sexta-feira, 1 de novembro de 2013

A "pedofilia" dos conservadores contra a veracidade dos fatos

Conservas sem parâmetro algum de comportamento decente
Ontem rolou, nas redes sociais, a notícia do site cristão Charisma News, de que a American Psychiatric Association (APA - Associação de Psiquiatria Americana) teria redefinido a pedofilia de transtorno ou desordem mental para orientação sexual. Não tardou para um conservador, Rodrigo Constantino, veicular a notícia, em sua coluna na VEJA, como um sinal do "esquerdismo doente, que relativiza tudo e não encontra mais parâmetro algum de comportamento decente".

Embora tenha acusado a esquerda de comportamento indecente, o fato é que a postagem de Constantino não foi nada decente. Pelo contrário, foi bem leviana já que ele não buscou confirmar a notícia junto à APA, limitando-se a reproduzir texto de site pra lá de duvidoso apenas como pretexto para a divulgação de trecho de seu livreto a "esquerda caviar". Inclusive, mesmo após ser refutado por várias pessoas, com base em declarações da própria APA, não tratou de apresentar resumo dessas declarações esclarecedoras como fez o próprio site cristão citado. E aí a esquerda é a única corrente desonesta, hipócrita e gananciosa do país. 

De fato, a primeira informação obtida sobre o assunto dava conta de que a APA teria feito uma distinção entre a pedofilia passiva (sem prática real, só fantasias) e a ativa (prática real envolvendo crianças), denominando a passiva de "orientação sexual" e a ativa de "desordem ou transtorno pedofílico". Já por aí ficava claro que não era a pedofilia propriamente dita que teria sido reformulada como mera orientação sexual. Posteriormente, porém, divulgou-se nota da própria APA esclarecendo ter sido o termo "orientação sexual" um erro de impressão que será corrigido nas próximas edições do manual e substituído pelo termo correto "interesse sexual". Embora a distinção seja meramente linguística, o uso do termo "interesse sexual" é mais adequado, pois orientação sexual já ficou marcado como referente às sexualidades não patológicas (hétero, homo e bissexualidade). Assim também cala-se de vez a boca dos histéricos de plantão.

Na verdade, essa falsa polêmica sobre a pedofilia visa de fato deslegitimar os direitos homossexuais (além de, no caso de Constantino, fazer propaganda de seu livro). Para os conservadores, o fato de a homossexualidade ter sido retirada do rol das parafilias da APA, em 1990, passando a ser reconhecida como orientação sexual, abriu as portas para a naturalização das outras "perversões" elencadas no 5º Manual Estatístico e Diagnóstico dos Transtornos Mentais (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders- DSM-5).

É bem provável que realmente as relações sadomasoquistas venham a sair da lista das parafilias em breve, pois a sociedade já as naturalizou e erotizou o suficiente para até produzir best-sellers como 50 Tons de Cinza, uma espécie de aventuras de Sabrina in chains (acorrentada). Provavelmente também os conservadores darão seu show de puritanismo hipócrita quando isso acontecer.

Entretanto, as relações SM são, bizarrices à parte, relações entre pessoas adultas estabelecidas de livre e espontânea vontade. Cada um que saiba a dor e a delícia de ser o que é. Por outro lado, a pedofilia, a zoofilia (relações com animais), o assédio sexual, o estupro, a prostituição forçada são relações de violência, pois não existe nelas o componente fundamental da sexualidade saudável que é o consenso entre as partes envolvidas. Se as pessoas que têm desejos dessa natureza os mantém no nível da fantasia, não há o que se fazer sobre o assunto (ver abaixo o bom  filme O Lenhador a respeito do tema). Se partem da fantasia para a ação, precisam ser contidas pela sociedade pois seus atos se configuram como criminosos.

Qualquer pessoa razoável sabe bem diferenciar as relações consensuais das forçadas. Os conservadores buscam misturar as coisas porque são simplesmente vigaristas morais e intelectuais.  


3 comentários:

Amigo, você escreveu um texto longo e bem articulado mas o fato é simples: quem pensa em comer uma criança está com graves problemas. O fato de não ter sido consumado qualquer ato não pode descaracterizar o transtorno. É alguém com um problema sob controle (sabe-se lá até quando).

Há muita diferença entre fantasia e realidade. Ninguém pode ser criminalizado pelo que sonha, pelo menos não até agora e espero que nunca. Então, se o portador desse triste desejo não o manifesta na prática, só se ele for ao terapeuta para que terceiros possam tentar interferir em sua situação. Caso contrário, o transtorno é problema exclusivamente dele e não da sociedade.

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