sexta-feira, 24 de maio de 2013

Feminismo e Liberalismo: uma relação histórica e íntima!

Não lhes desejo que tenham poder sobre os homens mas sim sobre si mesmas
A mistificação conservadora criou a teoria conspiratória do marxismo cultural do qual os modernos movimentos sociais (feminismo, LGBT, negro e ambientalista) seriam pontas de lança na guerra contra os valores tradicionais, a família, a cristandade, as democracias ocidentais e outras baboseiras do gênero. Esses movimentos, então, teriam surgido no bojo da revolução sexual, contracultural, da década de 60 do século passado, como resultado da influência de escritos da Escola de Frankfurt (escola de pensadores marxistas da década de 20). 

Trata-se de distorção histórica descomunal, fruto de um misto de ignorância, má-fé e preconceitos vários. A verdade é que os conservadores juntam num mesmo saco de gatos tudo aquilo que detestam: a esquerda, em geral, e os movimentos sociais em particular. Os fatos históricos, contudo, apontam em outra direção completamente distinta. Na realidade, sobretudo o feminismo (desde seus primórdios que não datam da década de 20 dos 1900 mas sim da Revolução Francesa) deve muito de seu nascimento ao pensamento liberal. Pode-se dizer, sem medo de errar, que boa tarde da longeva trajetória do movimento se deu em especial sob a bandeira dos princípios liberais naturalmente abordados da perspectiva feminina. Apenas a partir de meados dos anos 70, do século XX, vamos passar a ter uma predominância dos feminismos de esquerda na história do movimento, mas mesmo estes têm também suas diferenças.

O fato é que as mulheres são plurais decorrendo daí que o feminismo não poderia ser singular. São inúmeras hoje as correntes feministas que utilizam os referenciais ideológicos e doutrinários da sociedade em geral para analisar a condição da mulher. Coerentemente não se fala mais em feminismo e sim em feminismos. Como diz a autora do texto que reproduzo abaixo, sobre liberalismo e feminismo, Ingrid Cyfer, o termo "feminismo", como um termo unívoco, é usado para deslegitimizar a luta das mulheres por igualdade de direitos e autonomia, sendo, portanto, importante reconhecer a inadequação conceitual e mesmo estratégica da insistência do mesmo em sua forma singular.

Concordando, à guisa de contribuir para desconstruir a mistificação grosseira que esses conservadores vêm fazendo dos feminismos, reduzindo-os a uma de suas vertentes e ainda por cima de forma totalmente descontextualizada, transcrevo abaixo trecho do texto Liberalismo e Feminismo: Igualdade de Gênero em Carole Patemam e Martha Nussbaum (duas feministas liberais) e, em seguida, o texto integral pelo SlideShare. Trata-se de um texto acadêmico, mas acessível, que compara a abordagem dessas duas feministas sobre a condição da mulher.

Trecho da Introdução

“Feminismo” é ao mesmo tempo um termo maldito e impreciso. Maldito porque é na maior parte dos casos associado à defesa de uma suposta superioridade feminina, que exprimiria o mesmo sexismo do discurso que inferioriza as mulheres. Outra crítica comum é a de que o feminismo seria cego às diferenças biológicas entre homens e mulheres devido a um inconformismo injustificado e imponderado em relação às diferenças naturais, moralmente neutras. Diz-se ainda que o discurso feminista vitimaria a mulher na medida em que responsabilizaria exclusivamente o homem pela condição subalterna feminina. E, finalmente, é bastante freqüente também associá-lo a discursos moralistas que, em nome da igualdade, reprimiriam a sexualidade de homens e mulheres ao identificar a sedução e a relação sexual como locus de discriminação, nos quais a mulher estaria reduzida à condição de objeto.

A maior parte dessas críticas poderia atingir facilmente muitos alvos feministas. No entanto, dificilmente abalariam uma significativa gama de movimentos e teorias que se denominam feministas e, se fizessem-no, isso seria devido à imprecisão do termo “feminista”, que mascara as inúmeras nuances e divergências comportadas pelo conceito. A conseqüência dessa imprecisão é que as discussões acerca da igualdade entre homens e mulheres são freqüentemente deslegitimadas por críticas que tomam o feminismo por um termo unívoco. Diante disso, deve-se reconhecer que a adequação conceitual e mesmo estratégica da insistência no termo “feminismo” deve ser questionada."

 

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