Vou dar razão ao mote deste blog, que é ser contra o coro dos contentes, e questionar o comunicado de Ricky Martin ao público, no final de março, anunciando que é gay. Nada contra o rapaz da vida louca falar de sua vida o que bem entender - e melhor todo mundo assumido do que enrustido - mas comunicar à imprensa que é homossexual não soa estranho?
Alguém já viu alguma celebridade vir a público dizer que é hétero? Dirão: "ah, mas a sociedade pressupõe que todo mundo é hétero até prova em contrário, por isso não há razão para alguém declarar que é hétero." Mas também não há para declarar que é gay ou lésbica. Se queremos que a homossexualidade seja vista como natural, melhor agir de forma natural, como agem os héteros. Mesmo para quem sempre fingiu namorad@s de fachada, melhor simplesmente aparecer com a namorada, sendo mulher, ou com o namorado, sendo homem, do que reunir a família, os amigos e a imprensa para confessar que é homossexual. Homossexualidade não é pecado para ser confessado nem doença (foi retirada da Classificação Internacional de Doenças em 1990) para se anunciar como um desabafo tipo "tenho AIDS, mas estou vivo e bem."
Principalmente quando esses comunicados vêm de celebridades, como Ricky Martin, sempre me dá a impressão de que a criatura está com dificuldade para aparecer por seus dotes artísticos e resolve apelar para as declarações polêmicas a fim de se manter em evidência. Especialmente no caso de Ricky Martin, há razões para suspeitar de que seja realmente essa a intenção do cantor.
Li numa lista de discussão, em 2005, uma mensagem que falava da declaração de Martin (para a revista Blender) de que gostava de chuva dourada (brincadeira erótica com urina). Nessa mensagem, também já se comentava sobre a homossexualidade do intérprete, embora não tenha sido ela a razão da polêmica que girou em torno da citada declaração e sim à referência a uma preferência sexual da qual não se costuma falar em público. Martin chegou a se arrepender da revelação em função das pesadas críticas que recebeu, mas garantiu seus 15 minutos de fama.
Em junho de 2009, novamente Martin apareceu com outra declaração, desta vez assumindo que também transava com homens. Também porque sempre posara de hétero ("teve" uma namorada mexicana, a apresentadora Rebeca de Alba, por uma década), mas nunca convenceu nesse papel para quem tem um pouco de gayômetro. E, agora, em março de 2010, ele vem a público para comunicar que é gay, como se fosse alguma novidade.
Ativistas LGBT acharam o máximo. Eu achei o mínimo, pelo que ponderei acima, simples questão de marketing pessoal. E não fui só eu que achou estranho. Nos blogs e sites sobre celebridades mundo afora, o que se especula é que Martin teria recebido US$20 milhões, para se confessar homossexual, como adiantamento pelo livro de memórias sobre sua vida que está para lançar. Beeem, por vinte milhões de dólares até eu seria tentada a confessar toda a minha muy rica vida erótica para o Brasil e o mundo. Tá certo que não daria tanto IBOPE quanto as inconfidências sexuais das celebridades, mas alegraria muita gente..kkkkkk
Aliás, pode se ver, aqui no blog do próprio Ricky Martin, o rapaz falando de seu comunicado e de seu livro de memórias. É por essas e mais outras que prefiro o estilo natural e direto, mas sem espalhafato. Já disse isso em artigo que fiz sobre a visibilidade lésbica, há tempos atrás, citando Fernando Pessoa:
Não: não digas nada!/ Supor o que dirá/ A tua boca velada/ É ouvi-lo já./ É ouvi-lo melhor/Do que o dirias./O que és não vem à flor/Das frases e dos dias./És melhor do que tu./Não digas nada: sê!/Graça do corpo nu/Que invisível se vê./ Fernando Pessoa, 5/6-2-1931
O poema foi musicado pelos Secos e Molhados, nos idos da década de setenta, e continua belo e atualíssimo. Confira abaixo.
Não: não digas nada!/ Supor o que dirá/ A tua boca velada/ É ouvi-lo já./ É ouvi-lo melhor/Do que o dirias./O que és não vem à flor/Das frases e dos dias./És melhor do que tu./Não digas nada: sê!/Graça do corpo nu/Que invisível se vê./ Fernando Pessoa, 5/6-2-1931
O poema foi musicado pelos Secos e Molhados, nos idos da década de setenta, e continua belo e atualíssimo. Confira abaixo.