segunda-feira, 28 de julho de 2014

Rompendo a camisa de força dos gêneros: ‘homens, libertem-se’

Homens sempre usaram saias através da história
Essa história de hoje qualquer tipo de atividade social, cultural, política ter que vir com apoio governamental é realmente muito difícil de encarar.

Há duas, três décadas atrás, se faria a mesma coisa exclusivamente pela via voluntária, comunitária. Falar em liberdade de qualquer tipo com respaldo estatal sempre será meio contraditório, para dizer o mínimo, sobretudo considerando que o estatismo faz parte dessa mesma mentalidade patriarcal e autoritária que o movimento pela libertação dos homens diz combater.

Apesar desse porém, a ideia em si é boa. Vai ao encontro do que penso sobre a necessidade de acabar com a educação diferenciada que massacra a individualidade das pessoas, forçando meninas e meninos a se encaixarem  num modelito de mulher (hétero + feminino) ou  de homem (hétero + masculino) que não raro está em desacordo com a personalidade de cada criança. Esses modelitos mutilam sobretudo as potencialidades das mulheres, mas os homens também perdem na história. São criados para serem toscos, brutos, violentos, egoístas, parasitas. Felizmente, eles também estão se cansando dessa fórmula funesta e procurando outras maneiras de ser.

Particularmente, não acho que seja o caso de trocar de papéis, antes que alguém se confunda. O que nossa sociedade convencionou chamar de masculino e feminino conforma apenas características humanas que foram arbitrariamente separadas entre os sexos. Por exemplo, o "masculino" detém boa parte das qualidades humanas responsáveis por formar gente autônoma, independente, resiliente (capaz de absorver impactos sem se quebrar). São qualidades a ser cultivadas por ambos os sexos. Do mesmo modo, sensibilidade e delicadeza (que não são sinônimo de frouxidão) se configuram igualmente como qualidades a ser incorporadas por ambos os sexos. Um mundo com menos guerras e violência generalizada pode ser um dos bons resultados do fim dessa departamentação forçada. Outro bom resultado será sem dúvida a existência de um mundo onde cada pessoa possa ter a liberdade de definir como quer ser de acordo com sua individualidade e não como a sociedade exige que seja.

Seguem artigo do Globo sobre a libertação e dois vídeos do site da campanha (ver fontes ao final).

Ação ‘Homens, libertem-se’ lança manifesto pelo direito de brochar, falir e chorar
Movimento apoiado por artistas que pede fim do machismo tem autorização para captar R$ 400 mil via Lei Rouanet

RIO - Posso brochar. Posso falir. Posso ser frágil. Posso ser sensível. Posso ser cabeleireiro, decorador, artista e não gostar de futebol. Posso admirar uma mulher que eu ache bela com respeito. São esses e muitos outros os preceitos do movimento “Homens, libertem-se”, que estimula o macho (heterossexual) a romper estereótipos em que vivem aprisionados. O músico Paulinho Moska, os cartunistas Laerte e Miguel Paiva, os atores Lúcio Mauro Filho, Marcos Breda e Álamo Facó, o escritor Nelson Motta e a historiadora Mary Del Priore apoiam a ação.

A iniciativa é uma parceria entre o coletivo mo[vi]mento, de Rio e Minas, e o grupo teatral The Living Theatre, de Nova York. O projeto teve autorização de captação, por meio da Lei Rouanet, de até R$ 400 mil para intervenções artísticas que provoquem reflexão sobre a opressão masculina. Nos eventos, a cargo de grupos de teatro de vários estados, serão distribuídas as saias-cangas símbolo do movimento. Elas poderão ser trocadas por calças, que serão doadas a instituições de caridade.

‘Eles se impõem prisões’

A ideia para a ação, que começa a ganhar corpo pouco antes da comemoração do Dia Nacional do Homem (15 de julho), veio à cabeça da atriz Maíra Lana quando ela viu um homem usando saia em sua cidade, Ouro Preto.
Os homens ficaram desconcertados, e eu achei tão engraçado. Era só uma peça de roupa, mas revelava muito sobre as prisões que eles se impõem — lembra. — Faz 200 anos que as mulheres fizeram a primeira passeata pelo direito de usar calças. Então é um absurdo que meninos sejam punidos na escola por expressar sua subjetividade.
Maíra se refere a um estudante do tradicional Colégio Bandeirantes, de São Paulo, que, em junho de 2013, foi impedido de assistir a aulas usando saia, gerando protestos e angariando simpatias dos colegas, que fizeram “saiaços” em apoio.

A ideia de que “homem não chora” também foi fortemente confrontada, quando, após a derrota da seleção na Copa, alguns jogadores de futebol, como o novo ídolo David Luiz, desabaram em lágrimas.
É importante esses ídolos mostrarem quem são, sem filtros, extravasando o que sentem. Isso contribui para que outros homens se sintam confortáveis para expor emoções e angústias — comenta Maíra.
Uma das possíveis críticas ao manifesto do “Homens, libertem-se” é não mencionar a opressão sofrida pelos homossexuais. Segundo a criadora da ação, isso acontece porque “todos os homens estão incluídos no manifesto, sejam heterossexuais ou gays.”
Mas o nosso maior alvo é o homem hétero — admite. — Queremos que ele reveja seu conceito de masculinidade e identidade, como os homossexuais e as mulheres já fazem há décadas.
Em seu livro “Homem ainda não existe”, a psicóloga Christina Montenegro afirma que o grupo masculino é o único que não se organizou para discutir gênero.
É um absurdo que o comportamento dos homens ainda seja limitado. A opressão gera a violência com o outro e também consigo. Não é à toa que todas as estatística mostram que os homens são os que mais adoecem, os que mais se suicidam e conformam a maior parte da população presidiária e manicomial... Eles têm questões internas não resolvidas — afirma Christina.
As mulheres também ganham

O cantor e compositor Paulinho Moska, apoiador da ação, conta que se sentia oprimido pelo ideal de masculinidade na adolescência:
Eu era magrelo, usava pulseirinhas hippie e me identificava com Caetano, Gil e Bowie, que eram andróginos. Passei a ser chamado de bicha e viado de forma agressiva. Sofri até me ver livre da representação masculina clássica.
Nelson Motta ressalta que a reflexão pode causar um benefício não só para eles, mas também para elas, que vivem viveriam melhor num mundo com homens livres e menos violentos:
Participo do movimento porque amo as mulheres. Tenho três filhas e duas netas, que merecem amor, respeito e homens sensíveis e educados.


Fonte:
O Globo, por Marina Cohen,14/07/2014; site Porque Homens Libertem-se

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