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quarta-feira, 17 de setembro de 2014

'Violette', homenagem a uma mulher libertária


'Violette' contribui para a discussão de ideias

Longa inspira-se na relação de Violette Leduc e Simone de Beauvoir

Há um momento de Violette, o longa de Martin Provost ainda em cartaz na cidade, em que Emmanuelle Devos, na pele da protagonista, a escritora Violette Leduc, confessa que se sente feia. A ausência de beleza, o fato de não ter um corpo desejado, é uma fonte de amargura que se soma ao desencanto geral de sua vida. Violette foi abandonada na infância, cresceu ignorada pela mãe. O que a salva é a amizade de Simone de Beauvoir e, claro, a própria inteligência. Violette escreve, Simone, a autora de O Segundo Sexo e outros livros que pavimentaram a via da libertação da mulher no século 20, a exorta a ousar.

Simone de Beauvoir é interpretada por Sandrine Kiberlain, atriz que integra o elenco de Amar, Beber, Cantar, último longa de Alain Resnais, também em cartaz nos cinemas. O Resnais, até por ser o canto do cisne de um grande realizador - o próprio Resnais não se considerava um autor, embora o fosse -, está tendo suas virtudes exageradas. Provost não é tão conhecido nem apreciado, mas é bom começar a prestar atenção nele. O cinema de ideias ganha uma contribuição importante em Violette.

Provost tem se interessado pelos destinos de mulheres libertárias. Depois de Séraphine, de 2008 - sobre a pintora Séraphine de Senlis, praticamente analfabeta, mas que foi reconhecida como grande artista, antes de cair na depressão -, a ligação de Simone de Beauvoir e Violette Leduc lhe permite revisitar a intelectualidade que mudou o pensamento literário francês. Com Simone e Violette, a cena se amplia para abarcar os existencialistas. Jean-Paul Sartre, Albert Camus, Jean Genet. Se a anatomia delimita o destino de Violette - Sigmund Freud -, a palavra a resgata. A palavra escrita, falada. Violette nunca desfrutou, em vida, do prestígio dos escritores citados, mas, a partir de sua morte, em 1972, tem sido cada vez mais considerada. A autora maldita é hoje vista como pioneira. Protofeminista, bissexual. Ravages, de 1955, foi censurado pela sexualidade explícita na descrição de uma relação lésbica. A parte deletada ganhou versão publicada em 1966 - e Thérèse et Isabelle inclusive virou filme (de Radley Metzger).

É verdade que Gertrude Stein já afrontara alguns desses tabus - e na França, como devem se lembrar os cinéfilos que viram (e amaram) Meia-noite em Paris, de Woody Allen -, mas o foco de Violette é particular, nesse território ultimamente tão frequentado (e minado) das biografias filmadas. O filme não tenta explicar a baixa autoestima de Violette por seus traumas infantis e problemas familiares. A figura permanece intencionalmente difusa para que o público se sinta tentado a preencher os vazios do relato.

O ambíguo vínculo/romance de Violette e Simone traz para a tela um debate que abarca vida e arte. Simone difere de Violette, e esse é um elemento de atração, não de repulsa. A diferença não é só física, porque a Simone de Sandrine também não é exatamente sedutora nem erotizante. Parece até espectral. O que as liberta é a palavra - a literatura. E aqui a diferença talvez seja maior ainda. Simone, via existencialismo, questiona formas e comportamentos. Como autora, é planejadora e até calculista. Violette escreve à flor de sua pele sensível. A consciência da rejeição exala a dor de seu texto, mas também o júbilo (a catarse?) da escrita. Violette é muito interessante.

Fonte: O Estado de São Paulo, por Luiz Carlos Merten, 12 de setembro 2014

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

O Porteiro da Noite

Lançado em 1974, O Porteiro da Noite, da cineasta italiana Liliana Cavani, provocou muita polêmica e inclusive furor, entre judeus e feministas, ao retratar o ardente amor entre uma judia e um oficial da SS nazista.

A relação que começa em um campo de concentração, onde ele a salva da morte, recomeça em 1957, quando ela o reencontra como porteiro de um hotel em Viena. Longe de denunciá-lo às autoridades, como criminoso de guerra, ela volta aos seus braços, e eles retomam o relacionamento dos primeiros tempos.

Os amigos do porteiro, todos nazistas fugitivos, obviamente querem acabar com a testemunha de seu passado, passatempo a que se dedicam costumeiramente, mas o porteiro de novo tenta protegê-la, desta vez sem sucesso. Enfurnam-se num dos quartos do hotel onde vivem seu estranho amor até, já quase mortos de exaustão, saírem às ruas para serem obviamente mortos.

Mais do que um prato cheio para teorias psicanalíticas, dado o caráter sadomasoquista do relacionamento entre os personagens, O Porteiro da Noite transgride por mostrar que há mais entre vítimas e opressores do que sonha a vã filosofia do politicamente correto, nos fazendo pensar sobre a natureza da condição humana.

Ademais, o filme guarda uma cena para lá de sexy, ainda que decadente, chamada a cena bíblica pela referência à Salomé, onde Lucia Atherton (Charlotte Rampling, belíssima no filme) canta e dança para uma platéia de nazis embasbacados, incluindo seu amante, Maximilian Theo Aldorfer, interpretado por Dirk Bogarde. Veja abaixo. Fetiche puro. Para ver ou rever o filme todo, clique aqui.

Elenco
Dirk Bogarde (Maximilian Theo Aldorfer)Charlotte Rampling (Lucia Atherton)Philippe Leroy (Klaus)Gabriele Ferzetti (Hans)Giuseppe Addobbati (Stumm)Isa Miranda (Condessa Stein)Nino Bignamini (Adolph)Marino Masé (Atherton)Amedeo Amodio (Bert)Piero Vida (Day Porter)Geoffrey Copleston (Kurt)Manfred Freyberger (Dobson)Ugo Cardea (Mario)Hilda Gunther (Greta)Kai S. Seefeld (Jacob)
Esteve em exibição, em 2008,  no HSBC Belas Artes, mas volta e meia retorna em algum cinema. Também em DVD.



Reedição do original de 23/07/2008

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Mulheres no samba!

Nove de fevereiro de 2009 marcou o centenário de Carmen Miranda, a portuguesa que, exportada para nosso país, incorporou como ninguém o espírito brasileiro da ginga e da alegria juvenil que hoje parece coisa rara.

Carismática, Carmen também incorporou posteriormente a versão americana da baiana, tornando-se, mais do que uma cantora, um verdadeiro ícone não só da música brasileira mas do imaginário internacional.

Até hoje, vê-la em sua esfuziante baiana-americanizada é um prazer raro que só os artistas de alta qualidade conseguem provocar, como se pode verificar no vídeo abaixo.



E, para saber mais sobre a pequena notável, vale a pena visitar o site sobre a diva, Museu Virtual Carmen Miranda , de onde copiei a foto que abre essa postagem.

Mas, embora Carmen mereça não só um post, mas vários, este a cita apenas para introduzir o tema dos grupos de samba femininos que se espalharam pelo país nos últimos anos. Se Carmen estivesse viva hoje, bem poderia, em vez de aparecer acompanhada do masculino Bando da Lua, vir circundada dos femininos Samba de Rainha ou Samba de Comadre, por exemplo. Sem falar no Samba de Moças, Samba de Meninas, Toke Feminino, Toque de Salto, Razão Feminina, Entre Elas e vários outros mais amadores ou mais profissionais, iguais, no entanto, na demonstração de que mais um feudo masculino foi pro brejo.

Cantando samba de raiz, pagode, samba-rock, samba de roda, samba de escola de samba e assim por diante, as moças pegaram do cavaquinho, do pandeiro, do batuque, do violão e deram um lifting nesse ritmo que, apesar de tão brasileiro, apanha da música eletrônica importada, onipresente nas rádios e nas pistas de dança de norte a sul.

No feminino, o samba ganha sangue novo, um novo colorido, e recupera sua função de "levar a alegria a milhões de corações brasileiros." No vídeo abaixo, o mais conhecido entre os grupos de samba feminino, o Samba de Rainha, apesar de filho do outrora denominado "túmulo do samba", São Paulo, arrasa no batuque e na sonoridade. As meninas do SR também são mesmo a cara multi-étnica de Sampa (uma das integrantes é inclusive japonesa), demonstrando que o samba, mais do que negro, é simplesmente brasileiro, e que, nós, brasileiros, somos mesmo assim misturados de corpo e alma. Fora isso, não que eu queira assumir ninguém, mas tá na cara que muitas das moças do samba são também exímias sapateadoras.

Enfim, os grupos de samba femininos são legítimos herdeiros de Carmen Miranda e de tantas outras sambistas geniais que agora, além de cantar e encantar, também dispensam os homens nos instrumentos (hum, acho que produzi um duplo sentido).

Reedição de postagem de 12/03/09

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Vídeo "Faça acontecer" para um futuro sem fábricas de animais (e um pouco sobre West Side Story)

West Side Story (Amor, Sublime Amor) é um filme musical de 1961 que transporta o drama shakespeareano de Romeu e Julieta para o universo das gangues juvenis americanas formadas por imigrantes latinos e outros menos favorecidos. O cenário é a zona oeste de Manhattan em Nova York. Com coreografia inovadora e trilha sonora fantástica (Leonard Bernstein, Saul Chaplin), foi um divisor de águas na concepção dos musicais, tendo suas canções gravadas por inúmeros artistas e sua coreografia inspirado, entre outras, o clipe Beat It, de Michael Jackson.

No fundo, West Side Story trata do preconceito (qualquer deles) que dissemina o ódio e inviabiliza o amor. No filme, Tony, um ex-líder da gangue dos Jets (de brancos pobres), apaixona-se por María, irmã do líder da gangue rival, os Sharks, formada por imigrantes porto-riquenhos. Como no Romeu e Julieta original, entre disputas territoriais e ridículos códigos de honra, misturados no filme ao preconceito racial, o casal apaixonado não consegue sobreviver à estupidez humana.
Tony e Maria em West Side Story
Entre as músicas da trilha sonora (todas incríveis), Somewhere (Em algum lugar) se destaca como uma espécie de hino de esperança dos que vivem enjaulados pelas grades da discriminação e da opressão e sonham com a liberdade. Não por menos alguém teve a brilhante ideia de fazer um libelo pela libertação animal usando a música como tema.

Debulhei litros ao ouvir já o primeiro verso da canção associada às tristes imagens das chamadas fábricas de animais (de fato campos de concentração de bichos). Debulhei porque sempre cantei essa música pensando em todas as discriminações que sofrem os diferentes de todo o tipo e porque, naturalmente, nada me comove mais do que o sofrimento dos animais. O vídeo, de 2012, se chama Faça Acontecer (Make it Possible) e traz a mensagem de esperança de que é possível um futuro sem fábricas de animais, um futuro viável por causa das pessoas que mudam sua alimentação e se engajam na luta para que esse horror sob os céus deixe de existir.

Segue a letra da música, que fala por si mesma, traduzida para o português numa boa versão. E os vídeos Make It Possible e Somewhere do filme West Side Story. Deixo também o link para assistir online, legendada, essa obra-prima que é West Side Story, ganhadora, em 1962, do Oscar (em quase todas as categorias), do Grammy e do Globo de Ouro e, em 1963, do BAFTA britânico. E aqui, a trilha sonora.

Em algum lugar

Há um lugar para nós
Em alguma parte, um lugar para nós.
Paz e tranquilidade e céu aberto
Nos esperam em algum lugar.

Há um tempo para nós
Um dia haverá um tempo para nós
Tempo juntos e tempo de sobra
Tempo de olhar, tempo de amar

Algum dia, em algum lugar

Nós acharemos um novo modo de viver
Nós encontraremos um jeito de perdoar (Conseguiremos?)
Em algum lugar

Há um lugar para nós,
um lugar e um tempo para nós
Segure minha mão e já estaremos quase lá
Segure minha mão e eu lhe levarei até lá
De algum modo, um dia, em algum lugar.

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