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quinta-feira, 7 de abril de 2022

Capacitação em tecnologia para mulheres

Crédito: site do Laboratoria
Entidades como Laboratória e Letscode (Devel{Elas}} dão cursos gratuitos para corrigir desigualdade no setor, onde mulheres são apenas 23%; empresas como Itaú, iFood e Nubank dão empregos

Nos últimos dois anos, intensificou-se o número de cursos que capacitam profissionais nas diversas de tecnologia. Como forma de combater o déficit do segmento feminino, programas abriram caminho para que mulheres pudessem se recolocar no mercado de trabalho. Passadas as primeiras edições dessas iniciativas, contamos as histórias de duas mulheres que terminaram suas formações e buscaram a ponte com o primeiro emprego na área.

O mercado da tecnologia vem sendo movimentado por instituições como LaboratóriaProgramaria e Let’s Code que sozinhas ou em parceria com grandes empresas, como Oracle, TIM, Ifood, Nubank e Itaú, formam profissionais para atuar no mercado, muitas vezes, de forma gratuita. Além da capacitação técnica, programas como esses evidenciam o interesse do mercado em não só formar profissionais de tecnologia, como uma preocupação com a diversidade e inclusão, uma vez que há foco em grupos discriminados como mulheres e pessoas negras.

Segundo a Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação e de Tecnologias Digitais (Brasscom), a projeção é de um déficit anual de 106 mil profissionais até 2025. Em relação ao sexo, um levantamento realizado pela plataforma de empregos Catho mostrou que a presença de mulheres na área é de 23,6%, sendo que mulheres são 52% da população brasileira.

Carolina Daniel buscou a área da tecnologia aos 29 anos. Enquanto cuidava da filha recém-nascida, ela fez cursos na área. Foto: Taba Benedicto/Estadão
Formação com salário e benefícios

O primeiro emprego de Carolina Daniel na área da tecnologia começou efetivamente há uma semana. Aos 29 anos e com a carreira voltada para a área de humanas, como arquiteta e atriz, a alternativa da tecnologia surgiu durante a pandemia, enquanto cuidava da filha recém-nascida.
Com um bebê de colo, eu me senti muito à mercê da maternidade, muito focada nela. Bebês crescem rápido e você pensa que não está fazendo nada com a sua vida, então comecei a ficar muito aflita com a minha carreira. Meu marido, que já era área de tecnologia, me indicou alguns cursos e eu resolvi fazer. Me senti intelectualmente estimulada, ainda que eu estivesse só pensando em mamadas e fraldas”, conta.
Depois de alguns cursos livres, ela encontrou a escola de desenvolvedores Let’s Code e participou de dois programas de formação e contratação. O modelo de trabalho deles é baseado em parceria com empresas: a escola ensina programação gratuitamente para alunos selecionados e a organização patrocinadora do programa contrata alguns formandos.

Ao longo de três meses, Carolina aprendeu uma formação básica em dados, além de soft skills necessárias para o mercado de trabalho. Durante o tempo de curso, ela e os outros 35 selecionados já foram contratados pelo Itaú e passaram a receber salário e benefícios, enquanto se formavam. Ao término da capacitação, e já tendo feito entrevistas com diversas áreas dentro do banco, ela foi designada ao cargo de engenheira de dados júnior.

Com pouco tempo de experiência, Carolina entende que o seu maior desafio daqui para frente é entender o seu momento de mercado, principalmente considerando a maternidade e a transição de carreira.
Eu vejo muita gente entrando na tecnologia com 20 anos. O meu chefe mesmo tem 29, a mesma idade que eu. Eu estou em um outro momento da vida. Eu tenho uma casa para administrar, nove gatos, um cachorro, uma filha e uma família. Estou fazendo um movimento muito agressivo de carreira, indo do 8 ao 80 em um ano. Então, vou ter que correr atrás. Ao mesmo tempo, eu sei que eu trago uma bagagem comigo que ninguém mais tem, de alguém que passou por vários momentos da vida”, conta.
Alternativa ao desemprego

O desemprego durante a pandemia foi o pontapé para Ana Beatriz Costa, de 28 anos, conseguir se profissionalizar na área de tecnologia. Graduada em recursos humanos, sua experiência profissional passava longe da área de exatas: trabalhou em loja, foi massoterapeuta e entrevistadora do Cadastro Único (plataforma em que famílias acessam benefícios sociais do Governo).
 
Ana Beatriz Costa, de 28 anos, se profissionalizou na área de tecnologia devido ao desemprego na pandemia. Foto: Autorretrato
Parada em casa, ela lembrou que gostava muito de mexer com a linguagem html quando era adolescente.
Eu passava horas no Tumblr (plataforma de blogging) brincando com html. Por que não transformar esse gosto em tecnologia em uma carreira?”, diz.
Ela estudou sozinha por conteúdos no Youtube e fez cursos livres de uma semana de duração, até que conheceu a Laboratória, edtech que forma mulheres para reduzir o déficit dessas profissionais na tecnologia. Depois de seis meses de curso, se formou e conseguiu uma vaga como analista de dados júnior no Banco Next.

Hoje, já no mercado, diz que o maior desafio é seguir estudando novos conceitos.
Como eu entrei em uma área nova, eu preciso entender os conceitos que eu uso. A Laboratória me deu o conceito, mas o foco é em autoaprendizagem, então eu comecei do zero”, conta.
Para quem quer entrar no mercado da tecnologia, o conselho de Ana Beatriz é acreditar que é possível.

Não é tão difícil quanto parece. Muitas empresas têm aberto vagas procurando profissionais que estão na transição de carreira. A área de tecnologia pode não ser fácil, mas é acessível. A gente consegue conteúdo com uma certa facilidade na internet”, aconselha.

Quem são os empregadores?

Agora  empresas de diferentes segmentos e portes têm desempenhado papel importante na contratação dos profissionais de tecnologia, como iFood, Creditas, Accenture e NuBank, com destaque para bancos e fintechs (tecnologia e inovação aplicadas na solução de serviços financeiros).

Para debater assuntos de Carreira e Empreendedorismo uma dica é o perfil "estadão carreira e empreendedorismo", no Telegram, pelo seguinte link ou digitando @gruposuacarreira na barra de pesquisa do aplicativo.

Cursos de Programação

Laboratória: As inscrições para a 8ª edição do bootcamp de programação estão abertas até 15 de maio, pelo site. O curso é online e gratuito, mas, após a conclusão e a entrada no mercado de trabalho, as profissionais devem pagar uma parte do custo total do curso para financiar os estudos de outras mulheres. Os requisitos são: ser mulher, maior de 18 anos, viver no Brasil e ter cursado o Ensino Médio em escola pública ou particular com bolsa integral por critério de renda, além de ter disponibilidade para se conectar de segunda a sexta, no período da tarde.
Lets’ Code: A escola não é voltada apenas para mulheres, mas há processos focados na participação feminina e em maiores de 40 anos. Não há nenhum programa com inscrições abertas no momento, mas os interessados podem acompanhar novas aberturas no site do projeto.
Programaria: Com o slogan "empoderar mulheres através da tecnologia diminuindo o gap de gênero no mercado de trabalho, é isso que fazemos.", a programaria oferece curso on line de programação

Com informações de Mulheres se capacitam em tecnologia e trocam de profissão na pandemia, por Marina Dayrell, O Estado de S.Paulo, 26/ 03/2022 


terça-feira, 8 de outubro de 2019

História do Outubro Rosa, a campanha de prevenção ao câncer de mama


Campanha surgiu em 1990 em Nova York (EUA)
O movimento popular internacionalmente conhecido como Outubro Rosa é comemorado em todo o mundo. O nome remete à cor do laço rosa que simboliza, mundialmente, a luta contra o câncer de mama e estimula a participação da população, empresas e entidades. Este movimento começou nos Estados Unidos, onde vários Estados tinham ações isoladas referente ao câncer de mama e ou mamografia no mês de outubro, posteriormente com a aprovação do Congresso Americano o mês de Outubro se tornou o mês nacional (americano) de prevenção do câncer de mama.

A história do Outubro Rosa remonta à última década do século 20, quando o laço cor-de-rosa, foi lançado pela Fundação Susan G. Komen for the Cure e distribuído aos participantes da primeira Corrida pela Cura, realizada em Nova York, em 1990 e, desde então, promovida anualmente na cidade (www.komen.org). 

Em 1997, entidades das cidades de Yuba e Lodi nos Estados Unidos, começaram efetivamente a comemorar e fomentar ações voltadas a prevenção do câncer de mama, denominando como Outubro Rosa. Todas ações eram e são até hoje direcionadas a conscientização da prevenção pelo diagnóstico precoce. Para sensibilizar a população inicialmente as cidades se enfeitavam com os laços rosas, principalmente nos locais públicos, depois surgiram outras ações como corridas, desfile de modas com sobreviventes (de câncer de mama), partidas de boliche e etc. (www.pink-october.org).

A ação de iluminar de rosa monumentos, prédios públicos, pontes, teatros e etc. surgiu posteriormente, e não há uma informação oficial, de como, quando e onde foi efetuada a primeira iluminação. O importante é que foi uma forma prática para que o Outubro Rosa tivesse uma expansão cada vez mais abrangente para a população e que, principalmente, pudesse ser replicada em qualquer lugar, bastando apenas adequar a iluminação já existente.

Obelisco do Ibirapuera
A popularidade do Outubro Rosa alcançou o mundo de forma bonita e elegante, motivando e unindo diversos povos em em torno de tão nobre causa. Isso faz que a iluminação em rosa assuma importante papel, pois tornou-se uma leitura visual, compreendida em qualquer lugar no mundo.

No dia 02 de outubro de 2002, houve participação brasileira na campanha do Outubro Rosa, com a iluminação em rosa do monumento Mausoléu do Soldado Constitucionalista (mais conhecido como o Obelisco do Ibirapuera), situado em São Paulo-SP quando da comemoração dos 70 Anos do Encerramento da Revolução Constitucionalista. Desde então, outras iniciativas do gênero se sucederam com o envolvimento de governos, organizações não-governamentais, empresas e da sociedade civil nas mais variadas iniciativas de prevenção ao câncer de mama.

Como não poderia deixar de ser, neste ano de 2019, não faltam iniciativas para a campanha do Outubro Rosa. Seguem mais informações. 


Outubro Rosa: Sesc realiza mutirão da mamografia em todo o Brasil 

Outubro Rosa 2019: mensagens e notícias importantes sobre o câncer de mama

Campanha 'Outubro Rosa' alerta sobre a importância do diagnóstico precoce

Tipos de câncer | INCA - Instituto Nacional de Câncer

Com informações de outubrorosa.org

terça-feira, 28 de maio de 2019

O canal digital Univesp TV está oferecendo aulas de Ciência Política e Políticas Públicas gravadas na USP

Ciência Política

A Univesp Tv é um canal brasileiro de São Paulo. A programação inclui vários conteúdos acadêmicos e programas para toda a família.

Os vídeos são gravados nas seguintes universidades Univesp, USP, Unicamp e Unesp.

Sobre o curso: Programa do curso USP Univesp TV de Ciência Política. É um curso regular de pós-graduação, ministrado pelo professor José Álvaro Moisés, do departamento de ciência política da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo.



Conteúdo programático:

• Introdução;
• Cultura política e instituições democráticas;
• Primado da lei;
• Accountability;
• Modernização, cultura política e instituições;
• Análise Brasil;
• Sistema político e presidencialismo;
• Balanço geral.

Acesse aqui todo o curso de Ciência Política 

Políticas Públicas

Pensando nos estudantes de todo país, a plataforma Univesp TV, oferece aulas gravadas sobre Políticas Públicas, que é uma das matérias do curso de Gestão Pública.


Conteúdo programático

• Apresentação da disciplina;
• Políticas Públicas;
• Reforma do Estado;
• Tipos e Ciclo;
• Atores de Políticas Públicas;
• Métodos de monitoramento e avaliação de Políticas Públicas;
• Estruturas de Governança Pública;
• Planejamento de Políticas Públicas no Brasil.

Acesse aqui todo o curso de Políticas Públicas 

quinta-feira, 25 de abril de 2019

A divisão de cores de meninos e de meninas é uma invenção histórica e não algo natural

Wendy e Peter Pan vestidos de azul e rosa — Foto: Reprodução
Rosa nem sempre foi 'cor de menina' - nem o azul, 'de menino'

Pesquisadora americana explica que a divisão de gênero das cores é uma construção social. 'Assim, também é errada a ideia de que se você não tratar as crianças segundo um estereótipo de gênero elas vão crescer confusas, serão pervertidas, vão se tornar homossexuais, transgênero. Não há nenhuma evidência disso'.
A regra geralmente aceita é que rosa é para os meninos, e azul para as meninas. O motivo é que o rosa, sendo uma cor mais decidida e forte, é mais apropriado para meninos. Enquanto o azul, que é mais delicado e gracioso, é mais bonito para a menina."
O parágrafo acima foi publicado há cem anos, em 1918, por uma revista de moda infantil americana, a Earnshaw, voltada para profissionais da área. Foi encontrado por Jo Paoletti, professora emérita de Estudos Americanos na Universidade de Maryland, nos Estados Unidos, e autora do livro Pink and Blue: Telling the Boys from the Girls in America (Rosa e Azul: Distinguindo Meninos de Meninas nos Estados Unidos).
(Encontrar essa frase) virou minhas suposições de cabeça para baixo", lembra a pesquisadora, em conversa com a BBC News Brasil. Afinal, o rosa nem sempre havia sido uma cor de menina, nem o azul cor de menino.
A ideia de que há algo natural e permanente sobre o uso de rosa para as meninas e azul para garotos é historicamente errada", diz Paoletti.
Assim, também é errada a ideia de que se você não tratar as crianças segundo um estereótipo de gênero elas vão crescer confusas, serão pervertidas, vão se tornar homossexuais, transgênero. Não há nenhuma evidência disso. Não é dos estereótipos de gênero que nasce a identidade homossexual ou trans."
O uso de rosa ou azul mobilizou as redes sociais brasileiras em janeiro deste ano, chegando ao topo de assuntos mais comentados no Twitter. O motivo foi a divulgação de um vídeo de Damares Alves, a primeira ministra a ocupar a pasta de Mulher, Família e Direitos Humanos - criada por Jair Bolsonaro, em substituição ao Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos do governo de Dilma Rousseff.
Atenção, atenção! É uma nova era no Brasil. Menino veste azul e menina veste rosa!", fala Damares Alves no vídeo. A frase foi acompanhada em coro por apoiadores. Em seguida, todos pularam em comemoração - inclusive a ministra, nitidamente empolgada.
O contexto da frase é a intenção do novo governo de combater a chamada "ideologia de gênero". O termo, que não é reconhecido por estudiosos, foi popularizado por segmentos contrários à ideia de que gênero é uma construção social e, portanto, não está restrito ao sexo biológico de uma pessoa.
Fiz uma metáfora contra a ideologia de gênero, mas meninos e meninas podem vestir azul, rosa, colorido, enfim, da forma que se sentirem melhores", disse a ministra, após a reação das redes sociais, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo.
Vestidos brancos para bebês e azul feminino em alusão à Virgem Maria

A divisão de cores de meninos e de meninas é uma construção social recente, explica Paoletti.
Cem anos atrás, os bebês usavam vestidos brancos, independentemente do sexo da criança. Essas roupas brancas eram mais fáceis de serem mantidas limpas, porque podiam ser fervidas", diz ela. Além disso, era mais fácil trocar a fralda de um bebê de vestido do que com calças.
Quando as cores foram introduzidas no vestuário infantil, tinham tons pasteis, mas não importava se era rosa ou azul. Geralmente, eram escolhidas de acordo com o tipo físico da criança. Era muito comum ver bebês de olhos azuis vestindo azul. E bebês de olhos castanhos vestindo rosa. As pessoas achavam que combinava mais", continua Paoletti.
O uso das cores também variava de acordo com a região, explica a pesquisadora.
Em alguns países católicos, era comum encontrar o uso de azul para meninas, porque o azul era associado à Virgem Maria. Em outros locais católicos, como França e Bélgica, o primeiro filho costumava ser dedicado à Virgem Maria e vestido de azul, fosse menino ou menina."
Mais recentemente, o uso de rosa para meninas e azul para meninos se tornou padronizado em todo o Ocidente. Como isso ocorreu? Uma das explicações é que o padrão teria sido criado pela indústria da moda americana e se espalhado para outros países.

O professor de psicologia da Universidade do Novo México, Marco Del Giudice, analisou as ocorrências de rosa e azul para meninos e meninas em uma base de dados de milhões de livros, publicados a partir de 1880. Segundo ele, as referências a "rosa para meninas" começaram a ser mais abundantes a partir do final da Segunda Guerra Mundial, na década de 1940.

Além disso, outros simbolismos de gênero entraram na moda infantil, como laços e corações para meninas, aviões e bolas para meninos.

Antes, o que definia a moda infantil era a praticidade, a conveniência. Agora, as pessoas estão mais interessadas em garantir que seu filho pareça com o estereótipo de um menino", diz Paoletti.

Meninas preferem rosa? Ciência diz que não

Um estudo de 2011 publicado pela Sociedade de Psicologia Britânica analisou a preferência de cor de bebês e crianças com idades entre 7 meses e 5 anos. Cada criança recebeu um par de objetos, um com a cor rosa e o outro com uma segunda cor. Os pesquisadores, então, observaram qual era a preferência ou rejeição pelos objetos rosas.

O resultado foi que, com até um ano de idade, meninas e meninos escolheram objetos cor-de-rosa de forma semelhante. Ou seja, não havia uma preferência de um sexo ou do outro pela cor.

Já aos dois anos, as meninas passaram a preferir o rosa um pouco mais frequentemente que os meninos. E, a partir de dois anos e meio, a preferência por rosa despontou nas meninas, ao mesmo tempo que a rejeição ao rosa prevaleceu entre meninos.

Segundo as pesquisadoras, a preferência pelo rosa nessa idade pode ser explicada pela identificação de gênero que é dada pelos adultos e acaba absorvida pelas crianças.
As descobertas vão na contramão da sugestão de que as preferências de cor podem ter uma base biológica. Alguns pesquisadores propuseram que há mais vantagem evolutiva para mulheres que são atraídas por cores de frutas, como o rosa. Mas, se as mulheres tivessem uma predisposição biológica ao rosa, então isso seria evidente independentemente da aquisição de conceitos de gênero".

Fonte: BBC, 04/01/2019

Rosa para meninas e azul para meninos: a divisão nem sempre foi essa
 Foto: shutterstock.com/Natalya Lys
Entenda: como o rosa se tornou 'cor de menina' e o azul, 'de menino'
Registros históricos mostram que a afirmação da ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, parte de uma construção social; no início do século passado, a escolha dos tons era outra

RIO — O azul não foi sempre considerado uma "cor de menino"; nem o rosa, "de menina". De fato, até o início do século passado, era o contrário. O rosa era a cor masculina por sua semelhança ao vermelho e ao sangue, passando a ideia de "força". O azul, por sua vez, tinha como mensagem a "delicadeza".

Autora do livro "Pink and Blue: Telling the Girls from The Boys in America" (em tradução livre, "Rosa e Azul: diferenciando meninas de meninos dos EUA"), a historiadora Jo B. Paoletti afirma que, até a Primeira Guerra Mundial, prevaleciam os tons pastel.
 "A partir daí, o rosa passou a ser uma cor associada à masculinidade, era um vermelho aguado", escreve ela em seu site. "Em 1914, o'Sunday Sentinel', um jornal americano, aconselhou as mães a "usarem rosa para o menino e azul para a menina, se a pessoa fosse uma seguidora de convenções".
Em 1927, a revista americana Time questionou lojistas sobre que cor eles associavam a cada sexo, mas não houve consenso sobre o resultado.

Segundo Paoletti, a mudança para rosa para meninas e azul para meninos aconteceu somente após a Segunda Guerra Mundial.
                                                                            
Além disso, em meados da década de 1980, a ultrassonografia passou a apontar o sexo do bebê, fazendo com que os pais começassem a montar o enxoval das crianças comprando as roupas de acordo com a cor que associavam a meninos e meninas. Até então, usava-se principalmente o branco. Foi nesse momento que o mercado, de modo definitivo, selou a "divisão" entre essas cores.

Pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia, Bila Sorj considera que, mesmo com a transição das cores, a ideia transmitida pelo mercado permaneceu a mesma.
A cor é arbitrária, porque ainda considera-se, desde o início da História do consumo, que as meninas devem ser associadas à delicadeza e fragilidade, e os meninos, à força e a atividades vibrantes.

Para a jornalista Daniela Tófoli, autora do livro Pré-adolescente: um guia para entender o seu filho, a polarização entre azul e rosa está cada vez mais questionada.

Muitos pais estão optando por não saber o sexo dos bebês e preparam enxovais com cores como laranja e roxo — conta. — Também vejo crianças que não se encaixam neste modelo de mercado. Minha filha tem 9 anos e sua cor preferida sempre foi azul. É a cor que ela escolheu para a parede de seu quarto. Tivemos dificuldades em encontrar uma mochila azul sem temas masculinos. Por que a princesa tem que ser rosa ou lilás? E por que os pais devem se sentir incomodados se veem seus filhos estão com brinquedos rosas?
Fonte: O Globo, por Renato Grandelle, 03/01/2019 

terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

Mulheres com a mão na (arga)massa ensinam como reformar e pintar sua casa


Quem são as youtubers que empoderam mulheres na construção civil.
As minas que usam o YouTube para ensinar a assentar azulejo e rebocar parede 

A primeira vez que Paloma Cipriano trabalhou com argamassa na vida foi aos 16 anos de idade. A menina de Sete Lagoas, em Minas Gerais, estava cansada. Não aguentava mais ver sua casa em obras. O local estava em construção desde que havia nascido e sua mãe não conseguia dar sequência aos reparos. Foi aí que Paloma decidiu ajudar. Mais que acostumada a viver sem uma figura masculina — nunca viu a cara do pai —, a jovem não esperou pedreiro algum para meter a mão na argamassa.

Inscreveu-se em um curso de alvenaria, pesquisou o que precisava na internet, instalou o piso do seu quarto e não parou mais. Sete anos depois, Paloma segue reformando a casa. Só que agora filma e compartilha o que sabe com outras pessoas. A jovem de 23 anos é uma força na web, principalmente para as minas. Mostra que elas não precisam depender de pedreiro nenhum.

Paloma não é a única. Além do seu canal no YouTube, não faltam iniciativas empoderadoras. São diversos os canais, coletivos e produtoras de conteúdo que seguem a ascendente linha do faça você mesmo, também conhecido por do it yourself e bricolagem. Mesmo assim, a mineira segue uma temática nem tão explorada por outras garotas. Ela se especializou em construção civil, e a resposta tem sido ótima. São 100 mil inscritos em seu canal.
Vejo o pessoal falar que é diferente uma menina assentando cimento. Para mim, é normal. Sempre fiz na minha casa", conta.

Quem acessa os seus vídeos encontra de tudo: "como aplicar massa corrida", "como assentar azulejo", "como rejuntar piso" e muito mais. Seu vídeo mais assistido, "como rebocar parede", tem mais de 2 milhões e 300 mil visualizações.
Esse vídeo ainda faz muito sucesso. Depois de um tempo comecei a receber mensagens de mulheres que estavam reproduzindo em suas casas. Me inspirou a continuar gravando", diz.
A resposta positiva fica ainda mais clara nos comentários dos vídeos no YouTube. Apesar dos dizeres machistas e misóginos, não faltam mulheres expressando o apreço pelo trabalho que realiza.
Talvez não tenha noção de quanto isso muda a vidas das pessoas. Mas fico feliz e surpresa pelos comentários que recebo."
Sobre o seu feminismo, no entanto, Paloma afirma estar digerindo a informação que recebe. Sente-se orgulhosa por ajudar "mulheres que antes esperavam o marido para fazer uma coisa e agora não esperam mais".
Isso não vai fazer com o que o mundo mude, mas pode ajudar um pouquinho. Só de algumas mulheres sentirem vontade de tomar à frente o que antes era quase que completamente feito por homens eu já me sinto feliz", conta.
 Animada com a resposta, hoje foca toda a sua atenção no canal. Largou o estágio para produzir mais vídeos e já conta com alguns patrocinadores. "Agora quero terminar a reforma em casa", diz.

Faça você mesma

Na mesma pegada de Paloma também está bombando o canal Diycore, criado por Karla Amadori, catarinense de Lebon Régis. Mais fiel ao estilo faça você mesmo, Karla ensina seus mais de 500 mil assinantes a fazer uma porrada de coisa. Desde pintura básica e baús estofados até racks e painéis de madeira.

Formada em design de interiores, a jovem teve a ideia do canal em 2015, quando quis reformar seu quarto. A ideia era fazer um rack com caixotes de feira, mas não sabia nem como começar. Foi ao YouTube em busca de ajuda para o manuseio de ferramentas e não achou nada muito específico sobre os tais caixotes. Quando foi montar a peça decidiu gravar e publicar no site. O vídeo bombou — hoje conta com mais de 1 milhão de visualizações — e o sucesso a fez lançar o canal.

Com a resposta positiva do primeiro vídeo, ela começou a gravar outros trampos, tipo construir o armário do seu quarto e os móveis que queria colocar lá. Logo de cara, várias mulheres começaram a se manifestar sobre o conteúdo do canal: as minas adoraram e começaram a sugerir outros temas.


Karla também diz que não iniciou o seu projeto com o pleno objetivo de ajudar outras mulheres a se sentirem mais seguras para adentrar na área de marcenaria e decoração. Foi natural.
Quando viram uma mulher mexendo com ferramentas, fazendo o que na grande maiorias das vezes é feito por homens, elas se inspiraram. Fui alimentando essa coragem e hoje muitas falam que que querem encarar esses desafios", conta.

Nos seus comentários também não faltam mulheres de diferentes idades agradecendo as dicas. O Diycore, curiosamente, também é um puta sucesso entre os homens. Segundo Karla, eles já começam a crescer e muito nos comentários dos vídeos.
Mulher predomina um pouco mais, mas agora está bem masculino. Não sei se eles são mais quietos e só comentam depois de assistirem vários vídeos, mas sei que é um público que cresce."
Independentemente de quem é maioria, Karla está feliz em incentivar pessoas a colocarem a mão na massa.
Elas se sentem capazes de fazer e produzir e isso é muito legal da corrente faça você mesma", diz.
Ela também recebe contato de gente do Brasil inteiro para mostrar a sua influência na vida delas.
Recebo mensagem de mulher que não tinha coragem de mexer em nada e agora se sente mega feliz ao instalar um chuveiro ou pintar uma parede. Isso é muito bom. Estão se inspirando no meu trabalho."
Por que uma mina não sonha em ser marceneira quando criança?

Por causa de mulheres como Paloma e Karla, o YouTube está chamando a atenção de iniciativas como a Lumberjills, uma marcenaria fundada e tocada por duas minas feministas que lutam para mostrar que não há profissão que elas não possam dominar. O curioso é que a empresa não nasceu com o intuito de ser feminista. Tornou-se depois de tanto machismo e assédio que as fundadoras sofreram dentro do setor.

Criado pelas paulistanas Leticia Piagentini e Fernanda Sanino, o negócio se especializou em marcenaria customizada. O cliente pede e as minas fazem. As duas largaram tudo para abrir o negócio. Elas nunca tinham trampado com marcenaria antes na vida. Tinham na conta um curso básico e a vontade de abrir um negócio juntas. Encararam o machismo em suas tradicionais famílias italianas, que não viram sentido em duas mulheres bem-sucedidas largarem tudo para construir móveis, e meteram a cara a pau.
A gente não começou na militância, mas em pouco tempo deu pra perceber o quanto ela seria importante. Começamos a sofrer muito preconceito entre família e amigos e vimos que a empresa tinha que abraçar essa bandeira", diz Fernanda.
Além do núcleo familiar, ela fala que o foda é ainda ter que lidar com o machismo do setor, mesmo depois de três anos de empresa.
Quero um dia falar que sou marceneira e não causar espanto em ninguém", conta.
Menos pior seria se fosse só o espanto. Fernanda conta que já passou por situações de assédio assustadoras. Uma vez, quando foi realizar o trabalho em um imóvel, se viu sozinha junto com outros 20 homens trabalhando na reforma da casa. Em pouco tempo, pelo menos 15 deles pararam seus trabalhos para assistir a marceneira realizar o seu.
Em um quarto fechado, com esse bando de cara encarando. Eu tava fazendo uma cabeceira e os caras começaram a falar de usar a cama. Foi horrível. Eu estava completamente rendida. Não aguentei, saí para almoçar e pedi para retornar um dia que não tivesse mais ninguém trabalhando na casa", diz a jovem.

Mesmo assim, Fernanda está muito feliz com o sucesso do negócio. E mais contente ainda com o impacto entre as mulheres. "O mundo está mudando. Devagar, mas está. Estamos lutando contra o machismo. E o nosso trabalho vai mostrar que as mulheres podem ser marceneiras se elas quiserem." E é exatamente por isso que elas já começam a dar seus passos no YouTube. O canal da Lumberjills já conta com alguns vídeos próprios. 

A dupla diz que falta tempo para fazer mais vídeos. Passam o dia inteiro na oficina trabalhando nos pedidos dos seus clientes. Mesmo assim, acreditam no empoderamento que passam quando compartilham conhecimentos específicos como os que têm.
A gente quer muito produzir mais desse conteúdo. Já compramos a câmera e temos uma parceira para editar os vídeos. Queremos fazer a mulherada colocar a mão na massa", diz. Além disso, a empresa também realiza aulas para mulheres que querem aprender sobre o setor. "Estamos fazendo de tudo para as minas quebrarem essa barreira e entrarem no mercado. Afinal, por que uma menina não sonha em ser marceneira quando é criança? Está na hora disso mudar."
Fonte: Motherboard, por Rennan A. Julio, 31/03/2017

Publicado originalmente em 24 de abril de 2017

segunda-feira, 26 de novembro de 2018

Escola Sem Partido: projeto mal formulado, ineficaz, paranoico e obscurantista


Com a chegada de Bolsonaro à presidência, um dos grupos mais reacionários e obscurantistas que compõe a colcha de retalhos de seu governo, o tal Escola Sem Partido, está mais do que saidinho tentando emplacar sua visão fascistoide à educação brasileira sob a desculpa de impedir a doutrinação de esquerda nas escolas. O projeto está em discussão na Câmara Federal num cabo de guerra entre os obscurantistas que querem legalizar a ilegalidade e os professores e outros iluministas que a eles se opõem.

Desde que me inteirei dessa estrovenga macartista, passei a escrever sobre ela e a reproduzir artigos que também analisam o assunto. Vejam abaixo:




A coisa é tão absurdamente antidemocrática que até o ogro ultraconservador do Olavo de Carvalho se pronunciou contra ele (ver vídeo abaixo).

Reproduzo, agora, mais um texto e vídeo sobre assunto do comentarista da Jovem Pan Joel Pinheiro

Há doutrinação nas salas de aula?

Existe, de maneira geral, um viés ideológico na educação brasileira. Quem nunca teve um professor de esquerda? Eu tive vários, e dos que traziam suas convicções políticas para a sala de aula.

Alguns foram do perfil autoritário, que desestimulava o debate e exigia que os alunos “esquerdassem” na prova. Já outros foram professores incríveis, que estimulavam a discussão e incitavam os alunos a pensar por conta própria. A crença política era o material que animava o debate. Fui doutrinado? Se fui, não funcionou.

E eis que esse fato corriqueiro do nosso sistema —muitos professores serem de esquerda— virou o grande bode expiatório da precariedade de nossa educação.

Ninguém se preocupou em medir e conhecer a real extensão da tal doutrinação em sala de aula; mas os proponentes do projeto Escola Sem Partido (que se manifesta em diversas iniciativas e projetos de lei, uma das quais vem sendo debatida pelo Congresso) juram que se trata de um problema gravíssimo e que justifica colocar o Ministério Público para perseguir professores.

Não existe sequer um consenso mínimo do que seja “doutrinação”. Há todo um espectro de práticas que podem entrar na conta: desde um caso de abuso claro como o professor obrigar os alunos a fazer manifestação partidária para passar de ano, até práticas mais corriqueiras como usar um livro de autor “de esquerda” ou mesmo propor alguma análise que irrite algum pai de aluno.

Na prática, a corda está no pescoço de todos os professores, que foram eleitos os grandes inimigos infiltrados da família e da ordem social.

Uma coisa é certa: qualquer que seja a extensão da doutrinação, ela tem menos poder do que no passado. Nunca o professor teve tão pouco poder em sala de aula. Ele está francamente acuado.

Os alunos hoje têm acesso a internet; trazem smartphones para a sala, se informam em diversas fontes e contestam as informações do professor em tempo real. O professor tem hoje menos credibilidade que o grupo de WhatsApp.

O Brasil acabou de votar em peso em candidatos de direita. Se houver mesmo toda essa doutrinação, ela não está funcionando. E não há evidência nenhuma de que o posicionamento político dos professores tenha qualquer papel nos maus resultados educacionais no Brasil.

O Escola Sem Partido funcionará como uma mordaça aos professores, que se sentirão permanentemente vigiados e passíveis de punição se demonstrarem qualquer preferência ideológica e política.

Outro efeito, menos comentado, é eliminar a educação sexual das escolas, aumentando a proliferação de DSTs, a gravidez adolescente e a violência contra LGBTs, que já não é baixa.

É o resultado da ascensão de uma direita não particularmente esclarecida que, ao perceber a dominância do pensamento de esquerda entre os professores, em vez de focar formar professores melhores e aprimorar os atuais, trata a própria educação como atividade suspeita.

É uma pena estarmos discutindo um projeto mal formulado, ineficaz, paranoico e obscurantista como o Escola Sem Partido quando há tantas brigas e iniciativas a serem compradas na educação. Formar melhores professores, comprar melhores livros didáticos, formular regras para a distribuição do Fundeb, pesquisar metodologias de ensino mais eficientes etc.

Diante de um desafio tão grande e de uma lacuna histórica tão gritante, perder tempo com discussões ideológicas e ainda enfraquecer o agente central da educação, o professor, é um desrespeito a todos os jovens brasileiros.

Fonte: “Folha de S. Paulo”, 13/11/2018, por Joel Pinheiro da Fonseca

 

quarta-feira, 15 de agosto de 2018

Universidade de Tóquio baixou nota de mulheres em vestibular de Medicina

Diretor-geral da Universidade de Medicina de Tóquio, Tetsuo Yukioka,
 durante coletiva de imprensa. Foto: REUTERS/Toru Hanai
Faculdade japonesa baixou notas de mulheres em vestibular de Medicina
Segundo investigações, pontuação de homens era aumentada sob a justificativa de que as mulheres seriam mais aptas a deixar a profissão após terem filhos; advogados afirmam que prática durou cerca de dez anos

TÓQUIO - A Universidade de Medicina de Tóquio, no Japão, reduziu deliberadamente as notas de mulheres que prestaram seus exames de admissão durante ao menos uma década, disse uma comissão de investigação nesta terça-feira, 7. Segundo o grupo, a prática é um caso "muito sério" de discriminação. As autoridades da universidade negaram ter conhecimento das manipulações.

As alterações foram descobertas a partir de uma investigação interna realizada após alegações de corrupção na prova, que causou protestos e revolta. Advogados investigaram o caso do exame de admissão prestado pelo filho de um funcionário do Ministério da Educação e disseram ter concluído que sua nota, assim como a de vários outros candidatos, foi aumentada "injustamente". Em um dos casos, os investigadores apontaram 49 pontos de diferença entre o número real e o número inflado.

O grupo concluiu que as notas foram alteradas para dar mais pontos a homens do que a mulheres, diminuindo o número de mulheres aceitas. A justificativa seria o fato de que mulheres estão mais inclinadas a deixar a profissão depois de ter filhos ou por outras motivações. 
Esse incidente é realmente lamentável", disse o advogado Kenji Nakai, em entrevista coletiva. "Por meio de procedimentos de recrutamento enganosos eles tentaram iludir os inscritos, suas famílias, autoridades da escola e a sociedade como um todo." O inquérito demonstrou que as notas dos homens, incluindo alguns que anteriormente foram reprovados uma ou duas vezes, foram melhoradas, enquanto as notas de todas as mulheres e a de homens que haviam sido reprovados ao menos três vezes não foram. 
Os advogados disseram não saber quantas mulheres foram afetadas, mas afirmaram que a prática parece ter durado ao menos dez anos. Durante a entrevista, autoridades da universidade se culparam e se desculparam, prometendo estudar possíveis indenizações, mas não confirmaram estar a par dos casos de manipulação de notas. / REUTERS

Fonte: O Estado de S.Paulo, 07 Agosto 2018

sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Sem estereótipos de gênero, para que meninos e meninas possam desenvolver todo seu potencial

A pesquisadora Lise Eliot, autora do livro "Cérebro azul ou rosa" (Foto: Divulgação)
Particularmente, acho altamente especulativo qualquer argumento que tente atribuir caráter natural aos estereótipos de gênero. Para que a gente pudesse realmente saber se as diferenças biológicas entre mulheres e homens implicam diferenças comportamentais precisaríamos erradicar a educação diferenciada que adestra meninas e meninos de forma totalmente distinta. Se meninas e meninos são educados de forma totalmente diferente (e reprimidos caso saiam dos modelitos rígidos de mulher e homem estabelecidos pela sociedade), obviamente tenderão a se comportar de forma diferente. Para uma abordagem verdadeiramente científica, teríamos que analisar crianças criadas sem educação diferenciada por várias gerações (não adianta pegar um único exemplo historicamente recente e efetuado num único país). Enquanto isso não ocorre, qualquer tentativa de estabelecer relação intrínseca entre sexo e gênero é bem especulativa e suspeita de, na verdade, tentar renaturalizar os estereótipos sexuais. A neurocientista abaixo fica num meio termo, talvez porque acredite, como disse em uma de suas respostas, que é preciso ir devagar com o andor porque o santo é de barro:  
Como mãe, eu tentei quebrar o estereótipo de gênero tanto quanto possível. Mas você vai até onde é possível. As crianças pertencem a uma comunidade maior, e a definição de gêneros é muito importante na nossa sociedade. É um desafio. 
Um desafio que devemos enfrentar sempre. Uma sociedade sem estereótipos de gênero será mais livre, mais igualitária e produzirá gente mais sã. Não haveria transgêneros não fosse a educação desigual dada a meninas e meninos. Não haveria gente pensando que tem algo errado com seu próprio quando de fato errado foi o adestramento de gênero que receberam.


Lise Eliot: "Pais devem evitar rotular os filhos de acordo com o sexo”

Pesquisadora americana defende uma educação além dos estereótipos de gênero, para que meninos e meninas possam desenvolver todo seu potencial

Não existem tantas diferenças no cérebro de meninos e meninas quanto pensamos, mostram pesquisas científicas. Por que então pais e professores reforçam tanto as diferenças? Lise Eliot, neurocientista da Universidade de Medicina e Ciência Franklin Rosalind, em Chicago, nos Estados Unidos, diz que a distinção sexual é inevitável na nossa cultura, mas, em excesso, pode prejudicar o desenvolvimento pleno das crianças.
Para ser feliz na nossa sociedade, você precisa de uma boa mistura de traços tipicamente masculinos e femininos. Você precisa ser forte, assertivo, mas também precisa ser atencioso e sensível”, afirma Lise, autora do livro Cérebro rosa, cérebro azul, que foi lançado recentemente no Brasil. “Se apenas criarmos as crianças de acordo com estereótipos, eles não terão a oportunidade de desenvolver toda a gama de habilidades.”
Lise é formada pela Universidade de Harvard e tem PhD pela Columbia, além de pós-doutorado na Faculdade de Medicina de Baylor. É casada e tem três filhos, uma adolescente de 15 anos e dois meninos de 13 e 10 anos. Em entrevista a ÉPOCA, ela fala das reais diferenças entre os gêneros e dá dicas para não cair na armadilha de achar que garotas nunca serão boas em matemática, e que os garotos não podem ler e escrever tão bem quanto elas na escola.

ÉPOCA – Muito se fala sobre as diferenças entre homens e mulheres. Mas existem, de fato, grandes diferenças no cérebro de meninos e meninas?
Lise Eliot – É verdade que não identificamos muitas diferenças estruturais entre o cérebro dos meninos e o das meninas. As diferenças são muito sutis. Como eu destaco no livro, as principais diferenças psicológicas entre homens e mulheres não são programadas. Existe a noção popular de que homens e mulheres são programados para serem diferentes psicologicamente. Na verdade, não existem muitas evidências para isso. Particularmente no cérebro, muitas das habilidades que falamos – habilidades verbais, escritas, por exemplo – ão aprendidas. Nenhumas delas são traços de personalidade, estão presentes desde o nascimento. Todas são aprendidas. O melhor exemplo é a linguagem. 

ÉPOCA – A maioria das diferenças são culturais?
Lise – Penso que sim, mas não estou dizendo que 100% delas são culturais. Nós realmente temos evidência que a testosterona pré-natal de certa forma afeta o cérebro masculino promovendo uma maturação um pouco mais lenta e um nível maior de atividade, o que provavelmente se traduz em violência física. Mas estas são diferenças relativamente pequenas nas crianças, e elas se tornam muito maiores principalmente por causa da forma como tratamos meninos e meninas, da forma como eles brincam com seus amigos. Nós vivemos em uma sociedade muito segregada por gêneros. Crianças pequenas interagem pouco com crianças do outro gênero. Mesmo adultos, em nosso tempo de lazer, exceto com nossos cônjuges, não passamos muito tempo com pessoas de outro gênero. Com quem você se relaciona influencia no que você é bom. 

ÉPOCA – Quais são as principais diferenças?
Lise – As meninas são mais maduras que os meninos fisiologicamente. No nascimento, a diferença é de cerca de duas semanas. Nós sabemos que meninas falam mais cedo que os meninos. Elas dizem as primeiras palavras, em média, um mês mais cedo que eles. Então é uma diferença enorme. É uma diferença estatística e você precisa avaliar centenas de crianças para encontrar a diferença. Há exceções, claro. Na minha família, tenho uma menina e dois meninos. Meu filho mais velho falou mais cedo que os demais. Os meninos são mais ativos, eles correm mais do que as garotas. Mas não há diferenças em relação a isso na fase da gestação. Muitas pessoas pensam que os bebês que se movem mais podem ser meninos, mas isso não é verdade. Depois do nascimento, no primeiro ano de vida há uma pequena diferença no nível de atividade. Depois do primeiro aniversário, e principalmente quando eles têm dois ou três anos, meninos são mais ativos fisicamente. Estatisticamente, o menino médio é mais ativo que dois terços das meninas. Isso significa que a menina média é mais ativa que um terço dos meninos. 

ÉPOCA – Quais são os mitos em torno de como as meninas “são”?
Lise – Entres os mitos, podemos citar o de que as meninas não são tão agressivas ou competitivas. Isso é totalmente inverídico. O que ocorre é que as meninas aprendem a fazer isso de forma mais secreta. Outro mito é que os meninos são menos emotivos e afetuosos, e não conseguem demonstrar muita empatia. Isso não é verdade. Meninos aprendem a não chorar, eles aprendem a parecer durões, especialmente se convivem apenas com outros meninos. A cultura masculina tende a suprimir emoções masculinas e a sensibilidade. Não é que os garotos nascem insensíveis a outras pessoas. Todas as crianças aprendem sensibilidade social. Elas aprendem quando recebem cuidados. Quando alguém alimenta você, você aprende a alimentar outros. É por isso que a maioria das pessoas educam seus filhos da mesma forma que seus pais. Para os garotos, esse comportamento não é valorizado como é para as garotas, principalmente entre seus amigos. As meninas tendem a ser mais atenciosas e gostar de animais fofos e bebês. Se um menino disser entre seus amigos: “Que fofo!”, os outros vão dar risada. Eles não veem jogadores de futebol fazendo isso. 

ÉPOCA – Por que pais e professores devem prestar atenção às reais diferenças entre os gêneros?
Lise – Para ser feliz na nossa sociedade, você precisa de uma boa mistura de traços tipicamente masculinos e femininos. Você precisa ser forte, assertivo, mas também precisa ser atencioso e sensível. Se apenas criarmos as crianças de acordo com estereótipos, eles não terão a oportunidade de desenvolver toda a gama de habilidades. Se tentarmos ignorar ou contrapor os estereótipos, nós damos a todas as crianças a oportunidade de serem artísticas, científicas, matemáticas, competitivas ou cuidadoras – todos esses traços delas podem ser apoiados ou suprimidos pela educação. Normalmente, garotas fazem artes e meninos, matemática. É muito difícil ver um garoto em numa sala de arte. Mas isso é ridículo. Desde quando um homem não poderia ser artista? Nós vemos agora uma explosão de garotas atletas, depois que esta oportunidade foi dada a elas, principalmente depois dos anos 1970. Atualmente, temos dez vezes mais mulheres nos esportes nos Estados Unidos. Fica claro que, com oportunidade, as crianças expressam suas habilidades. Se você realmente prestar atenção em meninas pequenas, elas são muito ativas. Elas não sabem que não podem correr por aí, procurar insetos e subir em coisas. É mais tarde que aprendem a ser como uma lady. 

ÉPOCA – Que orientações você pode dar aos pais sobre a compra de brinquedos?
Lise – Acho que eles devem oferecer de tudo às crianças. Há muito o que aprender brincando com caminhões e há muito o que aprender brincando com bonecas. Os caminhões enfatizam habilidades físicas e mecânicas. As bonecas, as habilidades verbais, relacionais e de cuidado com os outros. Não queremos os dois tipos em meninos e meninas? Aos dois anos, meninos gostam mais de caminhões que as meninas, mas em famílias de mente aberta e irmãos dos dois gêneros, meninas podem ter mais interesse nesses brinquedos do que a média. Similarmente, meninos com irmãs podem ter mais interesse em bonecas, barbies e projetos de arte. O maior problema é que a maioria dos pais ainda estereotipa. Eu assisti a um programa de TV em que mostravam produtos incríveis para famílias e tudo era em rosa ou azul. Mesmo fora de casa, ensinamos que meninos e meninas são opostos. Eles aprendem essa ideia e, na hora de escolher os brinquedos, as crianças têm noção de gênero e querem se encaixar. Eles preferem coisas de um determinado gênero e evitam outras. Os pais deveriam evitar a rotulagem de gêneros o máximo possível. 

ÉPOCA – Como os pais podem ajudar os meninos a ler e escrever melhor?
Lise – Pais devem ler para os meninos todos os dias, encontrar livros de que eles gostem, como um sobre caminhões, por exemplo, além de tudo o que fazemos mais com as meninas. Nós falamos mais com elas, e é bem conhecido que o vocabulário falado de uma criança está diretamente relacionado à sua habilidade de leitura. Precisamos falar mais com nossos filhos, ouvi-los e engajá-los em diálogos. É esperado que uma garota fale mais e, pelos meninos serem mais ativos, elas ficam menos tempo sentados conversando. Você tem de se esforçar mais com seus filhos, assim como tem de se esforçar para fazer a sua filha praticar mais esportes. 

ÉPOCA – Como os pais podem ajudar as meninas a permanecer confiantes em matemática?
Lise – Isso está mudando rapidamente, pelo menos nos Estados Unidos. As meninas têm desempenho tão bom quanto o dos meninos até o ensino médio. Ao redor do mundo, a diferença entre os gêneros nessa disciplina está cada vez menor. Temos que continuar com as estratégias para as garotas que são valorizar o empenho delas, dar exemplos de vida, falar sobre mulheres que usam matemática em seus trabalhos e sobre o prazer disso. Francamente, precisamos ensinar a todos os nossos filhos que quem tem boas habilidades matemáticas pode ter acesso aos trabalhos mais bem pagos – em finanças, engenharia, ciências. 

ÉPOCA – No futuro, teremos muitas mulheres engenheiras ou trabalhando com computação?
Lise – Com certeza. No caso da computação, não há nada sobre isso que esteja associado a traços masculinos. Não é como trabalhar com engenharia, que está ligada a construções. Existem diferenças físicas entre homens e mulheres, é mais fácil para um homem assumir um trabalho em construções. Você consegue ver a conexão entre um emprego desse tipo, a engenharia e a formação de um estereótipo. No caso da computação, é só sentar e digitar. Não há razão para não termos mais mulheres fazendo programação. O maior problema é o estereótipo: muitas meninas temem se tornar geeks. Meninos passam a maior parte do tempo brincando com seus computadores. Para eles, a computação é a sua zona de conforto. Para elas, existe uma barreira de gênero.

ÉPOCA – Por que as adolescentes são mais vulneráveis à depressão?
Lise – Eu pesquisei e isso, assim como outras pessoas, achei que estivesse relacionado aos hormônios, já que na puberdade elas têm níveis elevados de estrogênio e progesterona. A evidência para isso é muito fraca. Talvez haja algum impacto hormonal, mas, para pesquisas que olham para diferentes causas, baixa autoestima é a principal causa da depressão. E a principal causa da baixa autoestima é a imagem negativa sobre o próprio corpo. Nós colocamos tanto foco na aparência física nas garotas, desde quando elas são bebês, que as que não se parecem como modelos – a maioria de nós – se sentem mal consigo mesmas. Elas têm esse peso que os garotos simplesmente não têm. Eles querem ser fortes e maiores, mas a maioria deles não fica na frente do espelho e diz: “Eu odeio o meu corpo”. É muito difícil achar uma adolescente que não faça isso. Todo mundo que tem essa “bagagem” de autoimagem ruim está mais vulnerável.

ÉPOCA – Você poderia dar mais ideias para balancear as diferenças emocionais entre garotos e garotas na adolescência?
Lise – Nós precisamos, sempre que possível, ensinar as meninas a gostar dos seus corpos. Nós precisamos encorajá-las a praticar mais esportes. Garotas fisicamente ativas se sentem melhor com seus próprios corpos. Elas são mais saudáveis. Além disso, aprendem a lidar melhor com a competição, trabalho em grupo, o que é importante na hora de conseguir um emprego. No caso dos garotos, precisamos ensiná-los a expressar suas emoções, encontrar espaços para que possam chorar.

ÉPOCA – Você acredita que é mais difícil criar meninos ou meninas de forma equilibrada?
Lise – Eu tenho os dois. Os dois têm seus desafios. Certamente, quando os meninos são pequenos, a atividade física é um desafio. Mas eu tenho uma amiga que tem uma filha que parece um carro de corrida. Na adolescência, para mães e filhas pode ser perigoso. É mais difícil para garotas. Na verdade, depende da criança. Se você tem dois filhos do mesmo gênero... Meus dois garotos são tão diferentes quanto minha filha é. 

ÉPOCA – Como suas experiências como mãe influenciaram seu livro?
Lise – Eu fiquei interessada no assunto quando eu já tinha um filho e uma filha, e estava grávida do terceiro. Naquela época, havia aquela discussão sobre cérebro masculino e feminino. Eu queria entrar na questão. Como mãe, eu tentei quebrar o estereótipo de gênero tanto quanto possível. Mas você vai até onde é possível. As crianças pertencem a uma comunidade maior, e a definição de gêneros é muito importante na nossa sociedade. É um desafio. Ao se aproximar da vida adulta, minha filha começou a entender isso e agradecer. Na faculdade, ela está envolvida com a questão LGB.  Jovens universitários se esforçam para quebrar estereótipos. Esperamos que na próxima geração vejamos menos pessoas categorizadas pelo gênero e mais pela sua humanidade.

Fonte: Época, por Amanda Polato, 01/10/2013

Ver também: Estudo mostra que educar meninas e meninos de forma desigual é prejudicial às crianças.

Estudo descarta haver diferenças significativas entre os cérebros de mulheres e homens 

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

Um país onde Alexandre Frota é modelo conservador merece estudo


Um país onde Alexandre Frota é modelo conservador merece estudo


É uma triste verdade: Henry David Thoreau (1817-1862) é cada vez mais o meu herói. A verdade é triste porque nunca fui um libertário. Mas o contexto determina o meu texto: como lidar com o fanatismo e a imbecilidade que esquerda e direita vomitam todos os dias?

Pela fuga. Pelo isolamento. Pela vida no bosque, onde os animais são mais civilizados do que a espécie humana em geral.

Nesta semana, em duas revistas diferentes ("The Economist" e "The Spectator"), contemplei o estado a que chegaram as universidades anglo-saxônicas, tomadas de assalto por meninos semiletrados que gostam de censurar as opiniões que consideram ofensivas.

O problema é que essas crianças têm uma saúde mental assaz frágil. Resultado: tudo é ofensivo para elas. Até a chuva que cai, imagino eu. Um mundo de silêncio seria o ideal —o silêncio de um cemitério, embora a palavra "cemitério", pela sua evocação da morte, possa ser um insulto desnecessário para quem acredita na eternidade da juventude. As minhas desculpas antecipadas.

A "The Economist", mais otimista, diz que o mundo não está perdido: nas universidades, sempre houve batalhas ideológicas contra ideias polêmicas. Certo. Mas a mesma revista informa que 20% dos estudantes universitários defendem a violência contra palestrantes controversos.

Mais: em Yale, 42% dos estudantes (e 71% dos estudantes conservadores) preferem não emitir opinião sobre política, raça, religião ou gênero.

Só a Universidade de Chicago se salva do dilúvio. Por quê? Porque decidiu aprovar uma declaração onde se recusa a proteger os estudantes de ideias ou opiniões que os mesmos considerem ofensivas. Para Chicago, não é permitido cancelar palestras ou criar "espaços seguros" para que as crianças se sintam, enfim, seguras.

Sem surpresa, não há praticamente incidentes na Universidade de Chicago, prova definitiva de que a covardia das universidades é a razão primeira para haver problemas.

Na "The Spectator", a escritora Lionel Shriver, uma progressista "old school", relembra outros números: 38% dos britânicos e 70% dos alemães defendem que o governo deve proibir discursos ofensivos para as minorias. A típica receita autoritária: por favor, Estado, exerce a tua censura para que eu não conviva com aquilo de que não gosto.

O Estado agradece —e cresce em autoridade e poder. Um clássico.

Tudo isso são loucuras esquerdistas? Seriam, sim, se uma certa direita não fosse igual.

Nas últimas semanas, tenho acompanhado as polêmicas "artísticas" brasileiras. Confesso que rio. Muito e alto. Um país onde Alexandre Frota é uma referência ideológica "conservadora" deveria ser caso de estudo internacional. 😂

Mas uma parte da direita brasileira também tem o seu interesse. Deixemos a questão da "pedofilia" para psiquiatras: não é preciso ter lido Freud para perceber que aqueles que veem "pedofilia" quando uma criança toca no braço de um artista pelado em pleno museu estão a falar mais dos seus fantasmas do que da realidade propriamente dita.

O que me impressionou foi ver essa direita a pedir mais Estado, mais intervenção do Estado, mais censura do Estado —e não, como seria de esperar, mais responsabilidade individual, ou familiar, na forma como se educam os menores.

Se isso é a direita, eu prefiro a esquerda. Entre a cópia e o original, eu sempre preferi o original.

Corrijo: eu não prefiro ninguém. Só o bosque, embora os meus amigos aconselhem prudência. Longe da civilização, eu não duraria 24 horas.

Talvez eles tenham razão. E eu, suspirando por ar limpo e alguma companhia, sinto uma estranha admiração pelos pensadores utópicos do século 19.

Com uma diferença: imagino uma comunidade de adultos, e não de autômatos, onde as pessoas discutem livremente; usam as palavras sem medo das patrulhas; educam os filhos sem mendigar o chicote do Estado; e até, Deus me livre, flertam com mulheres (ou homens) sem temerem acusações de machismo, assédio ou violência psicológica.

Seria uma espécie de reserva natural, digamos, onde se entra e de onde se sai voluntariamente —e longe desse berçário onde esquerdas e direitas gritam e fazem birra na mesma linguagem infantil.

Com sorte, as patrulhas acabariam por se destruir mutuamente —e nós, os sobreviventes, poderíamos sair da reserva e fazer o que mais interessa: começar de novo.

Fonte: Folha de São Paulo, 24/10/2017, por João Pereira Coutinho

quinta-feira, 12 de outubro de 2017

Estudo mostra que educar meninas e meninos de forma desigual é prejudicial às crianças


Por que evitar clichês de gênero na educação das crianças desde cedo
Estudo mostra que em países ricos e nos pobres educar de forma desigual é prejudicial. No Brasil, campanha de marca de sabão ataca estereótipos e é alvo de conservadores

Os meninos gostam de carros. As meninas, de princesas. Os meninos podem estudar, as meninas fazem as tarefas domésticas. São estereótipos de gênero estabelecidos na infância pelos pais, professores, colegas e a sociedade em geral e podem ser prejudiciais quando o indivíduo começa a adolescência – ao redor dos 10 anos. Esta é a principal conclusão do estudo Global Early Adolescent Study, feito em 15 países pela Organização Mundial de Saúde e a Universidade John Hopkins (Baltimore, Estados Unidos). O debate sobre como os estereótipos têm consequências negativas nas crianças acontece há anos. Pais e educadores que defendem, cada vez mais, uma educação baseada na igualdade com muitos atores intervindo para alcançar este objetivo, tal como, por exemplo, as empresas de roupas; as associações para a igualdade, as intervenções educacionais igualitárias ou os muitos pais atuais cuja mentalidade é diferente dos das gerações anteriores. Os especialistas aconselham a trabalhar a igualdade de gênero na infância e não esperar a adolescência.
Não importa se o seu filho está em Baltimore, Pequim ou Nairóbi”, explicam os autores da pesquisa que foi iniciada há seis anos, “o início da adolescência desencadeia um conjunto comum de expectativas de gênero rigorosamente impostas que estão ligadas a um maior risco ao longo da vida do indivíduo, de sofrer com HIV ou depressão, até recorrer à violência ou ao suicídio”.
Descobrimos que os meninos e meninas desde pequenas – tanto nas sociedades mais liberais quanto nas conservadoras – interiorizam logo o mito de que as meninas são vulneráveis e os meninos são fortes e independentes”, assegura em um comunicado Robert Blum, diretor do estudo e professor na Universidade Johns Hopkins. “Esta é a mensagem que foi reforçada por cada pessoa, companheiro, professor, cuidador (...) que vive no ambiente do pequeno ou da pequena”. Os pesquisadores observaram que suas conclusões coincidiam com as de trabalhos anteriores, que afirmavam que “durante a adolescência, o mundo se expande para os meninos e se contrai para as meninas”.
A análise chamada It Begins at Ten: How Gender Expectations Shape Early Adolescence Around the World é a primeira que explica como são construídas as expectativas de gênero no começo da adolescência, de 10 a 14 anos, e como os menores chegam à adolescência tendo claro se são meninos ou meninas em diferentes países do mundo, tanto nos mais ricos como nos mais pobres. Os especialistas também verificaram o risco na saúde mental e física.

As conclusões vêm de entrevistas realizadas nos últimos quatro anos a 450 adolescentes e seus pais e cuidadores na Bolívia, Bélgica, Burkina Faso, China, República Democrática do Congo, Equador, Egito, Índia, Quênia, Malawi, Nigéria, Escócia, África do Sul, Estados Unidos e Vietnã.

Consequências negativas dos estereótipos de gênero.

As entrevistas determinaram que, ao redor do mundo, tanto meninas como meninos estão presos a restrições de gênero desde muito cedo e elas podem ter consequências graves em sua vida, sendo piores nas meninas.
Os estereótipos femininos baseados na ‘proteção’ acabam deixando-as mais vulneráveis, enfatizando o desejo de vigiá-las e puni-las fisicamente quando quebram as regras”, continuam os especialistas. O que as leva a sofrer mais com abandono escolar, casar-se muito jovens, gravidez precoce, infecção por HIV e outras doenças sexualmente transmissíveis. Os meninos, em cidades como Xangai e Nova Deli, por exemplo, são “encorajados a sair de casa sem supervisão, enquanto que as meninas devem ficar em casa e fazer tarefas domésticas”.
Meninas e meninos das duas cidades relataram a vergonha que sofriam e os espancamentos que recebiam aqueles que tentavam cruzar a linha.

Em todas as cidades, exceto uma, Edimburgo (Escócia), tanto meninos quanto meninas tinham claro que era o menino que devia tomar a iniciativa em qualquer relacionamento. Em todos os cenários, as jovens afirmaram de forma consistente que a aparência física e seus corpos eram seu principal trunfo.
Precisamos repensar as intervenções de saúde e sociais, que normalmente são feitas quando os menores têm 15 anos ou mais, e começar a fazer isso mais cedo”, continua Blum. “Os riscos para a saúde dos adolescentes são influenciados frequentemente por papéis de gênero já aos 11 anos”, acrescenta Kristin Mmari, professora associada e principal autora da pesquisa. “Vemos como muitos países gastam milhões de dólares em programas de saúde que só começam aos 15 anos, e achamos que provavelmente seja tarde demais para fazer uma grande diferença”, acrescenta a especialista no mesmo texto.
Blum nega o argumento de que em várias partes do mundo os estereótipos de gênero são parte da cultura e, por isso, inamovíveis.
Continuamos imersos em estereótipos de gênero muito rígidos, por exemplo, em alguns lugares nos Estados Unidos e partes da Europa, só nas últimas décadas as coisas começaram a mudar muito. As mudanças podem acontecer, mas exigem vontade política e uma variedade de intervenções”, acrescenta. “E saber que incutir mitos sobre as diferenças de gênero em uma idade precoce pode levá-los a sofrer problemas prejudiciais no futuro.”
No Brasil, a marca de sabão de pó OMO lançou uma campanha na internet a favor da igualdade de gênero na semana passada. Em sua página do Facebook, a marca convocou todos que têm filhos “a fazerem recall de todas as brincadeiras que reforcem clichês sobre gênero.
Meninas podem, sim, se divertir com minicozinha, miniaspirador e minilavanderia, mas também podem ter acesso a fantasias de super-heróis, carrinhos velozes e dinossauros assustadores. E meninos também devem ter toda a liberdade para brincar de casinha, trocar fraldas de bonecas e ter uma incrível coleção de panelinhas”.
O post, no entanto, atraiu a oposição de grupos conservadores que se mobilizaram contra a campanha.


 Fonte: El País, por Carolina Garcia, 11/10/2017

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