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no Japão medieval

Quando Deus era mulher:

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Aserá,

a esposa de Deus que foi apagada da História

quarta-feira, 9 de abril de 2014

Bom testemunho para entender o que aconteceu em 64

Em outubro de 1965, militares deixaram claro
que não iriam devolver o poder aos civis

1964: um testemunho

Fernão Lara Mesquita

Para entender o que aconteceu em 64 é preciso lembrar o que era o mundo naquela época.

Um total de 30 países, parando na metade da Alemanha de hoje, havia sido engolido pela Rússia comunista por força militar. Invasão mesmo, que instalava um ditador que atuava sob ordens diretas de Moscou. Todos os que tentaram escapar, como a Hungria em 56, a Checoslováquia em 68, a Polônia em 80 e outros, sofreram novas invasões e massacres.

E tinha mais a China, o Vietnã, o Camboja, a Coreia do Norte, etc., na Ásia, onde houve verdadeiros genocídios. Na África era Cuba que fazia o papel que os russos fizeram na Europa, invadindo países e instalando ditadores no poder.

As ditaduras comunistas, todas elas, fuzilavam sumariamente quem falasse contra esses ditadores. Não era preciso agir, bastava falar para morrer, ou nem isso. No Camboja um quarto de toda a população foi executado pelo ditador Pol Pot entre 1975 e 1979, sob os aplausos da esquerda internacional e da brasileira.

Os países onde não havia ditaduras como essas viviam sob ataques de grupos terroristas que as apoiavam e assassinavam e mutilavam pessoas a esmo detonando bombas em lugares públicos ou fuzilando gente desarmada nas ruas.

As correntes mais radicais da esquerda brasileira treinavam guerrilheiros em Cuba desde antes de 1964. Quando João Goulart subiu ao poder com a renúncia de Jânio Quadros, passaram a declarar abertamente que era nesse clube que queriam enfiar o Brasil.

64 foi um golpe de civis e militares brasileiros que lutaram na 2.ª Guerra Mundial e derrubaram a ditadura de Getúlio Vargas, para impedir que o ex-ministro do Trabalho de Vargas levasse o País para onde ele estava prometendo levá-lo, apesar de se ter tornado presidente por acaso. Tratava-se portanto, de evitar que o Brasil entrasse num funil do qual não havia volta, e por isso tanta gente boa entrou nessa luta e a maioria esmagadora do povo, na época, a apoiou.

A proposta do primeiro governo militar era só limpar a área da mistura de corrupção com ideologia que, aproveitando-se das liberdades democráticas, armava um golpe de dentro do sistema para extingui-las de uma vez por todas, e convocar novas eleições para devolver o poder aos civis.

Até outubro de 65, um ano e meio depois do golpe, seguindo o combinado, os militares tinham-se limitado a cassar o direito de eleger e de ser eleito, por dez anos, de 289 pessoas, incluindo 5 governadores, 11 prefeitos e 51 deputados acusados de corrupção mais que de esquerdismo.

Ninguém tinha sido preso, ninguém tinha sido fuzilado, ninguém tinha sido torturado. Os partidos políticos estavam funcionando, o Congresso estava aberto e houve eleições livres para governador e as presidenciais estavam marcadas para a data em que deveria terminar o mandato de Jânio Quadros.

O quadro só começou a mudar quando em outubro de 65, diante do resultado da eleição para governadores, o Ato Institucional n.º 2 (AI-2) extinguiu partidos, interferiu no Judiciário e tornou indireta a eleição para presidente. Foi nesse momento que o jornal O Estado de S. Paulo, que até então os apoiara, rompeu com os militares e passou a combatê-los.

Tudo isso aconteceu praticamente dentro de minha casa, porque meu pai, Ruy Mesquita, era um dos principais conspiradores civis, fato de que tenho o maior orgulho.

Antes mesmo da edição do AI-2, porém, a esquerda armada já havia matado dois: um civil, com uma bomba no Cine Bruni, no Rio, que feriu mais um monte de gente; e um militar numa emboscada no Paraná. E continuou matando depois dele.

Ainda assim, a barra só iria pesar mesmo a partir de dezembro de 68, com a edição do AI-5. Aí é que começaria a guerra. Mas os militares só aceitaram essa guerra depois do 19.º assassinato cometido pela esquerda armada.

Foi a esquerda armada, portanto, que deu o pretexto para a chamada "linha dura" militar tomar o poder e a ditadura durar 21 anos, tempo mais que suficiente para os trogloditas de ambos os lados começarem a gostar do que faziam quando puxavam gatilhos, acendiam pavios ou aplicavam choques elétricos.

A guerra é sempre o paraíso dos tarados e dos psicopatas e aqui não foi diferente.

No cômputo final, a esquerda armada matou 119 pessoas, a maioria das quais desarmada e que nada tinha que ver com a guerra dela; e os militares mataram 429 "guerrilheiros", segundo a esquerda, 362 "terroristas", segundo os próprios militares. O número e as qualificações verdadeiras devem estar em algum lugar no meio dessas diferenças.

Uma boa parte dos que caíram morreu atirando, de armas na mão; outra parte morreu na tortura, assassinada ou no fogo cruzado.

Está certo: não deveria morrer ninguém depois de rendido, e morreu. E assim como morreram culpados de crimes de sangue, morreram inocentes. Eu mesmo tive vários deles escondidos em nossa casa, até no meu quarto de dormir, e já jornalista contribuí para resgatar outros tantos. Mas isso é o que acontece em toda guerra, porque guerra é, exatamente, a suspensão completa da racionalidade e do respeito à dignidade humana.

O total de mortos pelos militares ao longo de todos aqueles 21 "anos de chumbo" corresponde mais ou menos ao que morre assassinado em pouco mais de dois dias e meio neste nosso Brasil "democrático" e "pacificado" de hoje, onde se matam 50 mil por ano.

Há, por enquanto, 40.300 pessoas vivendo de indenizações por conta do que elas ou seus parentes sofreram na ditadura, todas do lado da esquerda. Nenhum dos parentes dos 119 mortos pela esquerda armada, nem das centenas de feridos, recebeu nada desses R$ 3,4 bilhões que o Estado andou distribuindo.

Enfim, esse é o resumo dos fatos nas quantidades e na ordem exatas em que aconteceram, do que dou fé porque estava lá. E deixo registrado para os leitores que não viveram aqueles tempos compararem com o que andam vendo e ouvindo por aí e tirarem suas próprias conclusões sobre quanto desse barulho todo corresponde a sentimentos e intenções honestas.

Fonte: Estado de São Paulo, 07/04/2014, Fernão Lara Mesquita é jornalista. Escreve em www.vespeiro.com.

terça-feira, 8 de abril de 2014

Estado brasileiro inchado e ineficiente flerta com o abismo


Destruindo o Estado brasileiro


EVERARDO, MACIEL - O Estado de S.Paulo

Constitui singular paradoxo a crescente destruição do Estado brasileiro nos governos de partidos de tendências, ao menos no discurso, estatizantes. A mídia oferece, dia após dia, abundantes exemplos de má gestão, incúria contumaz, desqualificação técnica nas decisões. É notório o fracasso das políticas públicas de segurança pública, educação, saúde, mobilidade urbana, etc.

A razia realizada na Petrobrás e na Eletrobrás produziu uma catástrofe, com expressiva perda de valor de mercado, endividamento elevado e recorrentes prejuízos. O dano é de tal magnitude que, se anunciado em passado recente, seria tido como alucinação.

No Banco do Brasil e na Caixa Econômica há uma contínua e crescente perda de qualidade nos serviços prestados, sem falar na temerária política de crédito do BNDES.

Esse estranho desapreço pelo Estado explica, também, as práticas de fisiologismo e de aparelhamento, sua variedade radical. Os ministérios passam a ser um múltiplo do número de partidos que integram a denominada "base aliada", aos quais se somam as "tendências" e as bancadas, em cada uma das casas congressuais, dos partidos.

As "indicações", contudo, não se limitam aos ministérios. Alcançam, além disso, as diretorias das autarquias, fundações, agências reguladoras e estatais, o que gera um caldo de cultura próprio para o florescimento de todas as modalidades de corrupção.

Para os conselhos de administração das estatais são designadas autoridades de alto coturno como forma só de elevar seus vencimentos, fraudando descaradamente o conceito de teto de remuneração dos servidores públicos.

Esse processo é de tal sorte exuberante que, em Brasília, a demanda dos órgãos públicos ultrapassou os limites fixados no plano urbanístico para projetar-se sobre os espaços antes destinados à atividade privada, assumindo proporções mastodônticas.

Receio que nenhuma pessoa bem informada, salvo os responsáveis pelas atividades de protocolo, conheça, simultaneamente, os nomes dos ministérios e de seus respectivos titulares.

Para justificar esse estado de coisas se recorre à cínica tese da governabilidade, deduzida do chamado presidencialismo de coalização, que frequentemente se converte em colisão por motivos poucos virtuosos.

Como reação primitiva à promiscuidade na provisão das funções públicas de confiança, exsurge o corporativismo, que, tanto quanto o fisiologismo e o aparelhamento, é uma forma nociva de indevida apropriação do Estado.

A aversão à meritocracia se estende ao Judiciário. É particularmente ultrajante a trajetória de humilhações a que se submetem magistrados, membros do Ministério Público e advogados que almejam assento nos tribunais. São obrigados a recrutar, quase sempre sem o mínimo pendor para a tarefa, apoio de políticos e dos membros dos tribunais para exercer aquilo que deveria decorrer tão somente de sua qualificação jurídica e moral. No limite, esse perverso ritual tende a comprometer a imparcialidade dos julgamentos.

Nesse quadro patológico, tem destaque o desprestígio do princípio constitucional da eficiência. Não há avaliações, minimamente consistentes, dos servidores ou dos serviços públicos. Não se buscam soluções para os problemas com base em critérios de eficiência, que nem sequer existem. A cada deficiência se responde toscamente com expansão do efetivo de pessoal, sem nenhuma preocupação com sua repercussão sobre o equilíbrio fiscal.

Ainda no âmbito da eficiência, é lamentável a banalização das greves no serviço público. Tornou-se comum o que deveria ser um recurso extremo, revelando a supremacia do interesse corporativo sobre o coletivo, tendo o povo como vítima indefesa. Sem lei, por negligência dos Poderes Executivo e Legislativo, as greves hoje são limitadas, precariamente, por uma decisão do Supremo Tribunal Federal.

Esse Estado inchado e ineficiente, que flerta com o abismo, decorre, principalmente, da voracidade intervencionista combinada com uma visão centrada na perpetuação do poder. Sua reconstrução é tarefa para estadistas.

CONSULTOR TRIBUTÁRIO, FOI SECRETÁRIO DA RECEITA FEDERAL (1995-2002)

Fonte: O Estado de São Paulo, 03/04/2014

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Plataformas de autopublicação para lançar seu livro

Publique seu Livro

Diz a sabedoria popular que três coisas o ser humano deve fazer na vida: plantar uma árvore, ter um filho e escrever um livro. Para aqueles que se aventuram nesse terceiro projeto, mais desafiador do que passar uma boa história para o papel foi, até agora, conseguir publicá-la. Mas isso está mudando. A internet propiciou o aparecimento das chamadas plataformas de autopublicação, que facilitam o processo para os pequenos autores.

Basta cadastrar-se online e converter arquivos em programas de edição de texto, como o Word, para o formato de livro eletrônico (e-book). O processo inclui instruções para que o próprio autor defina a capa e o preço da obra. Feito isso, o livro eletrônico pode ser vendido online para interessados no mundo todo.

Algumas plataformas de autopublicação oferecem também a venda de exemplares impressos, sob pedido (on demand). Não há exigência de tiragem mínima e os royalties para o autor variam de 35% a até 70% do valor de capa, substancialmente mais do que os 10% geralmente oferecidos no mercado editorial convencional. É um caminho novo para quem pretende deixar a história da família para os netos, editar contos eróticos ou distribuir apostilas de um curso.

A Bookess, uma das pioneiras na autopublicação no Brasil, oferece serviços extras, como revisão, elaboração do projeto gráfico e da ficha catalográfica. Mesmo com todos os trâmites, o escritor pode ver seu livro pronto em até 30 dias, a um custo sete vezes mais baixo do que o vigente pelas vias tradicionais.

A nova modalidade atraiu a atenção de grandes empresas como Amazon e Saraiva, que lançaram suas plataformas de autopublicação em português, em dezembro de 2012 e em junho de 2013, respectivamente. O diretor-geral da Amazon.com.br, Alex Szapiro, destaca a importância do novo caminho para obras que antes ficariam engavetadas, uma vez que as editoras convencionais têm capacidade limitada para revisar manuscritos.

Os livros publicados pela plataforma gratuita Kindle Direct Publishing (KDP) alcançam, por semana, em média, 20% dos mais vendidos no Brasil pela Amazon.com. Mas é um sistema que está só começando por aqui. Na Alemanha já atinge 50%; na França e na Espanha, 40%. Nos Estados Unidos, editoras tradicionais têm recorrido à autopublicação para garimpar novos autores, a exemplo de E. L. James, que começou pela KDP, antes de se tornar campeã de vendas com o título “50 tons de cinza”.

Deric Guilhen, diretor de produtos digitais da Saraiva, enxerga na autopublicação mais uma opção para os leitores. “Temos o maior site de venda de livros do Brasil, não podíamos ficar de fora desse movimento. Mas não nos esquecemos da importância do processo de curadoria convencional para as editoras”, pondera. Dos 25 mil títulos à venda na loja digital da Saraiva, cerca de 10% são da plataforma Publique-se, que possui 11,5 mil autores cadastrados.

“A falta de um trabalho editorial profissional prejudica a qualidade do texto final”, afirma Susanna Florissi, coordenadora da Comissão do Livro Digital da Câmara Brasileira do Livro (CBL). Para Marcelo Cazado, diretor executivo da Bookess, a tendência é a de que a autopublicação domine o mercado: “Muitos escritores têm recusado convites para migrar para grandes editoras por terem mais flexibilidade na autopublicação e mais autonomia para definir seus próprios preços e políticas de direitos autorais”. / COLABOROU DANIELLE VILLELA

COMO FUNCIONA:

Bookess

Escritores recebem 50% do valor de capa das suas obras, sem exigência de exclusividade. As obras podem ser publicadas no formato de livro eletrônico ou impressas sob pedido.

KDP (Amazon)

O autor é remunerado com até 70% do valor de capa de obras exclusivas na plataforma da Amazon ou com 35% para obras disponíveis em outras lojas. Apenas no formato e-book.

Publique-se (Saraiva)

Remuneração para o autor de até 35% do valor de capa da obra, sem exigência de exclusividade. Apenas no formato e-book.

Fonte: Estado de São Paulo, Celso Ming, 04/04/2014

sexta-feira, 4 de abril de 2014

Encerrando o resgate sobre o regime militar em 3 partes: queda de Jango; período ditatorial; abertura, anistia e redemocratização

Presidentes Militares
Em meio a avaliações muito ideologizadas do período militar, a Jovem Pan trouxe um resgate mais equilibrado e bem didático desta página de nossa História que precisamos conhecer com a devida imparcialidade. Ninguém pode negar que os militares instituíram um regime autoritário que, no período do AI-5 (1968-1978), tornou-se francamente ditatorial, promovendo a censura aos meios de comunicação e à cultura em geral, prendendo, torturando e matando até gente que nada tinha a ver com lutas armadas ou congêneres. Em texto e áudio (mas o áudio é imperdível). Muito bom.

Conjuntura que levou à queda de Jango




Pré-Golpe


 O golpe militar começou a ser desenhado bem antes de 1º de abril de 1964, curiosamente o "dia da mentira". Em 25 de agosto de 1961, o então presidente Jânio Quadros renunciava ao posto mais alto da República, com menos de 7 meses à frente da Presidência, fomentando uma grave crise política. Quadros esperava que o Congresso não aceitasse sua renúncia por causa do vice, João Goulart, que era de esquerda, mas a legalidade foi cumprida e Jânio caiu.

Os militares até tentaram já em 1961 impedir que Jango assumisse. Mas o parlamentarismo foi uma das saídas encontradas na época para acalmar os ânimos. O sistema de governo durou pouco mais de um ano, até 24 de janeiro de 1963, quando o povo decidiu nas urnas que queria a volta do presidencialismo.

Um ano depois, com os poderes restaurados e praticamente isolado politicamente, Jango convocou um grande comício em 13 de março de 1964, na Central do Brasil, no Rio de Janeiro, “pela emancipação econômica, pela justiça econômica e ao lado do povo, pelo progresso do Brasil”. João Goulart defendia as reformas de base, mas tinha cada vez menos força política. Ele era acusado de tentar instaurar o comunismo no País com um golpe. Em 19 de março, veio a resposta conservadora ao comício, com a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, que levou milhares à Praça da Sé, em São Paulo.

O Golpe

“Atenção, Brasil! Atenção, Minas Gerais! As tropas do segundo exército já sitiaram o estado da Guanabara”, anunciava o locutor num tom urgente. Entre 31 de março e 1º de abril de 1964, as tropas do General Olímpio Mourão Filho deixavam Juiz de Fora em direção ao Rio de Janeiro. Acuado, João Goulart foi para o Rio Grande do Sul.

O presidente do Senado, Auro de Moura Andrade, declarou então, aos berros a vaga aberta de Jango. "Numa hora gravíssima da vida brasileira, (João Goulart) abandonou o governo, e esta comunicação faço ao Congresso Nacional. Assim sendo declaro vaga a Presidência da República”, delara Auro, como pode ser ouvido no áudio original acima, para delírio dos presentes.

Professor emérito da UFRJ, José Murilo de Carvalho classifica o golpe de civil-militar. “Ninguém previu a natureza do golpe”, argumenta. Boris Fausto, historiador da USP, concorda: "Houve toda uma corrente que jamais imaginou que o episódio de 1964 fosse dar no que deu", diz.

Erguendo o regime

O Congresso Nacional elegeu, então, o general Humberto de Alencar Castello Branco como presidente. Ele prometia entregar o cargo em janeiro de 1966, como é possível ouvir no áudio original da época.

Logo estabeleceu os dois primeiros Atos Institucionais, que legitimaram o arbítrio, as cassações e a eleição indireta para presidente. Vários partidos foram extintos, permanecendo apenas o ARENA, representante governista e o MDB, de oposição. Castelo cassou o mandato de Juscelino Kubitschek, ex-presidente e senador pelo PSD, um nome forte para a esperada - e prometida - sucessão em 1965. Juscelino era acusado de corrupção e até de ser comunista, algo que nunca desmonstrara em seu governo de 1956 a 1961.

O biógrafo do político mineiro, Ronaldo Costa, diz que Castello Branco cometeu uma traição, pois tomou posse dizendo que passaria o poder para quem fosse eleito nas eleições diretas programadas para outubro de 1965, mas não cumpriu a palavra.

Outro forte concorrente ao Palácio do Planalto era Carlos Lacerda, da UDN, que apoiou o golpe, mas, deixado de lado, tornou-se um dos mais ferrenhos críticos do governo de Castelo, que prorrogou o próprio mandato por mais um ano. “Se em 1964, o perigo era o comunismo, nesse momento o perigo é entregar o Brasil a grupos econômicos americanos, como entregou o Governo Castelo Branco”, diz ainda Lacerda.

Mesmo com as cassações, para o historiador Marco Antonio Villa, o Brasil ainda não vivia uma Ditadura propriamente. "Uma falácia que diz que tem 21 anos. A Ditadura Militar, entre 1964 a 1968, foi um regime autoritário, mas não ditatorial. E por quê? Nós tivemos ainda um período de relativa liberdade de imprensa, uma grande explosão cultural, os festivais de música, o teatro, o cinema", argumenta. Para Villa, o período autoritário estava prestes a começar e duraria apenas 10 anos, de 1968 a 1978.

Próximo capítulo

Em 1967, tomava a conta o segundo presidente militar, Artur da Costa e Silva. “Prometo manter, defender e cumprir a constituição”, dizia também ao tomar posse. Os militares denominavam o Golpe de Revolução de 31 de março. “Nossa revolução foi justamente o coroamento de uma aspiração popular irreversível e impossível de deixar de atender”, proclamava Costa e Silva.

A Ditadura parecia, de fato, irreversível. E tornar-se-ia ainda mais em dezembro de 1968, sem nenhuma aspiração popular, com a promulgação do Ato Institucional nº 5, como veremos no próximo capítulo da série de 50 anos da Ditadura Militar.

AI 5, tortura e Milagre Econômico




O período militar brasileiro até 1968, mesmo sendo um regime imposto pela força, ainda contava com um certo grau de liberdade, especialmente no campo da liberdade de expressão. No entanto, após protestos estudantis, rebeliões em setores das forças armadas e ataques ao governo, o jogo se inverteu e a repressão a opositores se enrijeceu como nunca fora visto.

"O presidente da República poderá decretar o recesso do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas e das Câmaras de Vereadores por ato complementar em estado de sítio ou fora dele, só voltando os mesmos a funcionar quando convocados pelo presidente da República", anunciava a rádio da época, como é possível ouvir acima, com todos os áudios aqui descritos resgatados do período.

O quinto AI

O AI 5, editado em 13 de dezembro de 68 pelo governo Costa e Silva, representou o "golpe dentro do golpe" e inaugurava os "anos de chumbo" do Regime Militar. Entre os pretextos para o ato, estava o discurso do deputado Márcio Moreira Alves, que chamou o exército de "valhacouto de torturadores". Os militares queriam que o Congresso Nacional punisse o parlamentar.

Da tribuna da Câmara, ele rebatia: "Não se julga aqui um deputado. Julga-se uma prerrogativa essencial do poder legislativo, livre como o ar, livre como o pensamento a que dá guarida deve ser a tribuna do povo". Moreira Alves não foi punido, mas o país sim. Com o AI-5, o Congresso ficou fechado por 10 meses.

O ex-ministro Delfim Neto não demonstra constrangimento por ter participado da assinatura do ato institucional. "Se as condições fossem as mesmas e o futuro não fosse opaco, eu repetiria", disse durante sessão da Comissão da Verdade de São Paulo em 2013. "Eu não só assinei o Ato 5, como assinei a Constituição de 1988", tenta justificar-se Delfim.

"Baixaram as trevas sobre o País", decreta o jornalista Zuenir Ventura. Era o fim de direitos essenciais como o habeas corpus, a liberdade de expressão, a liberdade de reunião. "(O AI 5) acabou com tudo", diz Ventura. O país das ilusões deu lugar ao país do arbítrio, da censura aos meios de comunicação e da tortura.

O historiador da USP, Boris Fausto, diz que "foi um golpe dentro do golpe" e também lamenta o período de tortura e violência que prosseguiu ao Ato: "Foi um dos períodos mais tristes da história brasileira", avalia.

Junta militar

Em agosto de 1969, o presidente Costa e Silva sofreu um derrame cerebral. O incidente foi um divisor de águas dentro do regime. A linha dura não deixou que o vice-presidente, o civil Pedro Aleixo, tomasse posse. Uma junta militar ficou no poder por dois meses, período em que movimentos revolucionários sequestraram o embaixador americano Charles Elbrick.

Elbrick ficou detido por dois dias e foi liberto após os governantes cumprirem o pedido dos sequestradores, de libertar 15 presos políticos do Regime.

Médici

Ainda em 1969, o Congresso Nacional elegia o novo presidente, o terceiro do Regime Militar. "Mais um grande momento histórico com a posse do novo presidente da República Federativa do Brasil, General Emílio Garrastazu Médici e do vice-presidente, almirante Augusto Rademaker", anunciavam as ondas do rádio.

Médici gostava de evocar a palavra paz, que não combinava com os tempos vividos pelo Brasil. "Seja esse primeiro momento um momento de fé e confiança (...) para o bem estar de nossos povos e confiança comum na causa da justiça, do progresso e da paz", disse Emílio em discurso no primeiro encontro com o Presidente Richard Nixon, dos Estados Unidos da América, em 7 de dezembro de 1971.

"Milagre Econômico"

Neste encontro com Nixon, o Brasil já era tricampeão mundial de futebol, título alcançado pela seleção canarinho um ano antes, no México. Os feitos de Pelé e Cia. foram amplamente utilizados na esfera política para, junto com o grande crescimento econômico que o País vivia, validar o governo regente.

"O presidente Médici inaugurou oficialmente o trabalho de construção da rodovia Transamazônica e uma das obras essenciais do Programa de Integração Nacional elaborado pelo atual Governo", dizia a rádio. Os militares afirmavam que o "Brasil Grande" tinha três obras: a Transamazônica (que nunca foi concluída), a Ponte Rio-Niterói e o tricampeonato mundial de futebol.

O ufanismo fabricado tomou conta do Brasil: a economia crescia a passos largos. Em 1973 foi registrada uma expansão do PIB de 14%: um "milagre".

Tortura

Já nos porões dos orgãos de repressão como DOPS e Doi-Codi, os opositores, os considerados subversivos e a luta armada sofriam com a tortura. O irritado tenente-coronel Brilhante Ustra comtemporizava: "Ninguém foi morto lá dentro do Doi. Todos foram mortos em combate", esbraveja em depoimento à Comissão da Verdade, que apura os crimes da época, em Brasília. "Não faço acareação com ex-terrorista, não faço!", disse ainda em maio do ano passado em referência a Gilberto Natalini.

Já o ex-ministro Jarbas Passarinho, que apoiou o AI-5, não tinha como negar: "Reale júnior me faz a pergunta: 'o sr. acha que teve ou não tortura no Brasil'. Eu digo: 'eu acho'", depôs Jarbas.

O autor da biografia de Carlos Marighella, o jornalista Mário Magalhães, lembra que o regime transformou os gerrilheiros em inimigos públicos: "O então ministro da justiça (Luiz Antonio) Gama e Silva declarou Carlos Marighella, um dos líderes da luta armada do Brasil, inimigo público número um".

Carlos Marighella foi morto em uma emboscada feita pelo delegado Sérgio Paranhos Fleury, na Alameda Casa Branca, em São Paulo.

A luta pela anistia - próximo capítulo

Em 1974, tomava posse Ernesto Geisel, o quarto presidente militar. "Prometo manter, defender e cumprir a constituição", disse Geisel, de maneira protocolar, em sua posse.

Ainda sob a égide do AI-5, a oposição com o MDB ganhava força e o presidente Geisel prometia a distenção gradual e segura, mas lenta, muito lenta. No terceiro e último capítulo da série "O passado que não passa", veremos a lei da anistia, a abertura do regime e os avanços do Brasil durante os 21 anos de ditadura.

A redemocratização e os legados cultural e econômico





Esta é a terceira parte do especial Jovem Pan de resgate à memória sonora do Regime Militar, cujo golpe que o instaurou completa 50 anos no dia primeiro de abril. Depois das deposições políticas que deram início ao governo autoritário e da violenta repressão imposta pelo AI-5, era chegado finalmente o momento da reabertura política e da transição democrática. O presidente Ernesto Geisel prometia, sim, a abertura do regime, de forma "gradual e segura", mas lenta, muito lenta.

"Sem violência"

O milagre econômico já não era mais tão milagroso assim - a crise do petróleo pressionava a inflação e exigia habilidade do chefe militar. Geisel pronunciava que "o Brasil soube amadurecer suficientemente para em horas que exigem decisão e objetividade (...) superar situações transitórias", como é possível ouvir no áudio acima, assim como todos os áudios abaixo descritos.

Aos poucos, a oposição do MDB foi ganhando espaço, o que provocou divisões dentro do exército, que não sabia conviver com a política. A morte do jornalista Vladimir Herzog, em 1975, é até hoje simbólica, e aumentou as cobranças pela abertura, como defendia Dom Frei Paulo Evaristo Arns. "Não queremos nunca mais uma revolução semelhante àquela" pregava o religioso. "Gostaríamos de que a transição fosse discutida com o povo, mas sem violência", pedia o então arcebispo de São Paulo.

O debate sobre a abertura política passou longe da população, mas os tempos eram outros: Ernesto Geisel revogou o AI5 e os demais atos, em outubro de 1978.

Anistia

O novo presidente, general João Batista Figueiredo, assumiu o cargo no ano seguinte.

Pela primeira vez um presidente militar falava abertamente em redemocratização: "Por um regime político em que há liberdade de todos", dizia o líder. "Espero ver os anistiados reintegrados na vida nacional", proclamou Figueiredo.

João Batista Figueiredo assinou a lei da anistia, nem tão ampla e irrestrita como queria o senador Paulo Brossard, congressista do MDB. "Votado hoje o projeto da anistia restrita", bradava Brossard, "o da anistia mesquinha, da anistia calúnia, o da anistia paralítica!".

O ano de 1979 foi marcado pela anistia, pelo início da formação de novos partidos e a maior participação popular com as greves no ABC paulista. "Existe um trabalho a ser feito nos bairros e, o que é mais importante, ninguém ir até a porta da fábrica", dizia um certo Luiz Inácio Lula da Silva, para o brado do povo que o escutava.

A inflação subia e faltava gasolina. A extrema direita, contrária a abertura, promovia atentados, como o cometido contra a sede da OAB carioca. Em 1981, a quase tragédia no Rio Centro ampliou ainda mais o abismo entre os próprios os militares.

Legado

Os 21 anos do regime deixaram legados para ou bem ou para o mal. O Brasil virou um país urbano. O historiador Marco Antônio Vila cita a evolução econômica: "No ano de 1973, o Brasil cresceu 14%, portanto nós tivemos um processo de industrialização intenso (...) e uma revolução na infraestrutura", avalia.

O jornalista Etevaldo Siqueira, especialista em telecomunicações, destaca que o Brasil foi interligado. "O país não tinha telecomunicações", diz. "O fato de ligarem o Brasil ao mundo via satélite e via cabos submarinos foi realmente um grande avanço", confirma Etevaldo.

Apesar do arbítrio e da violência, o escritor e jornalista Zuenir Ventura ressalta a intensa produção cultural do período, justamente em contraposição ao regime instaurado. "Teve uma vitalidade muito grande no sentido de resistir à Ditadura. É aquela coisa de 'apesar de você'", diz Ventura, lembrando a música de Chico Buarque que tentava trazer esperança de dias melhores em meio à perseguição política.

O passado que não passa e o futuro que se vislumbra

"Nunca em nossa história que vemos tanta gente nas ruas para reclamar a recuperação dos direitos de cidadania e manifestar seu apoio aos candidatos", bradava Tancredo Neves em 1985, durante a campanha pelas Diretas. Votos diretos que o elegeriam.

E o primeiro baque pós-Regime Militar veio logo em seguida, com o doloroso anúncio da morte do presidente eleito: "Lamento informar que o excelentíssimo senhor Presidente da República Tancredo de Almeida Neves faleceu nesta noite", dizia o secretário de imprensa da Presidência da República, o jornalista Antônio Britto, na sala de imprensa do Instituto do Coração. Sarney assumiu, prometendo "manter, defender, cumprir a Constituição".

E a nova Constituição, que fechava de vez com o ciclo autoritário legal, foi proclamada com muita comemoração pelo presidente da Assembleia Nacional Constituinte, em 1988, o deputado Ulysses Guimarães: "Declaro promulgada (fortes aplausos) o documento da liberdade, da dignidade, da democracia, da justiça social do Brasil". Apesar de ainda conviver com um passado sombrio e que custa a passar, o país já aprendeu a olhar para o futuro. "Que Deus nos ajude e que isso se cumpra", finaliza Ulysses.

Fonte: Jovem Pan, 27/03/2013

quinta-feira, 3 de abril de 2014

Estado brasileiro: muito imposto e pouco retorno em serviços e qualidade de vida


Brasil é o pior em retorno de imposto à população, aponta estudo
     
Pela quinta vez consecutiva, o Brasil é o país que proporciona o pior retorno de valores arrecadados com tributos em qualidade de vida para a sua população.

A conclusão consta de estudo do IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação) que compara 30 países com maior carga tributária em relação ao PIB (Produto Interno Bruto) e verifica se o que é arrecadado por essas nações volta aos contribuintes em serviços de qualidade.

Estados Unidos, Austrália e Coreia do Sul ocupam respectivamente as primeiras posições do ranking. O Brasil está em 30º lugar, atrás da Argentina (24º) e do Uruguai (13º), quando se analisa o retorno de tributos em qualidade de vida para a sociedade.

Para medir esse retorno, o instituto criou em 2009 o Irbes (Índice de Retorno de Bem-Estar à Sociedade). No Brasil, ele é de 135,34 pontos; nos EUA, 165,78.

O indicador de retorno é resultado da soma de dois outros parâmetros usados pelo IBPT: a carga tributária em relação ao PIB (soma das riquezas de um país), com ponderação de 15% na composição do índice, e o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), calculado com base em dados sobre educação, renda e saúde e que serve para medir o grau de desenvolvimento econômico. Esse indicador tem peso de 85% na composição do Irbes.

Para a carga tributária, o estudo considera as informações da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico). Os dados de IDH usados são da ONU (Organização das Nações Unidas). Ambos são de 2012, último dado disponível.

No Brasil, a carga fiscal em 2012 foi de 36,27%, segundo mostra o levantamento do instituto, que atua no setor.

FISCO

A Receita Federal informou que não comentaria o assunto. Para o Fisco, a carga tributária do Brasil em 2012 foi de 35,85%. O resultado de 2013 ainda não foi divulgado.

Os percentuais do IBPT e da Receita são diferentes porque o instituto considera no cálculo os valores pagos com multas, juros e correção, contribuições e custas judiciais.

Para o presidente do IBPT, João Eloi Olenike, o estudo reforça e mostra a necessidade de cobrar dos governos de todas as esferas -federal, estadual e municipal- a melhor aplicação dos recursos pagos pelos contribuintes.

"Os brasileiros foram às ruas recentemente em protestos em que as faixas também mostravam a insatisfação com a elevada carga tributária e o pouco retorno em qualidade de vida", diz.

RANKING

Na edição anterior do levantamento, o Japão ocupava a quarta posição. Neste ano, passou para sexta. Já a Bélgica estava em 25º lugar e passou para a 8ª colocação.

Fonte: Claudia Rolli, Folha de São Paulo, 03/04/2014

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