segunda-feira, 22 de junho de 2015

E as rolas vão rolar: Boechat, Malafaia, homofobia e machismo


Depois da travesti crucificada na Parada LGBT de Sampa, a última polêmica, ocorrida na sexta (18), ficou por conta de um imbróglio envolvendo o jornalista Ricardo Boechat, da rádio BandNews FM, e o pastor Silas Malafaia, da Assembleia de Deus Vitória em Cristo.  Boechat, em seu programa matinal, afirmou “que é no âmbito de igrejas neopentecostais que estão acontecendo atos de incitação à intolerância religiosa”. Comentava sobre o caso da menina de 11 anos que foi atacada, no último dia 14, com uma pedrada, quando saia de um culto de Candomblé no Rio de Janeiro. Suspeita-se que tenham sido evangélicos os autores da agressão.

Malafaia, então, repondeu, via Twitter:
Avisa ao jornalista Boechat, que está falando asneira, dizendo que pastores incitam os fiéis a praticarem a intolerância. Verdadeiro idiota”.
Sabendo da tuitada, Boechat retrucou, em seu programa de rádio, sem poupar palavras. 
Ô, Malafaia, vai procurar uma rola, vai. Não me enche o saco. Você é um idiota, paspalhão, um pilantra, tomador de grana de fiel, explorador da fé alheia. E agora vai querer me processar pelo que acabei de falar que é o que você faz. Você gosta muito é de palanque. Eu não vou te dar palanque porque tu é um otário, tu é um paspalhão”.
[...]
...É o seguinte: é no âmbito de igrejas neopentecostais que estão acontecendo atos de incitação à intolerância religiosa, mais do que em outros ambientes. Em nenhum momento.... eu disse qualquer coisa que generalizasse esse comentário... Você é homofóbico, você é uma figura execrável, horrorosa. E que toma dinheiro das pessoas a partir da fé. Você é rico. Eu não sou rico porque tomei dinheiro das pessoas pregando a salvação depois da morte. O meu salário, os meus bens, o meu patrimônio vieram do meu suor, não do suor alheio. Você é um charlatão ....você é tomador de grana. Você e muitos outros. Não tenho medo de você, seu otário. Vai procurar uma rola, repetindo em português bem claro".
Malafaia sentiu o golpe e, em seguida, postou vídeo, em sua página no youtube, dizendo que iria processar o jornalista pela fala atravessada, além de comentar matéria sobre a demissão de Boechat do jornal O Globo, onde foi colunista. E terminou, desafiando novamente o jornalista: 
Então eu não tenho medo de você e está desafiado. Não é no seu programa não, porque eu não vou te dar esse mole. Em qualquer programa. Senta na mesa comigo que eu vou te engolir. Porque tu não tem argumento. Tu é bom sozinho, eu quero ver no confronto.
Os vídeos da treta entre os dois estão aí embaixo, primeiro o do Boechat, depois do Malafaia.

Nem é preciso dizer que o destempero de Boechat ganhou as redes sociais e as páginas de sites e blogs não tanto pelas várias verdades que disse sobre o execrável pastor mas sim por tê-lo mandado "procurar uma rola". A expressão, indiscutivelmente machista, é usada com frequência para tentar desqualificar as falas das mulheres que são mais assertivas, independentes, apresentando-as como "nervosinhas", "ranzinzas", "problemáticas", "mimizentas", "chatas", supostamente por falta de rola (ou de trepar). Claro, é absurdo insinuar que uma mulher (ou qualquer pessoa) age dessa ou daquela forma ou diz isso ou aquilo por falta de sexo. Trata-se, entre outras coisas, de uma forma de tentar silenciar as mulheres desconsiderando sua capacidade intelectual, sua racionalidade.

Ao mandar Malafaia "procurar uma rola", Boechat se dirigiu ao pastor, sobre o qual sempre pairou suspeitas de ser um gay mal resolvido (por certos trejeitos e afinadas de voz que costuma apresentar), como se fosse mulher, fazendo um outing atravessado do mesmo. Não que homens que apresentam características ditas femininas sejam necessariamente gays. Nem que homofóbicos sejam necessariamente gays mal resolvidos. Entretanto, quando essas duas características aparecem no mesmo perfil, há fundamento para se suspeitar que a figura seja um homossexual egodistônico, um gay que não se assume para si próprio (é inconsciente dos próprios desejos de tão reprimidos) e que persegue outros homossexuais como quem quebra espelhos para não ver a própria imagem. Nos EUA, é comum ativistas LGBT trazerem a público os casos homossexuais de muitos desses pastores evangélicos e políticos republicanos, ironicamente homofóbicos, que combatem os direitos homossexuais.

Concluindo, podemos dizer que, no cômputo geral, Boechat lavou a alma de muitos. Traduziu em público o que muita gente pensa sobre esse charlatão abominável chamado Silas Malafaia. Provocou também muitas risadas e memes (até eu entrei no clima). O que não impede que possamos analisar o uso da expressão "vai procurar uma rola", mesmo engraçada, por sua verdadeira natureza machista. Lamentável e inadvertidamente inclusive, Boechat referendou seu uso que deve aumentar. Criou assim uma faca de dois gumes.

1 comentários:

Parabéns pelo texto. Para ampliar esta multifacetada discussão sugiro:
http://saudepublicada.sul21.com.br/2015/06/22/homossexualidade-religiao-psiquiatria-uma-evolucao-5/

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