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A origem revisitada do Dia Internacional da Mulher

Mulheres samurais

no Japão medieval

Quando Deus era mulher:

sociedades mais pacíficas e participativas

Aserá,

a esposa de Deus que foi apagada da História

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

‘Cota não resolve problema da educação. Ela cria ilusão’

Eunice Durham, professora de antropologia da USP (Carol Carquejeiro)
Professora Eunice Durham diz o óbvio andando a pé, mas a estupidez ideológica de uns e a demagogia de outros vêm cegando a todos. Destaco:

Tanto as cotas raciais como as cotas sociais são remendos demagógicos. Entendo que os problemas que elas visam combater são reais. De fato, existe uma grande desigualdade educacional entre pobres e ricos, negros e brancos. Mas a questão é que isso está sendo combatido no lugar errado. Querem consertar as desigualdades do Brasil na porta da universidade, sendo que o problema se origina na educação básica. Não é o vestibular que discrimina. O vestibular é talvez o mecanismo mais justo de seleção. Só passa quem tem capacidade de passar, não há beneficiados. O filho do senador e o filho da doméstica fazem exatamente a mesma prova. Agora, se os que passam são majoritariamente provenientes da parte mais rica de população é por culpa do sistema público, que é de péssima qualidade. Não é o vestibular que é elitista – é o sistema básico que é desigual.

‘Cota não resolve problema da educação. Ela cria ilusão’

A estudiosa afirma que, apesar da propaganda acerca da reserva de vagas, a esmagadora maioria dos jovens seguirá sem lugar na universidade pública

Nathalia Goulart, na Veja on-line

‘O vestibular é talvez o mecanismo mais justo de seleção. Só passa quem tem capacidade. O filho do senador e o filho da doméstica fazem exatamente a mesma prova. Agora, se os que passam são majoritariamente provenientes da parte mais rica de população é por culpa do sistema público, que é de péssima qualidade. Não é o vestibular que é elitista – é o sistema básico que é desigual’

Em agosto, a presidente Dilma Rousseff assinou a chamada lei das cotas, que reserva 50% das vagas de universidades federais a estudantes oriundos de escolas públicas de ensino médio. Nesta semana, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, lançou um programa de inclusão social para as três universidades públicas paulistas, USP, Unicamp e Unesp – apontadas nos rankings internacionais como centros de excelência em pesquisa no Brasil. “Embora a proposta pareça um pouco melhor do que a lei federal, está longe de ser a solução”, diz a antropóloga Eunice Durham.

Ex-secretária de política educacional do Ministério da Educação, membro do Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas da USP e estudiosa do ensino superior, Eunice acusa a nova proposta de carregar o mesmo discurso e enganos revelados em 2002, quando foi adotada pela primeira vez no país o mecanismo de reserva de vagas (por raça, então), na UFRJ. “Tanto as cotas raciais como as cotas sociais são remendos demagógicos”, diz. “Existe uma grande desigualdade educacional entre pobres e ricos, negros e brancos. Mas a questão é que isso está sendo combatido no lugar errado. Querem consertar as desigualdades do Brasil na porta da universidade, sendo que o problema se origina na educação básica.” 

Para quem acha que a posição é ideológica, a professora oferece números. “Mesmo com toda essa propaganda de que a universidade agora está de portas abertas para os alunos da rede pública, 95% da população jovem vai seguir fora da universidade pública.” Mais efetivo e justo, defende a antropóloga, seria a criação e manutenção, pelas universidades públicas, de cursos pré-vestibulares que preparassem os estudantes da rede pública para o ingresso no vestibular. “Desde que a universidade chegou ao Brasil, as famílias ricas recorrem a esse tipo de aulas adicionais para garantir que seus filhos tenham o conhecimento necessário para passar no vestibular. Por que não oferecer a mesma oportunidade para os pobres?”, indaga a estudiosa. Confira a seguir trechos da entrevista que ela concedeu ao site de VEJA.

Como docente da USP e membro da comunidade acadêmica, como a senhora recebeu a notícia de que a universidade deve aderir ao programa de cotas do estado?

Embora pareça um pouco melhor do que a lei federal, a proposta do governo estadual está longe de ser a solução. A ideia pode até ser aproveitada, mas precisa ser melhor analisada. Não podemos implementar um plano assim, sem testar outras alternativas.

Quais os problemas das políticas de cotas?
Tanto as cotas raciais como as cotas sociais são remendos demagógicos. Entendo que os problemas que elas visam combater são reais. De fato, existe uma grande desigualdade educacional entre pobres e ricos, negros e brancos. Mas a questão é que isso está sendo combatido no lugar errado. Querem consertar as desigualdades do Brasil na porta da universidade, sendo que o problema se origina na educação básica. Não é o vestibular que discrimina. O vestibular é talvez o mecanismo mais justo de seleção. Só passa quem tem capacidade de passar, não há beneficiados. O filho do senador e o filho da doméstica fazem exatamente a mesma prova. Agora, se os que passam são majoritariamente provenientes da parte mais rica de população é por culpa do sistema público, que é de péssima qualidade. Não é o vestibular que é elitista – é o sistema básico que é desigual.

Hoje, cerca de 80% dos alunos da educação básica estão matriculados na rede pública. Não é natural desejar que universidades federais e estaduais atendam também a essa população? A questão primordial é que as cotas não dão conta de incluir toda essa gente. Posso citar alguns números: no estado de São Paulo, menos de 30% dos jovens estão matriculados no ensino superior – há, portanto, pelo menos 70% de excluídos. Dos 30% incluídos, as universidades públicas atendem apenas 15% do total de matriculados, isto é, 4,5% dos jovens – menos de 5%. As cotas não mudam esse cenário porque não criam vagas, elas apenas fazem a redistribuição. Querem criar um programa para incluir mais negros nesse porcentual de 4,5%, mas isso em nada vai alterar o nível crucial de exclusão que temos. Eu sou contra cota racial: ela penaliza outra parte da população que também precisa de estímulos: os brancos pobres. 

As cotas são uma falsa ideia de inclusão, então?
Exatamente. Mesmo com toda essa propaganda de que a universidade agora está de portas abertas para os alunos da rede pública, 95% da população jovem vai seguir fora da universidade pública. Por isso as cotas são demagógicas. Elas não lidam com o problema, elas criam uma ilusão.

E qual é o verdadeiro problema?
No Brasil, existe uma cultura de que ensino superior é sinônimo de universidade. Criou-se esse mito de que todo mundo precisa ser doutor e que curso técnico profissionalizante é algo menor, degradante. O país precisa oferecer cursos diferenciados para populações diferenciadas. Tem gente quem quer aprender sobre as coisas e tem gente que quer aprender a fazer coisas. Temos que oferecer escola para todo mundo, ou você acha que todo mundo precisa estudar física quântica na USP? O Brasil tem que decidir se quer colocar todo mundo na universidade ou se quer criar um ensino superior que ofereça condições para dar à maioria da população a condição para continuar os estudos depois do ensino médio, aprender uma profissão, se inserir no mercado de trabalho e exercer uma cidadania responsável. Mas você vê alguém discutindo isso? Eu não vejo. Só vejo um monte de gente querendo sair bem na foto dizendo que vai colocar mais meia dúzia de estudantes nas universidade federais e estaduais. E achando que com isso vai resolver o problema da educação no Brasil.

Equacionar esses problemas levaria anos. O que fazer pela população pobre, majoritária nas escolas públicas, que está no ensino médio e precisa ser incluída no ensino superior?
A solução mais imediatista que vejo é a criação, por parte das universidades públicas, de cursos pré-vestibulares de qualidade para alunos de baixa renda empenhados em ingressar no ensino superior. Alunos das próprias instituições poderiam atuar junto a professores como tutores e, estudantes que almejam ser professores, por exemplo, poderiam fazer estágio nesses cursos. Desde que a universidade chegou ao Brasil, as famílias ricas recorrem a aulas adicionais para garantir que seus filhos tenham o conhecimento necessário para passar no vestibular. Por que não oferecer a mesma oportunidade para os pobres? Esse pré-vestibular permitiria checar quais são as reais dificuldades dos alunos e os métodos mais eficazes para saná-las, pensando em depois replicá-los para a rede pública de educação básica.

O programa do governo estadual prevê que os alunos realizem um curso prévio, de dois anos, antes de ingressar nas universidades, uma espécie de ‘college’ que garantiria um diploma de nível superior. Isso não seria suficiente?
O programa prevê apenas que os que forem selecionados passem pelo curso. Não adianta nada privilegiar meia dúzia de pobres. É preciso oferecer oportunidade de crescimento a muito mais jovens. Pelo sistema que eu proponho, mesmo os jovens que não ingressarão na universidade pública terão a oportunidade de suprir as deficiências que acumularam ao longo da vida escolar. E estarão assim mais preparados para o mercado de trabalho.

Mas a senhora considera que os ‘colleges’ poderiam ser uma alternativa às universidades no futuro? Eu sou a favor da criação de ‘colleges’. Seria uma proposta revolucionária para o ensino superior brasileiro, mas não pode ser um ‘college’ emendado a um projeto de cotas para a universidade. Nos Estados Unidos, eles funcionam bem e atendem a mais da metade da população. Mas, no Brasil, o projeto ainda está muito cru. É preciso discuti-lo, saber como seria implantado, sua vigência e avaliação. Do jeito que foi apresentado, me parece apenas a resposta a uma pressão demagógica.

Indicadores internacionais mostram que as universidades públicas paulistas são a elite do ensino superior brasileiro, instituições dedicadas ao ensino e à pesquisa. As cotas podem afetar a qualidade dessas universidades?Eu acredito que sim. Existem algumas pesquisas que apontam o contrário. Elas, em geral, dizem que alunos cotistas têm desempenho inclusive superior aos não cotistas. Isso tem a ver com resiliência, a capacidade do estudante de se adaptar e vencer os obstáculos quando lhe é dada oportunidade. Mas no momento que essas pesquisas foram realizadas, as cotas tinham outra dimensão, incluíam um percentual muito menor de alunos. Agora estamos falando que metade de uma universidade será formada por alunos oriundos de uma escola de má qualidade. Não há como prever o futuro, mas acredito que a qualidade de uma instituição não depende apenas de bons professores, mas também do ingresso de bons alunos.

Guerra fria digital: Governo petralha se alia a escória autoritária mundial para censurar a Internet

Governo Dilma Roussef assina tratado para limitar acesso à Internet
Como não podia deixar de ser, o governo petralha de Dilma Roussef envergonhou o país mais uma vez ao aliar-se à escória autoritária mundial que quer tirar das cidadãs e dos cidadãos o direito à liberdade de expressão na Internet. Sob pretexto de  combater o "monopólio" dos Estados Unidos em relação à governança da internet, o Brasil se juntou aos governos da Rússia, China, Irã e outros países árabes, todos interessados em impor alguma limitação à web.

Vejam o editorial de ontem do Estadão a respeito do tema e tenham vergonha do governo que temos. Ao fim da postagem, acessem link para a campanha que a AVAAZ fez (ainda no ar) contra esse absurdo. 

Guerra fria digital

O Estado de S.Paulo

Uma "cortina de ferro" pode estar sendo baixada para dividir a internet em duas - a aberta e a fechada. Essa perspectiva sombria, que lembra o cenário da guerra fria, inclusive com os mesmos protagonistas, surgiu como resultado da recém-encerrada conferência da União Internacional de Telecomunicações (UIT), órgão da ONU, realizada em Dubai.

Dos 144 países com direito a voto, 89 aprovaram um novo tratado sobre os ITRs, como são chamados, na sigla em inglês, os regulamentos internacionais de telecomunicação. Os Estados Unidos, seguidos de todos os países da Europa, além de Canadá e Japão, recusaram-se a assinar o documento, sob a alegação de que ele confere aos governos o poder de interferir no livre fluxo de informações na internet. Do lado dos que firmaram o texto estão Rússia e China, além do Irã e de países árabes, todos interessados em impor alguma limitação à web.

O Brasil alinhou-se a esse grupo, com a justificativa, segundo o ministro Paulo Bernardo (Comunicações), de que o novo acordo é uma forma de combater o "monopólio" dos Estados Unidos em relação à governança da internet.

É uma referência ao fato de que o governo americano integra as instâncias decisórias na Icann (Corporação da Internet para Atribuição de Nomes e Números), entidade privada sediada na Califórnia cuja função básica, desde 1998, é administrar os domínios da rede no mundo todo, algo essencial a seu funcionamento, mas que não exerce controle nenhum sobre o tráfego de dados na internet.

Já os acordos resultantes da conferência de Dubai, ao abrigarem uma resolução que cita a internet, na prática abrem caminho para que a UIT, uma organização intergovernamental, tenha condições de regulamentar a web.

Trata-se de uma distorção, porque a UIT é responsável por normatizar os serviços de telecomunicações, e a internet não é se não apenas um cliente desses serviços. Um exemplo desse problema é a parte da resolução que aborda o chamado "spam", isto é, a mensagem eletrônica não solicitada, enviada em massa. Para os opositores do acordo, a definição do que é um spam, se deixada aos governos, será sempre arbitrária e muito possivelmente contrária à liberdade de expressão. Além disso, uma UIT com mais poder sobre a internet seria muito útil para as grandes empresas de telecomunicações interessadas em participar das novas formas de ganhos com a web. Por outro lado, uma vez que deixem de ser apenas meio de transmissão e passem a ter influência sobre o tráfego de dados, essas empresas poderão romper a neutralidade da rede, impondo tarifas diferenciadas para cada tipo de serviço. Tais pedágios contrariam os princípios de igualdade da internet.

Não se discute que os governos devem agir para garantir a segurança, a proteção de dados e o respeito à propriedade intelectual na internet. No mais, a atuação deve ser indireta, tal como no sistema adotado pelo Brasil, em que o Comitê Gestor da internet, do qual o governo é apenas uma parte, serve como órgão consultivo sobre a web, sem ter qualquer poder executivo sobre ela. Além disso, desde 1995 a internet está formalmente fora da Lei Geral de Telecomunicações, sendo considerada apenas um "serviço de valor adicionado". É justamente a ausência de controles oficiais que torna a internet dinâmica, capaz de inovar continuamente, e o modelo brasileiro está entre os melhores do mundo para mantê-la assim.

Contudo, a título de tirar dos Estados Unidos o suposto controle político da internet, países com tradição autoritária tentam legitimar internacionalmente um controle do tráfego de informações na web. O resultado é que a própria UIT, entidade que interfere em questões básicas das telecomunicações, como a coordenação de recursos de telefonia e do uso do espectro de radiofrequência, sairá enfraquecida desse confronto, algo que não aconteceu nem durante a guerra fria propriamente dita. E o governo brasileiro, movido por seu eterno objetivo ideológico de se contrapor aos Estados Unidos, assinou o tratado e aprovou a resolução sobre a internet sem reservas, legitimando esse atentado.

Veja campanha contra essa tentativa de censurar nossa liberdade de expressão.

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Branca de Neve não come mais as maçãs envenenadas dos manés Pondés

Sócrates não era politicamente incorreto
No final de semana, terminei de ler o tal Guia Politicamente Incorreto da Filosofia, do Luiz Felipe Pondé, e me senti lesada. Primeiro, metade das páginas do livro (literalmente) está em preto, com alguns desenhos ou sem nada. Depois, a outra metade escrita, com raras exceções, é um amontoado de falácias, generalizações, mofados clichês machistas, exemplos de ignorância pura e simples, entre outras pérolas, tudo isso alinhavado para referendar a tese desse loser conservador de que a natureza humana é uma merda, o ser humano é uma merda, a vida é uma merda e quem nega essa "realidade" é  mentiroso, hipócrita e mau-caráter. Inclusive atente-se para o detalhe de que, ao xingar, de antemão, os possíveis contestadores de sua visão de mundo (uma espécie de falácia ad hominem a priori), Pondé visa intimidar a consciência crítica do leitor a fim de tentar evitar o reconhecimento de sua embromação intelectual. O menininho da fábula diria: "O rei está nu!"  Se o politicamente correto é chato e vigarista, Pondé não fica atrás.

Por coincidência, na segunda-feira, lendo minha página inicial do facebook, estava lá alguém comentando um artigo do dito na FSP, chamado Branca de Neve Azeda, na mesma linha dos maravilhosos textos do tal guia. Fiz um comentário genérico sobre o artigo, mas alguém insinuou que eu estava passando ao largo do texto em si e só criticando o autor. Comecei a dar uma resposta, mas o comentário foi ficando longo demais e acabou virando esta postagem.

Na verdade, primeiro, fica difícil esmiuçar o artigo do Pondé porque ele não dá referências de suas afirmativas, com exceção do tal "opression studies" que teria sido cunhado pelo cara da Fox News (ver o texto ao fim da postagem).

"'Oppression studies' é uma expressão usada pelo jornalista americano Billy O'Reilly, da Fox News, para se referir às "ciências humanas engajadas no controle das mentes".

Aqui, já temos um problema porque o termo parece ser de fato de autoria de um professor do departamento de História da Universidade da Pensilvânia, chamado Alan Kors. Depois, Pondé parte para um monte de generalizações (como de costume), misturando alhos com bugalhos e culminando por dizer que o pessoal do "opression studies" quer impedir propagandas que apresentem "homens como sendo homens e mulheres sendo mulheres" e que seria também responsável pela versão atual da Branca de Neve onde a dita não termina com um homem, o que resultaria numa velhice solitária e azeda porque mulheres sem homem - esse artigo de "primeira" necessidade - acabam inevitavelmente nesse estado.

Embora diga que os "oppression studies", via um comitê de gênero, desses países  em que o "mundo é perfeito" (e se são de países como poucos?), sonham em fazer leis, depois indaga por que razão esses "cem car@s (não são muito mais do que isso)" "querem se meter na vida, na família e na escola dos outros, com o direito de dizer o  que meus filhos ou os seus devem ver na TV?" Quem é o tal comitê de gênero, de onde é, de onde Pondé tirou essa informação? Onde está a referência que demonstra a ligação dos "opression studies" com a versão da Branca de Neve da Kristen Stewart? No próprio corpo do artigo, pode-se colocar referências que respaldem o que dizemos, né mesmo? Será que ele dá aulas de filosofia (ai, ai!) sem indicar bibliografia?

E quando ele se mete a exemplificar como seria a tal propaganda que visa impedir a apresentação de "homens como sendo homens e mulheres sendo mulheres", manda os leitores imaginarem que seria, como querem os "opression studies", o comercial de uma família não heterossexual para que os não heterossexuais não se sentissem oprimidos. Também não se sabe de onde ele tirou mais essa, porém fica difícil imaginar que agências de propaganda, considerando ser a maioria das famílias heterossexual, fossem deixar de tentar vender produtos para elas, em detrimento dos lucros dos anunciantes e delas próprias, para agradar aos especialistas dos "oppression studies".

Politicamente correto versus Politicamente incorreto

O politicamente correto é uma traição às raízes libertárias dos movimentos sociais.

A verdade é que as pessoas parecem estar com a paciência tão esgotada, ou com o saco tão cheio (para agradar gregas e troianos), das extrapolações do politicamente correto que estão engolindo acriticamente a falação de qualquer um que as questione mesmo de maneira suspeita. Pondé é um dos que está capitalizando em cima desse saco cheio, como se observa no artigo citado quando enumera as várias situações em que alguém pode ser rotulado de opressor pelo politicamente correto, situações  que vão do delito de andar de carro a não concordar com o sistema de cotas raciais.

De fato, o politicamente correto é uma degeneração das justas lutas de amplos setores da população (de fato a maioria da população, considerando apenas mulheres, negros e homossexuais) por igualdade de direitos e inclusão social. Nas últimas quatro décadas, uma parte do ativismo estendeu o conceito de opressão de tal forma que acabou tornando-o uma espécie de patrulhamento da sociedade, de falas, piadas, anúncios comerciais, obras literárias e até dicionários por supostamente ofender grupos historicamente discriminados. Um dos exemplos mais absurdos do PC é a tentativa de retirar, dos dicionários, contrariando a função dos mesmos, as acepções pejorativas de certos vocábulos por serem "ofensivos" a negros, ciganos, mulheres, etc.. Não custa repetir que dicionários são meros inventários das palavras usadas por uma determinada comunidade linguística.

O politicamente correto tem dois erros fundamentais. Primeiro, renaturaliza os coletivos e as dicotomias, criados pela sociedade conservadora, além da necessidade de se assumir um sujeito político a partir do qual reivindicar direitos. Só que agora divide a sociedade esquematicamente em oprimidos e opressores, ofendidos e ofensores, como se houvesse algum ser humano sem preconceitos. Conquistados os direitos básicos de cidadania, deveria-se partir para a desconstrução dos coletivos que aprisionam as pessoas as mais distintas em currais específicos,  buscando criar um mundo onde todos sejam de fato julgados como indivíduos - por que isso é o que corresponde à realidade - e não por sua cor de pele, seu sexo ou orientação sexual. O PC vai na direção oposta.

Segundo erro, ao reduzir grupos discriminados à categoria de meras vítimas a serem protegidas pelo Estado, o PC ironicamente os desempodera. Atribuir todos os problemas dos indivíduos somente a condições sociais adversas é irresponsabilizar as pessoas pelos rumos da própria vida. De fato, o politicamente correto é uma traição às raízes libertárias dos movimentos sociais.

O Politicamente incorreto (PI) vem se transformando apenas no reduto dos conformistas e reacionários

Então, razões para se questionar o politicamente correto não faltam, mas é preciso sempre levar em consideração a consistência dos questionamentos apresentados e a partir de que lugar eles provêm para não se comprar gato por lebre. O politicamente incorreto, a princípio uma aparente reação saudável aos exageros e desmandos do politicamente correto,  vem cada vez mais se revelando apenas o reduto dos conformistas e reacionários ressentidos com as mudanças sociais que escaparam de seu controle.

Capitalizando o saco cheio das pessoas pelas extrapolações do PC, gente como Pondé e outros do gênero vêm tentando revitalizar ideias de uns 60 anos atrás. Se o PC reduz toda a trajetória dos indivíduos às condições sociais adversas que enfrentam (então, fulano é bandido apenas porque vítima da pobreza), o PI quer negar que as condições sociais e culturais tenham papel importante na vida das pessoas, como se vivêssemos num vácuo social, bastando aos indivíduos força de vontade para superar os obstáculos que a sociedade lhes interpõe. O politicamente correto não mente quando aponta o papel da cultura em nossas vidas. O problema é a "solução" que ele dá para essa realidade.

Então a historinha das "imagens de mulher sendo mulher e homem sendo homem", como fala Pondé no citado artigo, só existem ideologicamente. Pondé de fato se refere às imagens tradicionais de homens e mulheres, mas esconde o "tradicionais" porque quer renaturalizar essas imagens, reafirmar os papéis tradicionais de homem e mulher.

Entretanto, ninguém com honestidade moral e intelectual pode afirmar categoricamente no que, em termos de comportamento, as diferenças anatômico-fisiológicas entre homens e mulheres implicam de fato.  Nem sequer as diferenças de conformação física podemos dizer que são simplesmente naturais porque até há muito pouco tempo as mulheres eram restritas ao lar e tinham seus movimentos também restritos por todo o tipo de cerceamento físico, desde os espartilhos até o enfaixamento dos pés das chinesas que as impedia de andar. 

Ainda, até o início do século XX, as mulheres eram proibidas de fazer esportes, para não ficarem masculinizadas. E todo mundo sabe muito bem que o que não se usa atrofia. Livres das restrições de outrora, hoje as mulheres exibem corpos com músculos monumentais, como os das fisiculturistas, corpos bombados, como as das periguetes da vida, e corpos malhados como, aliás, até se exige atualmente como padrão feminino de beleza. Mulheres a la Botero estão fora de moda.

Pondé parece a Carolina da música do Chico: o tempo passou na janela, e só ele não viu.  

Então, ser homem e mulher hoje é diferente de um século atrás, o que demonstra a preponderância da cultura na conformação da vida dos indivíduos e das sociedades humanas. Mas Pondé não se conforma. Parece a Carolina da música do Chico: o tempo passou na janela, e só Carolina não viu.  Ele se ressente do novo papel da mulher, que não tem mais o homem como centro de sua vida, e apela para os mais surrados clichês machistas, repetidos ad nauseam na maior parte de seus artigos, para tentar reconduzí-la ao seu devido lugar (de objeto e serviçal). Até a versão cinematográfica atual da Branca de Neve, com a insossa da Kristen Stewart (o que salva o filme para mim é a Charlize Teron de Rainha Má) entra na dança desse conservador angustiado com a obsolência de homens como ele:

"A coitada tem que terminar sozinha para sustentar sua posição de rainha "empoderada", apesar de amar o caçador (passo essencial para libertar nossa heroína da opressão de amar alguém da nobreza, o que seria ainda mais opressor).


Os "oppression studies", na sua face feminista, revelam aqui o ridículo de sua intenção: fazer de toda mulher uma mulher sem homem porque ela mesma é o homem. Todo mundo sabe que isto é a prova mais banal da chamada inveja do falo da qual falam os freudianos. Fizeram da pobre Branca de Neve uma futura rainha velha e sem homem. Ficará azeda como todas que envelhecem assim."

Vejam lá se o roteirista e o diretor do filme, dois homens, ressaltemos, estão lá sabendo dos "oppression studies" (como perguntei no começo da postagem, onde está a ligação entre eles?) e fizeram, para se adequar aos ditos,  a Branca de Neve da Kristen Stewart como uma futura rainha velha e sem homem (como se "homem" fosse um valor em si mesmo). Ao contrário de Pondé, os criadores do filme estão no século XXI e quiseram simplesmente apresentar uma versão da fábula adequada aos dias de hoje, para as jovens de hoje, que não são mais certinhas e boboquinhas, que querem ser protagonistas e não coadjuvantes e que, portanto, têm objetivos muito mais variados e interessantes do que arrumar homem. Felizmente, aliás. Suas mães (algumas ainda), avós e bisavós eram obrigadas a arrumar um homem para sustentá-las, pois não podiam se autossustentar e, geralmente, depois do casório, descobriam que o príncipe encantado era um sapo dado a bater nelas. E sozinhas e azedas ficavam exatamente por terem feito suas vidas girarem em torno de um homem, sem outro tipo de realização pessoal, e acabarem trocadas, depois de velhas, por outra de vinte anos, restando-lhes a humilhação de um casamento de fachada (tendo que engolir a outra) ou o abandono simplesmente  Quem não conhece inúmeras histórias assim? Até hoje acontecem.

Pondé é um fóssil do qual um cientista "cons" tirou o DNA para trazer dinossauros de volta à vida e exibir num parque, mas falhou na segurança do lugar. Então alguns espécimes escaparam para a civilização e acham que podem voltar a dominar o planeta e recompor os tempos do Jurássico e Cretáceo.  Não está obviamente preocupado com a solidão feminina que supostamente só seria sanada por um homem. Dá até vergonha alheia de escutar esse tipo de coisa em 2012. Está preocupado é em condenar a independência feminina que vem deixando na solidão os manés como ele que sentem saudades dos tempos da Amélia e querem ressuscitá-la a qualquer preço. E olhe que, apesar de tantas mudanças, ainda não se conseguiu que os vagaus  dividam sequer o serviço doméstico, sobrecarregando as mulheres que, além da carreira, ainda bancam as empregadas de marmanjos caras-de-pau. Também porque elas aceitam, né?

Entretanto, realmente, hoje mulheres não precisam de homens para nada pois podem sobreviver sem eles. Se querem ter filhos, podem se valer de uma ficada ou de um banco de esperma. Para algumas mulheres, homens não servem sequer para momentos de lazer (sei que me entendem). E os homens que pensam com a cabeça que têm cérebro deveriam é agradecer ao feminismo por essas mulheres independentes, pois assim podem ter certeza de que, quando as mulheres decidem criar uma família com eles, é porque de fato os amam e não porque não tem outra escolha senão aturá-los. O machismo empobrece às relações humanas. É uma doença de manés, de pondés.

Para além dos PC e  PI 

Concluindo, a crítica aos excessos do politicamente correto é necessária e saudável, mas não pode ser usada para tentar jogar fora o bebê junto com a água suja da bacia. Os politicamente incorretos estão negando a importância história, social e política dos movimentos sociais por causa dos desmandos de uma corrente que se encontra em evidência há apenas uns 40 e poucos anos, o que historicamente não é nada. Falando só do feminismo, mais corretamente dos feminismos, eles estão aí desde a Revolução Francesa (1789-1799), quando as primeiras mulheres começaram a reivindicar igualdade de direitos com os homens. São mais de dois séculos. Muita água rolou embaixo dessa ponte, água que não pode ser reduzida àquela lenga-lenga conservadora que credita a origem dos movimentos sociais a um - mais mítico do que real - "marxismo cultural" da Escola de Frankfurt. 

Então, de fato, considerando a crítica anistórica e as generalizações, os PI criticam o movimento LGBT, a quem chamam escrotamente de gayzista, não por seus erros mas porque são contrários a igualdade das pessoas homossexuais com as heterossexuais. Criticam o movimento ambientalista, a quem chamam de ecochato, não por seus excessos mas sim porque são antropocêntricos e acham que a natureza está aí para nos servir. Criticam o movimento feminista, a quem chamam escrotamente de feminazista, não por seus exageros mas sim porque querem as mulheres de volta à submissão do papel feminino tradicional, onde, só mesmo na cabeça dos machões, elas encontrariam a felicidade.

O mané do Pondé diz isso de forma mais oblíqua, porque posa de muderninho (para disfarçar as ideias da idade da pedra), porém há outros mais explícitos: eles querem "mulheres submissas, tradicionais, recatadas, reservadas, voltadas para a família, femininas, conservadoras (tirado de um blog chamado esquerdopatia). Eles querem a Amélia de volta, minha gente! Melhor esperarem sentados para não cansar!

Felizmente as Brancas de Neve de hoje não aceitam mais maças envenenadas de ninguém nem ficam esperando que príncipes venham salvá-las. Quem espera nunca alcança. Vão à luta sozinhas ou só bem acompanhadas.

P.S. Reproduzo também trecho de texto do filósofo Paulo Ghiraldelli Jr sobre o tema do politicamente correto/incorreto (de seu blog tirei igualmente a charge do Sócrates que ilustra esta postagem): "Espero que essa modinha conservadora anti-liberal e anti-direitos, que está melando tudo com essa conversa defasada sobre o “politicamente correto”, passe de vez. Pois ela está beirando justamente aquilo que denuncia: a falta de inteligência. Do modo que está, atingindo até Sócrates, passou da conta." (leia todo o artigo)




Branca de Neve Azeda

por  Mané Pondé

Fazer a cabeça das crianças sempre foi um dos pratos prediletos do fascismo. Agora, nem a Branca de Neve escapa, coitada, do ódio dos fascistas. O conjunto de "estudos" que se dedica a fazer a cabeça das crianças é parte do que podemos chamar de "oppression studies".

Você não sabe o que é?

"Oppression studies" é uma expressão usada pelo jornalista americano Billy O'Reilly, da Fox News, para se referir às "ciências humanas engajadas no controle das mentes". Explico.

Reprovou um aluno? Opressão. É preguiçoso? Não, a sociedade te oprimiu e fez você ficar assim. Um ladrão te assaltou? Ele é o oprimido, você o opressor. Aliás, sobre isso, vale dizer que, com a violência em São Paulo, devemos reescrever a famosa frase do Che: "Hay que enfiar la faca en la cavera, pero sin perder la ternura jamás".

A frase dele, assinatura de camisetas revolucionárias, é: "Hay que endurecerse, pero sin perder la ternura jamás". Essa camiseta é a verdadeira arma contra gente como ele. Os americanos deveriam afogar o Irã em Coca-Colas, Big Macs e pílulas anticoncepcionais para as iranianas transarem adoidado com seus amantes.

Convidou uma colega de trabalho para jantar? Opressão! Você é um opressor por excelência, deveria ter vergonha disso. Não é um amante espiritual do Obama? Opressor! Come picanha? Opressor! Não acha que a África é pobre por culpa sua? Opressor! Suspeita de que o sistema de cotas vai destruir a universidade pública criando um novo espaço de corrupção via reserva tribal de mercado e compra de diplomas de escolas públicas? Se você suspeita disso, é um opressor! Acha que uma pessoa deve ser julgada pelos seus méritos e não pelo que o tataravô do vizinho fez? Opressor! Anda de carro? Opressor! Ganhou dinheiro porque trabalha mais do que os outros? Opressor!

Os "oppression studies" sonham em fazer leis. Por exemplo, recentemente, um comitê de gênero (isto é, o povo que diz que sexo não existe e que tudo é uma "construção social", claro, opressora) desses países em que o "mundo é perfeito" teve uma nova ideia.

Esses caras (ou seriam car@s?) querem proibir qualquer propaganda ou programação infantil que reproduza imagens de mulher sendo mulher e homem sendo homem. Não entendeu? É meio confuso mesmo. Vamos lá.

Imagine uma propaganda na qual existe uma família. Segundo os especialistas em "oppression studies", para a marca não ser opressora, a família não pode ser heterossexual, porque se assim o for, o "espelho social" (a imagem que a mídia reproduz de algo) fará os não heterossexuais se sentirem oprimidos.

O problema aqui não é que as pessoas devem ser isso ou aquilo (melhor esclarecer, se não eu viro objeto de estudo dos "oppression studies"), mas sim por qual razão esses cem car@s (não são muito mais do que isso), que não têm o que fazer na vida a não ser se meter na vida, na família e na escola dos outros, têm o direito de dizer o que meus filhos ou os seus devem ver na TV? Até quando vamos aturar essa invasão da vida alheia em nome dos "oppression studies"?

Contos de fadas como Branca de Neve, Cinderela e Gata Borralheira são grandes objetos de atenção dos "oppression studies". Claro, as três são oprimidas, por isso gostam dos príncipes. Se fossem livres, a Branca de Neve pegaria a Cinderela. Humm... não seria uma má ideia....

Veja o lixo que ficou a releitura da Branca de Neve no filme que tem a atriz da série "Crepúsculo", a bela Kristen Stewart, como a Branca de Neve. Coitada...

A coitada tem que terminar sozinha para sustentar sua posição de rainha "empoderada", apesar de amar o caçador (passo essencial para libertar nossa heroína da opressão de amar alguém da nobreza, o que seria ainda mais opressor).

Os "oppression studies", na sua face feminista, revelam aqui o ridículo de sua intenção: fazer de toda mulher uma mulher sem homem porque ela mesma é o homem. Todo mundo sabe que isto é a prova mais banal da chamada inveja do falo da qual falam os freudianos. Fizeram da pobre Branca de Neve uma futura rainha velha e sem homem. Ficará azeda como todas que envelhecem assim.

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Mais um golpe no antropocentrismo: “A pesquisa científica com animais é uma falácia”, diz médico Ray Greek

Dr. Ray Greek
Anda cada vez mais difícil para os antropocêntricos, que acham que a natureza está aí para nos servir, o que inclui os animais, sustentar seus anticompassivos pontos de vista.

Hoje não só ativistas de direitos dos animais mas inclusive cientistas levantam suas vozes contra os maltratos (muitas vezes verdadeiras abominações) cometidas pelos humanos contra nossos vizinhos de planeta. Em meados deste ano, cientistas redigiram um manifesto onde declaram que animais têm consciência (veja o vídeos ao fim da postagem). Qualquer dono de pet sabe bem disso, mas não somos "otoridades" científicas para merecer crédito.

Em outubro, foi a vez do médico Ray Greek contestar o uso de animais em laboratório (essa aberração) não em nome da ética mas da ciência. Reproduzo sua entrevista abaixo e destaco o trecho onde ele diz a verdadeira razão para a existência de testes em animais: a ganância e a corrupção.

Destaque: Se isso fosse verdade os cientistas já teriam abandonado o modelo animal. Por que isso não aconteceu ainda? 
Porque o trabalho deles depende disso. Nos Estados Unidos, a maior parte da pesquisa médica é financiada pelo Instituto Nacional de Saúde [NIH, em inglês]. O orçamento do NIH gira em torno de 30 bilhões de dólares por ano. Mais ou menos a metade disso é entregue a pesquisadores que realizam experimentos com animais. Eles têm centenas de comitês e cada comitê decide para onde vai o dinheiro. Nos últimos 40 anos, 50% desse dinheiro vai, anualmente, para pesquisa com animais. Isso acontece porque as próprias pessoas que decidem para onde o dinheiro vai, os cientistas que formam esses comitês, realizam pesquisas com animais. O que temos é um sistema muito corrupto que está preocupado em garantir o dinheiro de pesquisadores versus um sistema que está preocupado em encontrar curas para doenças e novos remédios.

“A pesquisa científica com animais é uma falácia”, diz o médico Ray Greek

Médico americano afirma que a pesquisa com animais atrasa o avanço do desenvolvimento de remédios

Há 20 anos, Ray Greek abandonou o consultório para convencer a comunidade científica de que a pesquisa com animais para fins médicos não faz sentido. Greek é autor de seis livros, nos quais, sem recorrer a argumentos éticos ou morais, tenta explicar cientificamente como a sua posição se sustenta. Em 2003 escreveu Specious Science: Why Experiments on Animals Harm Humans(Ciência das Espécies: Por que Experimentos com Animais Prejudicam os Humanos, ainda não publicado no Brasil) e o mais recente em 2009: FAQs About the Use of Animals in Science: A Handbook for the Scientifically Perplexed (Perguntas e Respostas Sobre o Uso de Animais na Ciência: Um Manual Para os Cientificamente Perplexos). Ele garante que sua motivação não é salvar os animais, mas analisar dados científicos. 

Além disso, Greek uniu esforços com outros médicos americanos e fundou a Americans for Medical Advancement, uma organização sem fins lucrativos que advoga métodos alternativos ao modelo animal. Em entrevista para VEJA, ele diz porque, na opinião dele, a pesquisa com animais para o desenvolvimento de remédios não é necessária.

O senhor seria cobaia de uma pesquisa que está desenvolvendo algum remédio?
Claro. Se a pesquisa estivesse sendo conduzida eticamente eu seria voluntário. Milhares de pessoas fazem isso todos os dias. Por vezes elas doam tecido para que possamos aprender mais sobre uma doença, em outros momentos ingerem novos remédios para o tratamento de doenças na esperança que a nova droga apresente alguma cura.

E se o medicamento nunca tivesse sido testado em animais?
A falácia nesse caso é de que devemos testar essas drogas primeiro em animais antes de testá-las em humanos. Testar em animais não nos dá informações sobre o que irá acontecer em humanos. Assim, você pode testar uma droga em um macaco, por exemplo, e talvez ele não sofra nenhum efeito colateral. Depois disso, o remédio é dado a seres humanos que podem morrer por causa dessa droga. Em alguns casos, macacos tomam um remédio que resultam em efeitos colaterais horríveis, mas são inofensivos em seres humanos. O meu argumento é que não interessa o que determinado remédio faz em camundongos, cães ou macacos, ele pode causar reações completamente diferentes em humanos. Então, os teste em animais não possuem valor preditivo. E se eles não têm valor preditivo, cientificamente falando, não faz sentido realizá-los.

Mas todos os remédios comercializados legalmente foram testados em animais antes de seres humanos. Este não é um caminho seguro?
Definitivamente não. As estatísticas sobre o assunto são diretas. Inclusive, muitos cientistas que experimentam com animais admitiram que eles não têm nenhum valor preditivo para humanos. Outros disseram que o valor preditivo é igual a uma disputa de cara ou coroa. A ciência médica exige um valor que seja de pelo menos 90%. 

Esses remédios legalmente comercializados e que dependeram de pesquisas científicas com animais já salvaram milhões de vidas...
A indústria farmacêutica já divulgou que os remédios normalmente funcionam em 50% da população. É uma média. Algumas drogas funcionam em 10% da população, outras 80%. Mas isso tem a ver com a diferença entre os seres humanos. Então, nesse momento, não temos milhares de remédios que funcionam em todas as pessoas e são seguros. Na verdade, você tem remédios que não funcionam para algumas pessoas e ao mesmo tempo não são seguros para outras. A grande maioria dos remédios que existe no mercado são cópias de drogas que já existem, por isso já sabemos os efeitos sem precisar testar em animais. Outras drogas que foram descobertas na natureza e já são usadas por muitos anos foram testadas em animais apenas como um adendo. Além disso, muitos remédios que temos hoje foram testados em animais, falharam nos testes, mas as empresas decidiram comercializar assim mesmo e o remédio foi um sucesso. Então, a noção de que os remédios funcionam por causa de testes com animais é uma falácia. 

Se isso fosse verdade os cientistas já teriam abandonado o modelo animal. Por que isso não aconteceu ainda? 
Porque o trabalho deles depende disso. Nos Estados Unidos, a maior parte da pesquisa médica é financiada pelo Instituto Nacional de Saúde [NIH, em inglês]. O orçamento do NIH gira em torno de 30 bilhões de dólares por ano. Mais ou menos a metade disso é entregue a pesquisadores que realizam experimentos com animais. Eles têm centenas de comitês e cada comitê decide para onde vai o dinheiro. Nos últimos 40 anos, 50% desse dinheiro vai, anualmente, para pesquisa com animais. Isso acontece porque as próprias pessoas que decidem para onde o dinheiro vai, os cientistas que formam esses comitês, realizam pesquisas com animais. O que temos é um sistema muito corrupto que está preocupado em garantir o dinheiro de pesquisadores versus um sistema que está preocupado em encontrar curas para doenças e novos remédios.

Onde estaria a medicina se não fosse a pesquisa com animais?
No mesmo lugar em que ela está hoje. A maioria das drogas é descoberta utilizando computadores ou por meio da natureza. As drogas não são descobertas utilizando animais. Elas são testadas em animais depois que são descobertas. Essas drogas deveriam ser testadas em computadores, depois em tecido humano e daí sim, em seres humanos. Empresas farmacêuticas já admitiram que essa será a forma de testar remédios no futuro. Algumas empresas já admitiram inúmeras vezes em literatura científica que os animais não são preditivos para humanos. E essas empresas já perderam muito dinheiro porque cancelaram o desenvolvimento de remédios por causa de efeitos adversos em animais e que não necessariamente ocorreriam em seres humanos. Foram bilhões de dólares perdidos ao não desenvolver drogas que poderiam ter dado certo.

Como as pesquisas deveriam ser conduzidas?
Deveríamos estar fazendo pesquisa baseada em humanos. E com isso eu quero dizer pesquisas baseadas em tecidos e genes humanos. É daí que os grandes avanços da medicina estão vindo. Por exemplo, o Projeto Genoma, que foi concluído há 10 anos, possibilitou que muitos pesquisadores descobrissem o que genes específicos no corpo humano fazem. E agora, existem cerca de 10 drogas que não são receitadas antes que se saiba o perfil genético do paciente. É assim que a medicina deveria ser praticada. Nesse momento, tratamos todos os seres humanos como se fossem idênticos, mas eles não são. Uma droga que poderia me matar pode te ajudar. Desse modo, as diferenças não são grandes apenas entre espécies, mas também entre os humanos. Então, a única maneira de termos um suprimento seguro e eficiente de remédios é testar as drogas e desenvolvê-las baseados na composição genética de indivíduos humanos. Para se ter uma ideia, a modelagem animal corresponde a apenas 1% de todos os testes e métodos que existem. Ou seja, ela é um pedaço insignificante do todo. O estudo dos genes humanos é uma alternativa. Quando fazemos isso, estamos olhando para grandes populações de pessoas. Por exemplo, você analisa 10.000 pessoas e 100 delas sofreram de ataque cardíaco. A partir daí analisamos as diferenças entre os genes dos dois grupos e é assim que você descobre quais genes estão ligados às doenças do coração. E isso está sendo feito, porém, não o bastante. Há também a pesquisa in vitro com tecido humano. Virtualmente tudo que sabemos sobre HIV aprendemos estudando tecido de pessoas que tiveram a doença e por meio de autópsias de pacientes. A modelagem computacional de doenças e drogas é outra saída. Se quisermos saber quais efeitos uma droga terá, podemos desenvolvê-la no computador e simular a interação com a célula.

Mas ainda não temos informações suficientes para simular o corpo humano no computador...
Temos sim. Não temos informações suficientes para criar 100% do corpo humano e isso não vai acontecer nos próximos 100 anos. Mas não precisamos de toda essa informação. O que precisamos é saber como e do que um receptor celular é constituído — isso já sabemos — e a partir daí podemos desenvolver, no computador, remédios baseados nas leis da química que se encaixem nesses receptores. Depois disso, a droga é testada em tecido humano e depois em seres humanos. Antes disso acontecer, contudo, muitos testes são feitos in vitro e em tecidos humanos até chegar em um voluntário humano.

Um computador não é um sistema vivo completo. Como é possível garantir que essa droga, que nunca foi testada em animais, não será nociva aos seres humanos?
A falácia nesse argumento é que os macacos e camundongos, por exemplo, são seres vivos, mas não são seres humanos intactos. E esse argumento seria muito bom, se ele não fosse tão ruim. Drogas são testadas em macacos e camundongos intactos por quase 100 anos e não há valor preditivo no sentido de dizer quais serão os efeitos da droga no ser humano. O que essas pesquisas têm feito, na verdade, é verificar o que essas drogas causam em macacos e em seres humanos separadamente e não há relação. Por isso, o que dizem é meramente retórico, não há nenhuma base científica.

O senhor já fez experimentos com animais. O que o fez mudar de ideia?
Meu posicionamento mudou apenas uma década depois que terminei a faculdade de medicina. Minha esposa é veterinária e comecei a notar como tratávamos nossos pacientes de maneira muito diferente. Comecei a notar também que alguns remédios funcionam muito bem em animais, mas não funcionam em humanos e algumas drogas funcionam em humanos, mas não podem ser usadas em cães, mas podem ser usadas em gatos e assim por diante. Não estou dizendo que os animais e os humanos são exatamente opostos, não é isso. Eles têm muito em comum.

A semelhança genética de 90% entre humanos e camundongos não é suficiente? 
Aparentemente não. Porque os dados científicos dizem que não. Não me interessa se somos suficientemente semelhantes aos animais para fazer testes neles ou não. A minha interpretação é científica. E a ciência diz que não somos. Na minha experiência clínica isso é verdade porque não conseguimos prever nem quais serão os efeitos de um remédio no seu irmão, realizando testes em você. Algumas drogas que você pode tomar, seu irmão não pode, por exemplo. Contudo, eu não sou contra todo tipo de experimento com animais. É possível recorrer aos animais para utilização de algumas partes. Por exemplo, podemos utilizar a válvula cardíaca de um porco para substituir a de seres humanos. Além disso, é possível cultivar vírus, insulina, mas isso não é pesquisa. O fracasso está em utilizar modelos animais para prever o que irá acontecer com um ser humano. Um ótimo exemplo disso é a Aids. Os animais não desenvolvem essa doença, de jeito nenhum. Eles sofrem de doenças parecidas com a Aids, mas por causa de vírus completamente diferentes. E os sintomas são muito diferentes dos manifestados em pacientes aidéticos. Por isso, não há correlação.

O senhor é contra o eventual sacrifício de animais em pesquisas científicas com o objetivo de salvar milhões de vidas humanas? 
Eu não tenho nenhum problema com isso. Meu problema com pesquisa animal não é de cunho ético e sim, científico. É como dizer que estamos em um cruzeiro atravessando o oceano Atlântico e um indivíduo cai na água e está se afogando. Ele precisa é de um salva-vidas mas não temos nenhum, então vamos arremessar 1.000 cães na água. Por que arremessar os cães na água já que eles não vão salvar a vida da pessoa? Você pode construir um argumento ético dizendo que é aceitável afogar esses cães mas o que eu quero dizer é que a pessoa precisa de um salva-vidas e não 1.000 cães afogados. E é exatamente isso que estamos fazendo com a pesquisa animal. Estamos matando cães pelo bem de matar cães. Não porque matá-los irá trazer a cura para doenças como a Aids ou o Alzheimer.


Fonte: Veja,16/10/2010;

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Desfazendo um mito: Ayn Rand não era conservadora

Ayn Rand não era conservadora
A tradução abaixo foi baseada no original Myth: Ayn Rand was a conservative do site The Atlas Society e adaptada para o português tendo em conta nossa realidade. Atentar para o fato, ao ler o texto Conservadorismo: Um Obituário, ou ouvir o vídeo abaixo, de que os americanos chamam de liberais (liberals)  os que de fato são de centro-esquerda, social-democratas, e "progressistas" em termos de moral e costumes (Vide o atual presidente americano Barack Obama). No sentido que empregamos, liberal para eles é libertário.

Atentar também para o fato de que Rand se refere ao comunismo real, dos regimes comunistas vigentes no leste europeu e outros países à época da palestra Conservadorismo: Um Obituário. Apesar da distância temporal, contudo, e guardadas as devidas proporções, suas palavras são bem atuais e servem como luva no conservadorismo brasileiro com seus Pondé e Olavos Carvalho da vida.

Desfazendo um mito: Ayn Rand não era conservadora

por Míriam Martinho (com base no original de William R Thomas)

Ayn Rand pode parecer conservadora, por ter em comum com conservadores a defesa da economia de livre mercado, mas de fato não o era em termos morais e intelectuais.

Sua filosofia, o Objetivismo, advoga a razão, o individualismo e a felicidade pessoal. Conservadores têm como valores fundamentais a fé, a tradição e o dever. Politicamente, o Objetivismo pode ser classificado como uma vertente liberal clássica ou libertária, expressando uma visão de mundo associada ao Iluminismo. Ayn Rand rejeitava enfaticamente a distinção progressista-conservador na no âmbito da cultura.

Em termos de bandeiras políticas, Rand defendeu o direito da mulher ao aborto e apoiou a liberdade de expressão. Também atacou o racismo, por sua discriminação coletivista, embora igualmente rejeitasse as políticas afirmativas pela mesma razão.

O Conservadorismo é uma tendência política e cultural que vê o passado como superior ao presente, que respeita a tradição e se mostra cauteloso sobre mudanças culturais. No mundo anglofônico atual, conservadores defendem a moralidade tradicional (valores familiares), a tradição religiosa (principalmente a cristã) e a prevalência da iniciativa privada sobre a burocracia governamental. Como citado, exatamente por este último aspecto, já que o movimento conservador tem lutado, desde os anos 60, por reformas visando o livre mercado, é que liberais clássicos, como os Objetivistas, têm feito coalizões políticas com eles.

Intelectualmente, contudo, os conservadores têm sido inimigos de Rand desde antes dos anos 50. Devastadoras resenhas de seus livros foram feitas por conservadores que interpretaram incorretamente seu individualismo, chegando a chamá-la de alguém apenas um pouco melhor do que um nazista. Por sua vez, Ayn Rand retribuiu as gentilezas dando palestras com temas como Conservadorismo: Um Obituário, na Universidade de Princeton, nos anos sessenta. (Ver abaixo trecho da palestra em vídeo e link para o texto da mesma)

E a hostilidade mútua tem fundamento. O Objetivismo deriva seu nome do compromisso que tem com a  objetividade. Os fatos e o que funciona são a base dessa visão de mundo e não a tradição. O Objetivismo rejeita “Deus” como um conceito incoerente e qualquer ideia de sobrenatural, pondo-se em conflito com as religiões tradicionais sobre essa questão. Rand ofereceu uma moralidade mundana e auto-centrada como base para uma vida calcada na razão e no comércio, com o orgulho como virtude principal. Desse modo, sua ética se contrapõe as ideias de dever e auto-sacrifício religiosos que muitos conservadores tanto prezam.

Em Conservadorismo: Um Obituário Rand acusa os valores filosóficos subjacentes ao conservadorismo de viciar suas tentativas de promover o capitalismo de mercado. Para ela, os conservadores não defendiam o capitalismo adequadamente porque "paralizados pelo profundo conflito entre o próprio capitalismo e o código moral que domina(va) a cultura americana: a moralidade do altruísmo." 

"Há muita coisa correta na tradição americana. Por exemplo, a defesa da liberdade e da liberdade individual entre suas ideias básicas. A America é o país do self-made man (do empreendedor). Também há muita coisa certa no conservadorismo: sua ética da responsabilidade individual, por exemplo, ou seu respeito pela Constituição. Mas estes valores só podem ser defendidos com base na razão e nos fatos. Não podemos aceitar substitutos para esses instrumentos".

Ayn Rand estava certa em não aceitar substitutos para a razão e os fatos. Eis porque não pode realmente ser considerada conservadora.

Fonte: The Atlas Society. Myth: Ayn Rand was a conservative, William R Thomas. Texto de Conservadorismo: Um Obituário (em inglês)
 

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