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quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Sobre o terror islâmico: Os esquerdopatas

Os esquerdopatas

Denis Lerrer Rosenfield 

O inominável, mais uma vez, mostrou o seu rosto. A frieza dos atos, a meticulosidade em sua preparação e o símbolo a ser atingido estampam a maldade extrema enquanto característica do terror. No caso do assassinato de cartunistas e jornalistas do Charlie Hebdo e de policiais, do terror islâmico.

Os terroristas mostraram, em sua ação, extremo profissionalismo. Não são lobos solitários nem indivíduos que agem de forma amadora, levados por uma emoção intensa. Foram treinados com tal objetivo e veicularam em seu ato o islamismo radical que os alimenta. Um policial ferido foi friamente assassinado no solo, quando os terroristas já se retiravam. Cartunistas chamados pelo nome eram alvos previamente determinados e deveriam ser exterminados.

Visaram tudo o que o terror não pode admitir: a liberdade de imprensa, em sua forma particularmente irônica e satírica, a liberdade de expressão e o que caracteriza de modo geral uma sociedade democrática e livre. Ou seja, procuraram atingir tudo o que consideramos como a civilização, a humanidade no que produziu de mais nobre no que diz respeito às suas ideias e seus princípios. Nada foi deixado ao acaso: jornalistas libertários e, dentre eles, o mais renomado, Wolinski, um judeu. Certamente isto não escapou aos terroristas islâmicos.

Contudo nada é propriamente novo. Igual comoção não se produziu quando cristãos foram crucificados no Iraque pelo Estado Islâmico. Houve uma estranha condescendência, como se essas imagens fossem, de certa maneira, menos impactantes. É como se estivesse sendo dito que essas comunidades cristãs não deveriam estar onde estão, apesar de sua origem remontar a muitos séculos, algumas descendentes dos primeiros cristãos. O cristianismo, para alguns, seria uma forma de cultura ocidental que não deveria fazer parte deste mundo, como se, por definição, ele devesse ser de natureza muçulmana radical.

Nada muito diferente do que acontece com Hamas em sua luta pela destruição do Estado de Israel, que terminou contando com a simpatia de boa parte de jornalistas e intelectuais. Alguns mais extremistas chegaram a pregar, em artigos, seu apagamento do mapa. Augusto Bebel, social-democrata alemão do final do século 19 e início do século 20, dizia que "o antissemitismo era o socialismo dos idiotas". Poderíamos parafraseá-lo e dizer que "o antissionismo é o socialismo dos imbecis".

O Hamas nada mais é que uma corrente do islamismo radical nascida da Irmandade Muçulmana. São duas faces do mesmo movimento, apregoando os mesmos "valores e princípios", como se valores e princípios fossem tudo o que procura justificar o aniquilamento dos princípios mesmos, universais, da civilização ocidental. Qualquer concessão ao multiculturalismo nada mais é, aqui, que uma adesão politicamente correta ao terror.

O caso do Egito é particularmente significativo, mostrando precisamente as contradições de uma esquerda que termina optando pela submissão. Os militares egípcios, de confissão sunita, compreenderam muito bem a natureza do islamismo radical e se opuseram resolutamente a ele. Aliás, no contexto atual, a liderança religiosa sunita desse país condenou em termos veementes o atentado terrorista ao jornal francês.

Ora, esses militares deram um golpe na Irmandade Muçulmana, que tinha conquistado o poder pela via eleitoral para ali se perpetuar. Esse movimento islamita utilizou a tática bolivariana de subverter uma instituição democrática por meios eleitorais. Note-se que, nesse período, armaram o Hamas e deram-lhe cobertura para atacar Israel com meios militares mais poderosos, pela importação de armamentos e de fábricas próprias de mísseis e foguetes.

Os militares egípcios salvaram, na verdade, esse país de se tornar um Estado terrorista. O mais surpreendente é que foram condenados pela esquerda por serem não democráticos, embora se tivessem legitimado posteriormente em nova eleição. Chama a atenção o fato de que os que se opõem diretamente ao terror sejam condenados, como se essa forma de islamismo radical tivesse o direito de existir, entendido por eles como o direito de exterminar os diferentes.

A comunidade yazidi, no Iraque, sofreu destino semelhante, sendo perseguida e assassinada pelos membros do Estado Islâmico. A violência foi também extrema, não poupando jovens e mulheres, estupradas, escravizadas e prostituídas. Sua condição é igualmente inominável, porém, de certa maneira, parece chocar-nos menos por se situar numa terra longínqua, enquanto a França nos é bem próxima.

Trata-se de uma trajetória da maldade que encontra agora, na figura de jornalistas contestatários, uma espécie de culminação, a do terror que, nesta sua forma, se torna mais assustadora. Acontece que esse desfecho contou, em seus momentos anteriores, com a simpatia de vários setores à esquerda do jornalismo e da intelectualidade. Muitos dos seus atos, com essas suas outras faces, eram vistos como modos de luta contra os EUA, o "imperialismo", o capitalismo e outras bobagens do mesmo quilate. Outros ainda afirmavam a necessidade do multiculturalismo, do direito de diferentes culturas (aliás, direito ao terror, propriamente falando!).

Outros ainda procuram explicar o terror como uma suposta retroalimentação entre ele e a islamofobia, ou "justificar" tais tipos de ação como "respostas" à profanação da imagem de Maomé, como se os terroristas tivessem o direito de impor suas crenças aos países ocidentais, eliminando seus valores. Claro que sempre há uma frase ou pequeno parágrafo final condenando o ato, como se assim o jornalista ou "analista" pudesse ainda salvar a sua face, não se mostrando francamente adepto do terror, o que não cairia bem no contexto atual de condenação mundial desse ato.

São, na verdade, esquerdopatas, ou seja, dizendo a mesma coisa de outra maneira, pensam com as patas.

*Denis Lerrer Rosenfield é professor de filosofia na UFRGS 

Fonte:  O Estado de São Paulo, 12/01/15, denisrosenfield@terra.com.br

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Sobre o terror islâmico: Viva a falta de respeito, humor não é ofensivo

Viva a falta de respeito, humor não é ofensivo

por Gregorio Duvidier

Colunista da Folha defende cartunistas do jornal francês "Charlie Hebdo", que "morreram pela nossa liberdade"

Muitos dizem que charges eram islamofóbicas, porém embate não era entre franceses e não franceses, mas entre humor e fanatismo

Um dos problemas de morrer é esse: vão falar muita asneira a seu respeito. E você já nem pode se defender. Não bastou serem fuzilados, os cartunistas do "Charlie Hebdo" foram vítimas de um massacre póstumo.

Pessoas de todas as áreas de atuação lamentaram a tragédia, MAS (não entendo como alguém, nesse caso, consegue colocar um "MAS") lembraram que o humor que eles faziam era altamente "ofensivo".

Poucas coisas irritam mais do que a vagueza desse termo "ofensivo" quando usado intransitivamente. Ofensivo a quem? A mim, definitivamente, não era. "Eles não deviam ter brincado com o sagrado", alegam alguns. MAS (aqui sim cabe um "mas") o que define o humor é exatamente isso: a brincadeira com o sagrado.

Discordo de quem pede respeito pelo sagrado. Para começar, acho que a palavra respeito é uma palavra que não cabe. Uma vez, vi o Zé Celso pedir a um jovem ator que não o tratasse por "o senhor", mas por "você". O ator disse que não conseguia porque tinha muito respeito por ele. E ele respondeu: "Não me interessa o respeito. O que me interessa é a adoração.".

O espaço da arte não é o espaço do respeito, mas o espaço da subversão, ou então da reverência, do culto. Do respeito, nunca.

No mais, tudo é sagrado para alguém no mundo. A maconha, a vaca, a santa de madeira, o Daime, Jesus e Maomé: tudo merece a mesma quantidade de respeito, e de falta de respeito.

Esperava essa reação raivosa dos fanáticos religiosos. No Brasil, o fundamentalista prefere os meios oficiais: não usa metralhadoras, mas tem bancada no Congresso e milhões no exterior.

Muitos (dentre os quais o pastor Marco Feliciano) já externaram o desejo de que o Porta dos Fundos "brincasse com islamismo pra ver o que é bom pra tosse". Até nisso temos complexo de vira-lata: nosso fundamentalismo tem inveja do deles.

O que nunca imaginei era que a mesma reação de "fizeram por merecer" partiria da própria esquerda. Muitos condenaram as charges como sendo islamofóbicas e lembraram que os imigrantes islâmicos já sofrem preconceito demais na França.

Mas esses imigrantes não eram os alvos, definitivamente, do humor do cartunistas assassinados. O embate não era entre franceses e não franceses, mas entre humor e fanatismo.

O traço infantil talvez confunda o leitor desavisado, mas é bom lembrar que as charges do "Charlie Hebdo" não tinham nada de ingênuas: eram facas afiadas na goela do ódio.

As coletâneas de capas do semanário sobre islamismo fazem parecer que esse era o grande tema do jornal. Não era. O jornal atirava para todos os lados, mas o alvo preferido era justamente a extrema direita de Le Pen --esse sim, islamofóbico.

Os chargistas que, mesmo ameaçados, não baixaram o tom, não devem ser tratados como pivetes malcriados que "fizeram por merecer", mas como artistas brilhantes que morreram pela nossa liberdade. Nosso dever é continuar lutando por ela, sem fazer concessões nem perder aquele ingrediente essencial: a falta de respeito pelo ódio.

A questão por trás disso tudo é a mesma de sempre: existe limite para o humor? A questão é complexa, mas a melhor resposta parece ser a seguinte: o limite está no objeto do riso. Rir de quem está por baixo é covarde, rir de quem está por cima é corajoso. Deve-se rir do opressor, e não do oprimido.

O problema é que essa resposta gera novas perguntas. Quem é o oprimido? Quem é o opressor? Muitas vezes, essa distinção não é clara.

Uma dica: quando surgir a dúvida sobre quem é o oprimido e quem é opressor, em geral, o indivíduo que foi fuzilado é o oprimido.

Fonte: Folha de São Paulo, 11 de janeiro de 2015

Sobre o terror islâmico: Raqqa, aqui

Raqqa, aqui

Por Demétrio Magnoli
Enquanto, na França, dezenas de milhares saíam às ruas para dizer "Eu sou Charlie", professores universitários brasileiros saíam de suas tocas para celebrar o terror. Não começou agora: é uma reedição das sentenças asquerosas pronunciadas na esteira do 11 de setembro de 2001. São sinais notáveis da contaminação tóxica de nossa vida intelectual e, especificamente, da célere conversão de departamentos universitários em latas de lixo do pensamento.

A mensagem dos franceses foi um tributo à vida e à civilização. "Eu sou Charlie" não significa que concordo com qualquer uma das sátiras do Charlie Hebdo. Significa que concordo com a premissa nuclear das sociedades abertas: a liberdade de expressão é, sempre, a liberdade daquele com quem não concordo. Isso, porém, nunca entrará na cabeça de nossos mensageiros da morte.

Seu discurso padrão começa com uma condenação ritual do ato terrorista: "É claro que não estou defendendo os ataques", esclareceu de antemão uma dessas tristes figuras, antes de entregar-se à defesa, na forma previsível da condenação das vítimas "justiçadas". "Não se deve fazer humor com o outro", sentenciou pateticamente Arlene Clemesha, que ostenta o título de professora de História Árabe na USP, para concluir com uma adesão irrestrita à lógica do terror jihadista. É preciso, disse, "tentar entender" o significado do ataque: "um atentado contra um jornal que publicou charges retratando o profeta Maomé, coisa que é considerada muito ofensiva para qualquer muçulmano".

Clemesha é só uma, numa pequena multidão acadêmica consagrada à delinquência intelectual. No mesmo dia trágico, Williams Gonçalves, professor de Relações Internacionais na Uerj, esqueceu-se do cínico aceno prévio para expor logo sua aguda visão sobre o "controle social da mídia" e, de passagem, candidatar-se a porta-voz oficial do Estado Islâmico: "Quem faz uma provocação dessas", explicou, referindo-se aos cartunistas assassinados, "não poderia esperar coisa muito diferente". O curioso, nas Clemeshas e nos Gonçalves, é que eles rezam pela mesma cartilha que Marine Le Pen, apenas com sinal invertido. O nome dessa cartilha é "choque de civilizações".

Na onda de islamofobia que varre a França, surfam dois lançamentos recentes. O livro "Le suicide français", do jornalista ultraconservador Éric Zemmour, alerta contra a destruição da cultura francesa por vagas sucessivas de imigração muçulmana. O romance "Soumission", de Michel Houellebecq, imagina a França governada por um partido islâmico no ano agourento de 2022. Segundo a gramática do "choque de civilizações", o Islã não cabe na França: um muçulmano só pode ser um francês se, antes, renunciar à sua fé. Os nossos Gonçalves e Clemeshas estão de acordo com isso –mas preferem que, para acolher os muçulmanos, a França renuncie a suas leis e a seus valores, entre os quais a laicidade do Estado. E, no entanto, apesar de Zemmour, Houellebecq, Clemesha, Gonçalves e Le Pen, milhares de muçulmanos franceses exibiram nas ruas os cartazes com a inscrição "Eu sou Charlie"...

Karl Marx escreveu cartas elogiosas a Abraham Lincoln. Leon Trostsky contou com a colaboração inestimável do filósofo liberal John Dewey para demolir as falsificações dos Processos de Moscou. Entre um evento e outro, o socialista August Bebel qualificou o antissemitismo como "o socialismo dos idiotas". Em outros lugares e outros tempos, o pensamento de esquerda confundiu-se com o cosmopolitismo e produziu as mais comoventes defesas das liberdades civis. No Brasil de hoje, com honoráveis exceções, reduziu-se a um pátio fétido habitado por "black blocs" iletrados, mas fanaticamente antiamericanos e antissemitas.

"Não se deve fazer humor com o outro", está escrito na lápide definitiva que cobre o túmulo do humor. Raqqa, a sede do califado, é aqui. "Eu sou Charlie".

Fonte: Folha de São Paulo, 10/01/2015

segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Sobre o terror islâmico: A primeira vítima é o humor

A primeira vítima é o humor

por Eugênio Bucci

O atentado contra a redação da revista Charlie Hebdo, ontem, em Paris, deixou para trás 12 cadáveres, 10 feridos e uma perplexidade do tamanho do mundo. O alvo dos terroristas foi a piada, o deboche. A vítima foi o humor. Dez dos 12 mortos trabalhavam na publicação, entre elas o diretor, Stephane Charbonier, que também era chargista (os outros dois mortos eram policiais, que não conseguiram deter os assassinos em fuga). A Charlie Hebdo fazia humor sobre o Islã e vinha sofrendo ameaças e agressões. Ontem foi finalmente dizimada. Testemunhas contaram que os atiradores teriam dito que "vingavam o Profeta" enquanto disparavam contra os cartunistas. Movidos por uma verdade absoluta qualquer, eles pretendiam silenciar e exterminar a ironia.

O sinal que mora dentro disso vem carregado de trevas. Muitos apontaram aí um crime contra a liberdade de imprensa e, portanto, um atentado contra os direitos humanos (embora muitos se esqueçam, a liberdade, que aparece no primeiro artigo da Declaração dos Direitos Humanos de 1948, é parte integrante e inseparável de qualquer entendimento que se possa ter das garantias fundamentais que cimentam a ideia que acalentamos de civilização). Mas é pior do que isso. Nessa tragédia concentrada, a vítima não é a imprensa em geral, não é a imprensa genérica. Estamos falando aqui da imprensa que faz rir, que falta com o respeito, que destroça a impostura de seriedade tão comum nos demagogos. Estamos falando de uma imprensa ainda mais arredia, que zomba da circunspecção dos circunstantes e rechaça a impostação e os salamaleques das autoridades, sejam elas religiosas, civis, militares ou simplesmente imbecis. Desta vez a vítima é a sátira. A vítima é a ironia.

Nada pode ser mais expressivo e mais aterrorizante. Matando a ironia, cortando-a pela raiz (e pelo pescoço), os autores da carnificina pretendiam matar o próprio espírito da modernidade. Se existe um traço distintivo da modernidade, é a ironia, essa sofisticação cética do espírito humano que passa pela recusa do argumento da autoridade - e pela ridicularização, mais ou menos ostensiva, da figura empolada da autoridade. A ironia duvida do poder porque sabe que o sujeito, em público e em privado, não governa todos os seus atos e todas as suas palavras. Enquanto uns batem continência e outros se ajoelham, a ironia ri. Não leva o ego tão a sério assim. Não dá crédito ao superego. Quando argumentam que o homem foi feito à imagem e semelhança de Deus, a ironia gargalha: se inventou esse tal de homem, Deus só pode ser mesmo um pastel. O melhor da ironia é rir de si mesma. Ela se sabe vã, embora se saiba também onipresente (mais onipresente do que Deus). Sabe-se presente, ainda que de forma involuntária, em tudo o que se move e em tudo o que fica parado na paisagem social e nas profundezas do psiquismo de cada um. Sem ironia o que é moderno fenece. Não há mundo moderno sem o arejamento da ironia e, no fundo, é exatamente esse arejamento que nos pode vacinar contra as catedrais do fundamentalismo e da intolerância, as forças malignas que nos tracionam para o passado.

Quem disparou contra os desenhistas corrosivos da revista francesa alimenta, sim, a fantasia tanática de aniquilar a democracia, a liberdade, a modernidade e, principalmente, a nossa ideia profana e fugidia de felicidade. Quem quer que tenha cometido tamanha brutalidade quer castrar a imaginação e o prazer, nos semelhantes e em si mesmo.

Além de monstruoso em todas as suas faces, o ataque terrorista à revista Charlie Hebdo é também um alerta sobre o lugar da liberdade de imprensa em tempos em que a imprensa parece não ter lugar no mercado. Os jornalistas acostumaram-se a pensar que ser independente se resume a não depender econômica e politicamente do governo, do Estado, de um grupo particular de anunciantes, das igrejas e do lobby cada vez mais poderoso das ONGs aparentemente boazinhas. Bem sabemos que, no Brasil, muita gente não assimilou metade dessa lição elementar, mas, de todo modo, ela continua sendo boa e necessária. Só tem um detalhe: ela não é mais suficiente. As agressões à liberdade de imprensa não partem mais apenas de juízes desavisados que impõem censura prévia em sentenças mal fundamentadas ou de governantes maliciosos que cooptam veículos fragilizados com o dinheiro ilimitado da publicidade oficial. A violência contra o direito à informação e a liberdade de expressão já não vem somente da cobiça dos endinheirados ou da ganância dos donos do poder. Agora quem se lança contra o espírito livre da crítica são gigantescas estruturas paraestatais e abertamente criminosas. Para não irmos longe, em comunidades da Colômbia e do México são grupos paramilitares, a mando de traficantes ou de milícias, que assassinam profissionais de imprensa e impõem às redações o pior dos regimes de terror. Quanto à polícia e quanto à Justiça, estas, muitas vezes compradas, se limitam a ser morosas ou aéreas. É o seu modo de ser cúmplice.

Hoje, em suma, o Estado não é deletério apenas quando move ataques contra a imprensa livre. Ele é ainda mais deletério quando não sabe (ou não quer) defendê-la.

Em Paris, o presidente François Hollande acertou ao ir prontamente a público para liderar a indignação da sociedade contra o gesto inominável. Mas a reação ainda é tímida. Na França, como no Brasil, ainda são numerosos os políticos que não perceberam que não poderiam existir sem a imprensa que zomba deles. Mais, muito mais do que antes o Estado é chamado a defender não apenas o instituto da reportagem investigativa e das críticas mais ácidas, mas também a irreverência, a sátira e a caçoada. Se a democracia não despertar para esse compromisso, será sucedida por um mundo em que o riso, a ironia e o gozo transgressor serão proibidos. E a política também.

* Eugênio Bucci é jornalista e professor da ECA-USP
Fonte: O Estado de São Paulo, 08 de janeiro

Sobre o terror islâmico: El islam como problema

Maurício Rojas
El islam como problema

A comienzos de junio Tony Blair publicó un artículo a propósito del asesinato del soldado británico Lee Rigby en una calle del sur de Londres que causó gran revuelo. Su título era Un problema dentro del islam y en sus párrafos más destacados decía lo siguiente:
No hay un problema con el islam... Pero hay un problema dentro del islam –de parte de los adherentes a una ideología que es una rama dentro del islam–. Y esto tenemos que ponerlo sobre la mesa y ser honestos acerca de ello. Por supuesto que hay cristianos extremistas y también judíos, budistas e hinduistas que lo son, pero me temo que esta rama dentro del islam no sólo abarca a unos pocos extremistas. En su núcleo existe una concepción de la religión y de la relación entre religión y política, que no es compatible con las sociedades pluralistas, liberales y tolerantes.
Para muchos fue una declaración escandalosa, lo que simplemente indica el grado de incapacidad de hablar con franqueza a que se ha llegado en lo referente al islam. Al poco tiempo vino la crisis egipcia, confirmando una vez más que el islamismo, es decir, lo que Blair considera la rama problemática del islam, "no sólo abarca a unos pocos extremistas". Sin embargo, si bien para muchos la constatación de Blair parece osada la verdad es que elude lo más importante y problemático, a saber, que aquella "concepción de la religión y de la relación entre religión y política, que no es compatible con las sociedades pluralistas, liberales y tolerantes" es, en realidad, la esencia misma del credo instaurado por Mahoma.

Cabe recordar que la idea distintiva del islam es que su libro sagrado, el Corán, es la palabra eterna, exacta e inmutable de Dios que Mahoma, con la mediación del arcángel Gabriel, sólo se limitó a recitar (Corán, Qu’rān, significa "la recitación" y la ortodoxia plantea que el texto, ya en árabe clásico, existió en Dios desde siempre). Esto crea un obstáculo mayor para cualquier intento de interpretación alegórica, matización o reforma del mensaje coránico. Pero lo decisivo es que este mensaje inmutable, complementado por los hadices o hechos y dichos del Profeta, no se refiere exclusivamente a cuestiones espirituales o supraterrenales, sino que aspira a regir directamente el conjunto de la vida social y espiritual. Ésta es la raigambre "totalizante" del islam, ya que excluye la existencia de un orden secular separado o no regido por la religión. Pero aquí también radica su matriz predemocrática, ya que no reconoce la soberanía legislativa del pueblo sino sólo la divina. Por ello, cuando los Hermanos Musulmanes dicen "El Corán es nuestra Constitución", están, de hecho, diciendo una obviedad para todo musulmán que siga tomando en serio los pilares mismos de su fe.

Si hacemos una comparación con el cristianismo y su evolución hacia una aceptación de la modernidad secularizada vemos dos notables diferencias que harán una evolución semejante mucho más difícil en el caso del islam. Por una parte, el cristianismo no es fundacionalmente totalizante (si bien tendería a serlo al ser adoptado como religión de Estado) y por ello no se articula originalmente como una religión que pretenda regir los asuntos de este mundo. "Dad al César lo que es del César, y a Dios, lo que es de Dios" y "Mi Reino no es de este Mundo" son dos magníficas síntesis bíblicas de esta distancia respecto del orden social y político terrenal. Por otra parte, a diferencia de Mahoma, Cristo no fue ni pretendió ser un jefe político-militar ni tampoco el creador de un orden social determinado. En suma, mientras que el cristianismo nació para resistir al mundo o incluso apartarse de él, el islam nació para conquistarlo y gobernarlo, para ampliar contantemente la "Casa del Islam" (Dār al-Islām) hasta absorber completamente ese mundo exterior llamado la "Casa de la Guerra" (Dār al-Harb).

Así y todo, el camino del cristianismo hacia una aceptación plena de una sociedad abierta no fue fácil. Su retirada hacia la esfera privada y la pérdida de su monopolio ideológico fue un proceso largo y desgarrador. También lo fue aceptar la crítica de sus textos sagrados, la autonomía de la ciencia y, sobre todo, la libertad del individuo para elegir sus formas de vida y, finalmente, creer o no creer. Nada semejante ha ocurrido dentro del islam y por ello su enfrentamiento con la modernidad –que no surge como en el mundo cristiano de una evolución interior sino que irrumpe como una fuerza exterior– ha sido tan difícil y traumático, provocando finalmente una fuerte reacción defensiva que propone la reislamización plena de la sociedad y la vuelta a la pureza de los orígenes, encarnada por esa utopía arcaica que es la umma o comunidad de los creyentes instaurada por Mahoma.

Este es el sentido estrictamente reaccionario del fundamentalismo islámico, pero lo que hay que entender es que el mismo no se deriva de una interpretación atávica o delirante del mensaje original de Mahoma, sino que fluye de la esencia misma de ese mensaje. En ello reside la dificultad que hay que saber reconocer y enfrentar, no para satanizar al islam sino para entender a cabalidad tanto su encrucijada actual como la fuerza del islamismo en sus diversas variantes.

El futuro dirá si el islam va a seguir siendo una "religión del recuerdo", es decir, de la fidelidad a la tradición (sunna) y al pasado, o si será capaz de evolucionar hacia una religión del futuro. Los que deseamos que prevalezca esta última alternativa debemos empezar por reconocer que existe un problema no sólo dentro del islam sino con el islam.

Fonte: Libertad Digital, 07/01/2015

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