão simples quanto jogar bola.
Memória é o que você escolhe esquecer, não necessariamente o que você enaltece e quer guardar. Por isso, desde 2015, com a explosão do feminismo no mundo, a gente passou a olhar para essa história de outra forma", diz Daniela Alfonsi, antropóloga e diretora do Museu do Futebol, em São Paulo, que inaugurou em maio a exposição CONTRA-ATAQUE! As Mulheres do Futebol, que reúne material precioso dos primeiros anos e da evolução do esporte no país.
Há registros da prática do esporte entre mulheres desde o começo do século passado, mas foi na década de 1940 que a prática começou a se popularizar entre elas. Tanto que começou a incomodar.
E, neste crescendo, dentro de um ano é provável que em todo o Brasil estejam organizados uns 200 clubes femininos de futebol, ou seja, 200 núcleos destroçadores de 2.200 futuras mães", escreveu o senhor José Fuzeira em carta endereçada ao então presidente Getúlio Vargas e publicada no jornal Diário da Noite em 7 de maio de 1940.
Num tempo de eugenia e preconceito, ninguém estranhou, em abril do ano seguinte, o Artigo 54 do Decreto-Lei 3.199, que determinava que "às mulheres não se permitirá a prática de desportos incompatíveis com as condições de sua natureza". Da mesma forma como também não pareceu estranho a ninguém o fato de ele nunca ter sido efetivamente cumprido.

As senhoras boleiras de Araguari
Imagem: Eduardo Merege/Museu do Futebol.
Parte fundamental dessa resistência teve como sede uma cidade mineira quase na fronteira com Goiás. Foi em Araguari que as mulheres futebolistas brilharam em 1958.

Com a intenção de ajudar financeiramente o Grupo Escolar Visconde de Ouro Preto, que passava por dificuldades, o fundador do Araguari Futebol Clube, Ney Montes, convocou pelo rádio meninas interessadas em montar um time de futebol local.

Entre as aprovadas estava Nádima Nascimento, então com 18 anos.
A mulher era educada para ser dona de casa e criar filhos, não tinha outra opção", lembra a hoje costureira, aos 78 anos.
O objetivo original de Ney Montes foi atingido logo no primeiro jogo
Já na estreia, a renda foi espetacular, encheu de gente para nos ver, e começaram a aparecer convites para jogar em cidades vizinhas", lembra a capitã Zalfa Nader, hoje com 73 anos. Nádima nunca esqueceu dois momentos tensos da trajetória. "Em Goiânia, as pessoas ameaçaram invadir o campo e, em Varginha, o avião, daqueles pequenos, deu uma pane."
Zalfa prefere lembrar do jogo em Belo Horizonte, quando as equipes se apresentaram com as camisas do Atlético e do América da capital.
Quando o Atlético fez gol, as pessoas jogaram chapéus e paletós no campo, de alegria."
O grupo das subversivas senhoras boleiras de Araguari durou cerca de um ano: no fim de 1959, tiveram convite para exibir seus talentos no México mas, por pressões afins, a lei foi cumprida e os times, proibidos.

A proibição acabou oficialmente em 1979, mas a regulamentação do futebol feminino no Brasil só chegou em março de 1983. Entre as regras, jogos de 70 minutos, sem cobrança de ingressos e a inacreditável determinação de que as jogadoras não poderiam trocar de camisa com as adversárias depois da partida.

Essa regra nasceu no ano anterior, quando, em uma uma preliminar feminina no Morumbi antes de São Paulo e Corinthians, a atriz e produtora Ruth Escobar trocou de camisa com outra jogadora.

Também em 1982 entrou em campo o que seria o maior escrete da primeira fase da história do futebol feminino brasileiro. Das areias de Copacabana, a fundação do time do Esporte Clube Radar, fundado em 1981, trazia uma figura fundamental para a primeira década do esporte, o advogado Eurico Lyra Filho.

Apaixonado pelo futebol feminino, Lyra ajudou a regulamentá-lo e, ao mesmo tempo, formou um time imbatível.

O Radar ganhou todas as seis edições da Taça Brasil, primeiro campeonato nacional da categoria, e outros seis campeonatos cariocas.

Mas Eurico era um reflexo do amadorismo da época. Todos os feitos do Radar foram conquistados sem que o dinheiro dos patrocinadores chegasse às jogadoras. Ele tinha fama de dar assistência, se preocupar, ajudar as famílias. Dinheiro, que era bom, nada.
Ele ajudava muito as meninas, mas, ao mesmo tempo, era uma prática comum na época elas jogarem por uma caixa de cerveja", lembra Suzana Cavalheiro, ex-lateral-direita.
Não existia para nós a perspectiva de ganhar um salário para jogar futebol naquela época", resume a ex-jogadora do Juventus, que recusou o convite do Radar para terminar a faculdade de Educação Física em São Paulo.
Às jogadoras sempre foi atribuído um discurso de 'paixão pelo futebol', que contribuiu para manter a falta de profissionalização e de uma devida valorização monetária", pontua Cláudia Kessler, professora da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e doutora em Antropologia Social.
Quando elas recebiam algo, eram lanches, passagens ou alguma quantia mínima, chamada de 'ajuda de custo'", completa.
Pela paz nos estádios

Imagem: Ney Montes/Arquivo Pessoal 
O Radar entrou para a história pela bola e pelas confusões. Só em 1983, primeiro ano da regulamentação, foram duas.

Em julho, na decisão da Taça Brasil, ganhava de cinco a zero no time do Goiás. A três minutos do fim do jogo, um grupo expressivo de jogadoras do time goiano não concordou com uma marcação e agrediu o árbitro, que expulsou o time inteiro.

Três meses mais tarde, a equipe de Copacabana decidiu o primeiro Campeonato Carioca feminino contra o Bangu. Depois de uma vitória pela contagem mínima para cada lado, a decisão foi para um terceiro jogo no estádio Moça Bonita, casa do Bangu.

O Radar abriu a contagem logo no começo, mas, aos 35 minutos do segundo tempo, só o juiz Ricardo Durães não viu a bola bater na mão da zagueira do time de Copacabana dentro da área.

As jogadoras do Bangu partiram para cima dele. Alguns torcedores invadiram o campo e fizeram o mesmo. O falecido patrono do time (e banqueiro do jogo do bicho) Castor de Andrade também correu para cima do árbitro. Sem função originalmente na briga, as jogadoras do Radar partiram para cima das adversárias.
O Castor de Andrade liberou os seguranças para espancarem o árbitro. Tinha tanto leão-de-chácara naquele dia que os jornais da época brincaram que o estádio do Bangu ia passar a se chamar Coliseu ou Simba Safári", conta Carlos Molinari, jornalista e historiador do Bangu.
No fim, o Radar venceu por um a zero, o jogo não terminou, todas as jogadoras do Bangu, que ajudaram a surrar o árbitro, foram suspensas e o time se desfez", conclui.
Logo, aquele que foi o primeiro escrete feminino do suburbano carioca a disputar um campeonato oficial foi também seu último. Se não durou muito, o time do Bangu rendeu um mito do esporte: Maria Lucia Lima, a Fia.

Queridinha de Castor de Andrade, que dizem ter ficado impressionado ao vê-la jogar, só não conseguiu uma coisa dele, como revelou em entrevista para o jornal O Globo este ano: jogar descalça, já que não havia chuteira feminina e ela não se adaptava ao calçado tipo Kichute usado pelo time feminino. Com o fim do time do Bangu, Fia foi para o Vasco e esteve nos grupos da seleção em 1988 e 1991.

A primeira seleção do Brasil
Imagem: Museu do Futebol/Coleção Suzana Cavalheiro
Muito por pressão de Eurico Lyra, a primeira seleção brasileira de futebol feminino foi formada para disputar um torneio experimental na China, em 1988, que serviu de teste para a organização do primeiro mundial da categoria, três anos mais tarde, no mesmo país.

Com doze países na disputa, o Brasil voltou com um honroso terceiro lugar e a certeza de que o amadorismo, no futebol feminino, era mesmo regra.

A campeã foi a Noruega, de quem o nosso selecionado ganhou na fase de grupos e para quem perdeu na semifinal. Se, dentro de campo, o futebol era algo equivalente, fora as coisas não poderiam ser mais diferentes.
As norueguesas tinham um kit de primeiros socorros que era fantástico, a gente não tinha nem um comprimido para cuidar do fígado", lembra Suzana Cavalheiro.
As dificuldades apareceram na preparação, no Rio. "A gente comia numa instalação militar, e a comida era insuficiente em termos de nutrientes para atletas", recorda Suzana, que fez parte do grupo.
A gente treinava em dois períodos e ainda lavava a própria roupa, porque cada uma só tinha dois jogos de uniforme."
O uniforme, por sinal era (e foi durante décadas) o que sobrava do material masculino. Quando foi marcada uma apresentação da seleção feminina no Maracanã antes de um Fla-Flu, em 1988, a vaidade falou mais alto.
Eles deram um agasalho com uma boca de sino deste tamanho, horrível, a gente não queria entrar com aquilo. Aí a Cebola ensinou um pontinho simples e todo mundo fez", conta Suzana.
Não à toa, uma das peças em exposição no Museu do Futebol é a camisa da seleção que Marcia Honório usou em 1988, ao lado de outros três uniformes, entre eles o do Mundial de 2019 - o primeiro a ser vendido no varejo e a ser feito sob medida para elas, por incrível que pareça.

'Remember the time'

'A gente treinava em dois períodos e ainda lavava a própria roupa,
porque cada uma só tinha dois jogos de uniforme', recorda Suzana
 Imagem: Museu do Futebol / Coleção Suzana Cavalheiro
Nos anos 90, o Radar havia encerrado as atividades. Ainda assim, a vida das mulheres que jogavam futebol melhorou um pouco. Mas só um pouco.
Como havia poucas equipes femininas, eu comecei jogando com os meninos. Só aos 14 anos que fui fazer uma avaliação no Saad, que foi o que me direcionou para o que me tornei hoje", lembra Emily Lima, ex-jogadora e atual treinadora das Sereias da Vila, time de futebol feminino do Santos, que começou a carreira quando o esporte já tinha uma década de regulamentação no país.
O Saad era um clube originário de São Caetano (SP) que montou seu time de futebol feminino em 1985 e teve destaque na categoria.
Houve dificuldades, claro, mas só fui viver uma situação negativa que me marcou de fato na seleção, quando tive resultados que não eram tão ruins quanto os de hoje e fui mandada embora por ser mulher", diz a primeira (e única) mulher a dirigir o time nacional feminino, que permaneceu dez meses no cargo, entre 2016 e 2017.
Como jogadora, ela saiu do Saad para o São Paulo em 1997, onde encontrou uma estrutura que já apontava novos caminhos.
No São Paulo a gente tinha uma casa como alojamento, um centro de treinamento só para a gente, eu nunca tinha vivido aquilo como atleta", conta a treinadora, que lembra, entre outras, de Sissi como uma das jogadoras que a inspiraram no começo da carreira.
Ela poderia ter sido melhor do mundo, com toda certeza."
Parece exagero, mas só parece. Sissi foi a primeira camisa 10 da seleção feminina, de fato e de direito. Ela já estava naquele time de 1988, mas brilhou mesmo na década seguinte.

A menina do interior da Bahia, que arrancava a cabeça das bonecas para usar como bola, fez um dos gols mais bonitos da história dos mundiais, em 1999 nos Estados Unidos. Bonito e útil: foi o "gol de ouro" contra a Nigéria que levou o Brasil às semifinais da competição, da qual o país sairia com o bronze e ela, como uma das artilheiras.
Depois da Era Telê (Santana), o São Paulo estava vivendo uma seca de títulos quando, em 1997, montou uma equipe feminina e contratou a Sissi", recorda Arnaldo Ribeiro, chefe de redação dos canais ESPN.
Como o time masculino passou a colecionar vexames, era comum a torcida gritar 'Sissi, Sissi' durante os jogos, pedindo a camisa 10 para o lugar de Souza, Dodô e companhia", conta o jornalista.
Aquele momento ainda apresentou ao país o talento de Mariléia dos Santos, a mulher que fez mais gols que Pelé (1.574) e brilhou sob a alcunha de um apelido dado pelo falecido locutor (e entusiasta do futebol feminino) Luciano do Valle: Michael Jackson. A nossa "rainha do pop" brilhou no Saad e no Torino, da Itália.
Marcar a Michael Jackson era triste, em meio metro ela fazia miséria", lembra Suzana Cavalheiro.
Michael estava no grupo que disputou as primeiras Olimpíadas da modalidade, em 1996, e viveu uma situação bizarra.
Uma coisa que me chamou a atenção na pesquisa para a exposição foi o fato de que a CBF mandou a seleção feminina para Atenas com as passagens de volta compradas para o fim da primeira fase", conta Daniela Alfonsi.
As meninas seguiram na competição, chegaram até as semifinais e o prêmio delas foi poder voltar no avião exclusivo do time masculino."
Ou seja, as coisas haviam melhorado, mas só um pouco.

Abrindo novos caminhos
Uniforme atual da seleção feminina
Aos 52 anos, Sisleide do Amor Lima, a Sissi, hoje trabalha como técnica de um time de base nos Estados Unidos. Ela integrou o time profissional do Vasco e chegou a enfrentar uma certa Marta quando jogava contra meninas das categorias de base. Aquela mesma que esquentou o banco do cruz-maltino para Fia, a jogadora que encantou Castor de Andrade.

Michael Jackson, quando parou de jogar, foi coordenar o futebol feminino no Ministério dos Esportes, hoje rebaixado a secretaria, para ajudar a pavimentar o caminho das meninas que cresceram já inspiradas pelo protagonismo de Marta.

Ao entrar em campo na França este mês, no mundial da categoria, a jogadora eleita seis vezes a melhor do mundo, que levou o futebol feminino brasileiro a um outro patamar quando apareceu, em 2000, vai carregar o peso do legado das ex-colegas, que abriram o caminho com muito sacrifício.
Em grande medida, as adversidades vividas por essas jogadoras foram tanto de ordem material como cultural. Algumas deixaram de estudar para se dedicar ao futebol e agora estão no mercado informal de trabalho, com vidas precárias", avalia Cláudia Kessler.
Nas crises, a gente se sobressai. No meio de tantas dificuldades, aquelas meninas tinham mais bola", compara Lu Castro, jornalista especializada em futebol de mulheres.
Além disso, estamos há treze anos falando de Marta. Precisamos colocar outros nomes na boca do povo, enaltecer as jogadoras que estão chegando, fazer com que outras se sobressaiam como ela", ressalta.
De qualquer forma, o futebol praticado pelas mulheres caminhou para que hoje possa oferecer uma outra visão de país. Ou seja, a saga das pioneiras valeu a pena.
A ideia de que o time masculino brasileiro representa a nação surge com o primeiro título sul-americano, em 1919. Há uma construção de que a seleção brasileira é o país e ela está toda baseada no futebol masculino", analisa Daniela Alfonsi.
A seleção feminina talvez abra a possibilidade de olhar para um outro país, que não é o que a gente está acostumado a ver, do oba-oba, dos noventa milhões em ação, mas que também é o Brasil."
Fonte: UOO, 07/06/2019

quinta-feira, 6 de junho de 2019

Obsolescência programada: aparelhos projetados para quebrar em pouco tempo

Lixão de Agbogbloshie em Accra (Gana), aonde vão parar os resíduos da Europa e dos Estados Unidos ( EFE)
Programado para estragar

Projetar aparelhos com defeitos e peças pouco duráveis para que o consumidor tenha de comprar novamente. É a obsolescência programada, uma prática que nos leva a um beco sem saída

A frase foi publicada em 1928 na Printer’s Ink, revista do setor publicitário norte-americano:
Um artigo que não estraga é uma tragédia para os negócios.” Para que vender menos se você pode vender mais projetando produtos com um defeito incorporado? Por que não abandonar esse afã romântico de fabricar produtos bem feitos, consistentes, duradouros, e ser logo prático? Não será melhor para o business fazer com que o cliente tenha de abrir a carteira mais vezes?
Essa é história de uma ideia que ganhou força como salvação dinamizadora nos anos da Grande Depressão, transformou-se num mantra da sociedade de consumo – comprar, usar, jogar fora, voltar a comprar – e se tornou, já na atualidade, uma séria ameaça ao meio ambiente. É uma história escrita aos poucos, capítulo por capítulo. O último e mais importante deles é o destaque que a questão ganhou nos debates da Europa, sinal de que existe uma crescente conscientização: em 4 de julho, o Parlamento Europeu aprovou (por 622 votos a favor e 32 contra) o Relatório sobre Produtos com Uma Vida Útil Mais Longa: Vantagens para os Consumidores e as Empresas, pedindo que a Comissão Europeia adote medidas.

Não só isso. A França, país com a legislação mais dura da Europa contra a obsolescência programada, acaba de registrar a primeira denúncia de um coletivo de consumidores contra os fabricantes de impressoras. O fato ocorreu em 18 de setembro: a associação Halte à l' Obsolescence Programmée (HOP, Contra a Obsolescência Programada) acusou marcas como Epson, HP, Canon e Brother de práticas destinadas a reduzir deliberadamente a vida útil de impressoras e cartuchos.

O truque não é novo. Começou a ser usado no final do século XIX na indústria têxtil (quando os fabricantes começaram a utilizar mais amido e menos algodão) e se consolidou em 1924, quando General Electric, Osram e Phillips se reuniram na Suíça e decidiram limitar a vida útil das lâmpadas a 1.000 horas, tal como aponta o festejado documentário espanhol Comprar, Tirar, Comprar (“comprar, jogar fora, comprar”), de Cosima Dannoritzer. E assim foi assinado o atestado de óbito da durabilidade.

Até então, as lâmpadas duravam mais. Como a que brilha ininterruptamente desde 1901 na central dos Bombeiros de Livermore, na Califórnia. De filamento grosso e intensidade menor que a de suas sucessoras (o que impede o alto aquecimento), essa lâmpada foi concebida para perdurar. E continua lá, brilhando, mostrando que a obsolescência programada está longe de ser um mito.

Desde a sensação causada nos anos trinta pelas meias de náilon Du Pont, que não rasgavam, até o telefone inteligente que fica burro sem razão aparente – e só um ano e meio depois de ser adquirido –, muita água passou debaixo da ponte. A obsolescência programada (OP) foi aprimorada. E a intenção de fraude por parte do fabricante não é algo fácil de demonstrar.
Hoje, os investimentos em pesquisa e desenvolvimento são para ver como reduzir a durabilidade dos aparelhos, mais do que para melhorá-los ao consumidor”. Quem se expressa de forma tão contundente é Benito Muros, um ex-piloto de 56 anos que há anos denuncia a OP. Presidente da Fundação Energia e Inovação Sustentável Sem Obsolescência Programada (Feniss), ele afirma que a OP está presente em todos os dispositivos eletrônicos que compramos, “até mesmo nos carros”.
Os consumidores franceses realizaram a primeira denúncia contra várias marcas de impressoras

Muros lidera uma empresa que desenvolve lâmpadas, semáforos e projetos de iluminação pública para Prefeituras da Espanha, conta que hoje é possível observar muitas formas de OP no mercado: dispositivos com carcaças que não permitem a dissipação do calor, e cujo aquecimento gera falhas prematuras; componentes como os condensadores eletrolíticos, cujas dimensões determinarão a vida do produto (perdem líquido com as horas de uso; quanto menor for a capacidade de armazenamento de líquido eletrolítico, menos vai durar); baterias que não podem ser retiradas (como foi o caso do iPhone) e que obrigam o usuário a comprar um novo aparelho; chips que agem como contadores e que estão programados para que o sistema pare de funcionar após certo número de utilizações, como ocorreu com algumas impressoras (o consumidor que ousar tentar consertar uma logo escutará que é mais barato comprar outra).

Muros, que diz ser alvo de campanhas de difamação na imprensa por se opor à OP – e que fabricou uma lâmpada que foi objeto de controvérsia, – afirma inclusive que atualizações enviadas para os nossos smartphones escondem uma mudança de software que os torna mais lentos.

A lâmpada acesa mais antiga do mundo, numa central dos Bombeiros de Livermore, na Califórnia 
Eles te enviam uma espécie de vírus que serve para preparar o telefone para o seu final”, diz. Outro aparelho jogado no lixo, e outro resíduo eletrônico que, mais cedo ou mais tarde, vai parar nos tóxicos (e sinistros) lixões que o mundo rico alimenta em lugares remotos, como a África.
Cerca de 215.000 toneladas de aparelhos eletrônicos, procedentes sobretudo dos Estados Unidos e da Europa, desembarcam todo ano em Gana, segundo a Motherboard, uma plataforma multimídia de longa trajetória sobre trabalhos de pesquisa. Acabam gerando 129.000 toneladas de resíduos em lugares como Agbogbloshie, um dos maiores lixões tecnológicos do mundo, situado em Accra, a capital do país.
Somos os responsáveis pelo nosso consumo. Não podemos seguir assim”, diz a cientista Mari Lundström
A indústria de tecnologia produz, sozinha, 41 milhões de toneladas de resíduos eletrônicos por ano, segundo uma pesquisa do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). Entre 60% e 90% desses produtos caem nas mãos de quadrilhas, que os descarregam ou comercializam ilegalmente. Além de Gana, países como Índia e Paquistão são importantes destinos de televisores, celulares e aparelhos de som descartados com a chegada das liquidações, porque não somos bobos, e porque uma semana de preços supostamente loucos é uma oportunidade que não se pode desperdiçar. Tudo pelo último modelo.

Ainda assim, a prática tem os seus defensores. Eles dizem que uma obsolescência programada controlada, sem abusos excessivos, é a fórmula para que o mundo continue funcionando como até agora. E uma fonte de criação de emprego.

Além disso, o avanço tecnológico traz soluções mais ecológicas e eficientes, como poderia ser o caso dos carros elétricos. Portanto, a OP poderia ter sentido, argumentam seus partidários.

O debate está aberto. E dele também participam aqueles que dizem que esse negócio de obsolescência programada é uma teoria da conspiração. Basta um passeio pelo Twitter para ver mais argumentos. Uns dizem que o verdadeiro problema não são as marcas, mas os consumidores: queremos produtos baratos para usar e jogar fora, e não estamos dispostos a pagar o que custariam se realmente fossem de qualidade (e, portanto, mais caros).

Nessa mesma linha se manifesta o diretor geral da Associação Nacional de Fabricantes de Eletrodomésticos (Anfel), da Espanha, que reúne as marcas de linha branca (geladeiras, lava-roupa, lava-louça, etc). Este jornal tentou realizar uma entrevista com algum diretor da Anfel, que só aceitou responder às perguntas por e-mail. Após afirmar que não há dados embasando a ideia de que os eletrodomésticos duravam mais em meados do século passado do que agora, e de qualificar a prática da OP como “deplorável”, Alberto Zapatero, diretor geral da Anfel, escreve: “Devemos levar em conta que os consumidores não só jogam fora os produtos que deixaram de funcionar, mas também o fazem por outros motivos, por exemplo quando um aparelho deixa de cumprir com suas expectativas por razões técnicas, regulatórias ou econômicas (caso de televisores não aptos para a transmissão digital), além do desejo dos consumidores de adquirir um novo modelo por questões de mudanças de funcionalidade, design e serviços.”

Não bastasse o consumismo desenfreado dos cidadãos ocidentais, existe também a contemporânea impossibilidade de consertar. E os dados indicam que o consumidor estaria disposto a reparar os produtos, se pudesse: 77% dos europeus prefeririam o conserto a uma nova compra, segundo o Eurobarômetro de 2014.
A sociedade dos resíduos não pode seguir assim. Estamos perante um modelo econômico superado”, afirma de Bruxela, por telefone, Pascal Durand, deputado verde europeu que liderou a iniciativa apresentada pelo Parlamento Europeu no final de julho.
A cifra de consumidores de produtos de tecnologia aumenta a cada ano. Novas classes médias de países como China e Índia se incorporam ao padrão de compra dos países mais desenvolvidos. Mais celulares, mais computadores, mais eletrodomésticos. Primeiro para o carrinho de compras, depois para o lixo. E mais extração de metais para produzi-los. Matérias-primas que não são ilimitadas.

Ao mesmo tempo, quanto mais curta é a vida dos dispositivos que compramos (veja os celulares, cuja expectativa de vida oscila entre um e dois anos, segundo os estudos europeus), maior é o volume de resíduos gerados.

Jogar fora aparelhos novos que poderiam ser consertados na Europa, enviando-os a lixões distantes em barcos que contaminam águas, para, ao mesmo tempo, comprar aparelhos fabricados em lugares distantes e que chegam em barcos que contaminam de novo. “Cedo ou tarde, isso vai acabar”, diz Durand.

Essa é uma das reflexões de uma proposta que foi batizada como “economia circular” e que ganha força nos fóruns europeus e globais. A ideia é simples: ao fabricar um bem, devemos levar em conta o resíduo que ele vai gerar para que este seja reutilizável, se possível totalmente. Desse modo, em vez de seguir o paradigma da economia linear (produzo, utilizo, jogo fora), passaríamos ao “produzo, utilizo, reutilizo”. E, se possível, conserto.

Legislar nesse sentido, portanto, significaria fazer com que as marcas aumentem os prazos de garantia; incentivar a possibilidade de reparação dos produtos em qualquer loja, não só nos serviços autorizados; que as marcas projetem artefatos que permitam a extração de peças, componentes, baterias; reduzir impostos às marcas que adotem essas medidas e aos artesãos que a elas se dediquem; perseguir e multar a obsolescência programada intencional; revelar a OP informática. A iniciativa apresentada no Parlamento Europeu vai nessa linha. A Comissão deverá dar uma resposta legislativa antes de julho de 2018.

Enquanto isso, países como a Finlândia arregaçam as mangas. O país escandinavo já conta com um plano para fazer a transição rumo à economia circular. Florescem as start-ups que procuram soluções para os resíduos que geramos, enquanto fundos são destinados para a pesquisa.

A Universidade Aalto integra um projeto de colaboração transversal que recebeu cinco milhões de euros (18,5 milhões de reais) para começar a caminhar. Mari Lundström, professora de hidrometalurgia e corrosão, lidera um programa que busca soluções para a reciclagem de metais. Em entrevista pelo telefone de Estocolmo, ela explica que os celulares, os fios elétricos e os computadores que jogamos no lixo estão repletos de materiais úteis e valiosos. Alguns inclusive são difíceis de encontrar no subsolo europeu; e, no entanto, jogamos tudo isso fora. Desperdiçamos níquel, cobalto, lítio... Muitos deles são facilmente recuperáveis através de tratamentos químicos, por exemplo. Um único telefone contém até 40 elementos recicláveis, dos quais só reutilizamos 10, explica Lundström. Doze empresas finlandesas que usam metais já trabalham com o fruto das pesquisas científicas.

Podemos reciclar o metal da lata de refrigerante. Mas precisamos de 20 vezes mais energia para recuperá-lo se essa lata foi queimada num saco com lixo orgânico, explica a cientista finlandesa. Este é um dos resultados das pesquisas do programa. Pode-se deduzir, portanto, que a economia circular deve ser promovida pelos Governos, pesquisada pelos docentes e assumida pelas empresas. Ok, mas também precisa dos cidadãos.
A chave da economia circular é o que cada pessoa fizer”, diz Lundström, de forma categórica. “Não podemos continuar vivendo como fizemos até agora. É necessária uma resposta da sociedade: somos responsáveis por nossa forma de consumir.”
Mas a economia circular também tem seus críticos. Alguns consideram que se trata de uma mera prolongação da ideia de crescimento sustentável, que, apesar de bem intencionada, não levou a grandes realizações. O problema, explicam, é o crescimento. É a lógica que nos empurra a seguir espremendo o planeta, cujos recursos são finitos.

A solução não é fácil, e romper com décadas de inércia levará um tempo. Há várias perguntas no ar. Num contexto de contínuo avanço tecnológico, será mesmo tão difícil melhorar a durabilidade dos produtos? Faz sentido continuar vivendo do mesmo jeito, conhecendo a toxicidade dos resíduos gerados por nosso modo de consumo? E os Governos não têm pensado em fazer nada a respeito?

Fonte: El País, por Joseba Elola


CONSUMIDORES SE MOBILIZAM NA FRANÇA

A França é a país com a legislação mais dura da Europa na luta contra a obsolescência programada, aprovada em 2015. As marcas que realizam a prática podem pagar multas de até 300.000 euros (1,1 bilhão de reais).

A denúncia da associação HOP apresentada em setembro, a primeira do gênero, acusou marcas como HP, Canon e Brother de práticas voltadas a reduzir deliberadamente a vida útil de impressoras e cartuchos; e destacava, em particular, o caso da Epson.

Este jornal solicitou entrevista com um diretor da Epson na Espanha, mas o pedido foi negado. Um porta-voz somente escreveu esta resposta por e-mail: “A Epson conhece a denúncia da associação HOP na França e trabalhará com as autoridades competentes para responder de maneira adequada e resolver o caso.” E acrescentou: “Rechaçamos totalmente a afirmação de que nossos produtos estão programados para estragar num período de tempo predeterminado.”



terça-feira, 4 de junho de 2019

Acusado de estupro, Neymar tenta desacreditar a denunciante em rede social



Míriam Martinho


Ao expor mensagens e imagens íntimas da mulher com quem se relacionou, no Instagram, à guisa de se defender da acusação de estupro, Neymar Jr., chamado de menino, embora seja homem feito, tornou-se mais suspeito do que antes.

Longe de mim afirmar que mulheres não possam ser desonestas, levantar falsos testemunhos, injuriar, difamar e caluniar. Mulheres também podem ser bem escrotas. Aliás, a pessoa mais escrota que conheci na vida é uma mulher. A figura é tão mau-caráter que parece vilã de história em quadrinhos. 

Então, que ninguém me venha dizer que meu posicionamento, sobre esse caso do Neymar, é corporativismo de sexo. Sim, eu acredito em presunção de inocência e tudo, daí não sair rapidinho crucificando seja quem for.

Neymar Jr.
Por conseguinte, indo aos fatos, não resta dúvida de que a moça foi se relacionar com o Neymar de livre e espontânea vontade. O que não se sabe é o que de fato rolou lá entre as 4 paredes do quarto de  hotel. Porque, se no meio da interação entre os dois, ele começou a agredi-la, a ponto de deixá-la com vários hematomas, segundo laudo divulgado pela imprensa, no mínimo há de se reconhecer que a moça pode estar dizendo a verdade em sua acusação. Porque uma coisa é você ir se relacionar com alguém; outra é esse alguém virar Mr. Hyde no meio da transa e começar a lhe fazer de gato e sapato (com perdão da expressão pouco ecológica). Se rolou o que não estava previamente acordado, principalmente havendo violência, dá pra falar em estupro sim.

O caso do Cristiano Ronaldo foi parecido. Foi com uma mulher para um hotel, chegando lá resolveu sodomizá-la, embora ela pedisse para ele parar. Ela foi à Justiça, e eles chegaram a um acordo de indenização financeira, como agora estão dizendo que aconteceu entre os advogados do Neymar e da moça. Daí pra frente, as notícias ficam meio nebulosas quanto ao "como" a história voltou à tona, se o vazamento do processo foi obra de um hacker ou da própria modelo (li diferentes versões do causo). O fato é que, nesse vazamento, ficou-se sabendo que CR7 reconheceu ter estuprado a moça.

Fazendo um aparte, no caso da tentativa de indenização requerida pela amante de Neymar, por danos morais, os agora ex-advogados da moça, lançaram nota afirmando que houve má fé dos advogados do jogador quando se encontraram:
... se ressalta o absurdo de uma reunião entre advogados ser referida, de maneira torpe, como tentativa de extorsão, ainda mais quando essa reunião só se realizou dado o convite feito pelos representantes de Neymar Júnior. Isso só demonstra que os representantes de Neymar Júnior, sabendo dos fatos, orquestraram uma armadilha com o objetivo de criar um álibi para o seu protegido, em prejuízo da vítima e de seus antigos patronos (ver a íntegra da nota aqui)
Então, o fato de alguém ter ido transar com alguém de livre e espontânea vontade não significa que esteja de acordo com tudo que possa rolar na transa. Se a pessoa for forçada a fazer algo que não quer, se for agredida, dá para caracterizar como estupro sim, mesmo que seja entre gente legalmente casada.


Por fim, recentemente (fim de abril) o Neymar meteu um soco num torcedor que o provocou ao fim do jogo em que o Paris Saint German perdeu a Copa da França (vídeo acima). Agora, é acusado de, no mínimo, ter batido em uma mulher, cujas fotos e conversas íntimas expôs em redes sociais. Ainda que o ato não seja considerado crime, porque as imagens estavam desfocadas, lugar de apresentar provas de defesa não é em rede social. Santo é que seu Neymar não é.

Conclusão, se não se pode afirmar de antemão que Neymar seja culpado de estupro, também não se pode afirmar que a moça esteja mentindo só pra lhe extorquir dinheiro. O histórico de esquentadinho do jogador e a forma como resolveu se defender das acusações da moça, em rede social, o tornam sim bastante suspeito. Como disse a antropóloga Debora Diniz, em texto da Marie Claire
Não sabemos a verdade do estupro, mas sabemos a crueldade com que Neymar expôs a intimidade vivida com esta mulher e com que a lançou à cena da pornografia global no intuito de atiçar o voyeurismo sexual. Como uma isca ao machismo latente, a adesão foi rápida: o papel do menino pobre foi colorido com a ingenuidade erótica comum aos homens quando se veem seduzidos por mulheres bonitas. Neymar seria só mais um “menino” que caiu nas artimanhas do sexo, e como prova, dizem os julgadores virtuais, basta ver as imagens enviadas pela mulher. O contraponto do “menino ingênuo” de 27 anos é a mulher interesseira ou prostituta. O enredo da defesa parece perfeito para silenciá-la: ela é duplamente culpada – pelo sexo indevido e pela exposição da intimidade de um menino.

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