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quinta-feira, 14 de maio de 2020

Patrícia Medici e Gabriela Cabral Rezende receberam o Whitley Awards, o “Oscar Verde” da conservação ambiental

prêmio cientistas brasileiras
Patrícia Medici e Gabriela Cabral Rezende dedicam a vida à fauna brasileira
 e receberam o Whitley Awards, o “Oscar Verde” mundial
Dois projetos idealizados por pesquisadoras brasileiras foram vencedores do maior prêmio de conservação ambiental do mundo, o "Fundo Whitley para a Natureza", chamado de “Oscar Verde”. Na manhã desta quarta-feira (29) Gabriela Rezende recebeu a notícia da vitória que a beneficia com cerca de R$ 260 mil (40 mil libras esterlinas) para auxiliar o financiamento de seus projetos envolvendo o mico-leão-preto.

Além das iniciativas inscritas, o Fundo ainda garante o principal prêmio da edição a um projeto que já tenha sido vencedor anteriormente e continue merecendo destaque na biodiversidade. Foi nesta categoria que consagrou Patrícia Medici com seu trabalho sobre a conservação de antas no Brasil, recebendo cerca de R$ 400 mil (60 libras esterlinas).

Gabriela Rezende preserva os micos-leões-pretos da Mata Atlântica
Gabriela Rezende estava entre os quinze finalistas do "Fundo Whitley para a Natureza", um dos mais prestigiados prêmios referentes à conservação no mundo, popularmente chamado de “Oscar Verde”. Premiado, o projeto trata da conexão dos fragmentos florestais da paisagem do Pontal do Paranapanema para garantir a reintrodução de micos-leões-pretos em áreas onde ainda não estão presentes.

Implantando o projeto, os corredores ecológicos estabelecerão uma área contínua de mais de 45.000 hectares de Mata Atlântica para micos-leões-pretos, aumentando a população na região e reduzindo a zero o risco de extinção das pequenas populações, já que estarão todas conectadas.
Além do reconhecimento e de toda a visibilidade que o prêmio trás, ele vem com um apoio financeiro que vai ajudar muito a dar os próximos passos para a conservação da espécie. Com esse recurso vamos focar nas atividades de manejo das populações, movimentar grupos de micos-leões-pretos para as áreas que estão sendo conectadas, justamente para garantir que eles ocupem essas áreas restauradas e que isso possibilite o crescimento da população”, explica.
O prêmio conferido usualmente é entregue em uma celebração oficial em Londres, dinâmica que foi modificada em função da pandemia do novo coronavírus. Quanto ao adiamento da cerimônia, Gabriela garante que a comemoração será ainda maior.
Vai ser muito emocionante viver tudo isso no dia da cerimônia, que foi postergada. Trazer notícias boas de conservação da biodiversidade em um momento tão complicado que o mundo está passando é muito especial”, completa.
Também faremos mais plantios de árvores e corredores para alcançar o nosso objetivo final de estabelecer essa grande área contínua e reconectar as populações de mico. Também não podemos deixar de lado as ações de educação ambiental e envolvimento comunitário, que são cruciais para garantirmos a sustentabilidade de tudo que a gente faz”, completa.
O prêmio conferido usualmente é entregue em uma celebração oficial em Londres, dinâmica que foi modificada em função da pandemia do novo coronavírus. Quanto ao adiamento da cerimônia, Gabriela garante que a comemoração será ainda maior.
Vai ser muito emocionante viver tudo isso no dia da cerimônia, que foi postergada. Trazer notícias boas de conservação da biodiversidade em um momento tão complicado que o mundo está passando é muito especial”, completa. 
Patrícia defende a causa da conservação da anta brasileira
Há 24 anos, a bióloga Patrícia Medici, cofundadora da ONG brasileira Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ), começou a desvendar os mistérios que envolviam as antas na Mata Atlântica, mais especificamente no Parque Estadual Morro do Diabo (SP). Se a perda de habitat, a caça e o aumento da urbanização eram ameaças para esse mamífero, o projeto utilizou a tecnologia de GPS, armadilhas fotográficas, a restauração de corredores florestais e até a atividade de educação ambiental como ferramentas da conservação da espécie.
Eu comecei a pensar em expandir para diferentes partes do Brasil esse projeto. Além da Mata Atlântica, em áreas que sabíamos da ocorrência desse animal como o Pantanal, o Cerrado e a Amazônia”, explica Patrícia.
E foi com a ideia de expansão das ações para o Pantanal que o projeto conquistou seu primeiro prêmio no Fundo Whitley, em 2008.
Houve uma reação do tipo: ‘é um projeto sobre antas mesmo que ganhou um prêmio?’ (risos). Isso gerou na gente uma necessidade de falar mais com o público sobre o animal”, relembra a pesquisadora.
Ampliar os conhecimentos, produzir o maior banco de dados sobre o animal e estudar o atropelamento da espécie nas estradas foram conquistas que permitiram que o fundo mantivesse o suporte para os diferentes passos do projeto.
Recebemos auxílio para dar continuidade às ações no Cerrado e agora este prêmio para a Amazônia”, vibra Patrícia.
Em 7 anos, no Mato Grosso do Sul, monitoramos 35 rodovias e detectamos mais 600 carcaças de antas por atropelamentos que ocasionaram a morte de mais de 30 pessoas. É, de longe, o problema mais sério para conservação e um risco para o tráfego nessas rodovias”
O dinheiro recebido pelo prêmio, agora, será dividido entre a expansão do projeto para a Amazônia e um retorno ao local de nascimento da iniciativa para avaliar a população dez anos após a pesquisa original. O valor recebido deve também ajudar a conter ameaças, criar planos a favor das antas e reforçar estratégias que reduzam o atropelamento desses animais em estradas, como cercamentos, radares e passagens de fauna.

A equipe coordenada por Patrícia é composta por cinco pessoas fixas, um trainee de algum país que possua o animal para obter conhecimentos e treinamentos sobre ele e mais sete colaboradores de diversas áreas que analisam, por exemplo, a contaminação de antas por agrotóxicos.

O prêmio "Whitley Fund for Nature " foi fundado na Inglaterra e completa 27 anos em 2020. Nessa trajetória já beneficiou mais de 200 projetos em 80 países com um financiamento que supera 16 milhões de libras, um valor que se aproxima dos 90 milhões de reais. Desde a origem da iniciativa, sete brasileiros já foram premiados (Patrícia Medici, por exemplo, havia vencido em 2008).

O dinheiro para auxiliar os projetos provém de doações de grandes instituições e fundações que vão desde o WWF até a Fundação Leonardo DiCaprio, por exemplo. Também foram premiados na edição deste ano projetos do Quênia, Butão, Nigéria, Indonésia e África do Sul, que envolviam assuntos como chimpanzés, antílopes e anfíbios.

Clipping Conheça as brasileiras vencedoras do maior prêmio de conservação ambiental do mundo, por Gabriela Brumatti e Giulia Bucheroni, Terra da Gente, G1 Campinas, 29/04/2020

terça-feira, 3 de setembro de 2019

Futuro Burger, hambúrguer que parece de carne, mas só tem vegetal

Não adianta chorar pelas queimadas na Amazônia, feitas para criar pastos para os chamados animais de corte, se você permanece sendo a rainha ou rei do grill. Nada destrói mais a natureza do que a pecuária, a indústria do matadouro. Comece a substituir a carne animal pelas chamadas carnes vegetais, cada vez mais feitas sob medida para mudar, nos corações e bocas, o ruinoso hábito de comer animais.+
Embarque, desde já, nessa tendência internacional, já presente no Brasil, experimentando, por exemplo, o Futuro Burguer.

Empresa brasileira quer conquistar carnívoros com hambúrguer vegano que promete sabor e textura de carne bovina

Quando se fala em hambúrguer vegano, a primeira reação de quem come carne geralmente é torcer o nariz com argumentos do tipo “não é a mesma coisa”. Pois acaba de chegar aos supermercados um produto feito exclusivamente de vegetais e que promete surpreender o paladar dos carnívoros.

Trata-se do Futuro Burger, primeiro lançamento da startup Fazenda Futuro, que se dedica a criar “carne” à base de plantas. Com aparência e textura e muito semelhantes à versão bovina, a novidade já está disponível em algumas lanchonetes de São Paulo e do Rio de Janeiro, e agora chegou a supermercados paulistas, cariocas e mineiros.

A ideia não é conquistar veganos e vegetarianos.
Estamos entrando no mercado de carnes. Queremos falar com quem procura uma alternativa saudável e sustentável sem deixar de lado o prazer em comer algo de que gosta”, explica Marcos Leta, fundador da Fazenda Futuro.
Para chegar no visual e sabor adequados, foram dois anos de testes. A receita final leva proteínas isoladas da soja, da ervilha e do grão-de-bico, além de beterraba para imitar a cor rosada e os sucos da carne. O produto não usa ingredientes transgênicos, tem menos gorduras saturadas do que a versão tradicional e contém fibras, por conta dos vegetais.

Onde encontrar

O Futuro Burger começou a ser vendido nas lojas do Carrefour, Pão de Açúcar, St. Marche e Quitanda, em São Paulo; La Fruteria e Zona Sul, no Rio de Janeiro; e Verdemar, em Minas Gerais.

Também é possível provar a novidade nas hamburguerias T.T. Burguer, na capital fluminense, e Lanchonete da Cidade, em São Paulo.

A meta da empresa é expandir a distribuição do hambúrguer nos próximos meses. No segundo semestre, uma versão de almôndega à base de plantas desenvolvida pela empresa deve chegar ao Spoleto, rede nacional de massas.

Tendência internacional

Buscar alternativas para driblar o consumo excessivo de carne é uma tendência que veio para ficar.
 “No Brasil, o número de gado é superior ao número de pessoas, e somos um dos países mais afetados pela agropecuária quando se trata de meio ambiente”, comenta Leta. “Este impacto ambiental faz com que as pessoas optem cada vez mais por mudanças na alimentação”, continua o empresário.
Lá fora essa movimentação é nítida. A marca Beyond Meat, de “carnes” à base de plantas, por exemplo, abriu seu capital neste mês nos Estados Unidos com alta de 163% em seu primeiro dia na bolsa de valores, chegando a um valor de mercado de 3,8 bilhões de dólares. Bill Gates e Leonardo Di Caprio, dois célebres entusiastas da causa do meio ambiente, investem na marca.

A Impossible Foods, nascida no ambiente tecnológico do Vale do Silício, abastece mais de 3 mil restaurantes norte-americanos com 226 toneladas de carnes vegetais todos os meses.

Elas, assim como a Fazenda Futuro, são consideradas foodtechs, ou seja, empresas que usam a tecnologia para criar novos produtos alimentícios.
O hambúrguer vegetal tupiniquim está sendo anunciado como a versão “1.0”. A 2.0 está sendo desenvolvida pela empresa atualmente e promete ser ainda mais parecida com a proteína animal.
Perfil nutricional

Veja o que encontramos em uma unidade (115 gramas) do Futuro Burger disponível hoje:

Calorias: 283 kcal
Proteínas: 15,8 g
Carboidratos: 14,3 g
Gorduras totais: 18,6 g
Gorduras saturadas: 6 g
Fibras: 4 g
Sódio: 684 mg

Clipping Conheça o Futuro Burger, que parece de carne, mas só tem vegetal, por Chloé Pinheiro, 24/06/2019, Saúde

quinta-feira, 6 de junho de 2019

Obsolescência programada: aparelhos projetados para quebrar em pouco tempo

Lixão de Agbogbloshie em Accra (Gana), aonde vão parar os resíduos da Europa e dos Estados Unidos ( EFE)
Programado para estragar

Projetar aparelhos com defeitos e peças pouco duráveis para que o consumidor tenha de comprar novamente. É a obsolescência programada, uma prática que nos leva a um beco sem saída

A frase foi publicada em 1928 na Printer’s Ink, revista do setor publicitário norte-americano:
Um artigo que não estraga é uma tragédia para os negócios.” Para que vender menos se você pode vender mais projetando produtos com um defeito incorporado? Por que não abandonar esse afã romântico de fabricar produtos bem feitos, consistentes, duradouros, e ser logo prático? Não será melhor para o business fazer com que o cliente tenha de abrir a carteira mais vezes?
Essa é história de uma ideia que ganhou força como salvação dinamizadora nos anos da Grande Depressão, transformou-se num mantra da sociedade de consumo – comprar, usar, jogar fora, voltar a comprar – e se tornou, já na atualidade, uma séria ameaça ao meio ambiente. É uma história escrita aos poucos, capítulo por capítulo. O último e mais importante deles é o destaque que a questão ganhou nos debates da Europa, sinal de que existe uma crescente conscientização: em 4 de julho, o Parlamento Europeu aprovou (por 622 votos a favor e 32 contra) o Relatório sobre Produtos com Uma Vida Útil Mais Longa: Vantagens para os Consumidores e as Empresas, pedindo que a Comissão Europeia adote medidas.

Não só isso. A França, país com a legislação mais dura da Europa contra a obsolescência programada, acaba de registrar a primeira denúncia de um coletivo de consumidores contra os fabricantes de impressoras. O fato ocorreu em 18 de setembro: a associação Halte à l' Obsolescence Programmée (HOP, Contra a Obsolescência Programada) acusou marcas como Epson, HP, Canon e Brother de práticas destinadas a reduzir deliberadamente a vida útil de impressoras e cartuchos.

O truque não é novo. Começou a ser usado no final do século XIX na indústria têxtil (quando os fabricantes começaram a utilizar mais amido e menos algodão) e se consolidou em 1924, quando General Electric, Osram e Phillips se reuniram na Suíça e decidiram limitar a vida útil das lâmpadas a 1.000 horas, tal como aponta o festejado documentário espanhol Comprar, Tirar, Comprar (“comprar, jogar fora, comprar”), de Cosima Dannoritzer. E assim foi assinado o atestado de óbito da durabilidade.

Até então, as lâmpadas duravam mais. Como a que brilha ininterruptamente desde 1901 na central dos Bombeiros de Livermore, na Califórnia. De filamento grosso e intensidade menor que a de suas sucessoras (o que impede o alto aquecimento), essa lâmpada foi concebida para perdurar. E continua lá, brilhando, mostrando que a obsolescência programada está longe de ser um mito.

Desde a sensação causada nos anos trinta pelas meias de náilon Du Pont, que não rasgavam, até o telefone inteligente que fica burro sem razão aparente – e só um ano e meio depois de ser adquirido –, muita água passou debaixo da ponte. A obsolescência programada (OP) foi aprimorada. E a intenção de fraude por parte do fabricante não é algo fácil de demonstrar.
Hoje, os investimentos em pesquisa e desenvolvimento são para ver como reduzir a durabilidade dos aparelhos, mais do que para melhorá-los ao consumidor”. Quem se expressa de forma tão contundente é Benito Muros, um ex-piloto de 56 anos que há anos denuncia a OP. Presidente da Fundação Energia e Inovação Sustentável Sem Obsolescência Programada (Feniss), ele afirma que a OP está presente em todos os dispositivos eletrônicos que compramos, “até mesmo nos carros”.
Os consumidores franceses realizaram a primeira denúncia contra várias marcas de impressoras

Muros lidera uma empresa que desenvolve lâmpadas, semáforos e projetos de iluminação pública para Prefeituras da Espanha, conta que hoje é possível observar muitas formas de OP no mercado: dispositivos com carcaças que não permitem a dissipação do calor, e cujo aquecimento gera falhas prematuras; componentes como os condensadores eletrolíticos, cujas dimensões determinarão a vida do produto (perdem líquido com as horas de uso; quanto menor for a capacidade de armazenamento de líquido eletrolítico, menos vai durar); baterias que não podem ser retiradas (como foi o caso do iPhone) e que obrigam o usuário a comprar um novo aparelho; chips que agem como contadores e que estão programados para que o sistema pare de funcionar após certo número de utilizações, como ocorreu com algumas impressoras (o consumidor que ousar tentar consertar uma logo escutará que é mais barato comprar outra).

Muros, que diz ser alvo de campanhas de difamação na imprensa por se opor à OP – e que fabricou uma lâmpada que foi objeto de controvérsia, – afirma inclusive que atualizações enviadas para os nossos smartphones escondem uma mudança de software que os torna mais lentos.

A lâmpada acesa mais antiga do mundo, numa central dos Bombeiros de Livermore, na Califórnia 
Eles te enviam uma espécie de vírus que serve para preparar o telefone para o seu final”, diz. Outro aparelho jogado no lixo, e outro resíduo eletrônico que, mais cedo ou mais tarde, vai parar nos tóxicos (e sinistros) lixões que o mundo rico alimenta em lugares remotos, como a África.
Cerca de 215.000 toneladas de aparelhos eletrônicos, procedentes sobretudo dos Estados Unidos e da Europa, desembarcam todo ano em Gana, segundo a Motherboard, uma plataforma multimídia de longa trajetória sobre trabalhos de pesquisa. Acabam gerando 129.000 toneladas de resíduos em lugares como Agbogbloshie, um dos maiores lixões tecnológicos do mundo, situado em Accra, a capital do país.
Somos os responsáveis pelo nosso consumo. Não podemos seguir assim”, diz a cientista Mari Lundström
A indústria de tecnologia produz, sozinha, 41 milhões de toneladas de resíduos eletrônicos por ano, segundo uma pesquisa do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). Entre 60% e 90% desses produtos caem nas mãos de quadrilhas, que os descarregam ou comercializam ilegalmente. Além de Gana, países como Índia e Paquistão são importantes destinos de televisores, celulares e aparelhos de som descartados com a chegada das liquidações, porque não somos bobos, e porque uma semana de preços supostamente loucos é uma oportunidade que não se pode desperdiçar. Tudo pelo último modelo.

Ainda assim, a prática tem os seus defensores. Eles dizem que uma obsolescência programada controlada, sem abusos excessivos, é a fórmula para que o mundo continue funcionando como até agora. E uma fonte de criação de emprego.

Além disso, o avanço tecnológico traz soluções mais ecológicas e eficientes, como poderia ser o caso dos carros elétricos. Portanto, a OP poderia ter sentido, argumentam seus partidários.

O debate está aberto. E dele também participam aqueles que dizem que esse negócio de obsolescência programada é uma teoria da conspiração. Basta um passeio pelo Twitter para ver mais argumentos. Uns dizem que o verdadeiro problema não são as marcas, mas os consumidores: queremos produtos baratos para usar e jogar fora, e não estamos dispostos a pagar o que custariam se realmente fossem de qualidade (e, portanto, mais caros).

Nessa mesma linha se manifesta o diretor geral da Associação Nacional de Fabricantes de Eletrodomésticos (Anfel), da Espanha, que reúne as marcas de linha branca (geladeiras, lava-roupa, lava-louça, etc). Este jornal tentou realizar uma entrevista com algum diretor da Anfel, que só aceitou responder às perguntas por e-mail. Após afirmar que não há dados embasando a ideia de que os eletrodomésticos duravam mais em meados do século passado do que agora, e de qualificar a prática da OP como “deplorável”, Alberto Zapatero, diretor geral da Anfel, escreve: “Devemos levar em conta que os consumidores não só jogam fora os produtos que deixaram de funcionar, mas também o fazem por outros motivos, por exemplo quando um aparelho deixa de cumprir com suas expectativas por razões técnicas, regulatórias ou econômicas (caso de televisores não aptos para a transmissão digital), além do desejo dos consumidores de adquirir um novo modelo por questões de mudanças de funcionalidade, design e serviços.”

Não bastasse o consumismo desenfreado dos cidadãos ocidentais, existe também a contemporânea impossibilidade de consertar. E os dados indicam que o consumidor estaria disposto a reparar os produtos, se pudesse: 77% dos europeus prefeririam o conserto a uma nova compra, segundo o Eurobarômetro de 2014.
A sociedade dos resíduos não pode seguir assim. Estamos perante um modelo econômico superado”, afirma de Bruxela, por telefone, Pascal Durand, deputado verde europeu que liderou a iniciativa apresentada pelo Parlamento Europeu no final de julho.
A cifra de consumidores de produtos de tecnologia aumenta a cada ano. Novas classes médias de países como China e Índia se incorporam ao padrão de compra dos países mais desenvolvidos. Mais celulares, mais computadores, mais eletrodomésticos. Primeiro para o carrinho de compras, depois para o lixo. E mais extração de metais para produzi-los. Matérias-primas que não são ilimitadas.

Ao mesmo tempo, quanto mais curta é a vida dos dispositivos que compramos (veja os celulares, cuja expectativa de vida oscila entre um e dois anos, segundo os estudos europeus), maior é o volume de resíduos gerados.

Jogar fora aparelhos novos que poderiam ser consertados na Europa, enviando-os a lixões distantes em barcos que contaminam águas, para, ao mesmo tempo, comprar aparelhos fabricados em lugares distantes e que chegam em barcos que contaminam de novo. “Cedo ou tarde, isso vai acabar”, diz Durand.

Essa é uma das reflexões de uma proposta que foi batizada como “economia circular” e que ganha força nos fóruns europeus e globais. A ideia é simples: ao fabricar um bem, devemos levar em conta o resíduo que ele vai gerar para que este seja reutilizável, se possível totalmente. Desse modo, em vez de seguir o paradigma da economia linear (produzo, utilizo, jogo fora), passaríamos ao “produzo, utilizo, reutilizo”. E, se possível, conserto.

Legislar nesse sentido, portanto, significaria fazer com que as marcas aumentem os prazos de garantia; incentivar a possibilidade de reparação dos produtos em qualquer loja, não só nos serviços autorizados; que as marcas projetem artefatos que permitam a extração de peças, componentes, baterias; reduzir impostos às marcas que adotem essas medidas e aos artesãos que a elas se dediquem; perseguir e multar a obsolescência programada intencional; revelar a OP informática. A iniciativa apresentada no Parlamento Europeu vai nessa linha. A Comissão deverá dar uma resposta legislativa antes de julho de 2018.

Enquanto isso, países como a Finlândia arregaçam as mangas. O país escandinavo já conta com um plano para fazer a transição rumo à economia circular. Florescem as start-ups que procuram soluções para os resíduos que geramos, enquanto fundos são destinados para a pesquisa.

A Universidade Aalto integra um projeto de colaboração transversal que recebeu cinco milhões de euros (18,5 milhões de reais) para começar a caminhar. Mari Lundström, professora de hidrometalurgia e corrosão, lidera um programa que busca soluções para a reciclagem de metais. Em entrevista pelo telefone de Estocolmo, ela explica que os celulares, os fios elétricos e os computadores que jogamos no lixo estão repletos de materiais úteis e valiosos. Alguns inclusive são difíceis de encontrar no subsolo europeu; e, no entanto, jogamos tudo isso fora. Desperdiçamos níquel, cobalto, lítio... Muitos deles são facilmente recuperáveis através de tratamentos químicos, por exemplo. Um único telefone contém até 40 elementos recicláveis, dos quais só reutilizamos 10, explica Lundström. Doze empresas finlandesas que usam metais já trabalham com o fruto das pesquisas científicas.

Podemos reciclar o metal da lata de refrigerante. Mas precisamos de 20 vezes mais energia para recuperá-lo se essa lata foi queimada num saco com lixo orgânico, explica a cientista finlandesa. Este é um dos resultados das pesquisas do programa. Pode-se deduzir, portanto, que a economia circular deve ser promovida pelos Governos, pesquisada pelos docentes e assumida pelas empresas. Ok, mas também precisa dos cidadãos.
A chave da economia circular é o que cada pessoa fizer”, diz Lundström, de forma categórica. “Não podemos continuar vivendo como fizemos até agora. É necessária uma resposta da sociedade: somos responsáveis por nossa forma de consumir.”
Mas a economia circular também tem seus críticos. Alguns consideram que se trata de uma mera prolongação da ideia de crescimento sustentável, que, apesar de bem intencionada, não levou a grandes realizações. O problema, explicam, é o crescimento. É a lógica que nos empurra a seguir espremendo o planeta, cujos recursos são finitos.

A solução não é fácil, e romper com décadas de inércia levará um tempo. Há várias perguntas no ar. Num contexto de contínuo avanço tecnológico, será mesmo tão difícil melhorar a durabilidade dos produtos? Faz sentido continuar vivendo do mesmo jeito, conhecendo a toxicidade dos resíduos gerados por nosso modo de consumo? E os Governos não têm pensado em fazer nada a respeito?

Fonte: El País, por Joseba Elola


CONSUMIDORES SE MOBILIZAM NA FRANÇA

A França é a país com a legislação mais dura da Europa na luta contra a obsolescência programada, aprovada em 2015. As marcas que realizam a prática podem pagar multas de até 300.000 euros (1,1 bilhão de reais).

A denúncia da associação HOP apresentada em setembro, a primeira do gênero, acusou marcas como HP, Canon e Brother de práticas voltadas a reduzir deliberadamente a vida útil de impressoras e cartuchos; e destacava, em particular, o caso da Epson.

Este jornal solicitou entrevista com um diretor da Epson na Espanha, mas o pedido foi negado. Um porta-voz somente escreveu esta resposta por e-mail: “A Epson conhece a denúncia da associação HOP na França e trabalhará com as autoridades competentes para responder de maneira adequada e resolver o caso.” E acrescentou: “Rechaçamos totalmente a afirmação de que nossos produtos estão programados para estragar num período de tempo predeterminado.”



sexta-feira, 22 de setembro de 2017

Bem-vinda Primavera!


Para homenagear a mais bela das estações, com suas flores e cores esplendorosas, quando tudo se renova, inclusive a gente, um texto de nossa grande poetisa Cecília Meireles e dois vídeos que já constam deste blog mas que repito nesta postagem porque também são como e para a primavera! 

Primavera
Cecília Meireles

A primavera chegará, mesmo que ninguém mais saiba seu nome, nem acredite no calendário, nem possua jardim para recebê-la. A inclinação do sol vai marcando outras sombras; e os habitantes da mata, essas criaturas naturais que ainda circulam pelo ar e pelo chão, começam a preparar sua vida para a primavera que chega.

Finos clarins que não ouvimos devem soar por dentro da terra, nesse mundo confidencial das raízes, — e arautos sutis acordarão as cores e os perfumes e a alegria de nascer, no espírito das flores.

Há bosques de rododendros que eram verdes e já estão todos cor-de-rosa, como os palácios de Jeipur. Vozes novas de passarinhos começam a ensaiar as árias tradicionais de sua nação. Pequenas borboletas brancas e amarelas apressam-se pelos ares, — e certamente conversam: mas tão baixinho que não se entende.

Oh! Primaveras distantes, depois do branco e deserto inverno, quando as amendoeiras inauguram suas flores, alegremente, e todos os olhos procuram pelo céu o primeiro raio de sol.

Esta é uma primavera diferente, com as matas intactas, as árvores cobertas de folhas, — e só os poetas, entre os humanos, sabem que uma Deusa chega, coroada de flores, com vestidos bordados de flores, com os braços carregados de flores, e vem dançar neste mundo cálido, de incessante luz.

Mas é certo que a primavera chega. É certo que a vida não se esquece, e a terra maternalmente se enfeita para as festas da sua perpetuação.

Algum dia, talvez, nada mais vai ser assim. Algum dia, talvez, os homens terão a primavera que desejarem, no momento que quiserem, independentes deste ritmo, desta ordem, deste movimento do céu. E os pássaros serão outros, com outros cantos e outros hábitos, — e os ouvidos que por acaso os ouvirem não terão nada mais com tudo aquilo que, outrora se entendeu e amou.

Enquanto há primavera, esta primavera natural, prestemos atenção ao sussurro dos passarinhos novos, que dão beijinhos para o ar azul. Escutemos estas vozes que andam nas árvores, caminhemos por estas estradas que ainda conservam seus sentimentos antigos: lentamente estão sendo tecidos os manacás roxos e brancos; e a eufórbia se vai tornando pulquérrima, em cada coroa vermelha que desdobra. Os casulos brancos das gardênias ainda estão sendo enrolados em redor do perfume. E flores agrestes acordam com suas roupas de chita multicor.

Tudo isto para brilhar um instante, apenas, para ser lançado ao vento, — por fidelidade à obscura semente, ao que vem, na rotação da eternidade. Saudemos a primavera, dona da vida — e efêmera.

Texto extraído do livro "Cecília Meireles - Obra em Prosa - Volume 1", Editora Nova Fronteira - Rio de Janeiro, 1998, pág. 366.


Publicado originalmente em 22/09/2012

quinta-feira, 23 de março de 2017

Empresa Memphis Meats, do Vale do Silício, produz carnes sem matar animais

Empresa produz carne vermelha e de frango sem matar animais 

A Memphis Meats, do Vale do Silício, anunciou na semana passada a criação bem-sucedida de filés de frango e de pato cultivados em laboratório, feitos com DNA dos animais, mas sem abater nenhum. Os produtos são feitos a partir de amostras de célula que se multiplicam quimicamente e formam filés quase idênticos aos que já conhecemos.

Os filés de aves vêm um ano depois do lançamento das almôndegas produzidas em laboratório pela mesma companhia, que promete revolucionar a indústria alimentícia produzindo carne “de verdade” sem crueldade.
É emocionante induzir os primeiros frangos e patos que não precisaram da criação de animais. Este é um momento histórico para o movimento da carne limpa”, disse, em comunicado, Uma Valeti, CEO da Memphis Meat. 
Nós realmente acreditamos que esse é um momento significativo para a humanidade, e uma oportunidade de negócio incrível – de transformar uma indústria global gigante enquanto contribuímos para resolver um dos problemas de sustentabilidade mais urgentes do nosso tempo”, continua.
Embora já estejam prontos, os produtos devem ser lançados aos consumidores apenas em 2021, quando a companhia espera ter reduzido os custos o suficiente para que seja viável a venda dos mesmos pelos valores das carnes no mercado. Atualmente, produzir 500 g de carne em laboratório custa cerca de US$ 9 mil.

Confira, abaixo, o vídeo de divulgação da companhia, e clique aqui para mais fotos dos pratos feitos com os produtos:


Fonte: Infomoney, 20/03/2017

segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

O Brasil precisa depor Dilma, entre outras razões, por uma questão de sobrevivência



Fernando Gabeira provando que ainda existe vida inteligente à esquerda. Destaco:

Quase todos concordam com a gravidade da crise, nunca antes neste país o governo errou tanto, corrompeu tão disciplinadamente a vida política, corroeu tanto os alicerces da jovem democracia, engrandecida com a luta pelas diretas. Naquele momento, a bandeira das diretas tinha conotação positiva, era a esperança que nos movia. Muitos acham que só ela nos move. Mas diante das circunstâncias ameaçadoras é o instinto de sobrevivência que nos pode mover: o Brasil está se desintegrando.
Hoje a esperança só pode ser construída na luta pela sobrevivência. Chegou a hora de conversarmos por baixo, uma vez que do sistema político não vem resposta. Naturalmente, saindo do pequeno universo, abrindo-se para as diferentes posições no campo dos que querem a mudança. Nada que ver com conversa de ex-presidentes ou com essa história de que oposição e governo têm de se entender.
O governo tem de entender que chegou sua hora, pois é o grande bloqueio no caminho da esperança. Não é possível que, no auge de uma crise econômica, epidemias e desastre ambiental, o país aceite ser governado por uma quadrilha de políticos e empresários.

Quase tudo em ruínas
Fernando Gabeira

Agora que tudo está em ruínas, exceto algumas instituições que resistem, não me preocupo em parecer pessimista. Quando anexei às listas das crises o grave momento ambiental, algumas pessoas ironizaram: el Niño? Naquele momento falava apenas da seca, da tensão hídrica, das queimadas e enchentes. Depois disso veio o desastre de Mariana, revelando o descaso do governo e das empresas que, não se contentando em levar a montanha, transformam o Doce num rio de lama.

No fim de semana compreendi ainda outra dimensão da crise. O Brasil, segundo especialistas, vive uma situação única no mundo: três epidemias produzidas pelo Aedes Aegypti (dengue, chikungunya e o zika vírus). O zika está sendo apontado como o responsável pelo crescimento dos casos de microcefalia. Sabe-se relativamente pouco sobre ele. E é preciso aprender com urgência. O dr. Artur Timerman, presidente da Sociedade Brasileira de Dengue e Arboviroses, considera a situação tão complexa como nos primeiros momentos da epidemia de aids.

Agora que está tudo em ruínas, restam os passos das instituições que funcionam, o prende aqui, prende lá, delata ou não delata, atmosfera de cena final, polícia nos calcanhares. Lembra-me a triste cena final do filme Cinzas e Diamantes, de Andrzej Wajda. A Polônia trocava um invasor, os nazistas, por outro, os comunistas: momento singular. No entanto, há algo de uma tristeza universal na Polonaise desafinada e no passeio do jovem casal por uma cripta semidestruída pelos bombardeios.

Aqui, a cena não é de filme de guerra, ocupação militar, mas de um thriller policial em que a quadrilha descoberta vai sendo presa progressivamente. Enquanto isso, não há governo para responder ao desemprego, empobrecimento, epidemias, mar de lama e ao sofrimento cotidiano dos brasileiros.

As cenas finais são eletrizantes e a ausência de um roteirista tornou o filme político ainda mais atraente. Mas perto da hora de acender a luz os cinemas se preparam, abrem as cortinas e já se pode ver, de dentro, como é sombria a noite lá fora.

Quase todos concordam com a gravidade da crise, nunca antes neste país o governo errou tanto, corrompeu tão disciplinadamente a vida política, corroeu tanto os alicerces da jovem democracia, engrandecida com a luta pelas diretas. Naquele momento, a bandeira das diretas tinha conotação positiva, era a esperança que nos movia. Muitos acham que só ela nos move. Mas diante das circunstâncias ameaçadoras é o instinto de sobrevivência que nos pode mover: o Brasil está se desintegrando.

Hoje a esperança só pode ser construída na luta pela sobrevivência. Chegou a hora de conversarmos por baixo, uma vez que do sistema político não vem resposta. Naturalmente, saindo do pequeno universo, abrindo-se para as diferentes posições no campo dos que querem a mudança. Nada que ver com conversa de ex-presidentes ou com essa história de que oposição e governo têm de se entender.

O governo tem de entender que chegou sua hora, pois é o grande bloqueio no caminho da esperança. Não é possível que, no auge de uma crise econômica, epidemias e desastre ambiental, o país aceite ser governado por uma quadrilha de políticos e empresários.

Às vezes me lembro do tempo do exílio, quando sonhava com um passaporte brasileiro. Agora é como se tivesse perdido o passaporte simbólico e de certa maneira voltasse à margem.

Vivemos momento em que quase tudo está em ruínas, como se fôssemos uma multidão de pessoas sem papel. O foco nas cenas de desmonte policial é importante. O voto direto dos senadores não seria aprovado, no caso Delcídio, não fora a vigilância da sociedade.

No entanto, a gravidade da situação pede muito mais. Há um momento em que você se sente órfão dos políticos do país. Mas logo em seguida percebe que é preciso caminhar sem eles. Hora de conversar na planície.

Não descarto a importância de um núcleo parlamentar que nos ajude a mandar para as Bermudas o triângulo Dilma, Renan, Cunha. Mas as grandes questões continuam: como recuperar a economia, como voltar a crescer de forma sustentável, como reposicionar o Brasil no mundo, distanciando-nos dos atrasados bolivarianos?

Uma das muitas maneiras de ver os limites do crescimento irracional é o próprio desastre em Mariana, a agressão ao Rio Doce. A essência desse crescimento é o depois de nós, o dilúvio. Às vezes o dilúvio se antecipa, como no distrito de Bento Rodrigues, e fica mais fácil compreender a gigantesca armadilha que legamos às novas gerações. É preciso uma conversa geral e irrestrita entre todos os que querem mudar, tirando da frente os obstáculos encalhados em Brasília.

Não se trata de estender o dedo como naquele cartaz do Tio Sam, dizendo: o país precisa de você. Na verdade, o caminho é mostrar que você precisa do país; se ele continuar se enterrando, alguns sonhos e perspectivas individuais se enterram também.

Compreendo as pessoas que temem a derrubada do governo e seus aliados porque não sabem precisamente o que virá adiante. Não sei se isto as conforta, mas o descobrimento do Novo Mundo foi feito com mapas equivocados e imprecisos. A fantasia dos navegantes estava povoada de monstros e prodígios, no entanto, acabaram sendo recompensados por se terem movido.

O desafio de agora é menor do que lançar-se nos mares desconhecidos. Os mapas nascem de um amplo diálogo e, mesmo se não forem cientificamente precisos, podem nos recompensar pela movida.

Desde o princípio, o impeachment era uma solução lógica, mas incômoda. Muita gente preferiu ficar com um governo porque ele foi eleito. Não importa se a campanha usou dinheiro do petrolão, Pasadena, não importam as mentiras, a incapacidade de Dilma. Ela foi eleita. Tem um diploma. E vamos dançar nas ruínas contemplando o luminoso diploma, cultuando sua composição gráfica, a fita colorida.

Muitos povos já se perderam no êxtase religioso como resposta a uma crise profunda. Mas os deuses eram mais fortes, o sol, a fecundidade, a morte. Estamos acorrentados a um diploma.

Fonte: Estado de SP, 04/11/2015

segunda-feira, 25 de maio de 2015

Humanos: crianças egoístas e más que querem prazer às custas do sofrimento de outros

Uma vida de inferno para que humanos consumam 100 gramas de sua dor
CRIANÇAS EGOÍSTAS

Frank Alarcón
Tristes são os tempos em que deve ser a força da lei, e não a sensatez, quem governa nossas ações. A proibição municipal do foie gras é preciosa tanto em caráter pedagógico como prático. Resistências a essa proibição são sintomas sérios de transtorno moral maior.
 Defensores do foie gras e da exploração animal parecem viver ainda na tenra infância –período em que a conduta egocêntrica mais se manifesta. Para essas crianças que comandam cozinhas em francês e frequentam restaurantes com ternos e saltos altos, se animais sofrem como consequência de suas vontades, o azar é deles.

O que devemos pensar de práticas que obrigam animais enclausurados a uma alimentação forçada, que alteram a fisiologia de suas vísceras, onde estas são extraídas de forma sanguinária, moídas, embaladas e vendidas como iguaria a consumidores voluntariosos?

E o que devemos pensar de consumidores que pouco se importam com as consequências de seus prazeres gastronômicos? Respostas para as duas perguntas se relacionam com a cruel produção e comércio do foie gras (fígado gordo, em francês), atividades que a Câmara de São Paulo busca proibir mediante sanção do prefeito Fernando Haddad.

A palavra-chave é egoísmo. Sob o risco de ter seu negócio e capricho gastronômico obstruídos, produtores e consumidores do foie gras reivindicam seu direito de vender/consumir o que bem desejarem, quando quiserem. Uma questão de fundo puramente pessoal, dizem eles.

Esse raciocínio raso ignora convenientemente uma terceira parte envolvida, à revelia, que é submetida a uma vida miserável para que desejos culinários de alguns minutos sejam atendidos.

Tudo indica que para os reféns do paladar, animais não são dignos de consideração moral. Assim como coisas, animais poderiam ser aprisionados, submetidos a rotinas de convívio dolorosamente artificial, alimentação e iluminação forçada e uma vida abreviada por um pescoço quebrado, uma degola ou outra crueldade que a criatividade humana possa conceber.

Sim, a palavra é esta: crueldade. O sofrimento animal transcende o momento de seu assassinato diante de uma existência de penúria deliberadamente provocada.

Defensores do foie gras e da exploração animal parecem viver ainda na tenra infância –período em que a conduta egocêntrica mais se manifesta. Para essas crianças que comandam cozinhas em francês e frequentam restaurantes com ternos e saltos altos, se animais sofrem como consequência de suas vontades, o azar é deles.

O sofrimento desses animais é desprezível diante do prazer de comer e cobrar –caro– por 100 gramas de crueldade. Aqui, demanda e oferta apadrinham o casamento entre egoísmo e economia. Alguns iludidos alegam que matar animais é tradição, registro cultural praticado há séculos e que, portanto, deve ser preservado. Constrangedor!

Não vivemos mais na Idade da Pedra nem comemos cotidianamente com as mãos nuas. Há séculos incorporamos à nossa rotina alimentar artificialidades como talheres, pratos, cocção de alimentos, guardanapos e papel higiênico.

Invocar o apego às raízes e à preservação cultural, além de embaraçoso, apenas revela quão escravos alguns segmentos da nossa sociedade são de tradições retrógradas.

Tristes são os tempos em que deve ser a força da lei, e não a sensatez, quem governa nossas ações. A proibição municipal do foie gras é preciosa tanto em caráter pedagógico como prático. Resistências a essa proibição são sintomas sérios de transtorno moral maior.

Provoco: Quem ousará proibir a produção e comércio do "foie gras" das classes B, C e D (a salsicha, a linguiça e o hambúrguer) em um país onde 70 milhões de bois e suínos e 5 bilhões de aves foram assassinados apenas em 2014 com os auspícios do governo federal?

Diante da inexistência de uma sociedade corajosa ou de líderes carismáticos capazes de discutirem seriamente a ética animal, mudanças incrementais não são desprezíveis. Explorar animais é eticamente equivocado, ambientalmente nocivo, nutricionalmente desnecessário. Egoístas discordarão.

FRANK ALARCÓN, 41, biólogo, é coordenador no Brasil da ONG Cruelty Free Internationnal

Fonte: Folha de São Paulo, Tendências e Debates, 23/05/2015

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Desconstruindo mitos sobre a Sabesp e a falta d'água em São Paulo


Três mitos sobre a Sabesp e a seca em São Paulo

Muitas falhas podem ser atribuídas à Sabesp, a estatal de saneamento de São Paulo. Mas entre acusações justas há equívocos que exalam pura ignorância econômica. Vejo muita gente dizer, por exemplo, que a seca em São Paulo se agravou porque a Sabesp, ao vender parte de suas ações na Bolsa, “passou a seguir a lógica do mercado”, “maximizando lucros e reduzindo investimentos”, para “privilegiar acionistas em detrimento do interesse público”. Há nesse raciocínio pelo menos três equívocos graúdos.
Mito 1: “Seguindo a lógica do mercado, a Sabesp reduziu investimentos”
Se a lógica do mercado levasse empresas a reduzir investimentos e privilegiar o lucro dos acionistas, o mundo viveria uma escassez generalizada. Enfrentaríamos falta de Coca-Cola, pois a empresa teria transferido dividendos a acionistas em vez de construir novas fábricas. Supermercados seriam lugares tristes repletos de prateleiras vazias, porque a Nestlé, a Ambev, Unilever e os produtores de frutas e verduras embolsariam lucros em vez de investir o necessário para atender o aumento da demanda.
É verdade que investir em novas tubulações para evitar vazamentos não é tão rentável quanto uma nova fábrica de refrigerantes. No entanto, pela lógica da “maximização de lucros” no longo prazo, a pior coisa que pode acontecer a uma empresa é não ter o que oferecer aos consumidores, como é o caso da Sabesp hoje em dia. A melhor é crescer e conquistar mercados. Por isso previsões de demanda, aquisições, estudos de ampliação e análises do “capex” (o capital destinado a investimentos) são parte do dia a dia de empresas que buscam lucro.
Quem acompanha o mercado financeiro sabe que toda a semana o preço de ações cai porque empresas anunciam projetos e aquisições. Como investimentos geralmente significam menos lucros ou dividendos nos meses seguintes, acionistas interessados no gráfico de curto prazo se livram dos papéis. Isso aconteceu recentemente com ações do Facebook, da Intel, da Microsoft, da Vale, da Lenovo, da Tim, entre muitas outras. O preço da ação costuma se reerguer depois de algumas semanas. Os acionistas mais ligados ao longo prazo entendem que, se a empresa está investindo, terá melhores fundamentos no futuro.
Mito 2: “A Sabesp enriqueceu os acionistas”
Só existe um motivo para uma empresa evitar investimentos e privilegiar os acionistas: se o principal acionista for o próprio governo. No caso de empresas estatais, uma distribuição maior de dividendos resulta em caixa mais gordo aos políticos no poder. E o que político gosta de fazer é gastar dinheiro o mais rápido possível. Diferente de donos de empresas, políticos têm um objetivo de curto prazo: a próxima eleição. Poucos resistem à tentação de sacrificar o futuro de estatais ou das contas públicas para gastar em obras ou propaganda.
Foi esse o caso da Sabesp? Se a empresa não sofreu da lógica do mercado, teria sido vítima da lógica da política? Difícil dizer. Segundo esta reportagem da Exame, a Sabesp é uma das empresas de saneamento que mais pagam dividendos no mundo. O governo de São Paulo, dono de 50,3% das ações, é o maior beneficiário desses repasses. No entanto, entre 2008 e 2013, de acordo com a consultoria Economática, a Sabesp ficou em 28º lugar entre as 30 maiores pagadoras de dividendos do Brasil. O retorno médio aos acionistas foi de 4,9%. É uma boa média, mas bem inferior à Eletropaulo (23%) ou estatais administradas pelo governo federal, como o Banco do Brasil (6,9%). Sem contar o rendimento das ações, que depende da sorte, os acionistas da Sabesp ganharam de dividendos menos do que se tivessem investido na poupança. “A Sabesp é uma boa pagadora de dividendos, mas não é um caso excepcional”, me disse Gianmarcelo Germani, da MoneyMark. “Outras estatais, como a Copel ou a Cemig, pagam dividendos muito superiores.”
Mito 3: “Distribuir dividendos vai contra o interesse público”
Se você tem uma empresa e precisa de dinheiro para ampliar o negócio, é geralmente mais barato lançar ações na Bolsa que emprestar no banco. De um dia para o outro, investidores jogam milhões de reais na sua mão. Em troca, esperam uma remuneração anual que, segundo a lei, precisa ser no mínimo 25% dos lucros que você conseguir. As empresas costumam pagar um pouco mais do que manda a lei, para ficar em paz com os acionistas e poder captar mais dinheiro da próxima vez que precisarem.
Se o governo paulista quisesse manter a Sabesp 100% estatal e se recusasse a vender ações, teria que emprestar do BNDES ou de bancos internacionais, ou bancar do próprio bolso investimentos para a ampliação de represas e da rede de abastecimento. Isso significa tirar dinheiro de hospitais e escolas para colocar numa empresa que poderia andar com as próprias pernas. Diversas estatais de saneamento dão prejuízo no Brasil: o rombo que elas causam acaba sendo pago com o imposto dos cidadãos.
É tentador imaginar um acionista milionário nadando no dinheiro enquanto o povo morre de sede, mas isso não passa de ficção marxista. Se a empresa é bem administrada, a participação de investidores provoca melhoria e ampliação de serviços. 
Repito: não acho a Sabesp um exemplo de empresa. Na verdade considero uma tremenda loucura legar a uma estatal algo tão importante quanto o abastecimento de água. Acredito que água potável só será abundante quando arranjarmos um jeito de haver concorrência nesse setor, pois monopólios legais (públicos ou privados) sempre vão decepcionar. O que me faz defender a Sabesp neste texto é somente a falta de noção de algumas acusações.
Fonte: Veja, por Leandro Narloch, Caçador de Mitos, 27/01/2015

terça-feira, 14 de outubro de 2014

Eduardo Jorge: quando a esquerda é honesta!

Eduardo Jorge contra as velhas esquerdas

Em entrevista à Bruno Torturra (aquele da Mídia NINJA, que representou o coletivo no Roda Viva ao lado de Pablo Capilé), do Estúdio Fluxo, Eduardo Jorge admitiu que o Marxismo é uma religião.
Eu, praticamente, saí de uma formação católica cristã muito rigorosa e, com 17, 18 anos, me converti a essa outra religião, ateia, que era o marxismo-leninismo. Na época eu não sabia que era uma religião, depois é que eu fui descobrir. [Bruno: Você acha que é uma religião?] É uma religião total, tem santos, tem profetas. Tem fé. Depois (rindo), com o tempo é que eu fui descobrir que tinha saído de uma religião e entrado noutra.”
De quebra, o ex-deputado constituinte ainda admitiu o que muitos outros ex-revolucionários não admitem. Afirmou que na época da oposição à Ditadura, ele e seus colegas do PCBR (Partido Comunista Brasileiro Revolucionário, enfase no “revolucionário” – Jorge participou da luta armada) não defendiam a democracia, mas sim uma outra ditadura, a do proletariado. E não ache você que somente os integrantes do PCBR o faziam. Eduardo Jorge, assim como Gabeira, conta com sinceridade pelo que lutava e esse é o único diferencial entre ele e outros ex-guerrilheiros e revolucionários. Quem militou pela VPR, ALN e outros grupos e partidos comunistas queria o mesmo, uma ditadura do proletariado.

Como o ex-candidato do PV bem disse na entrevista, não acreditavam na Democracia.

Mas sua posição mudou, ele diz ter reformulado seus conceitos em relação a democracia e a entende hoje como um bem primordial. Independente disto, ainda se assume um homem de esquerda. À Torturra, que desonestamente chamou-o de kassabista, disse mais. Para irritar de vez a esquerda brasileira, ou o restante dela, falou na entrevista que Stalin concorre com Hitler pela medalha de ouro de maior genocida de todos os tempos. E Mao Tsé Tung vem logo atrás, com a medalha de prata.

O hoje socialista verde, que frisa o todo tempo que o PV e o verdismo/ambientalismo são o que há de vanguarda na política, enquanto os demais são ideologias e partidos do Século XX, atrasados, não teme criticar as demais esquerdas.

Este é Eduardo Jorge, que recebeu quase 700 mil votos no último domingo (05/10/2014), para à presidência da república, e acaba de, junto a seu partido, declarar apoio oficial à Aécio Neves (PSDB) no segundo turno.

Assista a primeira parte da entrevista, quando Eduardo faz tais afirmações:



Fonte: Feedback Magazine, 09/10/2014

Ver também:
Integrante da luta armada afirma que muitos de seus companheiros até hoje não assumem que lutavam para impor uma ditadura de esquerda

sábado, 4 de outubro de 2014

Dia Mundial dos Animais: Parabéns, meus queridos amigos!


A música do segundo vídeo é Born Free (Nascido Livre) de Don Black e John Barry, trilha sonora do filme de mesmo nome de 1966. E liberdade é o maior presente que devemos devolver aos animais - hoje e sempre - e a nós mesmos, humanos.

Born free, as free as the wind blows
As free as the grass grows
Born free to follow your heart

Live free and beauty surrounds you
The world still astounds you
Each time you look at a star

Stay free, where no walls divide you
You're free as the roaring tide
So there's no need to hide

Born free, and life is worth living
But only worth living
'cause you're born free

(Stay free, where no walls divide you)
You're free as the roaring tide
So there's no need to hide

Born free, and life is worth living
But only worth living
'cause you're born free

Quem prende pássaros tem a alma encarcerada e nunca viu, entre suas grades, a imensidão do céu! (Míriam Martinho)

No mar, na terra e no ar. Born free!

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Vídeo "Faça acontecer" para um futuro sem fábricas de animais (e um pouco sobre West Side Story)

West Side Story (Amor, Sublime Amor) é um filme musical de 1961 que transporta o drama shakespeareano de Romeu e Julieta para o universo das gangues juvenis americanas formadas por imigrantes latinos e outros menos favorecidos. O cenário é a zona oeste de Manhattan em Nova York. Com coreografia inovadora e trilha sonora fantástica (Leonard Bernstein, Saul Chaplin), foi um divisor de águas na concepção dos musicais, tendo suas canções gravadas por inúmeros artistas e sua coreografia inspirado, entre outras, o clipe Beat It, de Michael Jackson.

No fundo, West Side Story trata do preconceito (qualquer deles) que dissemina o ódio e inviabiliza o amor. No filme, Tony, um ex-líder da gangue dos Jets (de brancos pobres), apaixona-se por María, irmã do líder da gangue rival, os Sharks, formada por imigrantes porto-riquenhos. Como no Romeu e Julieta original, entre disputas territoriais e ridículos códigos de honra, misturados no filme ao preconceito racial, o casal apaixonado não consegue sobreviver à estupidez humana.
Tony e Maria em West Side Story
Entre as músicas da trilha sonora (todas incríveis), Somewhere (Em algum lugar) se destaca como uma espécie de hino de esperança dos que vivem enjaulados pelas grades da discriminação e da opressão e sonham com a liberdade. Não por menos alguém teve a brilhante ideia de fazer um libelo pela libertação animal usando a música como tema.

Debulhei litros ao ouvir já o primeiro verso da canção associada às tristes imagens das chamadas fábricas de animais (de fato campos de concentração de bichos). Debulhei porque sempre cantei essa música pensando em todas as discriminações que sofrem os diferentes de todo o tipo e porque, naturalmente, nada me comove mais do que o sofrimento dos animais. O vídeo, de 2012, se chama Faça Acontecer (Make it Possible) e traz a mensagem de esperança de que é possível um futuro sem fábricas de animais, um futuro viável por causa das pessoas que mudam sua alimentação e se engajam na luta para que esse horror sob os céus deixe de existir.

Segue a letra da música, que fala por si mesma, traduzida para o português numa boa versão. E os vídeos Make It Possible e Somewhere do filme West Side Story. Deixo também o link para assistir online, legendada, essa obra-prima que é West Side Story, ganhadora, em 1962, do Oscar (em quase todas as categorias), do Grammy e do Globo de Ouro e, em 1963, do BAFTA britânico. E aqui, a trilha sonora.

Em algum lugar

Há um lugar para nós
Em alguma parte, um lugar para nós.
Paz e tranquilidade e céu aberto
Nos esperam em algum lugar.

Há um tempo para nós
Um dia haverá um tempo para nós
Tempo juntos e tempo de sobra
Tempo de olhar, tempo de amar

Algum dia, em algum lugar

Nós acharemos um novo modo de viver
Nós encontraremos um jeito de perdoar (Conseguiremos?)
Em algum lugar

Há um lugar para nós,
um lugar e um tempo para nós
Segure minha mão e já estaremos quase lá
Segure minha mão e eu lhe levarei até lá
De algum modo, um dia, em algum lugar.

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Cachorro e pássaro mostram que uma verdadeira amizade supera todas as diferenças

Pega-rabilonga
Vídeo onde um cachorrinho e um pássaro brincam para valer um com o outro. Pela esperteza e biotipo, o pássaro parece ser da família dos corvos, gaios e gralhas, provavelmente uma pega-rabuda, ou pega-rabilonga, pouco comum no Brasil. Divertido e emocionante!
 

sábado, 2 de novembro de 2013

Especialista em cardiologia nuclear afirma que testes em animais são inúteis para a produção de medicamentos e eticamente inaceitáveis

Há três grandes razões pelas quais testes continuam a ser feitos
 e elas são dinheiro, dinheiro e dinheiro.
'Uso de animais para estudar doenças e testar drogas para uso humano é um grande erro'
Especialista em cardiologia nuclear e diretor do Comitê Médico Pela Medicina Responsável, John Pipp afirma que é possível parar com os testes agora 

por Ana Freitas

O uso de animais em testes científicos e pesquisas acadêmicas poderia ser interrompido hoje mesmo sem nenhum ônus para o avanço científico: essa é a opinião do Dr. John Pippin, diretor de negócios acadêmicos da associação americana PCRM (Sigla em inglês para Comitê Médico Pela Medicina Responsável), sobre o uso de animais em pesquisas laboratoriais e acadêmicas.

O PCRM tem mais de 150 mil médicos e civis associados nos EUA e, desde 1985, defende uma medicina mais responsável e ética, e isso inclui a divulgação da importância da nutrição preventiva - em vez da prática de receitar drogas aos pacientes para corrigir problemas que poderiam ter sido evitados através de uma alimentação correta, por exemplo - e o fim do uso de animais em testes laboratoriais e pesquisas acadêmicas, entre outras coisas. De acordo com o PCRM, os resultados de testes com animais são tão imprecisos e incompatíveis com a maneira como o organismo humano reage que não faz sentido continuar submetendo os animais a eles. Para eles, não funciona, e se não funciona, não deveria estar sendo feito mesmo que não tivéssemos outras alternativas.

Em entrevista à GALILEU, John Pippin, especializado em cardiologia nuclear com mais de 70 artigos científicos publicados, falou sobre a ineficiência desse tipo de teste, as possíveis alternativas e sobre o caso do Instituo Royal.

GALILEU: Qual é a sua opinião sobre o uso de animais em pesquisas acadêmicas e testes laboratoriais?

Minha posição é que é errado sob todos os aspectos. É errado por razões éticas, e eu posso dizer isso, com autoridade porque eu já participei de pesquisas que testavam em animais, então posso dizer que, mesmo nas mãos de pessoas que cuidadosas e carinhosas, é horrível, cruel, e muitas vezes fatal para os animais que são usados nesse tipo de pesquisa. Essa é a questão ética.

A questão científica é que está provado que o uso de animais para estudar doenças humanas e testar drogas para uso humano antes que eles sejam mandadas para teste clínicos em pessoas é um grande erro. Os resultados geralmente têm uma aplicabilidade muito baixa em seres humanos, e é um sistema que claramente está demonstrado que não é eficaz, não prevê os resultados em organismos humanos, consome grandes recursos financeiros e produz poucos, quando nenhum, benefícios para pacientes.

Do ponto de vista científico, é errado porque não funciona. E do ponto de vista moral, é errado porque é cruel e fatal para os animais nos laboratórios.

Então porque os testes ainda são largamente usados por pesquisadores?

Há três grandes razões pelas quais isso continua e elas são dinheiro, dinheiro e dinheiro. As pesquisas em animais para doenças humanas, ao menos nos EUA, acontecem em universidades e ambientes acadêmicos, e essa pesquisa é paga por dinheiro público. Esses institutos gastam todo ano cerca de 13 bilhões de dólares em pesquisas usando animais. Obviamente isso é muito dinheiro, muitas grandes universidades nos EUA - Harvard, Yale, entre outras - ganham muito dinheiro para conduzir essas pesquisas. E sem esse dinheiro, carreiras e construção de infra-estrutura estariam em perigo. Há grande resistência no uso de animais em pesquisa porque é lucrativo.

Por que o governo continua a colocar dinheiro em algo que não funciona?

Eles não concordam que não funciona: eles acham que as vezes funciona, ou às vezes não funciona e que se esperarmos o suficiente, coisas que não funcionam agora funcionarão no futuro. Isso é nonsense. No caso dos EUA, por exemplo, o povo está pagando por essas pesquisas merece ver resultados que beneficiem sua saúde e bem-estar, e isso não está acontecendo.

Outra razão pela qual o governo continua a gastar dinheiro nisso é que as pessoas que tomam essas decisões são, eles mesmos, pesquisadores que usam animais nos testes, gente que acredita nisso. É por isso que pesquisa animal para doenças humanas continua.

Ativistas contra testes em animais (Foto: David Navalha/Flickr/Creative Commons)

E na indústria farmacêutica? Se o senhor afirma que esses testes são ineficientes para prever resultados em organismos humanos, por que eles continuam sendo feitos?

As empresas farmacêuticas estão interessadas em apenas uma coisa: ter os remédios aprovados pelo FDA (Foods and Drugs Administration, a vigilância sanitária dos EUA) para que sejam usados em humanos. A maneira mais fácil de fazer isso é dar ao FDA resultados de pesquisas com animais, porque o FDA está acostumado a ver resultados baseados nesse tipo de pesquisa, e é através de testes em animais que eles frequentemente aprovam testes em humanos.

E apesar disso, o próprio FDA já admitiu que testes em animais não são capazes de prever o comportamento do organismo humano diante de uma droga. 92% de todas as drogas testadas com sucesso em animais, e depois em humanos, falham de alguma forma [fonte]. Isso não é ciência, é bruxaria. Não deveria ser financiada e apoiado pela FDA, é uma fraude, e uma fraude que acontece por causa de dinheiro. Companhias farmacêuticas estão entre as maiores dos EUA, as mais ricas. O frustrante é que o FDA sabe que não faz sentido.

E quais são as alternativas mais eficientes ao teste com animais?

O princípio fundamental de achar alternativas melhores à política falida de usar animais é usar um sistema que se aplique a humanos.

Usando tecidos humanos, você consegue resultados que se aplicam a humanos, e você não precisa adivinhar se o que aconteceu com o rato também se aplica a humanos. É possível usar um tecido do fígado, colocar em contato com uma droga pra ver se vai causar algum câncer. Há vários tipos de tecidos possíveis, mas as amostras mais avançadas são ambientes tridimensionais, como partes de cânceres ou partes de tecido humano. E a área mais promissora nesse sentido é a de células tronco.

Hoje é possível obter células tronco que podem ser programadas para se tornar qualquer tecido que você queira a partir de outros tecidos. Dá pra criar corações, fígados, pulmões. Já foram criadas bexigas humanas a partir de células tronco. Isso mostra o potencial de usá-las para estudar o efeito de drogas e químicos em tecidos humanos. Há também métodos baseados em software: são vastos bancos de dados armazenando informações sobre o comportamento do organismo humano em geral e o que se observou até hoje que funciona e não funciona. É possível observar como uma droga influencia nos genes de alguém e pode vir a causar uma doença no futuro, ou como certos genes podem gerar uma pré-disposição para algumas doenças caso interajam com drogas. Empresas farmacêuticas já usam isso, porque eles sabem que funciona. Mas eles também usam testes em animais porque é isso que o FDA está acostumado a receber.

Se eu entendi bem, sua opinião então é que, se não funciona, não deveríamos nem nos preocupar em substituir o processo atual com alternativas, mas sim parar completamente?

Exatamente. Quando as pessoas me perguntam "mas se não usarmos animais, o que vamos fazer? Temos que fazer algo, não podemos dar remédios pras pessoas sem testá-los", minha resposta é "Olha, se não funciona, consome seus recursos, usa dinheiro do contribuinte e prejudica as pessoas, como drogas como o Vioxx fizeram [Vioxx foi um anti-inflamatório testado com resultados inócuos em animais, mas que depois, no mercado, chegava a triplicar o risco de morte por ataque cardíaco nos pacientes. Foi retirado de circulação nos EUA em 2004], então temos de parar!

Mesmo que não façamos nada alternativo, vamos parar. Não está funcionando". E aí eu digo que, poxa, ainda por cima há sim alternativas se a gente quiser usá-las.

Você ouviu falar do caso do caso do laboratório brasileiro que foi invadido por ativistas?

Dos beagles, não é? Sim, esse caso foi bastante repercutido nos EUA. Me entristece que as pessoas sejam obrigadas a agir fora da lei para fazer aquilo que acham que é certo. Essas pessoas são corajosas. Elas estão se arriscando por algo que sabem que é justo e não têm ninguém para protegê-las. Os beagles têm gente como elas.

Em quanto tempo você acha que os EUA vão parar de fazer testes em animais?

Acho que passamos do ponto em que pessoas discutem se pesquisas animais são abordagens científicas confiáveis. Todo mundo entende que não é. Gente como eu entende que essas pesquisas não têm valor nenhum, e outras pessoas da área acham que a abordagem é falha mas que de vez em quando ela traz alguns resultados úteis, e portanto têm que continuar fazendo.

Já passamos da parte em que provamos que testar em animais não é certo. Já estamos no caminho em direção a achar maneiras melhores de fazer isso Porque essa indústria não tem ética e só se preocupa com votos e dinheiro, eu diria 10 a 15 anos. E isso é porque demora um tempo até convencer a FDA que eles estão fazendo algo errado, mesmo com o comitê de ciência e o congresso dizendo que eles estão fazendo tudo errado.

Fonte: Revista Galileu On Line

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