sábado, 17 de março de 2012

Clipping legal: O Estado laico e os crucifixos na Justiça gaúcha

Ainda sobre o tema dos crucifixos, que continua se desdobrando (agora uma tal de Associação de Juristas Católicos entrou com representação para reconsideração da medida de retirada dos crucifixos das repartições públicas no RS), reproduzo objetivo artigo do Ministro do  Supremo Tribunal Federal, José Celso de Mello Filho, publicado na Revista Conjur e um comentário sobre o mesmo de um leitor cristão que faz a gente ter esperança de ver luz no fim do túnel. 

Cabe ressaltar que o clima exaltado, sobre esse tema até banal, deve-se em muito ao contexto polarizado entre esquerdistas e conservadores, um verdadeiro fla-flu de autoritários, que acaba funcionando como um imã de atração negativa até para pessoas normalmente moderadas. Equilibrados, resistam!

O Estado laico e os crucifixos na Justiça gaúcha


Por José Celso de Mello Filho

A laicidade do Estado brasileiro reveste-se de natureza eminentemente constitucional e traduz natural consequência da separação institucional entre Igreja e Estado.

O caráter laico da República atua, nesse contexto, como pressuposto essencial e necessário ao pleno exercício da liberdade de religião, que assegura a qualquer pessoa, dentre as diversas projeções jurídicas que dela resultam, o direito de professar ou de simplesmente não professar qualquer fé religiosa!

É por isso que o direito de ser ateu (como, também, o direito de ser adepto de qualquer corrente religiosa) qualifica-se como direito fundamental, cujo exercício se mostra insuscetível de ser obstruído ou embaraçado por autoridades e agentes estatais.

A Constituição da República, ao proclamar que o Estado brasileiro não tem perfil confessional, fez erigir verdadeiro "wall of separation" (para usar expressão utilizada por Thomas Jefferson) entre o domínio secular (reservado ao Poder Público) e a esfera espiritual (destinada às Religiões)!

O sentido de não confessionalidade da República brasileira significa que, no Brasil, por determinação constitucional (CF, art. 19, I), não haverá Estado Teocrático nem Religião Estatal! Os domínios do espírito, amplamente reservados à atuação das denominações religiosas, não podem sofrer ingerência do Estado, sob pena de a liberdade de religião expor-se a indevida interferência do Poder Público.

Vale ter presente, de outro lado, que grupos religiosos não podem apropriar-se do aparelho estatal, transformando o Estado em refém de princípios teológicos, em ordem a conformar e a condicionar, à luz desses mesmos postulados, a formação da vontade oficial nas diversas instâncias de poder.

O princípio nuclear da separação, ao consagrar a neutralidade confessional do Estado, permite protegê-lo contra investidas de grupos fundamentalistas (em tentativa de verdadeiro "take over" do Estado) ao mesmo tempo em que ampara as comunidades religiosas contra a intrusão (sempre opressiva e sufocante) do Estado no âmbito da liberdade!

O Estado laico (que não se confunde com o Estado ateu, este, sim, de índole confessional) não tem (nem pode ter) aversão ou preconceito em matéria religiosa, tanto quanto não se acha constitucionalmente legitimado a demonstrar preferência por qualquer denominação confessional, ao contrário do Estado monárquico brasileiro, cuja Carta Política (1824) consagrava o catolicismo como religião oficial do Império!

Parece-me justificável, desse modo, a resolução tomada pelo Conselho Superior da Magistratura do Estado do Rio Grande do Sul. Nem hostilidade oficial a qualquer religião nem ostentação, nos edifícios do Fórum (que são espaços de atuação do Poder Público), de quaisquer símbolos religiosos, como o crucifixo, a estrela de David ou o crescente islâmico!

José Celso de Mello Filho é ministro do Supremo Tribunal Federal.
Revista Consultor Jurídico, 10 de março de 2012

Abaixo comentário de um cristão verdadeiramente democrático, da minha turma dos congregados do equilíbrio.

Estado Laico, Religião e Intolerância - 12/03/2012 15:02 edsonbonane (Outros)

"Posso não concordar com nenhuma das palavras que você disser, mas defenderei até a morte o direito de você dizê-las." Voltaire

Parabéns ao Exmo José Celso de Mello Filho pelo excelente artigo, coerente e imparcial, como deve ser um artigo jurídico. O assunto é polemico, mas soubestes conduzir com maestria e inteligência.

Como católico sinto-me entristecido pela retirada dos crucifixos, mas concordo com a decisão em respeito a aqueles que não profetizam a mesma fé ou simplesmente são ateus. Mesmo porque, isto não muda a minha fé e permaneceram sobre minha mesa, meu crucifixo, minha bíblia e a imagem de Nossa Senhora e ao contrário do hipócrita citado pelo Sr. Chiquinho, minhas orações são feitas reservadamente e minha fé é profetizada pelo exemplo, pois um homem de fé trabalha pelo exemplo, pelos atos e não pelas palavras.

O que mais me entristece nesta situação é o radicalismo com que o tema é tratado, de ambos os lados. O respeito e tolerância, são princípios básicos de boa convivência, é o Estado Democrático, nem precisa ser religioso mas em todas as religiões são princípios básicos... mas basta ver os comentários que se percebe uma disputa quase pessoal.

É importante defender o seu ponto de vista, mas sem nunca, jamais, ferir o direito do outro de dizer o que ele pensa ou o que ele pratica.

1 comentários:

Não vejo como sustentar a manutenção de símbolos religiosos em prédios públicos. Quem quer ver crucifixo pendurado ponha um no pescoço e se olhe no espelho ou vá pra casa ou pra igreja. Muito bom o artigo do Ministro Celso de Mello.

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