segunda-feira, 25 de novembro de 2013

O paradoxo chileno por Carlos Alberto Montaner

Michelle Bachelet
Michelle Bachelet deve voltar à presidência do Chile porque provavelmente a consideram merecedora do cargo. Já passou por La Moneda (sede do governo) e deixou o poder com altíssimo grau de aprovação. Entretanto, desta vez, voltará para governar de outra forma, como tem prometido. Haverá saúde e educação “grátis”. Irá estabelecer as bases do Estado Benfeitor. O gasto público, claro, aumentará substancialmente, e com ele a alegre legião dos funcionários.

Não há dúvida. Existe insatisfação no país com o modelo chileno, apesar de seus imensos êxitos e do fato inegável de que o Chile hoje é a  primeira economia da América Latina. Por que então o inconformismo? Segundo Mauricio Rojas (economista chileno residente na Suécia), “trata-se de um longo processo que teve sua espetacular eclosão no ano de 2011, com grandes mobilizações sociais que conseguiram firmar um discurso antissistema que questionou os pilares do modelo chileno”.

E acrescentou mais adiante:“a centro-direita chilena acreditou que a eficiência do sistema lhe traria automaticamente legitimidade e apoio e descuidou do terreno onde realmente se decide o caminho das sociedades: o das ideias. Rojas, bastante preocupado, apontou esses fatos em um artigo intitulado Chile, rumo ao estado benfeitor e à democracia chavista.

Mauricio Rojas sabe do que fala. Em sua juventude foi um marxista ferrenho, membro do MIR (Movimiento de Izquierda Revolucionaria), e teve que exilar-se, depois do golpe de Augusto Pinochet, para não ser morto. Foi para a Suécia. Lá, felizmente, desemburreceu. Obteve um doutorado em economia na Universidade de Lund e abandonou as tolas superstições marxistas. Logo entendeu os erros do Estado de Bem-Estar Social. Foi deputado pelo partido Liberal e viveu intensamente a retificação dos excessos cometidos pelos socialdemocratas, especialmente depois da crise dos anos noventa.

A Suécia era um dos países mais habitáveis  do planeta,  mas, após o advento do estado benfeitor, o excessivo gasto público – chegou a 67% do PIB – e a intervenção do Estado na economia acabaram afogando as iniciativas da sociedade civil e arruinando as finanças suecas. Depois do tombo, os sucessivos governos locais, além de cortar gastos, aprenderam a depender mais do setor privado e a recorrer ao mercado mediante sistemas de vouchers (cheque, vale, cupom) que devolveram à sociedade a capacidade (e o direito) de escolher. Público e privado se harmonizaram.

A discussão, portanto, não deve ser sobre se é conveniente ou não erigir um estado de bem-estar social. O tema de fundo é outro: a sociedade produz suficiente riqueza para sustentar um modelo de convivência no qual as pessoas disponham de casas confortáveis, comida variada, roupas adequadas, educação e saúde de qualidade, transporte, comunicações, diversões e infraestrutura eficientes? Tudo isso é bem agradável, mas custa muito.

Os países escandinavos não estão no topo da lista do conforto planetário porque decidiram criar estados benfeitores e sim porque geraram um tecido produtivo no setor privado que lhes permitiu produzir sociedades como as que vemos na Suécia, Noruega, Dinamarca ou Finlândia.

A Suíça é a Suíça, ou a Áustria é a Áustria, não porque os bondosos políticos e funcionários dessas nações tenham decidido dotar suas sociedades de um alto padrão de vida e repartir a riqueza, mas sim porque o país conta com um aparato empresarial privado altamente competitivo que cria empregos bem remunerados e paga impostos. Aqui não há dúvida sobre quem vem primeiro, se o ovo ou a galinha.

Essa é a questão pendente do Chile. O país, sim, vai muito bem, porém não tanto como outros, e graças sobretudo às exportações de cobre, salmão, vinho, vegetais e alguns outros poucos produtos. Como disse o professor de Harvard, Ricardo Hausmann: “No Chile, as únicas coisas que se desenvolveram recentemente foram as AFP (o estupendo sistema privado de aposentadoria criado pelo economista José Piñera) e as empresas Falabella e Cencosud (lojas, supermercados). Embora surpreendente, o fato é que o país tem poucas empresas globalmente competitivas, e isso mostra uma falta de diversificação que deveria preocupar”.

O que o Chile e todos os países necessitam é de governos que se proponham, primordialmente, não a distribuir riquezas, mas sim a estimular a criação de empresas privadas vigorosas, competitivas e diversificadas que alimentem e sustentem o surgimento de classes médias educadas e, por tabela, custeiem um Estado eficiente. Como se faz isso? Tomara que a senhora Bachelet descubra logo antes de provocar um descalabro.

Fonte: El blog de Montaner, La Paradoja Chilena, 24/11/2013, Tradução Míriam Martinho

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