quinta-feira, 16 de junho de 2011

Drogas: reprimir ou liberar?

Já era para ter escrito sobre o tema antes, quando FHC deu entrevista sobre o documentário Quebrando o Tabu, que estreou recentemente, mas acabou passando a hora. Agora, com a liberação da Marcha da Maconha pelo STF (ontem, dia 15/06) decidi dar meu pitaco sobre o assunto.

Primeiro, adianto que a droga mais forte que tomo é cafeína, na forma de capuccino e pó-de-guaraná, na hora do cansaço, seguida do álcool presente em copo de vinho para acompanhar a refeição. Destilados raramente. Enfim, sou careta. E não tenho simpatia por dependências, de qualquer coisa, nem por dependentes de qualquer coisa.


Entretanto, quando jovem, experimentei e abusei de drogas lícitas e ilícitas, inclusive por ser da geração da contracultura, do sexo, drogas e rock’n’roll, a geração dos excessos por excelência. Essa experiência me permitiu estruturar uma visão mais realista sobre as drogas em geral, nem mistificadora nem demonizadora.

Todas as drogas tem o potencial de causar dano à saúde das pessoas, tanto as lícitas quanto as ilícitas. Os remédios que a gente compra na farmácia, legalmente, apresentam, em suas bulas, os efeitos adversos de suas substâncias. Algumas doenças inclusive são iatrogênicas, ou seja, causadas por remédios, remédios que são vendidos por empresas e sob controle da ANVISA.

Então, um dos argumentos mais frágeis dos que se opõem a descriminação e legalização das drogas é de que elas devem permanecer proibidas porque fazem mal. Sem dúvida, as drogas ilegais causam danos à saúde das pessoas, contudo, as legais também. Por que então algumas são criminalizadas e outras não? Por isso, para mim, o X da questão é quem produz a droga e a comercializa e não se ela causa dano ou não à saúde dos usuários, já que todas as drogas causam algum problema.

É fato incontestável que as drogas quando ilegalizadas (desde as mais leves como a maconha, cocaína, às mais pesadas como o ecstasy, heroína, crack e agora oxi) passam a ser produzidas e vendidas pelos profissionais do crime, os bandidos, os narcotraficantes. Ao que já é problemático, o consumo de drogas, acrescenta-se então o comércio trilionário do narcotráfico  que aterroriza sobretudo os habitantes mais pobres das regiões onde ele se instala.

Nos EUA, durante a lei seca, ou seja, quando as bebidas foram proibidas e não puderam mais ser vendidas no bar da esquina, o comércio do álcool passou para as mãos dos gângsteres, com as conseqüências já bem conhecidas do aumento da criminalidade, em todos os sentidos, no contexto de fabricação e comerciaização da droga. Quando a lei seca foi derrubada, o comércio voltou para as mãos das empresas, o que significou melhor qualidade dos produtos, fiscalização governamental, recolhimento de impostos.

Sempre foi e sempre será assim: qualquer produto que venha a ser proibido acabará inevitavelmente nas mãos dos criminosos, pois enquanto houver demanda haverá oferta legal ou ilegal. Para a sociedade em geral, melhor, portanto, que a oferta seja legal, já que a demanda não vai parar. Nunca parou desde que o mundo é mundo. O máximo que se pode fazer é alertar a população para os riscos que o uso de cada droga acarreta e delimitar os espaços onde pode ser consumida, como ocorre hoje com o tabaco.
 
Ah, dizem, mas o governo vai arrecadar ainda mais imposto que não retornará para a população, como ocorre com todos os outros impostos. Isso depende de nós cobrarmos os governos de forma mais contundente. E o importante a frisar aqui é que governos, em democracias, sempre podem ser cobrados. Traficantes, não.


Nem preciso dizer mais nada, para que, quem me leu até aqui, conclua que – pelo menos teoricamente - sou favorável a descriminação e a legalização das drogas hoje ilícitas (as que não causam a destruição da pessoa em três semanas, bem esclarecido). Não sei se ganharíamos mais com a descriminação e a legalização das drogas, mas seguramente perderíamos menos, bem menos.

Por que então disse que sou favorável à descriminação e à legalização das drogas em geral teoricamente apenas? Porque para descriminar e legalizar as drogas ilícitas é necessário também analisar o contexto onde são consumidas, se existe infra-estrutura para cuidar do aumento dos dependentes em suas horas difíceis. Considerando o que é a saúde pública no Brasil, certamente não podemos seguir o exemplo da Holanda, onde o consumo de drogas é permitido e as mesmas cedidas pelo próprio governo que também arca com os custos dos cuidados de saúde dos dependentes.

Por isso, pragmaticamente, defendo a descriminação e a legalização apenas da maconha, já que seus efeitos danosos não são muito maiores do que os causados pelo tabagismo ou pelo álcool, não vindo a onerar ainda mais o já sucateado sistema de saúde do país. Quanto às outras drogas, o tema da descriminação só do usuário está em aberto para mim. Em geral, penso que a descriminação do usuário sem a legalização da droga, e sua conseqüente fabricação pela indústria, não serve ao propósito central de tirar a produção e comercialização das drogas das mãos da bandidagem.

Quanto à liberação da chamada Marcha da Maconha, não sei como será possível realizá-la sem fazer apologia à droga. Considerando que a cannabis sativa permanece ilegal, a liberação ficou meio paradoxal por falta de uma delimitação do que se pode ou não livremente expressar sobre esse tema delicado. Sou até favorável que as pessoas manifestem sua opinião sobre a descriminalização da maconha, desde que de forma pacífica, mas, dada à não delimitação da abrangência da liberação, creio que a decisão do STF vai gerar simplesmente muita confusão.

6 comentários:

Eu li seu artigo sobre as drogas, e tenho a algo a te dizer. Não podemos comprar medicações com drogas ilicitas, porque as medicações apesar de terem efeitos colaterais, ninguém compra, toma, sofre os efeitos colaterais que muitas vezes são dores fortes, porque querem. O objetivo é prolongar a vida do paciente. Já as drogas ilicitas dimunuem o tempo de vida do cidadão. Portanto, não é apenas o lado comercial que devemos levar em consideração.
Obrigada pela oportunidade de poder te dizer isso! Pois aqui fazemos campanhas e mais campanhas contra a auto-medicação. MegLon

A maconha é usada para diminuir os efeitos da quimioterapia; a morfina para diminuir a dor dos pacientes com câncer; opiáceos para diminuir dores em geral. Todas essas substâncias são ilícitas, mas usadas para melhorar a vida de pacientes. O ponto é que tantos as lícitas quanto as ilícitas são drogas e têm efeitos colaterais. Ambas criam problemas de saúde que podem reduzir a vida dos pacientes. A comida causa sérios problemas de saúde às pessoas tanto que a obesidade é um grande problema mundial, mas ninguém pensa em criminalizar a comida. Enfim, são inúmeras as coisas que podem abreviar nossas vidas. A solução não é, portanto, criminalizar a todas. Míriam

Discordo! Ha um engano aí, hj existem medicações muito mais potentes para inibir as dores sem o uso do THC. Já evoluimos muito nesse sentido. A Obesidade é um patologia e nem todos tem pré-disposição a ela, portanto outro engano, algumas pessoas possuem o metabolismo super rapido. Não podemos considerar verdeira essa colocação. Tanto que existem a anorexia e bulimia. Porém, em qualquer situação, NINGUÉM toma uma medicação para reduzir seu tempo de vida. Inclusive há casos que os pacientes preferem não tomar nada. Não é verdadeira essa afirmação de redução de tempo de vida com medicações, só se forem auto-medicações ou sem acompanhamento correto. E ha os casos dos hipocondriacos... Precisam de tratamento e não dá para comparar tb. Cada patologia necessita de um tratamento diferente e nem todos utilizam medicações.
ão podemos confundir efeitos colaterais com sintomas. Efeitos colaterais são causados pelas medicações. Sintomas são causados pela própria patologia(com medicação ou não). Se reduzirmos os efeitos das quimios(medicações), poderemos diminuir junto seu efeito curativo. Melhor não fazer então!
O maior problema que encontramos no Brasil é a aprovação das medicações mais modernas e portanto, mais caras... Aí aparece a conversa do THC, mais barato né?
Vou te dar um exemplo bom. O Chá Verde, tão famoso, alguns estudos indicam que ele é perigoso, ele corta o efeito das quimioterapias(medicações) contra linfomas. O paciente pensa que alivia a dor, mas na verdade, cortou o efeito da medicação. MegLon

Oi MegLon, não entendi bem sua discordância. O meu ponto é que todas as drogas fazem mal, sendo usadas para fins medicinais ou recreativos. O que varia é o grau de nocividade de cada uma e - conforme a droga - o grau de dependência que provoca. Quem usa as drogas ilícitas não está buscando abreviar a vida e sim ter prazer. No caso da maconha, seu uso social é como o uso social da bebida. Ninguém se torna alcóolatra porque bebe uma cervejinha com os amigos, uma taça de vinho às refeições, uns drinks quando vai a uma festa. E para aquelas pessoas que começam a beber além da conta, a solução é tratamento e não cadeia. É o mesmo com a maconha. Custa menos caro, em todos os sentidos, a sociedade educar as pessoas sobre os perigos de cada droga e restringi-las do que criminalizá-las. O tabaco é um bom exemplo disso. As campanhas educativas e as restrições aos locais onde se pode fumar têm diminuído o número de fumantes, sem a necessidade de banir o cigarro. Educação sempre é melhor que repressão.

Oi querida, fica dicifil mesmo responder aqui. Masss vou tentar...
Minhas colocações foram quanto aos argumentos e comparação dos males das drogas licitas(medicações) x THC(utilizado para fins medicinais). E a mesma comparação das drogas ilícitas com a licitas.
Com seus argumentos chegamos a um denominador comum que todas as drogas geram patologias ou são necessárias para o controle delas(patologias). Certo? Vc propõe uma solução que é a Educação. Vamos lá então...
Drogas fazem mal = Todas
Uso = fins medicinais ou recreativos? Ué, mas a educação não deveria impedir isso? São drogas que geram patologias, deveriam servir como diversão?
Uso social da maconha não é igual ao uso do alcool, quem usa alcool não obriga o outro a fazer uso da fumaça que passou por dentro do organismo do fumante(cigarro ou macanho) e foi expelida. Mas entendo que o dano seja igual, geram patologias.
Existe uma classificação cientifica para o que alcoolismo diferente do que vc colocou em seu texto. Pelo que me lembro beber todos os dias, mesmo que seja 1 latinha de cerveja/copo de vinho já é considerado alcoolismo. Poderemos tirar a duvida com um especialista...
E para aquelas pessoas que começam a beber além da conta, a solução é tratamento e não cadeia. É o mesmo com a maconha. Custa menos caro, em todos os sentidos, a sociedade educar as pessoas sobre os perigos de cada droga e restringi-las do que criminalizá-las. "
Para isso também já existe diferença no Código penal e nas penas aplicadas para traficantes e para usuários em nossa legislação, a descriminalização só beneficiará o traficante.
Se nem mesmo com as leis respeitam, quem dirá respeitar a péssima educação que temos no Brasil? As próprias Universidades são berços do estimulo ao uso das drogas... E tudo isso tem um custo que é a uma sociedade psicologicamente doente, tanto pela violência gerada por essas drogas que retiram a capacidade de decisão e raciocínio do ser humano. Quem os impulsionam a atitudes desumanas e degradantes. Quanto pela demanda gerada ao sistema de saúde que não suportará bancar tudo o que virá pela frente com a legalização. Isso é sonho do FHC que não vive o dia a dia do SUS. MegLon

MegLon, eu não disse que todas as drogas causam patologia. Disse que todas tem um grau de nocividade e - conforme à substância que as compõe - podem causar dependência. Há diferença entre grau de nocividade e patogenia. Exemplo, 3 cafezinhos por dia dificilmente provocarão alguma doença. Mais que isso a cafeína começa a agredir o estômago. Dependendo da quantidade que a pessoa ingere pode gerar uma gastrite, depois uma úlcera. A cafeína, contudo, não é criminalizada por isso. O mesmo com o álcool, como citei. E o bebedor social é o que bebe eventualmente, não todos os dias. Se bem que, os médicos recomendam tomar uma taça de vinho tinto diariamente.
Então, o fumador social é como o bebedor social: a nocividade de seu hábito é muito pequena para compensar a criminalização. Por isso mesmo, acho que, no caso da maconha, não haverá maior sobrecarregamento do sistema de saúde em decorrência de problemas causados por ela. E, no caso dela, o ideal seria descriminar e legalizar.
Por fim, obviamente a liberação da maconha tem que vir acompanhada das condições de uso, da mesma forma que ocorre hoje com o tabaco. E da mesma forma que já ocorre com o tabaco, as pessoas devem ser informadas sobre os possíveis potenciais de dano à saúde causados pela cannabis.
Não tenho simpatia nem por tabagistas nem por maconheiros, mas melhor que comprem seus produtos no supermercado do que nas bocas de fumo da vida, onde ajudam a manter os narcotraficantes que afetam a vida de todos nós.

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