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segunda-feira, 14 de março de 2016

Manifestações contra Dilma, Lula e o PT reuniram número recorde de pessoas em todo o Brasil

1 milhão e 400 mil pessoas lotaram a Avenida Paulista 
A briguinha entre Lula e a Globo rendeu, pela primeira vez, uma reportagem à altura das manifestações. Leia e veja o vídeo abaixo.

Atos contra o governo Dilma e a corrupção reúnem multidões no Brasil

Milhões de manifestantes foram às ruas para protestar contra o governo Dilma, a corrupção e para pedir o impeachment da presidente.

Neste domingo, 13 de março, milhões de manifestantes contrários ao governo da presidente Dilma Rousseff foram às ruas, em cidades em todos os estados e no Distrito Federal.

As informações ainda estão chegando. Até aqui, sabe-se que houve manifestações em 239. Pelos cálculos até as 8h da noite, foram às ruas seis milhões e quatrocentas mil pessoas, segundo os organizadores.

Segundo as polícias militares, excluindo a do Rio de Janeiro, que não fez cálculos, foram três milhões e cem mil manifestantes.

No Rio de Janeiro, os organizadores calcularam que um milhão de pessoas foram às ruas.

Em São Paulo, a manifestação na Avenida Paulista foi o maior ato político já registrado na cidade, segundo o Datafolha.
Atos contra o governo Dilma e a corrupção reúnem multidões no BrasilMilhões de manifestantes foram às ruas para protestar contra o governo Dilma, a corrupção e para pedir o impeachment da presidente.

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Atos contra o governo Dilma e a corrupção reúnem multidões no BrasilMilhões de manifestantes foram às ruas para protestar contra o governo Dilma, a corrupção e para pedir o impeachment da presidente.http://goo.gl/NyBcZ1 #LuizInácioLuladaSilva #Lula #JairBolsonaro #Bolsonaro #DilmaRousseff #Dilmah #DilmaBolada #BlogDilmaRousseff #Dilma
Publicado por William Waack em Segunda, 14 de março de 2016
Superou, até, o comício das Diretas Já, na Praça da Sé, em 1984 - o maior até aqui. Hoje, os manifestantes voltaram a pedir, de forma pacífica, o impeachment da presidente Dilma Rousseff.

Eles também protestaram contra o ex-presidente Lula e o Partido dos Trabalhadores. Vestidos de verde e amarelo, os manifestantes, de norte a sul, demonstraram apoio ao juiz federal Sérgio Moro e às investigações da Operação Lava Jato.

Também houve homenagens ao Ministério Público e à Polícia federal. As equipes da Globo acompanharam desde cedo esse dia de manifestações pelo Brasil.

Verde e amarelo nas roupas. Clima pacífico nas ruas. Manifestantes voltaram a se reunir em praças e avenidas. O Hino Nacional foi repetido de norte a sul do pais. 

“Eu nunca tinha vindo, é a primeira vez, que agora eu acho que a gente tá no fundo do poço”, fiz manifestante.

Nas mãos dos manifestantes, bandeiras e cartazes contra a presidente Dilma, contra a corrupção e o ex-presidente lula e em apoio ao juiz Sergio Moro, que cuida da Operação Lava Jato. 

“Novos tempos venham, com mais democracia, mais justiça, menos corrupção”, diz manifestante.

“O pova tá cansado de ser roubado, humilhado, independente da classe social, tá todo mundo pagando o preço”, diz manifestante.

Na capital do país,o movimento começou cedo na Esplanada dos Ministério, o Pixuleco, boneco gigante do ex-presidente Lula vestido de presidiário chamava a atenção. No meio do gramado, uma cruz em homenagem ao juiz Sergio Moro. Algumas crianças aproveitaram uma grande bandeira do Brasil pra brincar de escorrega.

Segundo os organizadores, eram 200 mil pessoas, 100 mil segundo a PM. Um número bem superior ao da maior manifestação do ano passado - em 15 de março quando os organizadores calcularam 80 mil pessoas e a PM 45 mil. “Tô aqui lutando por um brasil melhor, como todo mundo aqui”, diz manifestante. 

Hoje os manifestantes em Brasília pediram a saída dos presidentes da Câmara, Eduardo Cunha e do Senado, Renan Calheiros. Alguns se juntaram para mandar um recado contra a presidente Dilma.

Em São Luis, a concentração foi na Avenida Litorânea. Os organizadores calculam que eram cinco mil pessoas. Segundo a PM, quatro mil manifestantes foram para as ruas pedir o fim da corrupção, o impeachment e em apoio ao juiz Sergio Moro.

Uma cobra gigante com a cara do ex-presidente Lula desfilou pela orla de Maceió. O boneco era uma referência às declarações de Lula, que disse que a jararaca estava viva, logo após ter sido levado a prestar depoimento na Lava Jato em condução coercitiva. 

Segundo os organizadores eram 35 mil pessoas. A PM calculou que 25 mil participaram da caminhada ao longo de dois quilômetros, o tempo todo em clima pacífico. 

A Praça da Liberdade, em Belo Horizonte, ficou lotada. O verde e o amarelo tomaram conta das ruas. Uma grande bandeira foi levada pelos manifestantes que pararam para rezar pelo país.

Eram 30 mil manifestantes segundo a Polícia militar. Cem mil segundo os organizadores. Há um ano, 25 mil mineiros foram para as ruas tanto segundo a PM quanto os organizadores.

Muitos cartazes homenageavam o juiz Sergio Moro, a Polícia Federal e o Ministério Público e em vários momentos, a manifestação gritava em coro palavras de ordem contra a presidente Dilma. 

No Recife, o protesto foi no bairro de Boa Viagem. Manifestantes percorreram a orla da praia em apoio à Operação Lava Jato, pedindo a prisão do ex-presidente Lula e o impeachment da presidente Dilma. Eram cem mil segundo os organizadores, 120 mil segundo a PM.

Milhares de pessoas lotaram o Farol da Barra, ponto turístico de Salvador. De verde e amarelo e no mesmo clima pacífico do resto do país, manifestantes fizeram uma passeata contra a corrupção e o governo da presidente Dilma. Eram cinquenta mil pessoas segundo os organizadores, 20 mil segundo a PM. Usando pranchas e caiaques, alguns manifestantes levaram para o mar faixas em homenagem à Policia Federal e ao Brasil.

A manifestação no Rio de Janeiro foi na orla de Copacabana. Oito quarteirões da Avenida Atlântica ficaram lotados.

“Pra tirar essa corrupção. O povo não aguenta mais é muita robalheira o povo tá desesperado”, 

A Polícia militar não divulgou estimativas de participantes. Os organizadores calcularam um milhão de pessoas. De qualquer forma visualmente foi o maior protesto até agora. Foram quatro no ano passado, o primeiro, em março, reuniu cem mil pessoas segundo os organizadores. Na época a PM também não fez estimativas. 

Mesmo quem estava na praia participou do protesto hoje. Nas varandas, também teve adesão ao protesto. Este grupo criou o "moro-bloco" em homenagem ao juiz Sergio Moro e em defesa da Lava Jato.

Durante a passeata, um avião da Frente Brasil Popular - que defende a presidente Dilma sobrevoou a manifestação. O clima foi pacífico, nas ruas as pessoas gritavam palavras de ordem contra a corrupção e o impeachment. 

As palavras de ordem contra a corrupção e o governo da presidente Dilma foram ouvidas e repetidas em todo o país. Milhares de pessoas com faixas e cartazes nas ruas também em favor da Lava Jato e do juiz Sergio Moro, o Hino Nacional deu o ritmo. 

Em Belém, eram 50 mil pessoas, segundo os organizadores. A PM não divulgou. Eles fizeram uma passeata carregando um bandeirão verde e amarelo. 

Em Goiânia, cedo, motoqueiros fizeram um apitaço pelo impeachment. À tarde, o protesto reuniu 90 mil pessoas segundo os organizadores. 60 mil segundo a PM.

Em Foz do Iguaçu, no Paraná, os organizadores contaram 15 mil pessoas, a PM, sete mil. No fim do protesto, os manifestantes soltaram balões com as cores da bandeira.

No interior de São Paulo, também teve protesto em Presidente Prudente, a manifestação reuniu 15 mil pessoas, segundo os organizadores. Nas contas da PM, 8 mil.

Em Jundiaí, cartazes de apoio ao juiz Sergio Moro e a favor do impeachment da presidente Dilma. Segundo os organizadores, 45 mil pessoas participaram. A PM não divulgou números na cidade.

Em Ribeirão Preto, manifestantes coloram numa cela pessoas fantasiadas do ex-presidente Lula e dos ex-ministros Antonio Palocci e José Dirceu. Nas faixas, o impeachment da presidente. Segundo a Polícia Militar, eram setenta mil pessoas. Os organizadores contaram 60 mil.

Rostos pintados e uma imensa bandeira nas cores do Brasil nas ruas de São José do Rio Preto.

Em Guarujá, no litoral paulista, manifestantes se concentraram em frente ao prédio onde fica o triplex que é alvo da investigação na Lava Jato. Segundo, os organizadores, eram cinco mil participantes, dois mil para a PM.

Vinte mil pessoas segundo os organizadores, onze mil segundo a PM, foram para as ruas em Natal. O clima pacífico e as roupas verde e amarelo tomaram conta da Praça Cívica no centro na cidade. Nas faixas e cartazes e nas palavras de ordem pedidos de impeachment da presidente Dilma, contra o PT e a favor da Lava Jato.

Em Aracaju uma manifestante foi para a rua com uma vassoura para varrer a corrupção do Brasil. Ao todo, dez mil pessoas participaram do protesto. Oito mil segundo a PM.

O sol forte em Macapá não desanimou os manifestantes que fizeram uma caminhada próximo ao forte de São Jose, às margens do Rio Amazonas. Em clima pacífico, três mil pessoas segundo os organizadores, mil segundo a PM gritavam palavras de ordem contra a presidente Dilma e a corrupção.

Em Curitiba, a capital da Lava Jato, uma multidão foi para as ruas. Tanto os organizadores quanto a PM calculam que duzentas mil pessoas participaram do protesto. Vários manifestantes usaram máscara do juiz Sérgio Moro.

Na maior cidade do país, o maior protesto, que começou antes mesmo que os manifestantes chegassem à Avenida Paulista. Nas estações de metrô, a multidão já gritava palavras de ordem.

O verde amarelo também estava nas janelas dos prédios na mão e no rosto das crianças
e nas roupas da maioria das pessoas que chegavam à Paulista.

“A participação aqui é puramente cívica. Uma participação pra mostrar que nós ainda precisamos de muita consciência política, cidadã”, diz Marcos Paro, geólogo. 

O grupo do interior de São Paulo encheu três ônibus e enfrentou duas horas de estrada para chegar até aqui.

“Viemos motivados a nos unir, com a união, aqui, em São Paulo, encontrando mais pessoas, e dando a nossa força porque precisamos um país melhor”, diz manifestante.

E teve gente que veio de mais longe ainda. Em coro os manifestantes revezavam os protestos.
Ora contra a presidente Dilma e a favor do impeachment...

“Não tem mais cabimento um governo desse, né?”, diz manifestante.

Ora contra contra o PT. E o ex-presidente Lula.

“A intenção é varrer a corrupção e dizer um basta em tudo o que está acontecendo de sujeira no nosso país”, Francisco de Assis de Souza, enfermeiro.

“Pra mim contribuir melhor com o pais, estou inconformado com apolítica do governo atual”, diz manifestante.

No meio do protesto um grupo apareceu com um pedalinho. Ainda o Pixuleco e um boneco gigante da presidente dilma.

A Federação das Indústrias de São Paulo levou um pato amarelo gigante. Simbolo de uma campanha contra os impostos.

“Então a gente veio aqui protestar, buscando um país melhor pros nossos filhos, principalmente”, diz Roberto Acastro. 

A multidão também se manifestou a favor do juiz Sergio Moro e da Operação Lava Jato.

O governador Geraldo Alckmin e o senador Aécio Neves, do PSDB foram ao protesto.
Eles chegaram a falar com jornalistas, mas acabaram hostilizados pelos manifestantes e tiveram que ir embora. E o protesto, que estava marcado pra começar às 2 da tarde, seguiu recebendo manifestantes.

Já são mais de 4 horas da tarde, o pessoal continua chegando na Avenida Paulista, Mas não consegue andar muito não, estamos na primeira quadra e antes de chegar no primeiro cruzamento, já para, não tem como andar mais.

Essa imagem mostra a Avenida Paulista às quatro e meia da tarde, quando 23 quarteirões já estavam tomados pela multidão ...

No protesto de hoje, a polícia calculou 1 milhão e 400 mil pessoas, 2 milhões e meio segundo organizadores e meio milhão na contagem do DataFolha, de acordo com o instituto, o ato superou as Diretas Já e foi a maior manifestação política já medida pelo DataFolha. 

Todos os números são bem superiores ao da maior manifestação do ano passado - em quinze de março - quando os organizadores e a pm calcularam um milhão de pessoas na Paulista, e o DataFolha, usando metodologia própria, contou 210 mil.

“O movimento Vem pra Rua não tem como objetivo final apenas o impeachment e a transição do Brasil, que são muito importantes. Nós somos um movimento que luta pela renovação política e pelo fim da impunidade. Por isso a importância da homenagem hoje à Operação Lava Jato e a preservação da Justiça. Não importa quem seja o novo governo, vamos continuar lutando pelas mesmas causas que lutamos hoje e independente do partido e independente do novo presidente da República”, afirma Rogério Chequer, líder do movimento Vem Pra Rua. 

“Fica um alerta pra todos os outros políticos - Cunha e quem quer que seja que tenha culpa no cartório. Aqui não é uma passeata de um partido só. Contra um partido só. É contra a corrupção. Todo mundo quer um país melhor. É isso”, diz Ricardo Saraiva de Carvalho, médico.

Em números levantados pelo G1, até as 8h da noite, neste domingo, os protestos aconteceram em todos os estados, em 239 cidades, incluindo as capitais, foi a maior manifestação contra o governo Dilma, o PT e o ex-presidente Lula até agora. Eram 3,1 milhões pessoas das ruas segundo a PM , excluindo as cidades em que a polícia não fez o levantamento, 6,4 milhões pessoas segundo os organizadores.

Em março de 2015, a maior manifestação até essa de hoje, foram 2,4 milhões manifestantes segundo a PM, 3 milhões segundo organizadores.

Fonte: G1, Fantástico, 13/03/2016

segunda-feira, 7 de março de 2016

Lula não pagou do próprio bolso por sítio e tríplex apenas para manter aura de eterno pobre dos pobres?



No artigo abaixo, a colunista do Estadão, Eliane Cantanhede, afirma que Lula não assume ser dono do sítio de Atibaia nem do Triplex do Guarujá porque se o fizer perde a aura de "eterno pobre dos pobres, que veio ao mundo salvar os desvalidos como ele próprio". De fato, surpreende que tendo sido presidente da República e ganhado para isso, Lula não pague do próprio bolso por sítios e triplex, mas tenho minhas dúvidas se é para manter o mito do operário que virou presidente ou se é por outra coisa qualquer. O futuro dirá. 

De qualquer forma, pessoalmente, só acreditei no PT como algo de diferente na política brasileira na década de 80 e até conviver com petistas nos movimentos sociais. Após essa década e esse convívio, meu apoio a candidatos petistas foi definhando, definhando até morrer antes de Lula chegar à presidência. Pra meu orgulho, Lula não contou com meu voto pra chegar lá e sempre me admirei profundamente de que, mesmo depois do mensalão, as pessoas continuassem votando nele. Por isso digo que, apesar do crápula que é, Lula é também espelho de um Brasil bastante feio que agora quer mudar de corpo e alma. Antes tarde do que nunca.


A jararaca

por Eliane Cantanhede

Se o Instituto Lula recebeu R$ 20 milhões das empreiteiras da Lava Jato e se o ex-presidente Lula ganhou R$ 10 milhões dessas mesmas empreiteiras por palestras, por que raios ele não comprou o sítio de Atibaia por R$ 1,5 milhão e reformou as áreas internas e a piscina por R$ 700 mil para desfrutar dele 111 vezes, guardar as 200 caixas do Alvorada, levar o barquinho da família e os pedalinhos dos netos?

E por que Lula não deu para Marisa Letícia o tríplex do Guarujá, instalou aquele elevador chique, mobiliou a cozinha e os quartos, tudo de primeira? Dinheiro ele tinha, de sobra. Como diria o jornalista Carlos Marchi, ainda sobrariam uns bons trocados. Aliás, o que Lula fez com os R$ 10 milhões, mais o salário de oito anos de Presidência, com cama, comida, roupa lavada e uísque de graça? Gastar com os filhos não foi, porque os meninos estão muito bem, obrigada.

De duas, uma: ou Lula é patologicamente pão-duro, desses que escondem o dinheiro debaixo do colchão para os amigos pagarem até o cafezinho, ou... a questão é de outra natureza: política. Apesar de milionário, ele precisava do mito do menino pobre de Garanhuns, que não tinha o que comer, perdeu um dedo nas fábricas e virou o eterno pobre dos pobres, que veio ao mundo salvar os desvalidos como ele próprio. Só assim, mantendo a mítica do grande líder, do pastor de almas, do salvador da Pátria, Lula teria, mesmo acuado e ferido, poder para jogar milhares de ovelhas (ou feras) para confrontos de rua contra adversários, imprensa e o algoz Sérgio Moro, um juiz a serviço dos ricos e poderosos – ah, e do PSDB!

É assim que, aos 70 anos, Lula encarna até hoje o líder juvenil que incendiou os metalúrgicos paulistas, depois os sindicalistas de outros setores e por fim os intelectuais do País inteiro. Não pode se dar ao luxo de comprar com o próprio dinheiro um sítio, um tríplex. Senão, como vai olhar a massa olho no olho, falar de igual para igual, jogar os pobres contra os ricos?

Com escritura lavrada de sítios e tríplex na praia, Lula temia perder a aura de vítima dos ricos inconformados porque milhões saíram da miséria e se aboletam nas cadeiras dos aviões. Como iria acusar “a elite branca de olhos azuis” por todas as mazelas? (Marisa é uma “galega” (como ele a chama) loura de olho verde, mas verde pode, azul é que não pode.)

Tudo, portanto, poderia se resumir ao marketing, ao ilusionismo, que produzem um preconceito às avessas: se Lula é pobre, não se formou, duela com o vernáculo, toma umas e fala palavrões, ele se beneficia nas duas pontas: é um “igual” para as massas e um “inimputável” para as elites (como definiu o mestre Clóvis Rossi). Logo, pode fazer o que bem entende, está não só acima das leis, mas do bem e do mal. Mas há mais do que marketing: ambição. Aí entram Petrobrás e empreiteiras.

Foi pelo preconceito às avessas que, em 1989, o adversário de Collor poderia ter sido Ulysses Guimarães, triplo presidente, Leonel Brizola, ícone da resistência em 1964, Mário Covas, três em um, ou, pela direita, Aureliano Chaves, honesto e cabeçudo. Mas não. Nenhuma dessas biografias e credenciais bateu o mito Lula, embalado pelo carisma, pelas massas, pelas elites intelectuais. Anos depois, o próprio Lula admitiu: “Ainda bem que não fui eleito!”.

Aos que me xingam até de “vagabunda” por definir o 4 de março de 2016 como um dia profundamente triste, repito que foi, sim. Porque Lula foi a utopia e a esperança de uma geração, criou o partido da ética, da justiça, da igualdade e, no seu governo (as condições são outros 500), o Brasil brilhou no mundo e as pessoas eram felizes, esbaldavam-se com fogões, geladeiras, carrinhos e aviões. Mas, ao final, ele e o PT de linda história comprovam, melancolicamente, o quanto o poder deforma e corrompe.

Fonte: Estadão, 06/03/2016


Lula manda a PF (eles) enfiarem o processo no cu.

quarta-feira, 2 de março de 2016

Casamento sobrecarrega a mulher porque homem não divide tarefas domésticas e cuidados com os filhos

Família tradicional = parasitagem masculina. Desigual: Cristiane, com a filha Hanna, trabalha 20 horas a mais que o marido, Alexandre, por semana - Ana Branco /


Que horas ele chega? Mulher trabalha cada vez mais que homem

Números do IBGE mostram que diferença entre dupla jornada dos dois gêneros aumentou nos últimos dez anos no Brasil

por Cássia Almeida / Daiane Costa

RIO - A mulher trabalha cada vez mais que o homem. Não se trata de opinião ou sentimento, é dado estatisticamente comprovado pelo IBGE. Em uma década, a diferença aumentou em mais uma hora. Em 2004, as mulheres trabalhavam quatro horas a mais que os homens por semana, quando se soma a ocupação remunerada e o que é feito dentro de casa. Em 2014, a dupla jornada feminina passou a ter cinco horas a mais, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), que reúne informações de mais de 150 mil lares.

Jornada delas em casa é o dobro da dos homens

Nestes dez anos, os homens viram sua jornada fora de casa cair de 44 horas semanais para 41 horas e 36 minutos, num resultado influenciado tanto pela formalização do mercado de trabalho quanto pelo aumento do número de homens inativos nos últimos anos, explica André Simões, do IBGE. A estagnação econômica de 2014 também ajuda a explicar a situação, com o aumento do desemprego. O tempo extra, no entanto, não se converteu em maior dedicação a afazeres domésticos. A jornada deles dentro de casa permaneceu a mesma de dez anos atrás: dez horas semanais.
É um tempo imutável — classifica a economista da UFF Hildete Pereira de Melo, estudiosa das questões de gênero.
No mesmo período, as mulheres mantiveram seu ritmo de trabalho fora de casa em 35 horas e meia. Dentro de casa, porém, a jornada delas chega a 21 horas e 12 minutos por semana, mais que o dobro da dos homens.

A sobrecarga para as mulheres é bem evidente na casa da dentista Aline Costa Guedes, de 35 anos, do vendedor Fábio Resende, de 36 anos, e da filha Catharina, de 4 anos, em Vila da Penha, subúrbio do Rio. Com o argumento “pintei as unhas e não posso estragá-las”, ela consegue fazer o marido, pelo menos, lavar louça. Segundo Aline, o tema é recorrente nas conversas com as amigas, que se admiram ao saber que Fábio “até lava louça”. Ela trabalha duas horas a mais que o marido por semana:
O Fábio é um excelente pai, presente, mas é normal que a carga dos filhos venha um pouco para cima da mãe. A logística da casa, desde lembrar que tem de pagar tal conta a comprar material de limpeza, é tudo comigo. Eu tenho vontade de chegar em casa e encontrar tudo direitinho.
O marido diz, brincando, que a mulher encontra a casa em ordem quando a diarista faz limpeza:
Ela só encontra a casa assim às quartas e sextas. Não me nego a fazer nada. Mas se eu vir o cesto cheio de roupa, não vou pôr na máquina.
A máquina de lavar roupas parece assustar.
A nossa máquina é a mesma desde que casamos, há oito anos. E ele faz perguntas até hoje: “É para usar qual botão?”, “Bota amaciante?” — brinca Aline.
Mas eu ponho pra bater e penduro — defende-se Fábio.
‘PARA MIM, TEM DE ESTAR TUDO AJEITADINHO’

Na casa da professora de Educação Física Cristiane Lacerda, de 45 anos, e do técnico de vôlei Alexandre Rozenberg, de 41 anos, em Botafogo, Zona Sul do Rio, a situação se repete. Com dois filhos, Breno, de 10 anos e Hanna, de 8 anos, praticamente todo o cuidado das crianças fica com Cristiane. Alexandre leva Hanna para a natação e serve o seu almoço.
Sou muito agitada. Ele é mais tranquilo. Ele ajuda, mas se está a fim de ver televisão, vai para a TV. As roupas ficam comigo, as coisas das crianças e a comida, porque nem um ovo ele sabe quebrar. Esses dias comprei alface e pus em cima da pia. Saí, voltei e estava ainda em cima da pia. Eu perguntei: “Não podia ter lavado?”. Ele disse: “Ah, você não falou” — conta Cristiane, que chega a trabalhar 20 horas a mais por semana que o marido.
Alexandre ouve as reclamações da esposa e diz estar gostando de saber o que a incomoda. Pede que ela fale mais, mas antes, defende-se.
Eu nunca lavei alface! Nem sei como faz. Sou do signo de virgem e, para mim, tem de estar tudo ajeitadinho. Fico incomodado com as coisas fora do lugar. Eu não vou mexer na máquina de lavar roupas. Mas, se quiser, eu ponho a mesa, eu dobro e guardo as roupas. Várias vezes ela vê que tem coisa para fazer e eu estou sentado vendo futebol na TV. Daí é a morte — conta em tom de brincadeira.
Regina Madalozzo, especialista em economia de gênero do Insper, diz que, mesmo quando a mulher trabalha fora, o ritmo é acelerado em casa:
Apesar de a mulher ter conquistado seu lugar no mercado de trabalho, ela ainda não se libertou do trabalho doméstico. Isso só pode mudar via educação. O trabalho doméstico é responsabilidade de todos. O problema é a dificuldade de os homens aceitarem uma ocupação que não é remunerada.
Segundo Simões, do IBGE, apesar de a sociedade estar discutindo a questão, a mudança no comportamento masculino ainda não surgiu nos números.
A mulher trabalha mais que o dobro dos homens. Não houve resposta a essas discussões que estão sendo travadas na sociedade. É cultural. O menino não é estimulado a ajudar nas tarefas domésticas. A menina ganha vassoura, fogão, boneca para cuidar e o menino, bola para jogar futebol.
Neuma Aguiar, socióloga da UFMG, e uma das poucas pesquisadoras no país a tratar do uso do tempo, diz que a ajuda masculina se limita às compras, ao cuidado dos filhos, principalmente no fim de semana e nos momentos de lazer, e o trato dos animais. O trabalho mais pesado de faxina, cozinha e cuidados recai sobre os ombros da mulher:
A saída que as mulheres encontraram para dar conta de todo o trabalho é ter menos filhos.
‘MEU FILHO É IGUAL A MIM, FICA NO SOFÁ’

E a desigualdade persiste mesmo entre os casais mais escolarizados. Entre as mulheres que têm ensino superior, a jornada é 4 horas e 12 minutos maior que a do homem. Entre as mulheres que têm ensino fundamental incompleto, a diferença é de 4 horas e 48 minutos em relação ao homem. O estudo faz a mulher trabalhar 36 minutos menos por semana. Neuma crê que a nova geração vai conseguir diminuir essa desigualdade:
Eu acho que as mulheres mais jovens podem mudar alguma coisa.
Cristiane e Alexandre, que desde outubro cortaram a empregada para reduzir gastos, passaram a incluir os filhos nas tarefas.
Meu filho é igual a mim quando minha mãe pedia ajuda: continua sentado no sofá — diz o pai.
Cristiane não perde a esperança:
Hanna ajuda mais do que Breno. Mas não quero que esse comportamento se repita no meu filho. Isso vem dos antigos. Parece normal, mas não é.
Segundo Hildete, as mulheres ficam muito culpadas quando estão no trabalho fora:
O trabalho em casa é trabalho não pago, oferecido para sociedade. Ela faz por amor.
Casamento sobrecarrega mulher

O casamento faz a mulher trabalhar mais. Estudo da economista do IBGE Cristiane Soares, apresentado em seminário da Associação Brasileira de Estudos Populacionais (Abep), mostra que em qualquer tipo de família, seja com filhos, com idoso, com pessoa doente em casa, a mulher trabalha mais se for casada, indicando que o marido dá trabalho ao invés de poupar a mulher. No caso dos homens, a situação é completamente inversa: o casamento livra o homem das tarefas domésticas. São mais indicadores que mostram a desigualdade de gênero no Brasil, onde a mulher ganhava em média 26% menos que os homens em 2014. Dez anos antes, ganhava 30% menos.

De acordo com os números apresentados pela pesquisadora, um homem solteiro que tem filhos pequenos e um idoso doente em casa dedica quase 20 horas semanais para o trabalho caseiro. O casamento o livra de mais de nove horas de trabalho: a jornada cai para 10 horas e 42 minutos. A mulher, na mesma composição familiar, dedica 25 horas e 36 minutos quando não tem companheiro. Ao se casar, o tempo dispendido sobe para 26 horas e 6 minutos, jornada meia hora maior ao dividir a vida com um homem.
Quando não é casado, o homem costuma terceirizar o serviço doméstico. Quando casa, transfere para a mulher — diz Cristiane.
‘UM FOLGADO E UM ENFORCADO’

Para Regina Madalozzo, especialista em economia de gênero do Insper, o serviço doméstico é considerado responsabilidade feminina:
Quando é casada, trabalha ainda mais em casa, pois quando o homem está morando com uma companheira, ele diminui o ritmo de afazeres domésticos. A cultura é que o trabalho doméstico é responsabilidade da mulher. É uma visão até das próprias mulheres. Prova disso é usarmos o termo “ele ajuda em casa”, como se não fosse uma obrigação.
Essa cultura de serviço faz a mulher reproduzir essa situação fora de casa. Segundo o mesmo estudo, 86% dos trabalhadores domésticos são mulheres. Entre os cuidadores, essa parcela sobe para 88,5%. Essas duas funções empregam 20% das mulheres ocupadas no país.
A sociedade aceita essa situação de sobrecarga feminina. A população está envelhecendo, e o trabalho de cuidado de idosos e doentes está sobre os ombros das mulheres. Em 2060, um terço da população será de idosos — afirma Cristiane.
A economista diz que a sociedade precisa discutir a intensificação do trabalho da mulher:
Principalmente no momento em que se discute igualar a idade de aposentadoria. As mulheres vivem mais, porém têm um trabalho mais intenso.
De acordo com a professora Maria José Tonelli, pesquisadora do Núcleo de Estudos em Organizações e Gestão de Pessoas da Fundação Getulio Vargas de São Paulo, a desigualdade não se restringe ao uso do tempo:
Essa condição apenas confirma um traço cultural que é a profunda desigualdade do país: entre pobres e ricos e entre homens e mulheres. O Brasil, assim como outros países latinos, é bastante machista. Romper essa barreira não é fácil, pois muitas vezes ela é quase invisível, de comportamento e valores.

Thiago de Almeida, psicólogo especialista em relacionamento e professor da USP, aconselha os casais a dividirem as tarefas de acordo com preferências e limitações:
A delegação de tarefas deve ser feita de forma pacífica. Tem aquela frase: atrás do folgado tem sempre um enforcado. Então, para que nenhum dos dois seja o enforcado, são necessários acordos.
A representante da ONU Mulheres no Brasil, Nadine Gasman - Agência Brasil

Entrevista: Igualdade só daqui a 80 anos, diz ONU
por Daiane Costa

A representante da ONU Mulheres no Brasil, Nadine Gasman, defende que a igualdade de gênero é questão de justiça. Para ela, quanto mais tarefas do lar as mulheres assumirem, menos chances têm de se dedicar a outros setores importantes, como a política.

Por que a desigualdade de jornada aumenta?

Quanto mais as mulheres se sobrecarregam com cuidados familiares e administração dos lares, menos chances têm de se dedicar a setores da vida que lhes interesse, como a política. Estamos falando de ajustes que precisam ser feitos com base na justiça. O empoderamento das mulheres é viável com a consciência sobre os seus direitos, e com uma sociedade engajada em mudar estruturas que fortalecem o poder dos homens às custas dos sacrifícios e de violações de direitos de gerações de mulheres.

Por que as mulheres ainda ganham menos do que os homens?

O mundo do trabalho é outra área em que as desigualdades de gênero e raça são visíveis devido à ocupação de postos de trabalho, oportunidades de ascensão profissional, condições de trabalho, remuneração e administração da vida pessoal. As mulheres ainda recebem cerca de 30% menos que os homens. O racismo e o sexismo geram situações extremamente cruéis para o desenvolvimento de carreiras. Quero chamar a atenção para a responsabilidade das empresas de se colocarem de forma ativa e colaborarem para o fim do racismo e do machismo.

Como mudar isso?

Os estudos apontam que, mantidas as condições atuais, levará 80 anos para alcançar a igualdade de gênero. A ONU adotou 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável para que o mundo faça mudanças rápidas e estruturais até 2030. É preciso identificar onde estão mulheres e homens, como vivem, onde elas estão excluídas, definir ações para corrigir essas distorções e assegurar o equilíbrio para que realmente possam desenvolver o seu potencial e lograr estas mudanças até 2030.

Como a mulher pode acelerar esse processo?

A igualdade de gênero é uma questão de justiça. É importante que mulheres e homens façam acordos sobre como administrar as tarefas familiares e de administração da casa. Estamos falando de novos valores sobre a vida, respeito e novas formas de relacionamento. Sem violência, intimidações e funções determinadas. Se todos vivem sob o mesmo teto, por que cabe às mulheres todo o trabalho?

De que forma a ONU atua para reduzir as diferenças?

A ONU Mulheres trabalha pela igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres. As Nações Unidas acreditam que é possível promover mudanças estratégicas no mundo até 2030. E as mulheres são decisivas nesse processo. Estamos desenvolvendo a iniciativa “Planeta 50-50: um passo decisivo pela igualdade de gênero” e buscando parcerias para que a igualdade seja uma realidade em 14 anos, beneficiando esta e futuras gerações. Nós, todas e todos, podemos ser a geração que mudará o planeta. Temos de trabalhar para eliminar todas as formas de desigualdades e discriminações.

Fonte: O Globo, 21/02/2016

Por que só as mulheres têm que lavar a roupa suja?
Finalmente um comercial que fala a verdade sobre o trabalho duro das mães e o quanto isto é injusto. www.tudosobreminhamae.com
Publicado por tudo sobre minha mãe em Segunda, 29 de fevereiro de 2016

segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

Fim do caminho para o PT

Fim do caminho para o PT
 Fernando Gabeira, em mais um bom artigo, fala da urgência de se tirar Dilma e o petismo do poder, agora que - como se alguém duvidasse - há provas de que a campanha da presidanta foi feita com dinheiro roubado da Petrobras. Destaco alguns trechos do artigo abaixo, mas sugiro sua leitura integral.
A Lava-Jato demonstrou que a campanha de Dilma foi feita com dinheiro roubado da Petrobras. E agora? Não é uma tese política, mas um fato, com transações documentadas. [...]
Simplesmente não dá para continuar mais neste pesadelo de um país em crise, epidemia de zika, desemprego, desastres ambientais, é preciso desatar o nó, encontrar um governo provisório que nos leve a 2018.
De todas as frentes da crise, a que mais depende da vontade das pessoas é a política. Se o Congresso apoiado por um movimento popular não resolver, o TSE acabará resolvendo. Com isso que está aí o Brasil chegará a 2018 como um caco, não só pela exaustão material, mas também por não ter punido um governo que se elegeu com dinheiro do assalto à Petrobras.
É hora de o país pegar o impulso da Lava-Jato: carro limpo, governo derrubado, de novo na estrada. É uma estrada dura, contenções, recuperação da credibilidade, quebradeira nos estados e cidades. É pau, é pedra, é o fim do caminho.
A semana, com a prisão do marqueteiro do PT e os dados sobre as transações financeiras, trouxe mais claramente o sentido de urgência. E a esperança de sair desta maré.
Fim do caminho

por Fernando Gabeira
“A liberdade é vermelha”, escreve num post de Paris Mônica Moura, mulher do marqueteiro João Santana. É uma alusão a uma trilogia de filmes inspirados nas cores da bandeira francesa. O primeiro deles se chamou “A liberdade é azul”. É compreensível que Mônica Moura tenha escolhido o vermelho entre as cores da bandeira. E que tenha escolhido a liberdade do lema da Revolução Francesa, que também conta com fraternidade e igualdade.

João Santana e Mônica ficaram milionários levantando a bandeira vermelha, no Brasil, na Venezuela, com as campanhas agressivas do PT e do chavismo. Com os bolsos entupidos de dólares, a liberdade é vermelha, pois à custa da manipulação dos eleitores latino-americanos, João Santana e Mônica Moura podem viajar pelo mundo com um padrão de vida milionário.

Mas chega o momento em que a cadeia é vermelha, e Mônica Moura não percebeu essa inversão. Nas celas da Polícia Federal e do presídio em Curitiba, o vermelho predomina. José Dirceu, Vaccari, o PT é vermelho. Marcelo Odebrecht, a Odebrecht é vermelha, basta olhar seus cartazes.

Uma vez entrei na Papuda e filmei uma cela vermelha com o número 13. Os condenados do mensalão estavam a ocupar o presídio. A divulgação da imagem foi um Deus nos acuda, insultos: as pessoas não têm muita paciência para símbolos. Mônica Moura fala esta linguagem. Se tivesse visto o take de seis segundos da cela vermelha, ela iria buscar outra cor para a liberdade.

A situação de Dilma e a do chavismo convergem para um mesmo ponto: tanto lá quanto aqui a aspiração majoritária é derrubá-los do poder. João Santana, num país onde se valoriza a esperteza, foi considerado um gênio. Gênio da propaganda enganosa, dos melodramas, dos ataques sórdidos contra adversários. O único critério usado é a eficácia eleitoral avaliada em milhões de dólares, certamente com taxa extra para os postes, Dilma e Haddad.

Sua obra continental se espelha também no resultado dos governos que ajudou a eleger: Dilma e Maduro são rejeitados pela maioria em seus países. O que aconteceu na semana passada é simplesmente o fim do caminho. Com abundantes documentos, cooperação dos Estados Unidos e da Suíça, não há espaço para truque de marqueteiros.

O dinheiro de Santana não veio de fora. Saiu do Brasil. Saiu de uma empresa que tinha negócios com a Petrobras, foi mandado para o exterior por seu lobista Zwi Skornicki. E saiu também pela Odebrecht.

A Lava-Jato demonstrou que a campanha de Dilma foi feita com dinheiro roubado da Petrobras. E agora? Não é uma tese política, mas um fato, com transações documentadas.

Na semana passada ouvi os panelaços por causa do programa do PT. O programa foi ao ar um dia depois da prisão de João Santana. Mas o tom era o mesmo, uma mistificação para levantar os ânimos. E um pedido de Lula: parem de falar da crise que as coisas melhoram.

Em que mundo eles estão? Em 2003, já afirmei numa entrevista que o PT estava morto como proposta renovadora. Um pouco adiante, com o mensalão, escrevi “Flores para los muertos”, mostrando como uma experiência que se dizia histórica terminou na porta da delegacia.

Na semana passada, escrevi “O processo de morrer”. Não tenho mais saída exceto apelar para “O livro tibetano dos mortos”, que dá conselhos aos que já não estão entre nós. O conselho é seguir em frente, não se apegar, não ficar rondando o mundo que deixaram.

Experimentei aquele panelaço como uma cerimônia de exorcismo: as pessoas saíam às janelas e varandas para espantar fantasmas que ainda estavam rondando as casas. Poc, poc, poc. Na noite escura, o silêncio, um grito ao longe: fora PT. E o PT na tela convidando para entrar nas fantasias paradisíacas tipo João Santana, já trancafiado numa cela da PF em Curitiba.

Simplesmente não dá para continuar mais neste pesadelo de um país em crise, epidemia de zika, desemprego, desastres ambientais, é preciso desatar o nó, encontrar um governo provisório que nos leve a 2018.

De todas as frentes da crise, a que mais depende da vontade das pessoas é a política. Se o Congresso apoiado por um movimento popular não resolver, o TSE acabará resolvendo. Com isso que está aí o Brasil chegará a 2018 como um caco, não só pela exaustão material, mas também por não ter punido um governo que se elegeu com dinheiro do assalto à Petrobras.

É hora de o país pegar o impulso da Lava-Jato: carro limpo, governo derrubado, de novo na estrada. É uma estrada dura, contenções, recuperação da credibilidade, quebradeira nos estados e cidades. É pau, é pedra, é o fim do caminho.

A semana, com a prisão do marqueteiro do PT e os dados sobre as transações financeiras, trouxe mais claramente o sentido de urgência. E a esperança de sair desta maré.

Artigo publicado no Segundo Caderno do Globo em 28/02/2016

Fonte: Blog do Gabeira, 28/02/2016

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

Devido ao surto do vírus zika, revista Forbes defende cancelamento da Olímpiada no Rio

Chegou a hora de cancelar a Olimpíada no Rio, defende revista 'Forbes'
Com a crise no Brasil agravada pelo surto de vírus zika, “está começando a parecer que chegou a hora de cancelar os jogos Olímpicos de 2016 no Rio de Janeiro'', diz um texto publicado no site da revista de economia “Forbes''.
A razão é simples: mulheres jovens não podem viajar com segurança para o país'', diz o texto, publicado na seção de finanças nos esportes.
Por mais que a água poluída e questões de segurança já tornassem as coisas difíceis para qualquer pessoa que quisesse visitar o país, agora o Brasil está na linha de frente da epidemia do vírus zika'', explica, lembrando que a Organização Mundial de Saúde já decretou emergência internacional por causa da doença.
Segundo a “Forbes'', na situação atual, somente atletas vão poder viajar ao país, e mesmo entre os competidores há mulheres que vão correr riscos.
O Comitê Olímpico Internacional deve mudar os Jogos de lugar, adiar sua realização ou cancelar a Olimpíada. Prevenção é a melhor opção diante de uma ameaça tão séria à humanidade'', complementa.
O risco de epidemia global das doenças se tornou um assunto político a ser tratado por diplomatas em encontros internacionais e médicos de todo o mundo na Organização Mundial da Saúde. E agora o zika praticamente mobiliza o noticiário internacional sobre o Brasil. Mais da metade das menções ao país na imprensa estrangeira tratam do zika. Na última semana, foram centenas de reportagens todos os dias, com diferentes abordagens e com variados graus de aprofundamento. E assim, a associação entre zika e Brasil chegaram ao topo das tendências mais populares do planeta no Google.

Fonte: Brasilianismo, por Daniel Buarque, 05/02/2016

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Formadores de opinião da esquerda brasileira são financiados por grandes capitalistas

Leonardo Sakamoto faz parte do conselho editorial da Agência Pública
Reproduzo o texto abaixo do site Spotniks porque achei interesse apontar a contradição do pessoal que vive clamando contra o capitalismo enquanto é financiado por bilionários capitalistas. Deixando claro que o problema não é o financiamento em si das entidades (não se trata de uma novidade), mas sim as causas financiadas muitas vezes incompatíveis com sociedades democráticas e as liberdades individuais. Vale a leitura também para refletir sobre as razões dos próprios financiadores (!?)

Eles formam a opinião da esquerda brasileira. E são financiados por esses grandes capitalistas.

por Felippe Hermes

Permitir a todo cidadão comum americano viver a noite foi motivo para fazer de John D. Rockefeller o homem mais abonado de seu tempo e um dos mais ricos da história. Seu produto revolucionário, o querosene, fez com que todo lar americano pudesse ter acesso a um espaço do dia antes muitas vezes restrito a uma pequena elite, capaz de pagar pelo óleo de baleia ou pelas velas comuns. A marca de Rockefeller entretanto vai muito além dessa empreitada. Sua guerra pessoal com Andrew Carnegie em torno da filantropia é uma herança americana presente ainda nos dias atuais.

Nenhum país do mundo realiza tantas doações como os americanos. São US$ 358 bilhões apenas em 2014 (cerca de 15% do PIB brasileiro doado para a caridade). A exemplo de Rockefeller, criar uma fundação e legar seu nome às mais variadas obras tornou-se uma obsessão de quase todo bilionário americano. Prédios de universidades quase sempre carregam o nome de ex-alunos ricos – alguns foram até mesmo construídos por meio de doações, como a Universidade de Chicago, criada por Rockefeller.

Para além de prédios e bibliotecas (como as 3 mil bibliotecas construídas por Andrew Carnegie), os bilionários americanos empenham-se em questões de cunho social e engajamento político. Dentre as mais de 1,52 milhão de entidades de caridade americanas, algumas merecem destaque exatamente pelo ativismo a que se propõem. Dentre elas, a Fundação Ford, criada em 1936 pelo bilionário Henry Ford, a Open Society, do bilionário George Soros, e a própria Fundação Rockefeller, cujos interesses hoje vão bem além da educação.

Com patrimônio bilionário, tais fundações não poupam recursos em defender suas agendas. Enquanto a Fundação Ford doa US$ 560 milhões anuais, a Fundação Open Society prevê doar US$ 960 milhões em 2016. Tantos recursos acabam parando também no Brasil e na América Latina, onde a Fundação Ford doa em média US$ 25 milhões anuais, contra US$ 37 milhões da fundação de Soros. Abaixo, algumas das causas beneficiadas por tais fundações – e que, não sem motivo, ajudam a formar a opinião da esquerda tupiniquim.

1. CENTRAL ÚNICA DOS TRABALHADORES


Maior das centrais sindicais brasileiras, a CUT (Central Única dos Trabalhadores) é responsável por representar cerca de 1 em cada 3 trabalhadores filiados a sindicatos no país. Seus 7,5 milhões de filiados fazem da CUT a maior entidade recebedora do imposto sindical no país. A despeito de fazer campanha contra o imposto (que obriga cada trabalhador com carteira assinada no país a repassar 1 dia de trabalho aos sindicatos), a entidade recebeaproximadamente R$ 51 milhões anuais, ou 1,6% do valor arrecadado com o imposto (de R$ 3,2 bilhões/ano). Os demais são distribuídos entre os 15,8 mil sindicatos brasileiros.

O imposto sindical obrigatório, no entanto, uma exclusividade brasileira não existente em nenhum outro país do mundo, não é a única forma de sustento da entidade presidida por Vagner Freitas (conhecido por sugerir em discurso no Palácio do Planalto que se preciso fosse, pegaria em armas para defender o governo Dilma – e claro, por seu cargo como conselheiro no BNDES, um trabalho cujo rendimento por participação em algumas poucas reuniões mensais pode remunerar até R$ 21 mil seu ocupante). A CUT complementa seu orçamento ainda com participação em ganhos de associados nas negociações sindicais e doações de fundações e organizações internacionais.

Firmado em 2014, o acordo entre a CUT e a Fundação Ford rendeu à entidade aproximadamente $150 mil (ou R$ 350 mil com o câmbio da época). Com contratos como este, além dos demais acordos com BNDES e Petrobras, a organização se destaca também na elaboração de premiações, como o Prêmio CUT: Democracia e Liberdade Sempre, que em 2011 laureou o ex-presidente Lula como o título de “personalidade de destaque na luta por Democracia e Liberdade” (na mesma edição, o MST ganhou como “instituição de destaque na luta por Democracia e Liberdade”).

2. INTERVOZES



Com slogans como ‘democratizar a mídia’, grupos de esquerda e políticos brasileiros insistem há algum tempo em impor um debate sobre o papel da mídia e o peso da regulação do Estado no setor. A exemplo do que fez a Argentina, tais movimentos lutam por uma limitação de grupos de mídia que torne a imprensa mais fragmentada, e consequentemente mais suscetível ao achacamento dos governos. Com participação do debate do Marco Civil da Internet às campanhas de Banda Larga Popular, grupos como o Intervozes se apresentam como os principais centros de produção de ideias para o debate da mídia no país.

O peso excessivo do capital no viés da informação é o alvo preferido neste debate. Se por um lado, a imprensa brasileira sofre de uma crise que se prolonga há anos, forçada a reinventar seu modelo de negócios para manter-se de pé e evitar demissões em massa de jornalistas, grupos como o Intervozes em nada são afetados por estes dessabores do mercado. E a razão para isso é fácil de explicar: seu financiamento é assegurado por organizações internacionais.

Para a Fundação Ford, financiar ideias de regulação da mídia em países emergentes é uma ideia relativamente antiga. A própria Intervozes consta na lista de doações da entidade há pelo menos 9 anos, com uma doação de US$ 160,7 mil em 2006 (a organização americana está no rodapé da página do movimento como “financiamento institucional”). De lá para cá foram US$ 2 milhões, ou quase R$ 15 milhões, quando considerada a inflação brasileira, para pautar o debate de mídia no Brasil.

Algumas das ideias defendidas pelo Intervozes são possíveis de conferir aqui, em seu blog na Carta Capital.

3. AGÊNCIA PÚBLICA



O empreendedorismo no setor de mídia tem ganhado força nos últimos anos, sob o manto da independência e da não participação de grandes grupos de mídia. Sites como a Agência Pública ganharam destaque ao produzir reportagens-denúncia a respeito dos mais diversos temas. Aos mais esquecidos, a agência é responsável pela matéria “A nova roupa da direita”, que trata exatamente do financiamento americano a grupos da “Nova direita” no Brasil e na América Latina.

Em tom de denúncia, o site, que é mantido por organizações como a Open Society (do bilionário húngaro-americano George Soros) e a Fundação Ford – demonstra como organizações brasileiras estariam recebendo financiamento americano para defender suas ideias. Uma doação de US$ 25 mil à rede americana Students For Liberty feita pelos bilionários Charles & David Koch (controladores da Koch Industries, ambos entre os 10 mais ricos do mundo, segundo a Bloomberg), torna-se prova cabal de que a sua filial brasileira, a rede Estudantes Pela Liberdade, faria parte do chamado ‘Kochtopus’ (a rede de entidades que recebe doações dos irmãos Koch). Como já defendeu a revista Carta Capital, os irmãos teriam supostamente doado estes valores à organização americana para que fosse feita no Brasil a defesa de ideias como a privatização da Petrobras (uma vez que ambos possuem empresas em oleodutos e petroquímica).

Além dos US$ 500 mil recebidos da Fundação Ford desde sua criação, e de valores desconhecidos da Open Society, de Soros, a Pública, como é conhecida, conta ainda com extensas campanhas de financiamento coletivo para bancar seu modelo de negócio sem fins lucrativos. Em determinada campanha, por exemplo, a agência arrecada verbas para bancar bolsas de estudo para jornalistas (com remunerações que chegam a R$5 mil mensais). Contando com o blogueiro do Grupo UOL/Folha, Leonardo Sakamoto, em seu conselho editorial, a Pública presta ainda alguns serviços de produção de conteúdo para organizações como a ClimateWorks (fundação americana voltada para o meio ambiente), que já doou cerca de US$ 200 mil (ou R$800 mil em valores atualizados) desde 2012, quando iniciou a parceria. O foco, segundo a ClimateWork, é garantir a cobertura independente de políticas públicas na Amazônia.

4. CUNHÃ – COLETIVO FEMINISTA



Um dos mais conhecidos coletivos feministas brasileiros, o Cunhã, entende sua atuação como algo muito além da própria luta feminista contra projetos de leis considerados ofensivos às mulheres e aos constantes atos de violência de gênero. Sua atuação é também política – especificamente como base de apoio ao governo Dilma.

Organizador dos atos contra o impeachment na Paraíba e da Marcha das Margaridas (o evento financiado pelo BNDES e Petrobras que leva anualmente milhares de mulheres a Brasília por meio de coletivos feministas, CUT e MST), o coletivo Cunhã tem por objetivo defender direitos reprodutivos, enfrentar a violência doméstica, garantir trabalho, autonomia e maior participação política das mulheres. Dentre os principais financiadores da organização, encontra-se a Brazil Foundation, organização com sede nos Estados Unidos que atua buscando doações para projetos no Brasil. Dentre os doadores da Brazil Foundation, destaca-se o ex-presidente do Banco Central e assessor do candidato Aécio Neves, Armínio Fraga, além do banco de investimentos Goldman Sachs e da Vanguard Capital, gestora de ativos norte-americana.

Financiar o movimento feminista é uma tradição de longa data da Fundação Ford. Além do coletivo Cunhã, que recebeu US$ 450 mil, a organização Themis (US$ 360 mil), SOS Corpo(US$ 750 mil) e a organização “Católicas Pelo Direito de Decidir” (US$ 200 mil) também estão na lista de doações da entidade. No geral, para financiadores do coletivo Cunhã, como a Fundação McArthur, a International Women’s Health Coalition e a própria Fundação Ford, tais financiamentos possuem como ideia central apoiar projetos de planejamento familiar e organizações favoráveis a direitos como o aborto. Para organizações como o coletivo Cunhã, entretanto, tais fontes de financiamento servem também ao interesse político-partidário.

5. VIVA RIO E SOU DA PAZ



O referendo do desarmamento completou em 2015 seus 10 anos. A despeito da vitória do NÃO, com 63,94% dos votos, as duas principais organizações por trás da defesa do desarmanento mantém sua atuação e contam com verbas cada vez maiores.

Com receitas de R$ 450 milhões em 2014 (sendo R$ 440 milhões em contratos de prestação de serviço na área de saúde), a ONG Viva Rio ainda mantém uma forte atuação como defensora do desarmanento, posição também mantida e ampliada pela ONG Sou da Paz – cuja receita, apesar de mais modestas (R$ 15,2 milhões em 2014), também financia majoritariamente campanhas pelo desarmamento (a fundação Sou da Paz foi fundada como uma campanha pró-desarmamento em 1997). A Viva Rio, mais antiga, de 1993, possui dentre seus fundadores José Roberto Marinho, além de ter João Roberto Marinho em conselho (ambos herdeiros do Grupo Globo, que consta na lista de apoios da fundação).

Dentre os financiadores, porém, as organizações internacionais ganham destaque, junto de instituições financeiras como Credit Suisse e Santander. A Open Society, de George Soros, consta como apoiadora da Sou da Paz (sem valores declarados), além da fundação holandesa Bernard Van Leer, que contribuiu com 57 mil euros em 2014. A Fundação Ford, por exemplo, doou mais de US$ 600 mil para o Instituto Sou da Paz. Uma das doações, realizada em 2005, fez com que o Tribunal Superior Eleitoral proibisse o instituto de participar da campanha do referendo do desarmamento (segundo a lei brasileira, organizações com financiamento estrangeiro não podem participar de campanhas políticas). Por parte da ONG Viva Rio os nomes se repetem, além de consulados de países como França e Suécia, organizações não-governamentais europeias, da Polícia Militar do Rio de Janeiro, das Organizações Globo, a ONG é também beneficiária de doações por parte das Fundações Ford e da Open Society, de Soros.

O Instituto Sou da Paz é também o realizador de uma pesquisa a respeito de doações da indústria armamentista a políticos brasileiros. Segundo a denúncia, cerca de 21 parlamentares eleitos, que comporiam a bancada da bala, receberam R$ 2 milhões em doações nas eleições de 2014. O valor, de forma irônica, é aproximadamente 10% do orçamento do próprio instituto.

Fonte: Spotniks, 01/02/2016

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

A trajetória da santificação do Estado na História do Brasil

RESUMO: O texto rebate afirmação do sociólogo Jessé Souza, que destacou, em entrevista à "Ilustríssima", a suposta "demonização" do Estado na sociedade brasileira. O autor argumenta que, pelo contrário, na história do Brasil o poder e o papel do Estado têm sido exaltados, em contraste com a tradição da democracia liberal.

Raízes do Brasil político: Os caminhos de um projeto iliberal

Por Marcus André Melo

Instigante debate tem sido gerado pela assertiva de Jessé Souza, na "Ilustríssima" (10/1), de que o Estado tem sido, no Brasil, "demonizado como corrupto e ineficiente e o mercado visto como o reino de todas as virtudes". Na realidade, as raízes do Brasil político e institucional passam longe de Sérgio Buarque de Holanda: elas se assentam em solo diverso, na santificação do Estado.

As instituições políticas brasileiras foram moldadas por essa visão iliberal. Ela foi o princípio organizador da ordem social de acesso limitado, para usar o conceito de Douglass C. North e coautores, que caracteriza o Brasil do século 20.

O Brasil monárquico, centralizador e escravagista do século 19 é por excelência o Brasil "Saquarema". Esse Brasil é produto da imaginação política do Visconde do Uruguai e dos líderes do Regresso Conservador: eles que forjaram as instituições fundamentais do país. Como lembra José Murilo de Carvalho, Uruguai é o pai do projeto conservador vitorioso que aposta na intervenção autoritária do Estado para redimir a nação e que marcou o Brasil do século 20.

Esse projeto se assenta no pressuposto de que a sociedade civil e o mercado são viciosos –faccionais, particularistas, locais– e de que o Estado é o ator fundamental nesse reformismo "pelo alto". O Estado demiurgo garantiria a integridade da ordem territorial e social.

Os discípulos diretos dessa visão no século 20 são Alberto Torres e Oliveira Vianna. Ao referir-se ao Brasil "invertebrado" criado pela República, Torres postulava um Estado forte que domasse os interesses privados regionais e patrocinasse o interesse coletivo. Em "Organização Nacional" (1910), Torres apresentou um projeto de reforma constitucional nacionalista e centralizador –e forneceu parte considerável do léxico iliberal que dominou o discurso político no século 20. Nessa chave, as instituições políticas liberais eram consideradas pouco propícias para prosperar no solo brasileiro. Vem de Torres e de pequeno círculo de publicistas com quem mantinha afinidades eletivas a fantasia do espelho de Próspero: a noção de que a democracia era coisa alienígena porque anglo-saxônica.

O nosso "Ocidente" seria outro: Ibérico. Iberismo e democracia, autogoverno, ou governo limitado, seriam incompatíveis. Vem também desse círculo de publicistas o horror aos partidos políticos e à competição política. O "locus" da política eram os Estados –todos os partidos eram estaduais–, daí o horror à federação.

Quando finalmente escreveram uma constituição –para um Estado Novo em folha–, celebraram-na com uma tenebrosa queima de bandeiras estaduais.

Torres também forneceu a chave para a fórmula da disjunção "país legal versus país real". Não adiantava insistir, como seu adversário Rui Barbosa, em fazer cumprir a letra da lei, mas reconhecer o "idealismo da constituição", e superá-lo. Em livro com esse título, Oliveira Vianna sustentou que o remédio para essa disjunção era um Estado forte que asseguraria seus interesses contra os interesses mesquinhos, porque privados, dos clãs familiares. Para isso seria necessário passar por cima da Constituição artificial, porque liberal, ou elaborar uma carta constitucional em que o império da lei fosse uma ficção.

CORPORATIVISMO

Barbosa Lima Sobrinho, em sua biografia de Torres, mostra a influência decisiva dessa agenda na criação das instituições da Era Vargas –cujos principais atores políticos reuniam-se na Sociedade dos Amigos de Alberto Torres, fundada em 1932. Um dos seus membros, Oliveira Vianna, foi artífice de instituições com as quais convivemos até hoje, as estruturas corporativistas que regulam o mercado de trabalho no Brasil: a Justiça do Trabalho, o imposto sindical, a unicidade sindical, o IAA (Instituto do Açúcar e do Álcool), o IBC (Instituto Brasileiro do Café) e outros órgãos do intervencionismo econômico, como o Código de Águas e de Minas –a lista é longa.

Vianna flertou abertamente com o racismo e o fascismo, mas a maioria dos arquitetos do Brasil contemporâneo não aderiu abertamente a projetos totalitários. A historiografia brasileira criou uma expressão própria para identificar o conteúdo substantivo do programa desses publicistas: "liberais autoritários", por buscarem fortalecer direitos individuais a partir de instrumentos autoritários. Na balança, na realidade, esses direitos pesavam muito menos do que a razão de Estado.

É fundamental enfatizar que Uruguai, Torres e Oliveira Vianna não eram literatos. Não moldaram apenas a visão de mundo dos brasileiros, tal como Sérgio Buarque de Holanda. Uruguai, Torres e Oliveira foram todos membros de cortes superiores e presidentes de província e Estados –além de ministros. Foram homens de Estado, construtores de instituições. Influenciaram gerações de militares golpistas e a esquerda brasileira.

A rejeição ao liberalismo naquele contexto não foi um fenômeno brasileiro –só que no Brasil deitou raízes que permanecem até hoje. As democracias maduras fortaleceram o Poder Executivo e aprofundaram a democracia, extirpando a dimensão iliberal; no Brasil só fizeram a primeira tarefa, não a segunda. Muitas instituições (do mercado de trabalho etc.) continuam intactas até hoje e apresentam patologias desconhecidas no resto do mundo (como a existência de 38 mil sindicatos inorgânicos).

O denominador comum do programa conservador, à esquerda e à direita, era o caráter subordinado que questões relativas à regra da lei, a responsabilização e controle democrático do Estado ocupavam na agenda de mudança. As instituições de controle e os direitos civis e políticos mereceram apenas notas de rodapé.

A emancipação individual via educação não entrou na agenda. A democracia era valor não universal: o ditador foi aclamado pelo queremismo como grande líder. Afinal, matava, mas redistribuía. Não importava se as lideranças de esquerda tivessem apodrecido no calabouço do Estado Novo. Um novo "xibolete" fornecia a defesa contra a denúncia do abuso de poder e da corrupção: a desqualificação como udenismo.

A perda da eficácia simbólica dessa arma retórica no Brasil na atual conjuntura é sinal de mudança na cultura política.

Fortalecer o Poder Executivo na nova era industrial era imperativo, mas, ao mesmo tempo, seria necessário fortalecer os controles democráticos, como insistia Afonso Arinos. Essa agenda só foi enfrentada na Constituição de 1988, quando houve delegação significativa de poder ao Ministério Público, ao Judiciário, aos tribunais de contas. As reformas dos anos 1990 também eliminaram parte do legado varguista.

A República Velha viveu a maior parte do tempo sob estado de sítio e poucas vozes se insurgiam contra o militarismo, o abuso de poder, a falta de competição política, a corrupção. O único a se levantar contra o estado de coisas vigente foi Rui Barbosa. Para ele, o presidente brasileiro havia se convertido no "poder dos poderes, o grande eleitor, o grande nomeador, o grande contratador, o poder da bolsa, o poder dos negócios, e o poder da força. Quanto mais poder tiver menos lhe devemos cogitar na ditadura [...] por todos reconhecida mas tolerada, sustentada, colaborada por todos".

Rui e poucos outros buscaram seis vezes aprovar a Lei de Responsabilidade, sem sucesso: "Ainda não houve presidente nesta democracia republicana que respondesse por nenhum dos seus atos. Ainda nenhum foi achado a cometer um só desses delitos, que tão às escâncaras cometem. A jurisprudência do Congresso Nacional está, pois, mostrando que a Lei de Responsabilidade, nos crimes do chefe do Poder Executivo, não se adotou, senão para não se aplicar absolutamente nunca".

E concluía: " O presidencialismo brasileiro não é senão a ditadura em estado crônico, a irresponsabilidade geral, a irresponsabilidade consolidada, a irresponsabilidade sistemática do Poder Executivo". A lei pedida por Rui só foi aprovada 40 anos depois, e debatida seriamente apenas na atual conjuntura de crise do país.

GRANDE ELEITOR

O monopólio do poder pelos incumbentes e o abuso do cargo estão patentes na falta de competição política: presidentes eleitos com 90% (Rodrigues Alves) ou 99,7% (Washington Luís) dos votos.

Na denúncia de Rui, em 1914, estão apontadas as principais mazelas do Brasil, que surpreendem por sua atualidade: o presidente orwellianamente denominado por Rui de "O Grande Eleitor" exercia e continua a exercer papel decisivo na sobrevivência política dos deputados e senadores na barganha por emendas ao Orçamento e distribuição de cargos na base aliada.

Na República Velha, as eleições eram uma disputa para selecionar quem desfrutaria "o privilégio de ser o aliado do poder central" (Nunes Leal) –padrão que foi decerto muito mitigado com a introdução do multipartidarismo. Como Rui afirmou, os governos eram "pais e senhores das maiorias legislativas". Hoje essas maiorias continuam sendo construídas à sombra do Executivo, mas não ancoradas em arranjos programáticos –e sim em fundos públicos.

O presidente era e continua sendo em graus distintos "O Grande Nomeador", detendo o poder de nomear e demitir milhares de servidores. O presidente também é "O Grande Contratador". Usa e abusa do orçamento público em relações incestuosas com o setor privado. Modernamente manipula o crédito de bancos públicos sob seu controle direto e maneja politicamente os investimentos de fundos de pensão. O presidente encarna, e continua a fazê-lo, o poder da Bolsa, o poder dos negócios. Na ordem social de acesso limitado não há distinção entre empresa e Estado: essas esferas se amalgamam intimamente. A falta de instituições que representem compromissos críveis eleva os custos de transação e cria uma estrutura de incentivos danosa ao desenvolvimento endógeno.

As instituições são a chave para o desenvolvimento, para o chamado novo institucionalismo econômico de North e da nova economia política do desenvolvimento de Daron Acemoglu e coautores. A natureza e a qualidade das instituições explicam em grande medida o sucesso e fracasso das nações.

As "raízes do Brasil"–a chave para a compreensão do dilema brasileiro– são as instituições políticas e econômicas extrativas que foram implantadas ou a ordem social de acesso limitado que caracterizou a sociedade brasileira, para utilizar conceitos dessa literatura. Historicamente o traço distintivo foi a exclusão política e social: do escravo, do analfabeto e das mulheres.

A extensão do sufrágio para as mulheres e a criação da Justiça Eleitoral em 1932 (reduzindo as fraudes) aumentou a inclusão. A introdução da representação proporcional permitiu pela primeira vez na história que incumbentes fossem derrotados, revigorando a participação política e o pluralismo. Mas a exclusão do analfabeto perdurou até a Emenda Constitucional 25 de 1985. Só com a recente redemocratização a participação política se universalizou.

Os três pré-requisitos ("doorstep conditions") –império da lei, controle da violência e instituições impessoais– para a transição à sociedade de acesso aberto, segundo North, só agora parecem ter adquirido alguma materialidade.

Podemos dizer gramscianamente que, enquanto "a velha ordem morre e a nova não nasce, ainda surge uma grande variedade de sintomas mórbidos": sua manifestação é o desfile de descalabros a que os brasileiros têm assistido com perplexidade.

O Brasil de grande parte do século 20 é uma ordem social de acesso limitado. Em contraste com o que North denomina estados naturais frágeis e básicos, a violência aberta, produto da competição interelites, foi em grande parte contida. O império da lei é limitado e emerge em virtude do reconhecimento pelas elites de que permite ganhos recíprocos: surge do conluio rentista. O império da lei para Acemoglu resulta da contenda redistributiva; para North ele é produto de um arranjo intraelite, de seu autointeresse (esta é a principal controvérsia entre eles).

Essa interpretação é mais persuasiva: o império da lei só tem tido alguma efetividade na contenda entre as elites políticas e econômicas. O regramento das disputas entre elites e não elites foi marcado pela impunidade. A teoria prevê que o império da lei expanda o seu escopo do círculo das elites para a sociedade como um todo. A identidade dos atores tem importado cada vez menos, como se pode observar nas decisões da instituições judiciais brasileiras.

Quanto à violência política, ela marcou o século 20, pelo menos até a redemocratização. O início da República foi um episódio militar, e eles foram atores fundamentais em 1922, 1926, 1930, 1937, 1945, 1954, 1964-85. Pela primeira vez na história, a violência parece domada.

Nas sociedades de acesso aberto, a "destruição criadora" leva permanentemente à criação e, pela competição, dissipação de rendas geradas pela inovação. Nas sociedades de acesso limitado, as rendas tendem a ser mais duradouras, embora possa ocorrer volatilidade e circulação nos setores das elites. As rendas são politicamente distribuídas, desencorajando a inovação e engendrando ciclos de "stop and go". Não há componente endógeno no desenvolvimento. As rendas se manifestam das mais variadas formas: crédito subsidiado, direcionado, acesso a contratos governamentais, regras de conteúdo, desonerações. E, para o Estado, a captura do imposto inflacionário.

O abuso de poder e o risco permanente de expropriação de contratos têm sido o traço distintivo no Brasil, e só na quadra atual observa-se pela primeira vez a efetiva punição das elites. Mas, se o chefe do Executivo é iliberal, a mudança sofre retrocessos.

MAJESTADE

Assim, as raízes do Brasil econômico são políticas. A essa mesma conclusão chegou, em 1932, Ernest Hambloch, cônsul britânico no Rio de Janeiro. Para ele o problema do atraso econômico do país resultava de suas instituições políticas e, particularmente, do abuso de poder presidencial. Em seu livro sugestivamente intitulado "Sua Majestade o Presidente do Brasil" (1936), sua crítica centrava-se no poder despótico exercido pelo Executivo e a ausência de "rule of law", o império da lei:

"Quando as coisas continuamente não estão bem em um país com os recursos formidáveis que o Brasil possui, deve haver uma constante que explique o fenômeno. Altas tarifas de importação, impostos de exportação, políticas de valorização com endividamento excessivo, falta de continuidade nas políticas de administração pública, distúrbios sociais e revoluções –todos esses fatores podem ser apontados para explicar as atribulações do comércio e das finanças públicas. Mas esse fatores não são as causas fundamentais e eles próprios não explicam nada!"

E conclui: "As raízes dos problemas brasileiros devem ser buscadas nas deficiências do regime político".

A forte tradição iliberal é a grande vencedora no processo histórico de construção do Estado no país. Sustentar o contrário é perder de vista o essencial: as instituições políticas brasileiras foram forjadas a partir de uma profunda rejeição de uma visão liberal "latu senso". As raízes do Brasil político e econômico não estão fincadas na demonização do Estado: pelo contrário, estão profundamente imbricadas na sua santificação. A transição começou, embora a grande variedade de sintomas mórbidos cause perplexidade.

MARCUS ANDRÉ MELO é professor titular de ciência política da Universidade Federal de Pernambuco e foi professor visitante nas universidades Yale e MIT. Ilustração Ana Prata, Foto Danilo Verpa/Folhapress

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