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Quando Deus era mulher:

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Aserá,

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terça-feira, 3 de junho de 2014

Democracia participativa de Dilma é reunião dela com compadres e comadres do PT


Pelo visto temendo perder a eleição, Dilma apelou para um decreto onde institucionaliza de vez a simbiose do governo com os chamados movimentos sociais a fim de se manter no poder de um jeito ou de outro. Digo que institucionaliza de vez porque esse processo de institucionalização já vem ocorrendo faz tempo. A formação de conselhos disso e daquilo em órgãos governamentais não é de hoje. 

Em retrospectiva, alguns movimentos sociais sempre estiveram estreitamente ligados à esquerda ortodoxa. Outros, porém, como os chamados modernos movimentos sociais (negro, feminista, LGBT, ambientalista), mantiveram sua independência em relação à esquerda tradicional durante a década de oitenta do século passado (aqui no Brasil). O contexto político da época ajudou muito na manutenção dessa posição de autonomia. A esquerda ortodoxa de então considerava apenas a luta de classes e contra a ditadura como as grandes lutas (a luta maior). As outras eram lutas menores, divisionistas da grande cruzada. Assim os partidários da luta menor deveriam esquecer suas demandas particulares para se engajar na luta maior. A proposta não colou.

O tempo passou, o Muro de Berlim ruiu (1989), gerando o efeito dominó que derrubou os regimes comunistas do Leste Europeu. Na América Latina, as viúvas do Muro mal enxugaram as lágrimas, pela morte do comunismo, e já passaram a se rearticular, no famigerado Foro de São Paulo (1990) a fim de reconstruir na região a perdida Cortina de Ferro. Nesse processo, voltaram à carga contra os movimentos sociais autônomos, desta feita, contudo, incorporando suas demandas e atrelando-as à sua  nova luta maior.

A estratégia se acentuou e se consolidou com a chegada de Lula e sua turma ao poder. O processo de cooptação e aparelhamento dos movimentos foi total. Seus encontros originais foram substituídos por conferências petistas. Os fundadores dos movimentos, ostracizados, sua verdadeira história, distorcida e usurpada. Os movimentos sociais, com raras exceções, tornaram-se correias de transmissão do petismo e do bolivarianismo latino-americano. Pra se ter uma ideia, a última conferência regional LGBT foi realizada em Varadero, Cuba (6-9/05/14), sob os auspícios da ditadura comunista dos Castro que perseguiu e enjaulou homossexuais em tempos idos.

Entre os inúmeros efeitos colaterais negativos dessa situação, destaca-se o de validar a paranoia conservadora que vê, nas demandas específicas dos movimentos, uma relevante contribuição para um golpe comunista. Na verdade não têm, mas, nas atuais condições, anda difícil separar o joio do trigo. Sem falar também que, como Dilma fez acordo com deus e o diabo, ou talvez fosse melhor dizer, com o diabo azul e o diabo vermelho, volta e meia as demandas específicas dos movimentos são rifadas para agradar àqueles que pagam mais.

O fato é que, cooptados e institucionalizados, esses movimentos não representam mais de fato os segmentos que dizem representar. As bandeiras dos movimentos se tornaram pretexto para uns e outras alcançarem cargos em instâncias governamentais cada vez mais numerosas a fim de alimentar tantas boquinhas. E a população a quem dizem representar nunca sequer viu os membros desses movimentos mais gordos ou mais magros, com raras exceções.

Daí que, concluindo, o decreto de Dilma institucionaliza de vez instâncias de poder paralelas ao poder parlamentar que nada mais são do que o PT conversando com seus compadres e comadres dos movimentos sociais amestrados. De participativa, portanto, a Política Nacional de Participação Social (PNPS) não tem nada.

Há críticas à democracia representativa vindas de todos os cantos do espectro político, mas, até prova em contrário, ela tem mostrado ser o regime mais adequado para as sociedades se gerenciarem. Quando ela fraqueja, a barbárie autoritária, diga-se de esquerda ou de direita, costuma tomar o seu lugar. Preservá-la e, no caso brasileiro, aprimorá-la para que de fato represente a população brasileira é um dever de todos. Da mesma forma, é imperioso resgatar os movimentos sociais (que não existem para substituir a democracia parlamentar) das garras dos bolivarianos e oportunistas de todo o tipo. São duas instâncias de política igualmente válidas, mas cada uma no seu devido lugar.

Mudança de regime por decreto

A presidente Dilma Rousseff quer modificar o sistema brasileiro de governo. Desistiu da Assembleia Constituinte para a reforma política - ideia nascida de supetão ante as manifestações de junho passado e que felizmente nem chegou a sair do casulo - e agora tenta por decreto mudar a ordem constitucional. O Decreto 8.243, de 23 de maio de 2014, que cria a Política Nacional de Participação Social (PNPS) e o Sistema Nacional de Participação Social (SNPS), é um conjunto de barbaridades jurídicas, ainda que possa soar, numa leitura desatenta, como uma resposta aos difusos anseios das ruas. Na realidade é o mais puro oportunismo, aproveitando os ventos do momento para impor velhas pretensões do PT, sempre rejeitadas pela Nação, a respeito do que membros desse partido entendem que deva ser uma democracia.

A fórmula não é muito original. O decreto cria um sistema para que a "sociedade civil" participe diretamente em "todos os órgãos e entidades da administração pública federal direta e indireta", e também nas agências reguladoras, através de conselhos, comissões, conferências, ouvidorias, mesas de diálogo, etc. Tudo isso tem, segundo o decreto, o objetivo de "consolidar a participação social como método de governo". Ora, a participação social numa democracia representativa se dá através dos seus representantes no Congresso, legitimamente eleitos. O que se vê é que a companheira Dilma não concorda com o sistema representativo brasileiro, definido pela Assembleia Constituinte de 1988, e quer, por decreto, instituir outra fonte de poder: a "participação direta".

Não se trata de um ato ingênuo, como se a Presidência da República tivesse descoberto uma nova forma de fazer democracia, mais aberta e menos "burocrática". O Decreto 8.243, apesar das suas palavras de efeito, tem - isso sim - um efeito profundamente antidemocrático. Ele fere o princípio básico da igualdade democrática ("uma pessoa, um voto") ao propiciar que alguns determinados cidadãos, aqueles que são politicamente alinhados a uma ideia, sejam mais ouvidos.

A participação em movimentos sociais, em si legítima, não pode significar um aumento do poder político institucional, que é o que em outras palavras estabelece o tal decreto. Institucionaliza-se assim a desigualdade, especialmente quando o Partido (leia-se, o Governo) subvenciona e controla esses "movimentos sociais".

O grande desafio da democracia - e, ao mesmo tempo, o grande mérito da democracia representativa - é dar voz a todos os cidadãos, com independência da sua atuação e do seu grau de conscientização. Não há cidadãos de primeira e de segunda categoria, discriminação que por decreto a presidente Dilma Rousseff pretende instituir, ao criar canais específicos para que uns sejam mais ouvidos do que outros. Ou ela acha que a maioria dos brasileiros, que trabalha a semana inteira, terá tempo para participar de todas essas audiências, comissões, conselhos e mesas de diálogo?

Ao longo do decreto fica explícito o sofisma que o sustenta: a ideia de que os "movimentos sociais" são a mais pura manifestação da democracia. A História mostra o contrário. Onde não há a institucionalização do poder, há a institucionalização da lei do mais forte. Por isso, o Estado Democrático de Direito significou um enorme passo civilizatório, ao institucionalizar no voto individual e secreto a origem do poder estatal. Quando se criam canais paralelos de poder, não legitimados pelas urnas, inverte-se a lógica do sistema. No mínimo, a companheira Dilma e os seus amigos precisariam para esse novo arranjo de uma nova Constituição, que já não seria democrática. No entanto, tiveram o descaramento de fazê-lo por decreto.

Querem reprisar o engodo totalitário, vendendo um mundo romântico, mas entregando o mais frio e cinzento dos mundos, onde uns poucos pretendem dominar muitos. Em resumo: é mais um ato inconstitucional da presidente Dilma. Que o Congresso esteja atento - não apenas o STF, para declarar a inconstitucionalidade do decreto -, já que a mensagem subliminar em toda essa história é a de que o Poder Legislativo é dispensável.

Fonte: O Estado de São Paulo, 30/05/2014

quarta-feira, 28 de maio de 2014

O liberal Isaiah Berlin analisa o teólogo e filósofo alemão Johann Georg Hamann, inimigo mortal do Iluminismo e ardoroso porta-voz do irracionalismo

O mago do Norte

Isaiah Berlin recopilou textos do teólogo e filósofo alemão Johann Georg Hamann, inimigo mortal da Ilustração e porta-voz do irracionalismo. O resultado é uma festa das ideias

por Mario Vargas Llosa

Isaiah Berlin foi um democrata e um liberal, um desses raros intelectuais tolerantes, capazes de reconhecer que suas próprias convicções podiam estar erradas, e acertadas as de seus adversários ideológicos. E a melhor prova desse espírito aberto e sensível, que contrastava sempre suas ideias com a realidade para ver se as confirmava ou contradizia, ele deu ao dedicar seus maiores empenhos intelectuais a estudar nem tanto os filósofos e pensadores afins à cultura da liberdade, mas sim os seus mais inflamados inimigos, como um Karl Marx ou um Joseph de Maistre, aos quais dedicou ensaios admiráveis por seu rigor e ponderação. Tinha a paixão do saber e, quanto aos que promoviam as coisas que ele detestava, como o autoritarismo, o racismo, o dogmatismo e a violência, antes de refutá-los queria entendê-los, averiguar como e por que haviam chegado a defender causas e doutrinas que agravavam a injustiça, a barbárie e os sofrimentos humanos.

Um bom exemplo de tudo isso é o volume intitulado The Magus of the North. J.G. Hamann and the Origins of Modern Irrationalism (1993), coleção de notas e ensaios que Berlin não chegou a integrar num livro orgânico e que foram recolhidas e prefaciadas por Henry Hardy, seu discípulo, a quem nunca poderemos agradecer suficientemente por seu extraordinário trabalho de rastreamento e edição das dezenas de trabalhos que Isaiah Berlin, por seu escasso interesse em publicar e por seu maníaco perfeccionismo, deixou dispersos em revistas acadêmicas ou inéditos. Eu acreditava ter lido todos os trabalhos do grande pensador liberal, mas este me havia escapado e acabo de fazê-lo, com o mesmo absorvente prazer que tudo o que ele escreveu.

O extraordinário dessas notas, artigos e esboços de ensaios que Berlin ao longo de sua vida dedicou ao teólogo e filósofo alemão Johann Georg Hamann (1730-1788), inimigo mortal do Iluminismo e ardoroso porta-voz do irracionalismo, é que, através deles, esse reacionário convicto e confesso aparece como uma figura simpática e em muitos sentidos até moderna. Sua defesa da sem-razão – as paixões, o instinto, o sexo, os abismos da personalidade – como parte integral do humano e sua ideia de que todo sistema filosófico exclusivamente racionalista e abstrato constitui uma mutilação da realidade e da vida são perfeitamente válidas, e suas audazes teorias, por exemplo sobre o sexo e a linguística, de certa forma prefiguram algumas das posições libertárias e anárquicas mais radicais, como as de um Michel Foucault. Do mesmo modo, é profética sua denúncia de que, se seguisse pelo caminho que havia tomado, a filosofia do futuro naufragaria em um obscurantismo indecifrável, máscara do vazio e da inanidade, que a poria fora do alcance do leitor comum.

Onde essas coincidências cessam é nessa encruzilhada onde aparece Deus, a quem Hamann subordina tudo o que existe e que é, para o místico germânico, a justificação e explicação única e final da história social e dos destinos individuais. Seu rechaço às generalizações e ao abstrato e sua defesa do particular e do concreto fizeram dele um porta-estandarte do individualismo e um inimigo mortal do coletivo como categoria social e signo de identidade. Nesse sentido foi por um lado, diz Berlin, um precursor do romantismo e do que dois séculos mais tarde seria o existencialismo (sobretudo na versão católica de um Gabriel Marcel), mas, do outro, um dos fundadores do nacionalismo e, inclusive, assim como Joseph de Maistre, do fascismo.

Hamann nasceu em Königsberg [atual Kaliningrado], filho de um barbeiro cirurgião, no seio de uma família pietista luterana, e sua infância transcorreu em um meio de gente religiosa e estoica, cujos antepassados desconfiavam dos livros e da vida intelectual; ele, entretanto, foi um leitor voraz e deu um jeito de entrar na universidade, onde adquiriu uma formação múltipla e algo extravagante em história, geografia, matemática, hebraico e teologia, ao mesmo tempo em que por conta própria aprendia francês e escrevia poemas. Começou a ganhar a vida como tutor dos filhos da próspera burguesia local e, durante algum tempo, pareceu conquistado pelas ideias que vinham da França de Voltaire e Montesquieu. Mas, não muito depois, durante uma estadia em Londres vinculada a uma misteriosa conspiração política, e após alguns meses de dissipação e excessos que o levaram à ruína, experimentou a crise que mudaria sua vida.

Ocorreu em 1757. Mergulhado na miséria, isolado do mundo, sepultou-se no estudo da Bíblia, convencido, como Lutero, conforme escreveria mais tarde, de que o livro sagrado do cristianismo era “uma alegoria da história secreta da alma de cada indivíduo”. Emergiu dessa experiência transformado no conservador e reacionário briguento e solitário que, em panfletos polêmicos que se sucediam como socos, criticaria com ferocidade todas as manifestações da modernidade, onde quer que aparecessem: na ciência, nos costumes, na vida política, na filosofia e, sobretudo, na religião. Tinha retornado, e com zelo ardente, ao protestantismo luterano de seus ancestrais. Arrumou adversários e inimigos a torto e a direito, devido ao seu caráter intratável. Estava acostumado, inclusive, a se inimizar com gente que o respeitava e queria ajudá-lo, como Kant, leitor dele e que tentou lhe conseguir um cargo na Universidade. Sobre ele disse que “era um homúnculo agradável para fofocar por um momento, mas totalmente cego perante a verdade”. Por Herder, que foi seu admirador confesso e se considerava seu discípulo, nunca teve o menor apreço intelectual. Não é estranho, por isso, que sua vida tenha transcorrido quase no anonimato, com poucos leitores, e que fosse extremamente austera, devido aos obscuros empregos burocráticos com os quais ganhava seu sustento.

Depois de morto, o Mago do Norte, como Hamann gostava de chamar a si mesmo, foi logo esquecido pelo escasso círculo que conhecia sua obra. Isaiah Berlin se pergunta: “O que há nele que mereça ser ressuscitado em nossos dias?”. A resposta dá lugar ao melhor capítulo do seu livro: “The Central Core” (“O núcleo central”). O verdadeiramente original em Hamann, explica, é sua concepção da natureza do homem, nos antípodas da visão otimista e racional que a respeito dela promoveram os enciclopedistas e filósofos franceses do Iluminismo. A criatura humana é uma criação divina e, portanto, soberana e única, que não pode ser dissolvida em uma coletividade, como fazem os que inventam teorias (“ficções”, segundo Hamann) sobre a evolução da história rumo a um futuro de progresso, em que a ciência iria desterrando a ignorância e abolindo as injustiças. Os seres humanos são diferentes, e também os seus destinos; e sua maior fonte de sabedoria não é a razão nem o conhecimento científico, e sim a experiência, a soma de vivências que acumulam ao longo da sua existência. Nesse sentido, os pensadores e acadêmicos do século XVIII pareciam-lhe autênticos “pagãos”, mais afastados de Deus que “os ladrões, mendigos, criminosos e vagabundos” – os seres de vida “irregular” –, que, pela instabilidade e os tumultos da sua arriscada existência, podiam muitas vezes se aproximar de maneira mais funda e direta da transcendência divina.

Era um puritano e, entretanto, em matéria sexual propugnava ideias que escandalizaram todos os seus contemporâneos. “Por que um sentimento de vergonha ronda nossos gloriosos órgãos da reprodução?”, perguntava-se. A seu ver, tentar domesticar as paixões sexuais debilitava a espontaneidade e o gênio humano e, por isso, quem queria se conhecer a fundo devia explorar tudo, e, inclusive, “descer ao abismo das orgias de Baco e Ceres”. Entretanto, quem nesse domínio se mostrava tão aberto em outro sustentava que a única maneira de garantir a ordem era mediante uma autoridade vertical e absoluta que defendesse o indivíduo, a família e a religião como instituições tutelares e intangíveis da sociedade.

Embora esse livro de Isaiah Berlin seja um amálgama de textos, padeça de repetições e dê às vezes a impressão de haver muitos vazios que ficaram por preencher, é lido com o interesse que ele sabia imprimir a todos os seus ensaios, os quais sempre convertia, não importa do que tratassem, em uma festa das ideias.

Fonte: El País, 17/05/2014

terça-feira, 27 de maio de 2014

O verdadeiro embate dos dias de hoje é entre empreendedores e burocratas

Marcos Troyjo
Bom texto do economista e cientista social Marcos Troyjo sobre a questão "crescimento-desigualdade" que anda bombando sobretudo devido ao lançamento do livro do economista francês Thomas Piketty intitulado "Capital no Século 21". Destaco:


A principal tensão do mundo contemporâneo não advém do conflito distributivo entre capital e trabalho. O cabo de guerra é entre empreendedores e burocratas, seja na forma da grossa camada de gestores cujo intuito é a autopreservação ou nas inúmeras esferas estatais que esclerosam o dinamismo econômico.
Socialismo para milionários

Pego emprestado título de um livro de Bernard Shaw para esta coluna. A frase é perfeita para descrever o atual frenesi em torno da dualidade "crescimento-desigualdade".

Duas investidas recentes acirram o debate. A primeira é o Índice de Progresso Social (IPS), que busca aferir o desenvolvimento relativo dos países sem utilizar o referencial do PIB. A segunda, a acalorada recepção ao "Capital no Século 21", de Thomas Piketty.

A repercussão de ambos é multiplicada, na Europa e nos EUA, pelos traumas não curados da Grande Recessão –sobretudo as elevadas taxas de desemprego.

Tanto o IPS quanto o "Capital" de Piketty apontam para a prevalência do investimento social "para além do crescimento da economia". Convidam a retomar a questão da moralidade do capitalismo. Repisam (sobretudo em Piketty) a desproporção nas remunerações a capital e trabalho como principal obstáculo ao bem-estar social.

De acordo com esses apontamentos, a desigualdade, mal maior do capitalismo, poderia remediar-se com maior carga tributária e mais investimentos "no social".

Sem entrar demais nos altos e baixos do IPS ou de Piketty, minha percepção é que ambos devem interessar mais a países avançados do que a nações em desenvolvimento. É papo para ricos.

Dos países que ocupam as 20 primeiras posições do IPS (em que supostamente o PIB não conta), todos apresentam renda per capita anual superior a US$ 30 mil. Ainda assim, mesmo para os que já se desgarraram da armadilha da renda média, como sustentar amplo acesso a educação e saúde pública sem crescimento ao longo do tempo?

Nesse contexto, o atual debate sobre desigualdade reflete a binária consideração de "crescimento" ou "austeridade" como alternativas para países em crise de dívida soberana, caso da Europa mediterrânea em 2011.

Há mérito na crítica à inércia patrimonialista no Ocidente. As soluções tributário-distributivistas apontadas por Piketty, contudo, não tratam de questão –importante o suficiente para os ricos– e absolutamente essencial para países em desenvolvimento. Que padrão de economia política adotar para, ao final do dia, gerar excedentes que custeiem os trampolins sociais?

Decepciona, em Piketty, não ver referência a "empreendedorismo", "competitividade", "start-ups", "papel da inovação", ou à "destruição criativa" de Schumpeter.

A principal tensão do mundo contemporâneo não advém do conflito distributivo entre capital e trabalho. O cabo de guerra é entre empreendedores e burocratas, seja na forma da grossa camada de gestores cujo intuito é a autopreservação ou nas inúmeras esferas estatais que esclerosam o dinamismo econômico.

Para países como o Brasil, o grande desafio é encontrar seu próprio modelo de capitalismo competitivo que o permita pagar o preço da civilização.

Deixemos para amanhã manuais de instalação de um "Welfare State 2.0", como o IPS ou o tijolo de Piketty. Concentremo-nos, agora, nas lições de Acemoglu e Robinson em "Por que as Nações Fracassam".

Fonte: Folha de São Paulo, 16/05/2014

segunda-feira, 26 de maio de 2014

Clipping da semana (19/05 a 23/05)

Se a atual presidente não for reeleita, vai ser bom para a economia, mas, de acordo com Jakobsen, talvez uma vitória da Dilma seja até positivo, pois "o Brasil precisa de uma crise de verdade, com uma magnitude enorme, para ver se toma jeito. E com ela isso irá ocorrer". 

Libertários são pessoas que, a grosso modo, acreditam ser o Estado o grande inimigo da liberdade dos indivíduos e que, portanto, seria melhor a sociedade se autogerir sem a presença dessa instituição. Mas o termo "libertário", cunhado pelo anarquista francês Joseph Déjacques, em meados do século XIX, tem um significado bem mais amplo do que apenas pregar liberdade de mercado e um princípio de não-agressão.

Igualdade perante a lei, igualdade de oportunidades, igualdade de resultados, eis a questão? Talvez simplesmente combater as injustiças seja mais adequado.

O presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), ministro Augusto Nardes, disse nesta quinta-feira (15) que o Brasil vai passar "vergonha" na Copa do Mundo por causa da série de obras inacabadas.

sexta-feira, 23 de maio de 2014

Economista dinamarquês 'detona' governo Dilma e diz que Copa e Olímpiadas foram as piores coisas que o Brasil já decidiu fazer



Economista dinamarquês 'detona' o Brasil e indica melhor investimento para fugir do caos

SÃO PAULO – O economista-chefe e CIO (Chief Investment Officer) do Saxo Bank na Dinamarca, Steen Jakobsen, afirmou que o Brasil vive uma das piores situações políticas possíveis e que o cenário macroeconômico do país está preocupante. "A situação macro do Brasil é a pior dos países que eu já visitei. E eu visito 35 países por ano", disse durante o evento 'Criando Sucesso Operando em Mercados Globais', na última terça-feira (06).

Segundo ele, essa atual situação é culpa do governo Dilma, que resolveu adotar um modelo experimental que "é uma verdadeira festa" e, desde o começo, estava fadado ao fracasso. "O Brasil tem os políticos que merece, porque são vocês, brasileiros, que votam errado e colocam eles lá. A atual presidente, por exemplo, não sabe o que quer e está completamente perdida" , disse Jakobsen. "Além disso, o Banco Central também está perdido e os conflitos aumentam a cada dia. A falta de reformas e as decisões políticas fora do tom deixaram a situação insustentável", completou.

Para o especialista, se as pessoas votarem certo, as coisas irão melhorar em 2015, mas 2014 será mais um ano difícil, afinal, o governo não irá conseguir segurar a inflação, que irá ultrapassar o teto da meta, e nem fazer o país crescer. "O PIB brasileiro crescerá menos que 1% em 2014", afirmou.
Só uma crise de verdade pode nos salvar

Se a atual presidente não for reeleita, vai ser bom para a economia, mas, de acordo com Jakobsen, talvez uma vitória da Dilma seja até positivo, pois "o Brasil precisa de uma crise de verdade, com uma magnitude enorme, para ver se toma jeito. E com ela isso irá ocorrer" . "A ruptura irá ocorrer nas eleições e essa será a oportunidade de o país mudar", disse.

No entanto, o especialista ainda ponderou que talvez nem essa seja a solução, afinal, segundo ele, apesar de a única forma de conseguir mudanças seja por meio do fracasso, "o Brasil é o campeão mundial em fracassos e ainda não mudou".
Onde investir em meio ao caos?

Assim, em meio a todo o caos que o Brasil está vivendo, com intensa volatilidade, crescimento baixo, inflação nas alturas e uma das maiores taxas de juros do mundo, é importante saber onde investir seu dinheiro, afinal, a aversão a risco tomou conta dos mercados brasileiros há muito tempo, visto que a bolsa de valores só anda de lado.

O economista-chefe indicou aos brasileiros, como melhor opção de investimento no momento, a renda fixa, em especial, os títulos públicos do Tesouro Direto. "O brasileiro precisa aproveitar essa taxa de juros altíssima, afinal, pelo menos para alguma coisa ela tem que servir. Por isso, os investidores devem entrar forte em renda fixa e, ao mesmo tempo, ficar bem longe do mercado de equities, afinal, na atual conjuntura ele está muito perigoso" , alertou. "Depois das eleições, se tudo der certo, os brasileiros podem voltar a pensar em bolsa de valores", completou.

Copa do Mundo

Por fim, Jakobsen afirmou que sediar a Copa do Mundo 2014 e as Olimpíadas 2016 foi a pior coisa que o Brasil poderia ter decidido (ou se proposto a) fazer. "O dinheiro que deveria estar indo para lugares extremamente carentes, está indo para coisas inúteis. O Brasil só estará pronto para receber uma Copa do Mundo em 20 ou 30 anos", finalizou o dinamarquês.

Fonte: Uol Economia, 07/05/2014

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