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terça-feira, 11 de maio de 2021

Doutora mais jovem do Brasil, a química Daphne Cukierman busca tratamentos para Parkinson e Alzheimer

A doutora em Química Daphne Cukierman
Com apenas 26 anos, Daphne Cukierman já participou da síntese de 54 compostos candidatos ao combate do distúrbio degenerativo.

Em 2021, a química Daphne Cukierman se tornou a doutora mais jovem do Brasil. Ela defendeu sua tese aos 26 anos, seis meses e 10 dias de idade, o que a coloca como a mulher mais nova do país com o título, segundo o site Rank Brasil. A pesquisadora procura novos compostos para o tratamento de doenças neurodegenerativas, como o Parkinson e o Alzheimer.

Daphne fez três anos de Engenharia Química na PUC-Rio antes de mudar para o curso de Química pura. Trocar uma graduação que oferece boas oportunidades de trabalho pela carreira na pesquisa científica nunca é uma decisão fácil no Brasil, onde as bolsas de pesquisa estão completamente defasadas em relação à inflação, e os laboratórios sofrem com corte atrás de corte no orçamento.

Na época em que Daphne se mudou para a Química, muitos pesquisadores estavam testando moléculas que contêm o grupo funcional 8-hidroxiquinolina para o tratamento de doenças neurodegenerativas. No jargão dos químicos, um grupo funcional é um pedacinho que aparece igual em muitas moléculas diferentes – e acaba dando a eles características em comum.

Um exemplo típico do ensino médio é a hidroxila, que é um átomo de oxigênio juntinho de um hidrogênio. Toda molécula classificada como um álcool – como o bom e velho etanol da cachaça e do posto de combustível –, contém hidroxila. Assim, ela acaba servindo como uma etiqueta para identificar esse grupo de compostos.

O professor que orientava Daphne na iniciação científica (nome que se dá a pesquisa realizada por um aluno de graduação) uniu o grupo funcional 8-hidroxiquinolina a uma outra classe química, as hidrazonas, criando um composto híbrido. E foi sobre essa molécula frankenstein que a pesquisadora se debruçou ao longo dos últimos anos, com o enfoque em suas potenciais aplicações para o tratamento de Parkinson.

Antes de explicar o que a molécula faz, vale entender o básico do que acontece no cérebro de quem tem Parkinson. A doença é caracterizada pelo acúmulo, no cérebro, de uma proteína chamada alfa-sinucleína. Essa proteína é importante para o funcionamento adequado do órgão – mas só quando está sozinha. O problema começa quando as moléculas de alfa-sinucleína passam a se ligar entre si, formando grandes cadeias chamadas oligômeros. Esses agrupamentos de proteína são tóxicos e levam à morte das células do sistema nervoso, causando os sintomas da doença de Parkinson.

Um dos fatores que contribui para a formação dos oligômeros é um desequilíbrio na quantidade de íons de cobre no cérebro. Íons são moléculas ou átomos que ficam com uma pequena carga elétrica porque estão com alguns elétrons a menos ou a mais. Assim como a alfa-sinucleína, íons de cobre são importantes para o bom funcionamento neurológico, mas o excesso deles em algumas regiões acaba “colando” as proteínas, levando à formação de oligômeros.

O que o composto híbrido faz é competir com a proteína pela ligação aos íons de cobre. Ele chega às células do cérebro e “rouba” o excesso de íons. Sem ter com quem se ligar, a alfa-sinucleína não vira oligômero, não mata os neurônios e não desencadeia a doença de Parkinson.

Tudo isso em teoria, claro. As propriedades benéficas do composto já foram observadas in vitro e em camundongos, mas ainda não em humanos. O trabalho de conclusão de curso (TCC) de Daphne, derivado de sua iniciação científica, avaliou qual das partes da molécula frankenstein eram mais importantes para o efeito benéfico do composto.
“Quando defendi meu trabalho de conclusão de curso, a professora da banca falou ‘isso não é um TCC, isso é um bom mestrado’. Aí eu vi que estava pronta para partir direto para o doutorado”, diz a pesquisadora. Ela já tinha diversos artigos publicados, além de prêmios pelos trabalhos de iniciação científica e TCC. Assim que terminou a graduação, ela fez o processo seletivo para o doutorado e passou em primeiro lugar.
Nos anos que se seguiram, Daphne criou variações daquele mesmo composto. Criar novas moléculas é como montar Lego: nem sempre o composto original tem todas as peças necessárias para virar o que você quer – no caso, um bom medicamento. Encaixar alguma peça extra pode aumentar a estabilidade da molécula ou deixá-la mais solúvel.

Daphne considerou 54 moléculas análogas ao composto original e avaliou quais seriam as combinações com as melhores características. A solubilidade da molécula, por exemplo, é essencial (já que somos 70% água), assim como sua estabilidade – para que ela consiga chegar intacta ao cérebro, sem sofrer nenhuma reação relevante no caminho. Além de tudo, ela não pode ser tóxica, é claro.

Ao final da pesquisa, a cientista chegou em quatro moléculas que atendiam a todos os requisitos, incluindo uma especialmente promissora. Nos próximos anos, ela pretende testar esses compostos em animais, para que, um dia, eles possam estar à disposição dos pacientes com Parkinson.

Clipping Doutora mais jovem do Brasil desenvolve tratamentos contra a doença de Parkinson, por Maria Clara Rossini, Superinteressante,18/ 04/2021

terça-feira, 4 de maio de 2021

Maria Goeppert Mayer foi a segunda mulher a receber um Nobel de Física por definir a estrutura do núcleo atômico

Maria Goeppert Mayer só se tornou professora titular aos 54 anos Getty Images
"Voluntária", "bolsista", "pesquisadora associada": estes foram alguns dos títulos que Maria Goeppert Mayer acumulou ao longo de 30 anos liderando pesquisas científicas que a levaram a ganhar o Prêmio Nobel de Física em 1963.

Em outras palavras, a física alemã trabalhou a maior parte de sua carreira em diferentes universidades americanas sem receber salário. Ela pesquisava "apenas pelo prazer de fazer física", diz sua biografia publicada pelo Prêmio Nobel.

Embora houvesse regras antinepotismo nos Estados Unidos naquela época, a verdade é que "nenhuma universidade teria pensado em contratar a esposa de um professor", explica a academia sueca. Era o marido dela, o químico americano Joseph Mayer, que conseguia os cargos de professor e pesquisador em tempo integral, enquanto ela recebia as sobras. Literalmente.
"Ela viu um escritório vazio e perguntou se poderia usá-lo; negaram e, em vez disso, deram a ela uma sala no sótão", diz a renomada Universidade Johns Hopkins, nos EUA, uma das instituições de ensino onde o casal trabalhou.
A história dela, contada no âmbito do projeto The Women of Hopkins, "é um exemplo de determinação perante os obstáculos", reconhece a universidade.

Quando Goeppert Mayer finalmente se tornou professora titular, ela estava com 54 anos.

Sétima geração

Goeppert Mayer nasceu em 28 de junho de 1906 em Katowice, cidade que fazia parte da Alemanha na época, mas hoje pertence à Polônia.

O pai dela era a sexta geração de uma família de acadêmicos, e sempre presumiu que a única filha iria para a faculdade e seguiria o legado familiar.
Meu pai costumava me dizer: 'Quando você crescer, não se torne uma mulher', no sentido de uma dona de casa", disse Goeppert Mayer, citada pelo Nobel.
Embora inicialmente sua intenção fosse se formar em matemática, ela decidiu estudar física após participar de um seminário de mecânica quântica ministrado por Max Born, um dos pais do então incipiente ramo da ciência.

Born acabaria se tornando o mentor de Goeppert Mayer ao longo de seus anos de estudo na Universidade de Göttingen, na Alemanha.

Mas depois de completar o doutorado, a jovem se casou e mudou para os Estados Unidos, em parte em busca de melhores oportunidades acadêmicas e também para ficar longe do movimento político que culminaria na ascensão de Adolf Hitler ao poder.

Na verdade, durante a Segunda Guerra Mundial, Goeppert Mayer trabalhou no Projeto Manhattan, o programa secreto do governo americano que desenvolveu a bomba atômica.

Projeto Manhattan
A urgência da Segunda Guerra Mundial levou o governo dos Estados Unidos a tratar a capacidade de Goeppert Mayer com mais respeito do que o demonstrado por suas universidades mais importantes", afirma o Nobel.
Em 6 e 9 de agosto de 1945, os Estados Unidos lançaram duas bombas atômicas sobre Hiroshima e Nagasaki, no Japão
Ela chegou inclusive a dizer que, graças ao Projeto Manhattan, ela conseguiu pela primeira vez na carreira "se firmar" por conta própria como cientista, sem "se sustentar" no marido.

Seus biógrafos concordam que, embora ela apreciasse o respeito que recebeu dos colegas e as responsabilidades adquiridas durante aqueles três anos de trabalho, ela tinha esperança de que o projeto fracassasse.

De acordo com o Nobel, Goeppert Mayer era "veementemente anti-Hitler, mas ciente de que a arma que estava ajudando a criar poderia ser usada contra amigos e familiares que viviam na Alemanha".

E embora a bomba tenha sido desenvolvida e usada nas cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki, matando dezenas de milhares de pessoas, as pesquisas lideradas por ela não foram efetivamente bem-sucedidas.
Não encontramos nada e tivemos sorte... escapamos da culpa pungente que os responsáveis ​​pela bomba sentem até hoje", admitiria mais tarde, segundo o Nobel.
Os 'números mágicos'

Foi depois da guerra que Goeppert Mayer começou a trabalhar com física nuclear, linha de pesquisa que a levaria a definir a estrutura do núcleo atômico e ganhar o Prêmio Nobel.
Getty Images Quando Goeppert Mayer ganhou o Nobel de Física em 1963, ela se tornou a segunda mulher na história a receber o prêmio.
Sem entrar em muitos detalhes técnicos, o que a cientista conseguiu demonstrar repetidamente é que os núcleos mais estáveis ​​sempre tinham uma certa quantidade de nêutrons ou prótons. Os "números mágicos" eram 2, 8, 20, 28, 50, 82 e 126.

Mas ela não se deu por satisfeita: agora que sabia que eram números especiais, queria saber por quê.

Foi assim que ela começou a desenvolver o que é hoje o famoso modelo nuclear de camadas.

De acordo com um artigo de 2008 da American Physical Society (APS), "o fato de que os núcleos com um certo número de núcleons (nêutrons e prótons) eram especialmente estáveis ​​já havia sido notado antes, mas os físicos tinham certeza de que um modelo de camadas não poderia estar correto."

É que nessa época prevalecia outro modelo criado por ninguém menos que Niels Bohr, que havia ganhado o Prêmio Nobel por suas pesquisas sobre a estrutura dos átomos.

De acordo com a APS, Goeppert Mayer "tinha uma formação menos formal em física nuclear, (então) estava menos enviesada".

Seu colega e amigo Edward Teller resumiu de forma mais eloquente:
Ela teve a ideia absurda de se opor ao modelo de núcleo atômico de Bohr. Fui enfático em minhas críticas. Mas acabou que Maria estava certa e, merecidamente, recebeu o Prêmio Nobel."
Uma de quatro

Goeppert Mayer não era a única capaz de pensar de forma inovadora sobre a estrutura do núcleo atômico.

Quando estava prestes a enviar sua pesquisa para a Physical Review, soube que outra equipe liderada por Hans Jensen havia chegado à mesma conclusão na Alemanha.
Ela pediu que adiassem seu artigo para ser publicado no mesmo número que o deles, mas o dela acabou sendo publicado em número depois do deles, em junho de 1949", diz o artigo da APS.
Mais tarde, Goeppert Mayer e Jensen se conheceram, se tornaram amigos e colaboradores. Juntos, publicaram um livro sobre o modelo nuclear de camadas e, em 1963, compartilharam o Prêmio Nobel.

Naquela época, apenas uma mulher na história havia recebido o Nobel de Física: Marie Curie, 60 anos antes.

Marie Curie foi a primeira pessoa a receber dois prêmios Nobel em áreas distintas, física e química, em 1903 e 1911, respectivamente.

Levaria mais 55 anos para outra mulher, Donna Strickland, ganhar o prêmio novamente em 2018. A quarta e última física a conquistá-lo foi Andrea Ghez no ano passado.

O legado

Em 1960, pouco depois de chegar a San Diego para começar seu primeiro trabalho como professora titular na Universidade da Califórnia, Goeppert Mayer sofreu um ataque cardíaco.

Daí em diante, teria uma saúde frágil até sua morte em 1972, mas ainda assim não parou de pesquisar e dar aulas.
É uma daquelas mulheres que lutaram por seus objetivos quando a sociedade exigia que ficassem em casa", diz à BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC, a física Louise Giansante, autora principal do artigo "Mulheres na física: pioneiras que nos inspiram", publicado em 2018 na revista da Organização Internacional de Física Médica.
Ela enfrentou uma série de desafios em sua vida profissional e pessoal", acrescenta, "o que incluiu guerras e mortes, mas também simplesmente criar seus filhos e ser esposa enquanto tentava continuar sua pesquisa".

Suas descobertas e contribuições marcantes são amplamente utilizadas até hoje. Acho que sua história precisa ser contada e pode servir de inspiração sobretudo para mulheres jovens, que ainda têm que enfrentar muitos desafios", conclui Giansante sobre o legado da física alemã.

Clipping Maria Goeppert Mayer, a Nobel de Física que explicou números mágicos trabalhando sem remuneração, por Ana Pais (@_anapais), BBC News Mundo, 2 maio 2021

quinta-feira, 22 de abril de 2021

Marie Curie: o que o filme da Netflix deixou de contar sobre a cientista

Foto de divulgação do filme Radioactive, protagonizado por Rosamund Pike; a atriz está caracterizada em frente a uma lousa preenchida com elementos químicos
Marie Curie (Rosamund Pike) ensinando na Sorbonne em cena do filme Radioactive Radioactive/Netflix/Divulgação

Ela visitou o Brasil em 1926, foi a primeira mulher a fazer doutorado na França e a única a ganhar dois prêmios Nobel em campos científicos diferentes.

Protagonizado pela brilhante Rosamund Pike e com a participação especial de Anya Taylor-Joy, Radiactive (2019) foi lançado recentemente na Netflix. Dirigida por Marjane Satrapi, a biografia narra alguns dos principais feitos de Maria Salomea Skłodowska, a Marie Currie, que nasceu em Varsóvia, na Polônia, em 7 de novembro de 1867, e mais tarde se mudou para Paris, na França, para realizar seu doutorado. Um dos principais nomes da ciência mundial, a polonesa descobriu, em parceria com seu marido, Pierre Curie, dois novos elementos, o Rádio e o Polônio, e possibilitou um dos mais eficazes tratamentos contra o câncer, a radioterapia.

O filme entrega, mas deixa alguns fatos importantes de fora ou até subentendidos, o que é compreensível, levando em conta a escolha de roteiro do diretor. Para você conhecer ainda mais essa cientista e mulher fenomenal, separamos dez coisas sobre a icônica Marie Currie que o longa não te conta (ou te conta muito por cima):

1. Marie Curie é até hoje a única mulher na história a ganhar dois prêmios Nobel

Radiactive (2019) mostra que a cientista foi duas vezes vencedora do Nobel, uma vez de Física e outra de Química, e que em ambos os episódios precisou lutar contra adversidades instauradas pela sociedade patriarcal e sexista. O que o filme não deixa tão explícito é que ela é a única mulher na história da Ciência a realizar tais feitos!

2. Ela é também a única pessoa a ser premiada pelo Nobel em dois campos científicos diferentes

O químico Linus Pauling ganhou dois prêmios Nobel: um em 1954, de Química, por sua obra científica, e outro em 1962, pelo seu ativismo contra testes nucleares. Só que este segunda foi o Nobel da Paz. Não tira o método do norte-americano, considerado um dos cientistas mais importantes de todos os tempos, mas Marie Curie foi indicada e ganhou dois prêmios Nobel no campo da Ciência, tornando pioneira e única na história, entre homens e mulheres, a conquistar tamanha honraria.

3. A polonesa foi a primeira mulher a fazer doutorado na França

Em uma época em que estudar era algo raríssimo para as pessoas do sexo feminino, que eram forçadas a seguir as imposições sociais machistas caso não quisessem ficar mal faladas (como serem boa esposas, mães e donas de casa), Curie não só fez doutorado como foi durante ele que encontrou na radiação, baseada em estudos iniciais realizados por Henri Becquerel, sua tese de conclusão de curso. É importante lembrar que, como o filme mostra, Curie foi a primeira mulher a lecionar na Universidade de Sorbonne.

Foto em preto e branco da cientista Marie Curie andando de bicicleta com seu marido, Pierre, em Paris; eles posam para a foto em uma vilinha florida
Pierre e Marie Currie durante passeio de bicicleta em Paris, em 1895, fotografados por Albert Harlingue em um jardim no bairro de Sceaux Musée Curie ; coll. ACJC / Albert Harlingue, Cote MCP69/Divulgação

4. O pai de Marie também era da área de Exatas

Władysław Skłodowski era professor de física e matemática no ginásio em uma escola de Varsóvia, cidade em que moravam, mas foi demitido por defender a independência da Polônia e a falar abertamente sobre isso. Como da época parte do país pertencia à Rússia czarista, um regime que flertava bastante com o absolutismo, não era permitido ter certas opiniões, ainda mais quando ela eram contrárias ao imperador e a seu governo. Mais tarde, o pai de Marie chegou a abrir um escola, mas esta funcionava muito precariamente.

5. Marie Curie lutou contra a depressão

Radiactive (2019) dá indícios para o espectador de que a cientista tinha algum transtorno mental, cujo estopim foi a morte da mãe, a pianista Bronisława Skłodowska, que faleceu de tuberculose em 1878, quando Marie tinha apenas 11 anos. Desde então, a polonesa tinha aversão a hospitais, que foi onde teve que se despedir de sua mãe. Entretanto, o longa não deixa explícito que Curie lutou contra a depressão, principalmente durante o começo da adolescência, e que o estopim não foi apenas a morte da mãe, mas também a da irmã mais velha, que morreu de tifo quando Curie tinha 7 anos de idade.

6. A cientista não era ateia

Em uma das partes do filme disponível no catálogo da Netflix, Rosamund Pike, que interpreta a cientista polonesa, retruca a irmã, quando questionada sobre acreditar em vida após a morte, e diz que crê, sim, que a mãe esteja em um lugar melhor: em um buraco na Polônia, que é bem melhor que a França. Para muitos, essa fala dá a entender que a cientista era ateia, ou seja, não acreditava na existência de divindades. Contudo, Curie se considerava agnóstica, acreditando apenas naquilo que pode se provar, mas concordando ser impossível afirmar com certeza se Deus existe ou não.

7. Ela bem que tentou voltar para a Polônia

O filme dirigido por Marjane Satrapi falhou nessa questão. Parece que Curie nunca quis voltar para a Polônia, tendo encontrado na França, mais precisamente em Paris, sua casa. Em determinada cena, a irmã da cientista até sugere que ela retorne para Varsóvia, argumentando que lá todo mundo a amava, o que não era bem verdade. Marie cogitou voltar para seu país de origem, sendo que Pierre Curie, seu marido, estava até disposto a ir com ela e se tornar professor, só que a Universidade da Cracóvia se recusou a aceitá-la no papel de cientista, simplesmente porque ela era mulher. Então, no fim, apesar de tudo, a França ainda era um país, entre muitas aspas, mais “promissor”.

8. A polonesa não usou seu dinheiro apenas para ajudar os soldados de guerra

Uma cena de Radiactive (2019) mostra Curie oferecendo suas honrarias de ouro dos prêmios Nobel que recebeu em troca de ambulâncias e equipamentos para ajudar os soldados de guerra, que estavam tendo partes do corpo amputadas sem necessidade, por pura falta de recursos médicos. Nas duas vezes em que ganhou o Nobel, porém, ela distribuiu dinheiro para pessoas próximas que ela sabia que estavam precisando, inclusive muitos estudantes foram ajudados financeiramente pela Madame Marie, como era carinhosamente conhecida.

Foto em preto e branco da cientista Marie Curie durante visita ao Brasil; ela está rodeada de pessoas e o Pão de Açúcar aparece ao fundo
Marie e Irène Curie (de roupas totalmente pretas ao centro) no Rio de Janeiro, em 1926, posando com outros estudiosos em frente ao Pão de Açúcar Musée Curie ; coll. ACJC / Cote MCP1266/Divulgação

9. Marie Curie já esteve o Brasil

Em agosto de 1926, a cientista desembarcou em Belo Horizonte para participar de uma conferência sobre radiatividade na Faculdade de Medicina da Universidade de Minas Gerais. Naquela época, os primeiros paciente com câncer estavam sendo tratados com a “Curieterapia”, hoje conhecida como radioterapia, no Instituto de Radium de Belo Horizonte, primeiro hospital especializado no uso da radioterapia contra o câncer no Brasil. Ele atraiu a atenção da cientista, que durante sua passagem pelo Brasil visitou o local e doou duas agulhas de rádio, usadas no processo de irradiação dos tumores, para a instituição criada pelo médico Borges da Costa. Curie veio acompanhada de sua filha mais velha, Irène Joliot-Curie, que também fazia pesquisas sobre a radiação aplicada na medicina.

10. Ela morreu aos 66 anos, vítima da sua própria genialidade

O longa não mede esforços para mostrar o quanto a sociedade é oportunista e pensa apenas em lucro, com empresas lançando produtos “radiativos” apenas pelo hype, sem antes fazer questão de saber se era seguro ou não. Sem contar o fato de o ser humano usar as descobertas de Marie e Pierre para o mal, criando as horrorosas bombas atômicas. Mas o filme não conta como a cientista morreu – só que, provavelmente, foi por causa da radiação, já que Curie e mais um monte de gente que havia sido exposta a ela estavam sendo diagnosticadas com anemia e câncer. Marie Curie faleceu em 1934, aos 66 anos, vítima de uma leucemia gravíssima. Até hoje, as anotações e as coisas deixadas pela polonesa só podem ser manuseadas com proteção, por causa da radiação que continuam emanando. 

Clipping Radioactive: 10 coisas sobre Marie Curie que o filme da Netflix não conta, por Isabella Otto, 20/04/2021, Capricho

terça-feira, 6 de abril de 2021

Neurocientista Gina Rippon lança livro que desbanca suposta inferioridade do cérebro feminino

Neurocientista Gina Rippon

 Por muitos séculos, a ciência tem sido utilizada para sustentar que as mulheres são inferiores aos homens. Teorias nesse sentido foram criadas e propagadas por figuras como Aristóteles, Charles Darwin, Arthur Schopenhauer e Friedrich Nietzsche. Alimentada desde a Idade Antiga, essa visão persistiu mesmo com o avanço científico. A partir do século 18, diversas técnicas e metodologias da medicina foram criadas a fim de estudar as diferenças (muitas vezes inexistentes) entre os sexos masculino e feminino — quase sempre para justificar a desigualdade sexual na sociedade da época, que marginalizava mulheres e outras minorias.

Trabalhos tidos como científicos mediam crânios de mulheres a fim de alegar sua incapacidade intelectual e argumentar por que elas seriam menos racionais e mais emocionais. Apesar de soarem absurdas atualmente, muitos pesquisadores ainda insistem em encontrar diferenças funcionais no cérebro de homens e mulheres. Hoje, isso é feito a partir de estudos com técnicas de neuroimagem.
Em geral, eles [os autores] não são especialistas na área, mas se propõem a explicar problemas comportamentais em relacionamentos ou no trabalho pautando-se pela diferença entre os sexos”, afirma a neurocientista britânica Gina Rippon.
Professora da Universidade Aston, no Reino Unido, Rippon é especialista em técnicas de imagem cerebral e pesquisa o uso de eletroencefalografia e magnetoencefalografia em estudos sobre processos cognitivos. Ao longo de sua carreira, ela se deparou com diversos artigos que utilizavam exames como esses para procurar diferenças entre o “cérebro masculino” e o “cérebro feminino”. Notando inconsistências nesses trabalhos, passou a questioná-los e a investigar o assunto.

Para mostrar que a desigualdade sexual não tem base biológica, a neurocientista escreveu seu primeiro livro não acadêmico, Gênero e os nossos cérebros: como a neurociência acabou com o mito de um cérebro feminino ou masculino (no original em inglês temos "nossos cérebros generificados", o que é bem mais preciso), lançado em janeiro no Brasil pela editora Rocco. Nele, ela discute a contribuição da ciência para a criação de preconceitos e reúne evidências de que comportamentos tido como masculinos ou femininos são socialmente construídos, e não ditados pelo cérebro. A seguir, Rippon reflete sobre a cultura sexista na neurociência, conta como começou a questionar pesquisas pautadas pela diferença entre os sexos e dá dicas de como identificar e desbancar estudos enviesados.

Com ao menos quatro décadas de expertise em técnicas de neuroimagem, você se dedicou a muitos estudos sobre condições como esquizofrenia, transtorno do espectro autista e dislexia. De que maneira a relação entre sexo e neurociência começou a chamar sua atenção também?

Durante a minha formação, convivi com uma visão inflexível da neurociência: a ciência da época acreditava firmemente em ligações fixas entre o cérebro e o comportamento. Isso incluía uma organização fixa desse órgão, com diferenças igualmente fixas entre os cérebros de homens e mulheres. Ao longo dos anos 1980 e 1990, houve uma revolta por parte de alguns pesquisadores, descontentes com as explicações dadas a certos comportamentos e baseadas apenas na biologia do cérebro. As principais críticas giravam em torno, principalmente, das desculpas dadas à desigualdade entre os sexos: muitos estudos sugeriam que, de alguma forma, as mulheres eram inferiores, que não tinham certas habilidades por conta de algumas características físicas cerebrais e, por isso, não seriam bem-sucedidas em negócios, política, ciência etc.

Esses pesquisadores começaram a questionar e sugerir que, por um momento, ignorássemos a biologia e focássemos na forma como a sociedade molda o comportamento das pessoas, principalmente como mulheres são colocadas e mantidas em posições inferiores.


O movimento feminista teve influência na sua carreira e nessa crítica que foi sendo alimentada dentro da comunidade científica?

Com certeza. Na verdade, eu sentia que havia uma desconexão entre o meu envolvimento pessoal com a segunda onda do feminismo e o tipo de pesquisa que eu estava fazendo. Eu comecei a perceber que os estudos não traziam provas conclusivas sobre a ligação entre cérebro, comportamento e diferenças sexuais. E isso remete a mais de um século de pesquisas pautadas por uma forte agenda das diferenças, que apoiava que mulheres deveriam ter uma posição inferior na sociedade.

Esse tipo de pensamento ganhou uma nova força com o desenvolvimento de técnicas de neuroimagem. Por meio delas, nós realmente pudemos ver o que esse órgão é capaz de fazer em seres humanos vivos. Muitos papers começaram a pipocar afirmando que haviam encontrado “A” diferença entre o cérebro de homens e mulheres — cada um apontando para uma resposta diferente. Mas nenhuma delas trazia provas realmente consistentes de que houvesse uma distinção relevante.

Então, podemos dizer que essa é a definição de “neurolixo” da qual você trata em seu lixo?

Eu chamo de neurolixo esse emprego incorreto da neurociência e de neuroimagens por autores de livros populares sobre ciência. Em geral, eles não são especialistas na área, mas se propõem a explicar problemas comportamentais em relacionamentos ou no trabalho pautando-se pela diferença entre os sexos. Muitos interpretam mal o resultado de estudos ou se baseiam em pesquisas de má qualidade para justificar comportamentos, ignorando completamente o fato de que temos mais provas de que o cérebro de homens e mulheres são mais similares do que diferentes. Aliás, muitos estudos que chegaram a essa conclusão não foram publicados. Afinal, não é tão interessante dizer que não há diferenças na capacidade cerebral de homens e mulheres, não é mesmo?

Pode nos contar sobre o que mais motivou você a escrever essa obra e desmascarar pesquisas desse tipo?

O livro surgiu para mostrar que há novas formas de estudar cérebro e sexo, sem se pautar em diferenças biológicas e levando em consideração como a sociedade molda nossos comportamentos, que não são inatos. Minha motivação é mostrar que não há base biológica em estereótipos como “mulheres são melhores para lidar com crianças’’, ou “meninos gostam mais de matemática do que meninas”. É ir contra o pensamento de que a igualdade entre mulheres e homens nunca será atingida porque há uma “diferença natural e biologicamente determinada” que deveria ser intocada e inquestionável. Eu não me tornei cientista porque tenho “o cérebro de um cientista”; foi por ver as consequências públicas dessa crença fixa de algo que não era verdade.

Na sua visão, quais são os principais equívocos cometidos por neurocientistas e autores leigos ao tratar sobre cérebro e comportamento?

Um dos maiores erros é não reconhecer o que sabemos hoje sobre a plasticidade cerebral. Antes, acreditava-se que apenas o cérebro de bebês e crianças fosse elástico, sendo modificado pelas novas experiências e habilidades. A partir de uma certa idade, pensava-se, o órgão se tornava mais fixo. Agora nós sabemos que, por exemplo, nosso cérebro ganha novos neurônios ao longo de toda a vida e sua estrutura e função mudam constantemente, seja ao aprender uma língua, tocar um instrumento ou jogar um esporte. O maior erro é assumir que qualquer diferença que você encontra surge de um fator biológico invariável, sem olhar para outros fatores.

Como podemos identificar quando um estudo é enviesado ou não foi feito de forma rigorosa?

Essa pergunta é muito importante. Junto com as psicólogas Cordelia Fine [da Universidade de Melbourne, na Austrália] e Daphna Joel [da Universidade de Tel-Aviv, em Israel], escrevi um artigo voltado para leigos explicando alguns pontos que precisam ser levados em consideração para saber se uma pesquisa é duvidosa ou não. Verifique se a descoberta foi replicada em outro lugar com uma amostra diferente; qual foi o tamanho da amostra do estudo e quantas comparações foram feitas também são pontos relevantes. Vale refletir: os pesquisadores discutem as semelhanças e as diferenças ou apenas enfatizam as diferenças? Comparando com outros estudos mais reconhecidos, o quão consistente essa pesquisa é?

O que deve ser feito para que os jovens cientistas não repitam os mesmos erros e estejam conscientes desse viés?

Estou no processo de escrever algo para periódicos científicos sobre como saber se você coletou dados e os analisou corretamente. A forma como você apresenta suas conclusões também é muito importante para que não sejam feitas más interpretações — há pessoas que não são especialistas e que irão ler o que você escreveu e serão impactadas pelos resultados que você traçou.

Pesquisas sobre o cérebro são de interesse geral, todos nós temos curiosidade para saber como ele funciona. Então, tanto os jornais científicos quanto os autores precisam ser muito cuidadosos. Ao relacioná-lo com questões de gênero, podemos estar influenciando a criação de crianças ou a elaboração de políticas públicas sobre diversidade e inclusão. Isso envolve muita responsabilidade na forma como você relata suas conclusões.

Quais são os prejuízos de estudos como esses, produzidos por mais de um século, para a nossa sociedade?

Eu me preocupo muito com a sub-representação das mulheres na ciência, um problema de longa data. Por muito tempo, assumiu-se que elas não poderiam ser cientistas porque não tinham o cérebro apto para isso. Conforme o tempo foi passando, ficou claro que as mulheres são tão capazes quanto os homens. Ainda assim, os discursos sexistas se adaptaram, e há quem acredite em razões biológicas de por que mulheres escolhem não fazer ciência, mesmo que elas possam.

A ciência, como uma organização, tem sua cultura — e ela pode ser bem hostil para mulheres. Há muito a ser feito até que as pessoas parem de olhar para o indivíduo e comecem a observar a cultura que uma determinada organização possui. Precisamos perceber que talvez não estejamos permitindo que as pessoas conquistem seu potencial por conta da forma como estruturamos a nossa cultura.

Clipping “Minha motivação é mostrar que não há base biológica em estereótipos”, Revista Galileu, 24/03/2021

Estudo descarta haver diferenças significativas entre os cérebros de mulheres e homens 
Como o "neurossexismo" está impedindo o progresso da igualdade de gênero - e da própria ciência 

quinta-feira, 25 de março de 2021

Metade dos caçadores de 9000 anos atrás era composta de mulheres


Descrição artística de uma mulher  caçadora de  9000 anos atrás nas montanhas andinas do Peru MATTHEW VERDOLIVO/UC DAVIS IET ACADEMIC TECHNOLOGY SERVICES

Os homens antigos são tradicionalmente retratados como caçadores, enquanto as mulheres são coletoras. Mas esse estereótipo pode não ser nada mais do que isso, de acordo com um novo estudo.

A ideia de que os ancestrais do sexo masculino vagavam pela terra com lanças nas mãos enquanto as mulheres ficavam em casa para cuidar dos filhos e preparar refeições parece, na verdade, infundada. Em vez disso os antigos caçadores que viveram há cerca de dez mil eram cerca de metade mulheres, sugere o estudo.

Esta descoberta abre novas possibilidades interessantes de como era realmente a vida dessas mulheres antigas.

Em um estudo publicado na quinta-feira na revista Science Advances, uma equipe de arqueólogos explica que ideias profundamente cimentadas sobre papéis sexuais nas sociedades antigas têm atrasado a ciência.
[Vários] estudiosos teorizaram que tal divisão de trabalho teria sido menos pronunciada, totalmente ausente ou estruturalmente diferente entre nossos primeiros ancestrais caçadores-coletores. [Mas] apesar de tais considerações teóricas, alguns estudiosos relutaram em atribuir a funcionalidade de caça para ferramentas associadas a enterros femininos.”
Essencialmente, o campo resistiu amplamente às teorias sobre antigas caçadoras em favor da narrativa existente de que as mulheres antigas ficavam em casa para ter ou cuidar dos filhos.

Os arqueólogos atribuem parcialmente esse descuido ao “preconceito sexual contemporâneo”. No entanto, os restos que eles descobriram no Peru em 2013 podem oferecer grandes evidências da ideia oposta para serem ignoradas.

Randall Haas, o primeiro autor do estudo e professor assistente de antropologia na UC Davis, disse em um comunicado que essas descobertas mudaram completamente a forma como ele imaginou essas sociedades antigas.
Nossas descobertas me fizeram repensar a estrutura organizacional mais básica dos antigos grupos de caçadores-coletores, e grupos humanos em geral”, disse Haas. “Possivelmente por causa de suposições [históricas] sexistas sobre a divisão de trabalho na sociedade ocidental, descobertas arqueológica de mulheres com ferramentas de caça simplesmente não se encaixavam nas visões predominantes do mundo. Foi preciso um caso forte para nos ajudar a reconhecer que o padrão arqueológico indicava o comportamento de caça real das mulheres.”
O início da caça de grandes animais era possivelmente feita por mulheres e homens

Ao contrário de nossos ancestrais mais modernos, que podem deixar para trás evidências escritas para nos ajudar a reimaginar suas vidas, os cientistas que estudam povos do Pleistoceno Superior e do Holoceno Inferior (cerca de nove mil a doze mil anos atrás) têm muito menos evidências.

Para descobrir como eram esses povos antigos, os acessórios com os quais viveram — e com os quais foram enterrados — podem ser a chave.
Os objetos que acompanham as pessoas na morte tendem a ser aqueles que as acompanharam em vida”, escrevem os autores do estudo.
Escavações dos cemitérios no Peru. Crédito: Randall Haas
No Peru, a equipe descobriu restos que as análises dentais, ósseas e proteicas sugerem ser um indivíduo do sexo feminino entre 17 a 19 anos. Enterrados ao lado desse indivíduo havia uma variedade de itens tradicionalmente encontrados no kit de ferramentas de um caçador de grandes animais, incluindo projéteis pontiagudos, ferramentas de corte e uma faca.

No total, eles encontraram 24 artefatos neste cemitério relacionados à caça e processamento de grandes animais.

Para ter certeza de que a descoberta não foi apenas um acaso, a equipe conduziu uma revisão de 107 sítios arqueológicos que datam da mesma época nas Américas, cerca de dez mil anos atrás.

Com base nas ferramentas encontradas nesses vários cemitérios, a equipe descobriu que eles continham os restos mortais de 16 homens e 11 mulheres caçadoras.
Modelos plausíveis ​​variam entre 30 e 50% da participação feminina, sugerindo que a caça inicial era provavelmente neutra em relação ao sexo ou quase neutra”, escrevem os autores.
Embora as descobertas apoiem ​​uma nova teoria da igualdade sexual entre caçadores e caçadores que vivem no Pleistoceno Superior e no Holesteno Inferior, os autores afirmam que mais trabalhos são necessários para reconciliar essas descobertas com evidências mais recentes sugerindo que esses papéis eram divididos pelos sexos. A caça já foi praticada por homens e mulheres antigas, antes que os homens assumissem um papel de liderança neste trabalho?

Os cientistas especulam que a tecnologia mais crua que os antigos caçadores usaram no Pleistoceno Superior e no Holesteno Inferior pode significar que todas as pessoas capazes (machos ou fêmeas) precisariam ser convocados para caçar em prol da eficiência. Sociedades pré-históricas mais avançadas podem ter precisado apenas dos homens para caçar.

Para responder a essas e outras perguntas, os cientistas esperam concluir análises mais comparativas para descobrir por que essas antigas caçadoras podem ser exceções ou se os arqueólogos estão deixando passar detalhe importantes como resultado do pensamento moderno.

Resumo: A divisão sexual do trabalho com mulheres como coletoras e homens como caçadores é uma grande regularidade empírica da etnografia de caçadores-coletores, sugerindo um padrão de comportamento ancestral. Apresentamos uma descoberta arqueológica e uma meta-análise que desafiam a hipótese do homem-o-caçador. Escavações no local montanhoso andino de Wilamaya Patjxa revelam um sepultamento humano de 9.000 anos (WMP6) associado a um kit de ferramentas de caça com pontas de projéteis de pedra e ferramentas de processamento de animais. Análises osteológicas, proteômicas e isotópicas indicam que este primeiro caçador era uma jovem fêmea adulta que subsistia de plantas e animais terrestres. A análise das práticas de sepultamento do Pleistoceno Superior e do Holoceno Inferior nas Américas situam o WMP6 como o primeiro e mais seguro sepultamento de caçadores em uma amostra que inclui dez outras mulheres em paridade estatística com os primeiros sepultamentos de caçadores machos. As descobertas são consistentes com práticas de trabalho não generalizadas nas quais as primeiras caçadoras-coletoras eram caçadoras de grandes animais. 

Clipping Estávamos todos errados: não eram os homens que caçavam na antiguidade, por Marcelo Ribeiro, 05/11/2020, Hyperscience. Img: Science Mag

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