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A origem revisitada do Dia Internacional da Mulher

Mulheres samurais

no Japão medieval

Quando Deus era mulher:

sociedades mais pacíficas e participativas

Aserá,

a esposa de Deus que foi apagada da História

terça-feira, 19 de janeiro de 2021

Boudicca, a icônica rainha britânica que botou medo no Império Romano e inspirou feministas do século XX

Há 2000 anos, Boudicca liderou uma revolta e quase derrotou os poderosos romanos
 no que hoje é a Inglaterra.
 
Boudicca - também conhecida como Boadicea na forma latina - é uma figura icônica, mas controversa.

Vista por uns como uma das primeiras combatentes feministas pela liberdade e por outros como uma assassina brutal e sanguinária, ela tem sido uma presença constante na história da Europa.

Cerca de 2 mil anos atrás, essa aristocrata da Idade do Ferro liderou uma revolta e quase derrotou os poderosos exércitos romanos que invadiram sua terra natal, no que seria hoje East Anglia, no nordeste da Inglaterra.

Seja amada ou odiada, Boudicca tem um lugar na história como uma pioneira, com a capacidade de reunir um grande número de tropas de tribos diferentes com seu talento natural para comandar.

Então, que lições de liderança podem ser aprendidas com essa rainha guerreira?

1. Se vestir para a ocasião funciona

Vestida para impressionar - Boudicca sempre foi retratada como
uma guerreira destemida.
Todos sabem a importância de se vestir para a ocasião - mas Boudicca é uma das poucas que perceberam como isso faz diferença.

Ela é comumente descrita como uma mulher feroz e poderosa, dirigindo sua própria carruagem e brandindo uma lança, com seu cabelo selvagem voando ao vento.

Não temos como saber como a rainha realmente era, mas o historiador romano Cassius Dio - escrevendo décadas depois da morte dela - oferece esta descrição:
Na estatura, ela era muito alta, na aparência, aterrorizante, no relance de seu olhar, feroz. (...) Uma grande massa de cabelos negros caía sobre seus quadris, em volta do pescoço havia um grande colar de ouro e ela usava uma túnica de diversas cores, sobre a qual um grosso manto estava preso com um broche."
Há poucas dúvidas de que Boudicca tenha sido uma das primeiras a adotar o poder das roupas para passar uma mensagem - ela sabia como aproveitar esse recurso ao máximo, deixando uma impressão duradoura em seus inimigos.

2. Um nome forte pode te levar longe

Fiel a seu nome, que significa vitória, Boudicca foi bem-sucedida 
nas primeiras batalhas. 
O nome Boudicca é derivado da antiga palavra britônica "boud", que significa vitória.

Boudeg significa portador da vitória, e Boudega - a alternativa feminina -, quem traz a vitória.

Podemos seguramente presumir que esse não era o nome que a rainha guerreira recebeu ao nascer, mas sim um que ela adotou mais adiante.

O nome forte parece ter ajudado na mobilização de um exército.

3. Nunca subestime as habilidades de alguém

Boudicca é ainda lembrada na cidade inglesa St Albans, onde lutou contra os romanos. 
O marido de Boudicca, Prasutagus, era o governante da tribo Iceni de East Anglia. Ele foi tolerante com os romanos invasores e por isso foi autorizado a continuar governando seu povo.

Eles tomaram terras e, quando Boudicca se recusou a pagar grandes impostos, foi publicamente açoitada e forçada a assistir ao estupro de suas duas filhas, com ao redor de 12 anos na época.

Eles também subestimaram a ira de uma rainha desprezada: Boudicca decidiu revidar, reunindo tropas de sua própria tribo e de outras.

Os soldados reunidos derrotaram a Nona Legião Romana, destruindo a capital da Grã-Bretanha romana, Colchester, além das cidades de Londres e St Albans.

4. Treinamento efetivo é mais valioso do que uma grande força de trabalho
Mesmo após seguidas vitórias, Boudicca perdeu a derradeira batalha para os romanos
Após a queda de Londres e St Albans, o governador romano decidiu reunir suas tropas e confrontar o exército de Boudicca.

Embora ela parecesse ter uma vantagem numérica, os homens indisciplinados e mal equipados da rainha não eram páreo para a habilidade de tropas romanas, treinadas profissionalmente e bem armadas.

Mesmo com dez vezes mais soldados, como hoje se imagina, Boudicca foi derrotada pelo exército romano. Ela morreu logo após seu fracasso, depois de supostamente envenenar-se.

5. Destaque-se na multidão

Os romanos não estavam acostumados com mulheres desobedecendo ordens
O ataque liderado por Boudicca não foi o único contra a ocupação romana, mas sua rebelião se destaca na história em grande parte porque ela era mulher.

A arqueóloga britânica Jane Webster, da Universidade de Newcastle, diz que "mulheres líderes ofendiam as sensibilidades romanas".
Não era a ordem das coisas. É por isso que sabemos muito mais sobre essa rebelião do que sobre muitos outras contra Roma."
A professora Miranda Aldhouse-Green, também arqueóloga e autora britânica, acha que Boudicca "é uma figura icônica, porque ela foi uma das poucas mulheres a enfrentar o poder de Roma".

Na verdade, ela continua sendo a única mulher a ter liderado forças combinadas da Grã-Bretanha contra um exército de ocupação.

Os registros históricos que temos sobre Boudicca são escassos, faltam detalhes e os que existem são muitas vezes contraditórios, mas Webster diz que "ela permaneceu na literatura e persistiu como um bom exemplo de rebeldia porque era mulher".

6. É importante ter um modelo

O movimento sufragista se inspirou na rainha guerreira em sua luta pelo voto. 
Durante o século 16, as pessoas voltaram a se interessar por escritores clássicos, e o relato do historiador romano Tácito sobre a rebelião de Boudicca foi ressuscitado.

Outra mulher importante e poderosa no mundo de um homem foi a rainha britânica Elizabeth 1ª, que diz ter se inspirado bastante na história de Boudicca.

Muito mais tarde, os vitorianos reinventaram Boudicca como uma figurona do imperialismo britânico.

Talvez a rainha guerreira tenha sido mais apropriadamente reivindicada pelo movimento sufragista e pelas mulheres que lutam pelos direitos femininos.

Ela se tornou um modelo importante para uma geração que lutou contra o patriarcado e conquistou o voto para as mulheres.

O professor Richard Hingley, arqueólogo da Universidade Durham, no Reino Unido, explica que, por sabermos tão pouco sobre ela, Boudicca "é uma figura muito flexível e ambígua que pode representar muitas coisas diferentes para pessoas diferentes".

Clipping 6 lições de liderança da rainha guerreira que aterrorizou os romanos, 06/01/2021, BBC. Crédito Imagens: Getty Images

terça-feira, 22 de dezembro de 2020

PM recebe ‘Oscar do Serviço Público’ por criação de Patrulha Maria da Penha de assistência a mulheres

Claudia Moraes Foto: Ana Branco / Agência O Globo

 Claudia Moraes, de 47 anos, despertou o olhar para a causa ao analisar estatísticas e pensar políticas públicas

Na primeira aula de equitação na Academia de Polícia Militar Dom João VI, em Sulacap, Claudia Moraes caiu do cavalo. Hoje tenente-coronel, ela lembra que imediatamente levantou e subiu de novo no animal. E não esquece o nome da égua: Estrela. “Nossa, você tem coragem”, disse o instrutor. Responsável por lançar o programa Patrulha Maria da Penha — Guardiões da Vida, que em um ano e quatro meses de funcionamento já assiste a mais de dez mil mulheres, ela acaba de ganhar o prêmio Espírito Público — uma espécie de Oscar para servidores do país — por sua trajetória.

Nascida na Vila Kennedy, estudante de escolas públicas e ex-funcionária de call center, a oficial de 47 anos ingressou na Academia da PM aos 26, após prestar vestibular para a Uerj. A meta era conquistar a tão sonhada estabilidade do serviço público e poder ajudar a família. Na PM, já enfrentou tiroteio e correu atrás de bandido no meio da rua vestindo uniforme de passeio (usado para eventos da corporação), com salto e saia. Mas sua carreira na PM se destaca pela atuação em gestão. No Instituto de Segurança Pública (ISP), ela foi analista criminal e coordenadora dos conselhos comunitários.

“Meu olhar despertou”

Com a voz rouca depois de um dia inteiro de aula on-line de Direitos Humanos e Sociologia para alunos do Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças (Cfap), ela revela uma passagem traumática da vida: conta que sofreu abuso na adolescência, aos 14 anos, dentro de um ônibus, quando ia para a escola. Apesar dessa marca que carrega, diz que foi sua participação na organização do Dossiê Mulher, de 2010 a 2018, no ISP, que a fez se engajar de corpo e alma no tema da prevenção da violência contra a mulher.
 Meu olhar despertou para a violência contra a mulher a partir do trabalho com estatística. Via a cada ano os números se acumulando e me perguntava: Como reduzi-los através de políticas públicas? — conta Claudia, que ali deu uma guinada na carreira: — Queria aprender mais e comecei a me especializar. Fiz mestrado em Ciências Sociais na Uerj e fui da primeira turma de pós em Gênero e Direito da Escola de Magistratura.
Em agosto de 2019, ela criou, com o apoio da instituição, a Patrulha Maria da Penha, que fiscaliza hoje o cumprimento de medidas protetivas de 10.472 mulheres no Estado do Rio. Nesse tempo, foram 231 agressores presos por descumprimento das decisões judiciais e nenhum feminicídio. Algumas vítimas têm contato diário com as equipes, seja por WhatsApp e telefone ou presencialmente, através de visitas das equipes, sempre com um PM homem e uma policial mulher.Tropa, que tem sempre uma mulher, garante execução de medidas protetivas para vítimas Foto: Agência O Globo

Casada com o coronel da reserva Robson Rodrigues, ex-chefe do Estado-Maior da PM do Rio, Claudia dedica o prêmio à equipe da patrulha — há 250 policiais capacitados — e diz:
Atendemos desde mulheres pobres e desempregadas a estudantes e pessoas com perfil de classe média alta. A vida delas é o verdadeiro prêmio.
Pelos últimos levantamentos da Patrulha Maria da Penha, aumentou a adesão de mulheres ao programa na pandemia: entre agosto e novembro, a média diária de ingresso chegou a 30, sendo que, no primeiro ano de funcionamento do projeto, a taxa era de 23.

Mais confiança na polícia

Uma das vítimas a entrar para o programa nesse período foi uma consultora de marketing de 37 anos, mãe de dois filhos, que sofria constantes ameaças, agressões verbais e tortura psicológica do ex-marido e pai das crianças.
Só nunca apanhei. Todo resto teve — conta ela, que, tomada pelo medo, não conseguia mais trabalhar.
Após conseguir a medida protetiva, que proibiu a aproximação do ex-marido, que deve ficar a uma distância mínima de 200 metros, ela recebeu por WhatsApp mensagem da patrulha, que atua em rede com outros órgãos, incluindo o Judiciário.

A vítima diz que o programa não só fez ela se sentir segura, como derrubou preconceitos em relação à PM.
Meu ex-marido ainda é devedor de pensão. Por isso eu digo: para mim, a única coisa que funciona nesse Brasil é a Patrulha Maria da Penha. Quando a polícia entrou, ele, parou até de me mandar mensagens — conta, que já acionou o grupo para ajudar um amigo gay.
Todos os batalhões do estado e mais três UPPs — Rocinha, Andaraí e Barreira do Vasco — têm equipes da patrulha. Enquanto na PM as mulheres são apenas 11% do efetivo — 4.990 de 44.648 policiais —, dentro do programa a presença é menos desigual. Entre os capacitados, elas são 47%. Para fazer parte, tem que ser voluntário, ou seja, precisa querer.

Referência na área, a juíza Adriana Ramos de Mello, titular do I Juizado da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Capital, define Claudia como uma profissional de excelência e uma mulher inspiradora:
É uma verdadeira ativista dos direitos humanos das mulheres. Na PM, com sua força, criou a Patrulha Maria da Penha, que é extremamente completa, abrange todo o Rio. Claudia se dedica pessoalmente.

Um dos organizadores do prêmio Espírito Público, Eloy Oliveira, diretor da Republica.org, ONG voltada para a melhoria do serviço público, também elogia Claudia:
Ela passou por muitos lugares na PM do Rio, uma corporação extremamente machista. Ainda assim, o trabalho dela se destacou.
Clipping ‘Oscar do Serviço Público’ premia PM que criou a Patrulha Maria da Penha, que assiste mais de 10 mil mulheres, por Ludmilla de Lima, Globo, 19/12/2020

quinta-feira, 5 de novembro de 2020

Por que a oposição entre socialismo e capitalismo é uma falsa questão


Eu ri com esse vídeo do Ranking dos Políticos, ao fim do post, reagindo a outro vídeo do Guilherme Boulos, onde o dito fala um monte de falácias sobre as maravilhas do socialismo em oposição ao capitalismo. Eu, mesmo quando estava na faixa de idade do pessoal que hoje acredita nos leros do Boulos, já não acreditava em socialismo. Cresci ainda sob a Guerra Fria, quando os podres da URSS já circulavam pelo mundo: o genocídio dos ucranianos, o Grande Terror, obras do Stalin (um das maiores genocidas da História), mas, depois, já sem o carniceiro, também a invasão da Hungria (1956) e da Tchecoslováquia (1968) pela tropas soviéticas. - Nunca ouviram falar da primavera de Praga? - Depois da queda do muro de Berlim e, em seguida, do fim da URSS, mais informações circularam sobre a mortandade (na casa dos muitos milhões) em todos os países que caíram sob o jugo do chamado socialismo real. Fora que, como jovem ativista do movimento homossexual, lá nos idos de 1980, eu também já sabia dos campos de reeducação de homossexuais em Cuba, do sufoco generalizado que era ser gay ou lésbica em países onde a individualidade das pessoas não tinha vez e cuja moral não era lá muito diferente dos evanjegues americanos ou da ultradireita em geral. 

Eu sou da geração da contracultura que era libertária e imensamente crítica tanto da tecnocracia e da sociedade de consumo dos EUA quanto da tecnocracia e do totalitarismo soviéticos. Minha geração queria pensar em outras possibilidades que não essas que nos apresentavam. Problema é que a AIDS, identificada em 1981, fechou de vez as portas da contracultura, que já vinham se estreitando desde a década de 70, acabando com a revolução sexual e todo clima libertário e também libertino da geração do "paz e amor". E a contracultura, como movimento específico, não se rearticulou nas décadas seguintes. Quem veio a se rearticular na década de 90 foi a esquerda ortodoxa, as então viúvas do Muro de Berlim, com as mesmas velhas ideias que não passaram no test drive da História em canto algum, em momento algum. E foi essa velha esquerda que fez a cabeça das novas gerações, principalmente na América Latina e no Brasil. Daí hoje essas gerações ficarem pagando o grande mico de apoiar gente como o Boulos e, ainda pior, o neostalinista, Jonas Manoel, que um idiotizado Caetano Veloso resolveu trazer à luz.

A discussão capitalismo versus socialismo é uma falsa questão porque não se pode comparar um sistema que funciona, apesar dos seus muitos pesares, com outro que nunca funcionou. Os adeptos dessa relíquia macabra socialista só servem para nos impedir de discutir, com ideias de hoje, o capitalismo em si mesmo e o custo ambiental e humanamente insustentável do seu sucesso. 

Mas, pessoal, socialismo não funciona mesmo. E não, isso não é papo da direita. É a real. O exemplo da China que, quando puramente comunista, fora matar milhões também de fome e em execuções sumárias, era um país rural e atrasado e virou, ao aderir à economia de mercado, uma potência mundial em apenas 50 anos, deveria ter enterrado de vez a ideia do socialismo como alternativa ao capitalismo. Incrível, no entanto, o quanto a humanidade prefere manter essa neurose coletiva de insistir nesse mesmo erro eternarmente.

A discussão capitalismo versus socialismo é uma falsa questão porque não se pode comparar um sistema que funciona, apesar dos seus muitos pesares, com outro que nunca funcionou. Os adeptos dessa relíquia macabra socialista só servem para nos impedir de discutir, com ideias de hoje, o capitalismo em si mesmo e o custo ambiental e humanamente insustentável do seu sucesso. 

Ah, e o Trump ganhou na Flórida porque o eleitorado latino (20%), composto majoritariamente de cubanos e seus descendentes, compram sua retórica anticomunista. E de comunismo esse pessoal, que viveu a coisa na própria pele, nem quer ouvir falar.

terça-feira, 27 de outubro de 2020

Magalu é companhia brasileira com mais mulheres em seu conselho de administração

Apenas 7% dos conselhos de administração de 275 empresas com ações na bolsa de valores de
São Paulo, a B3, são presididos por mulheres – um deles é o do Magalu, com Luiza Helena Trajano
(Foto: Divulgação)
O Magalu é a companhia brasileira com a maior concentração de mulheres em seu conselho de administração, com três no board, o equivalente a 43% do total de sete assentos

De cada 100 vagas nos conselhos administrativos das principais empresas do Brasil, apenas 11,6 são ocupadas por mulheres, segundo levantamento realizado pela Teva Índices, em parceria com a corretora Easynvest, que destrinchou as posições de liderança em 275 empresas listadas na B3, a bolsa de valores de São Paulo, com capitalização mínima de R$ 300 milhões.

São só 214 mulheres para 1.846 assentos. Apenas 19,3% das empresas pesquisadas têm duas ou mais mulheres no conselho, e 48% são conduzidas por conselhos exclusivamente masculinos.

Quando se olha para os cargos mais elevados, a participação feminina é ainda menor: do total de conselheiros homens, 6% são CEOs, na comparação com 1% das mulheres. E apenas 7% dos conselhos são presididos por lideranças femininas.

No Magazine Luiza, a situação é diferente: 43% das vagas no conselho de administração são ocupadas por mulheres – são elas a empreendedora Luiza Helena Trajano, a consultora Betania Tanure e a administradora Ines Correa de Souza.

Apenas cinco empresas brasileiras, dentre as pesquisadas, têm três mulheres nesses cargos. Em termos percentuais, nenhuma supera os 43% do Magalu – a empresa segunda colocada tem 33% de participação feminina. 

Na média mundial, segundo um relatório global e anual realizado pela Mercer, as mulheres ocupam apenas 23% dos cargos de nível executivo, e 29% dos postos de nível sênior. Mas esse é um cenário em rápida transformação entre as empresas dos países desenvolvidos.

Ao valorizar as lideranças femininas, o Magalu segue uma tendência internacional – o banco Goldman Sachs, por exemplo, anunciou em janeiro que não vai mais realizar IPO (ou oferta pública inicial de ações) para empresas americanas e europeias que não tenham mulheres em seus conselhos. Coautora do estudo da Teva, a Easynvest vai recomendar a seus clientes que priorizem as ações das empresas que se destacaram por valorizar a diversidade no mais alto posto de gestão.

Do interior de São Paulo

Luiza Helena Trajano sustenta uma trajetória que comprova a capacidade das mulheres em construir empresas de grande porte e enorme sucesso. Nascida em Franca, no interior de São Paulo, Luiza começou a trabalhar como balconista na loja dos tios, chamada A Cristaleira. Tinha 12 anos e queria juntar dinheiro para comprar presentes de Natal para a família e os amigos.

A tia, Luiza Trajano Donato, realizou um concurso cultural numa rádio local para que os moradores da cidade escolhessem um novo nome para a loja. Foi assim que surgiu o Magazine Luiza. Depois da primeira experiência como balconista, a sobrinha manteve contato com a empresa, até que, aos 18 anos, tornou-se funcionária efetiva.

Luiza Helena formou-se em direito e em administração e percorreu diferentes setores da empresa. Tornou-se presidente da rede – atualmente, o CEO é seu filho, Frederico Trajano, enquanto ela preside o conselho de administração.

Além das atividades na companhia, Luiza preside o Grupo Mulheres do Brasil, um movimento suprapartidário fundado em 2012 para discutir e implementar medidas capazes de aumentar a participação feminina na sociedade. Ela conduz muitas das reuniões do grupo, que já conta com mais de 33 mil participantes.

E assim mantém o Magalu como uma empresa que lidera o incentivo à participação feminina nos mais altos postos de comando das maiores companhias do País.

Clipping Magalu: alma e gestão femininas, Marie Claire, 15/10/ 2020.

quinta-feira, 24 de setembro de 2020

Contracultura brasileira: o desbunde que desafiou a esquerda e os militares


 Gal Costa, Os Mutantes, Jards Macalé, Gilberto Gil (com Torquato Neto), Novos Baianos, Caetano Veloso, Jorge Mautner, Luiz Melodia, Rogério Duprat, Sérgio Sampaio, Tom Zé e Walter Franco 

A música Sangue Latino é de 73. Os Secos e Molhados existiram de 71 a 74 em sua formação original. Os Dzi Croquettes de 1972 a 1976. O musical Hair foi encenado de 69 a 71. Andróginos e libertários. Em pleno período do regime de exceção. Foram filhos da contracultura que os militares não reprimiram com a contundência que reprimiram a esquerda ortodoxa, mesmo porque a consideravam meio alienada, visão compartilhada pela esquerda da época. Segundo consta, foi a esquerda da luta armada que apelidou os contraculturais no Brasil de desbundados. A contracultura no BR foi o desbunde. 



E a geração que prevalece no país na década de 70 foi exatamente a do desbunde, a do "sexo, drogas e rock'n'roll", da "minha casa no campo, meus amigos, meus discos, meus livros e nada mais" e não a da esquerda que queria nos transformar num Cubão. Aliás, a matriz do movimento homossexual no Brasil e no mundo foi a contracultura, não a esquerda tradicional que era tão homofóbica e machista quanto os conservadores. Ainda hoje, vejo muito mais em comum entre eles do que sonham as vãs filosofias. 

Lembrei disso porque, desde que lançaram uma tese pra lá de discutível que afirma ter o regime militar instituído uma política de Estado contra pessoas homossexuais, volta e meia vem alguém me perguntar dos sofrimentos que passei por ser lésbica sob a ditadura. 

Então, vamos esclarecer, o período 64-84 se deu de fato sob um regime de exceção, mas não sob um regime totalitário. Nós não vivemos uma espécie de Gilead como no "O Conto da Aia," pra citar uma referência atual. Os agentes da repressão não estavam visíveis a cada esquina, não ficavam acompanhando as pessoas até o supermercado, não havia corpos de subversivos pendurados nos muros das cidades ou na frente das casas, não se executava gente a sangue frio em ruas de bairros de classe média. A abdução dos ditos subversivos se dava mais na surdina, na calada da noite ou em blitz pontuais durante o dia. Nós outros vivíamos uma aparente normalidade, com as pessoas levando suas vidas de forma não muito diferente da de hoje.


A juventude daquele período, no Brasil, gastava seu tempo tomando todas e transando muito, indo a teatros (onde se faziam críticas veladas ao regime), aos cinemas (ver Bergman, Pasolini, Fellini, Polansky, Woody Allen) e a Salvador (que virou a Meca dos desbundados). Também gastava seu tempo lendo livros, jornais (cheios de mensagens cifradas) e a imprensa alternativa, assistindo os festivais de música popular e as novelas na TV. Indo ainda a musicais e, no final da década, entre 78 e 79, acabando-se nas baladas dos dancing days.
++++++++

Enfim, esse era o meu cotidiano naquele período. Não sofri repressão da ditadura por ser lésbica. Da ditadura, sofri repressão como estudante, quando fui às ruas em 1977 participar das manifestações promovidas pela UNE que se rearticulava. Fui inclusive presa na tristemente célebre invasão da PUC pelas forças do famigerado coronel Erasmo Dias. Porque manifestação de rua não podia mesmo acontecer, ainda mais contra o governo. 

Como lésbica, a repressão que sofri foi da sociedade ultraconservadora da época, tão vigente aqui, sob um regime de exceção, quanto nos EUA, a democracia mais estável da História. Naquele período, a homossexualidade ainda era considerada doença ou crime (nos EUA, a homossexualidade só deixou de ser crime na década de 70), as pessoas homossexuais eram totalmente marginalizadas, como se fossem realmente criminosas, aparecendo na imprensa somente nas páginas policiais. Provavelmente a invasão que promovi, com outras ativistas, em 19 de agosto de 1983, no antológico Ferro's Bar de São Paulo, foi a primeira a inaugurar uma nova abordagem da imprensa sobre o assunto, com artigo da Folha de SP nos tratando de forma positiva. 

Em outras palavras, não vão comprando acriticamente qualquer tese que aparece. Busquem sobre a contracultura no Brasil no oráculo do Google. Há teses e livros sobre o tema que, sem dúvida, vão lhes ampliar o horizonte, abrir uma nova perspectiva sobre a realidade sócio-cultural daquele período paradoxalmente de repressão mas também de grandes mudanças políticas e comportamentais. Aqui uma dica: Contracultura – Alternative Arts and Social Transformation in Authoritarian Brazil, de autoria de Christopher Dunn. Liberdade cabeluda:  O  inusitado caráter político da contracultura brasileira

Por último, naqueles conturbados anos do regime militar e da Guerra Fria (com a bomba atômica pairando sobre nossas cabeças), nós vivemos a contracultura (considerada por muitos como a última grande utopia) e tínhamos aquela coisinha verde que, hoje, a gente procura à esquerda, à direita, no centro, em cima e embaixo, e não encontra. Nós tínhamos esperança. Ao contrário, atualmente, vivemos num clima distópico que parece sobretudo uma mistura do 1984 com O Conto da Aia mas também conta com pitadas do Admirável Mundo Novo e do Fahrenheit 451. Sinto muito!
 😓

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