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quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Sociólogo afirma que conservadores antidemocráticos crescem nas costas dos erros do PT

Marcio Sales Saraiva
Sociólogo ligado à Rede Sustentabilidade afirma que a esquerda brasileira está, hoje, esfacelada e desmoralizada e que o conservadorismo - como este blog sempre disse - cresce nas costas dos erros do PT. Então, seguindo a tradição autoritária brasileira, mal estamos saindo desse triste período autoritário da esquerda fóssil, jurássica, bolivariana bananeira e já nos vemos às voltas com o autoritarismo de direita, representado pelo crescimento de uma direita mais estúpida, carrancuda, linha-dura, com simpatias por regimes autoritários, antifeminista, contra os direitos das pessoas LGBT. Isso é de fato nefasto como disse o entrevistado. O Brasil precisa é de democracia, de gente capaz de conviver com as diferenças ideológicas e com a diversidade humana e não de trocar idiotas de esquerda por imbecis de direita. Não é possível que o país não consiga se livrar dessa sina autoritária.

Segue abaixo a entrevista do sociólogo, com destaque para o trecho abaixo. Adianto que não tenho simpatia pela Rede da Marina, apenas achei a crítica que ele faz à esquerda pertinente e importante, por isso a reproduzo. 

Eu acredito que, se essa esquerda não se renovar, não se conectar com o século 21, não desenvolver um projeto que possa ganhar os corações e mentes dos indivíduos e ganhar a confiança de vários setores da sociedade, com certeza, será varrida por um bom tempo do mapa político e eleitoral do País. O resultado disso já estamos vendo: o crescimento exponencial da direita, da extrema-direita e das forças mais reacionárias no Brasil. Esse crescimento é espontâneo? Não. Esse crescimento é um fruto da Era PT. A direita volta a crescer à medida que o PT vai cometendo erros sobre erros. A decepção e a desilusão são imensas diante do partido que prometeu ética na política com um discurso de esquerda que procurava ser "diferente de tudo que aí está". Esses conservadores crescem nas costas dos erros do PT, que arrastou o então imaginário social positivo a respeito da esquerda para a lama da corrupção e das alianças imorais. E agora nós temos uma direita muito maior, mais organizada e com uma voz ativa no cenário político. O pior disso tudo é que nem sempre é uma direita liberal e comprometida com a democracia. Esses liberais eu respeito, mas o que tenho visto é o crescimento de uma direita mais estúpida, carrancuda, linha-dura, com simpatias por regimes autoritários, antifeminista, contra os direitos das pessoas LGBT. Isso é nefasto.
Esquerda brasileira olha para trás, diz intelectual ligado à Rede

Sociólogo, cientista político, mestre em Políticas Públicas pelo Programa de Pós-Graduação em Serviço Social (PPGSS-UERJ) e um autodeclarado "democrata pós-moderno", Marcio Sales Saraiva é um intelectual defensor dos ideais de justiça, igualdade e direitos humanos.

É também filiado à Rede Sustentabilidade e amplamente conhecido dentro do novo partido de Marina Silva.

Em entrevista ao blog, ele refletiu conosco sobre a situação em que se encontra a esquerda brasileira, o avanço do conservadorismo, o debate ideológico nacional e o possível futuro do pensamento progressista no País.

O senhor escreveu recentemente sobre o "aniquilamento da esquerda brasileira". Nesse contexto, qual seria o diagnóstico para essa esquerda?

Marcio Sales Saraiva: Dentro do "critério Bobbio" do que é esquerda e direita, considero razoável dizer que hoje a esquerda brasileira está, num primeiro momento, esfacelada e desmoralizada. Mas poderá se recuperar na medida em que ela abrir mão de dogmas do passado e conseguir refletir de forma honesta sobre o presente. Fazer uma autocrítica profunda e apontar para uma agenda ética, política, socioeconômica e cultural antenada com o século 21. Trata-se de apresentar à sociedade um programa de esquerda que seja crível, razoável e possível. Não adianta falar, por exemplo, em dar um calote na dívida. Isso é loucura. Ninguém acreditaria nisso. Poderia levar o País a uma insolvência econômica. Hoje, com o mundo globalizado e as economias interconectadas, se você faz algo desse tipo, você dá uma pancada violenta no mercado com fuga imediata de capitais. São questões muito pragmáticas das quais a esquerda precisa se dar conta com mais realismo e menos devaneio.

Podemos considerar essa esquerda brasileira que temos hoje como uma esquerda elegível?

Eu acredito que, se essa esquerda não se renovar, não se conectar com o século 21, não desenvolver um projeto que possa ganhar os corações e mentes dos indivíduos e ganhar a confiança de vários setores da sociedade, com certeza, será varrida por um bom tempo do mapa político e eleitoral do País. O resultado disso já estamos vendo: o crescimento exponencial da direita, da extrema-direita e das forças mais reacionárias no Brasil. Esse crescimento é espontâneo? Não. Esse crescimento é um fruto da Era PT. A direita volta a crescer à medida que o PT vai cometendo erros sobre erros. A decepção e a desilusão são imensas diante do partido que prometeu ética na política com um discurso de esquerda que procurava ser "diferente de tudo que aí está". Esses conservadores crescem nas costas dos erros do PT, que arrastou o então imaginário social positivo a respeito da esquerda para a lama da corrupção e das alianças imorais. E agora nós temos uma direita muito maior, mais organizada e com uma voz ativa no cenário político. O pior disso tudo é que nem sempre é uma direita liberal e comprometida com a democracia. Esses liberais eu respeito, mas o que tenho visto é o crescimento de uma direita mais estúpida, carrancuda, linha-dura, com simpatias por regimes autoritários, antifeminista, contra os direitos das pessoas LGBT. Isso é nefasto.

E quais seriam as perspectivas de futuro para a esquerda brasileira?

Eu considero que essa é "a pergunta do milhão". Penso que o futuro da esquerda brasileira passa por uma releitura radical do seu passado à luz da contemporaneidade e pela necessidade de se refundar, ética e politicamente, sobre novos valores, novos paradigmas, como por exemplo, o da sustentabilidade planetária. Ou seja, eu penso que o que a história pede hoje é uma nova esquerda. Nova esquerda não só porque ela vai trocar de camisa, trocar de símbolo ou trocar de nome. Isso é algo muito superficial. Mas nova esquerda no sentido de concepção, de visão de mundo. Que a esquerda possa realmente aprender com os erros do passado: desde o culto ao Estado até o "vale-tudo" em nome da mudança social. A Rede Sustentabilidade, por exemplo, está tentando isso. Mas não é só a Rede. Tem gente espalhada por vários partidos e gente fora dos partidos políticos que vem meditando e refletindo sobre essas questões, criando novas formas de atuação com mais horizontalidade e democracia, sem uma metanarrativa arrogante que dê conta de todas as coisas, dialogando com as questões da pós-modernidade. Mas ainda assim, no geral, o que chamamos de "esquerda brasileira" tem enorme dificuldade de se repensar.

Qual é a tendência diante dessa dificuldade de se repensar enquanto movimento ideológico?

A tendência é fazer o que ocorreu na fundação do PSOL. Diante da fragmentação social e política, culpa-se a direita, as forças reacionárias, os "golpistas" ou o próprio PT de "desvio doutrinário/ideológico". Qual seria a solução "inovadora" pra essa esquerda tradicional? Voltar novamente ao passado. A esquerda permanece numa espécie de eterno retorno ao passado. Como se a solução para o mundo pós-moderno - com seus dilemas e potencialidades - estivesse, em síntese, no passado. No retorno literal a Marx, Gramsci ou Althusser, ao invés de olhar para frente e pensar: "Bem, dadas as novas condições socioeconômicas, culturais, ambientais e políticas, o que podemos pensar como progressista daqui pra frente? O que é ser progressista hoje?". Claro, isso não quer dizer que a esquerda deva negar sua trajetória, seu passado. De forma alguma. Já disse que o equilíbrio é necessário e há lições que ainda hoje são preciosas. Marx, Gramsci e Togliatti ainda nos dizem algo, mas não podemos encará-los como uma espécie de cânon sagrado, vozes inquestionáveis de uma "verdade divina do proletariado". Eles, os clássicos, nos apontam problemas que precisam ser repensados a partir do hoje.

Não ocorre, vamos colocar assim, um certo bullying ideológico quando alguém tenta fazer essas novas reflexões dentro da esquerda?

Sem dúvida. No Brasil, há intelectuais que têm na tradição de esquerda sua referência, mas que estão pensando no hoje com os olhos no futuro. Veja, por exemplo, Luiz Eduardo Soares, Marco Aurélio Nogueira, Boaventura Souza Santos ou Bruno Cava Rodrigues. Mas isso é algo que irrita profundamente a maioria da esquerda tradicional, agarrada aos velhos paradigmas. Nesse movimento de repensar, hoje, somos poucos. A maioria corre pro velho. Corre pro antigo. Até porque isso oferece uma solidez psicológica e emocional. É algo típico do fundamentalismo religioso. Eu diria que a esquerda brasileira tende a um certo fundamentalismo ideológico. Ela se volta aos fundamentos e se agarra neles, diante de um presente que é muito arriscado, que é muito complexo, cheio de desafios e paradoxos, fluido e não rígido. Nesse campo, nossa esquerda tem traços semelhantes ao fundamentalismo religioso. Quem na esquerda ousa pensar diferente é prontamente tachado de "coxinha", de "reacionário" ou de "liberal".

Num cenário em que há um movimento mundial de se repensar a esquerda, por que a esquerda brasileira seria então tão fundamentalista?

Eu tenho impressão de que teorias e ideias renovadoras do pensamento ideológico chegaram muito atrasadas ao Brasil e, por muito tempo, a esquerda brasileira ficou isolada da esquerda mundial. Mas com o processo de globalização da informação, essa situação de "atraso" vem sofrendo profundas modificações. A esquerda brasileira está sendo forçada a pensar em conjunto com o mundo. Ainda assim, ela resiste. Quem na esquerda aceita dialogar com as contribuições de um John Rawls, Adam Przeworski, Amartya Sen ou mesmo Hannah Arendt não é visto com bons olhos.

E quais seriam questões importantes para a esquerda de hoje?

Como conduzir um programa de responsabilidade fiscal sob uma perspectiva de esquerda, por exemplo? Ou governos de esquerda devem ser necessariamente deficitários? O Syriza, na Grécia, tem enfrentado essas questões pragmáticas. E muita gente já se retirou do Syriza por causa disso. Porque é muito fácil você fundar um partido novo, de esquerda, que fica na oposição parlamentar "contra tudo e todos" com um purismo ingênuo. O desafio é quando esse partido de esquerda senta na cadeira do governo e assume responsabilidades públicas. Aí ele tem que dar conta da realidade. Sair do discurso fácil do "contra tudo isso aí". Deixar a promessa e transformá-la em política pública concreta. Sair das perspectivas utópicas da campanha para administrar o real. E esse real cotidiano é massacrante. O Tsipras tem passado por muita dificuldade, porque uma coisa era o que ele dizia na campanha, outra é executar. Não é fácil.

Onde poderíamos enxergar algumas dessas reflexões que você cita ocorrendo na esquerda global?

Você tem, por exemplo, uma tradição de esquerda que vem inovando muito desde o eurocomunismo na Itália, na França e na Espanha. Incluindo setores de esquerda liberal do Canadá. Anthony Giddens, com toda sua teorização da Terceira Via, trouxe contribuições muito importantes, principalmente com o livro Para além da Esquerda e da Direita. A Utopia Desarmada, do Jorge Castanheda, Christopher Lasch, Pierre Rosanvallon, Manuel Castels, Zygmunt Bauman, Alain Touraine, Castoriadis, Daniel Cohn-Bendit, Michel Lowy e os ecossocialistas... Todos trazem aportes importantes para a esquerda renovada do século 21. Precisamos aprender com a experiência do Syriza. A experiência dos movimentos da Espanha, como o Podemos. Acompanhar os movimentos de reforma do Partido Democrata nos Estados Unidos, do Partido Socialista Espanhol (PSOE). Olhar o modelo sueco, com o Partido Operário Social-Democrata da Suécia. A própria experiência da Frente Ampla no Uruguai. Mas nada disso parece fazer muito sucesso no Brasil. Pelo contrário, a tendência da esquerda brasileira sempre foi de condenar esses autores e movimentos que, nem sempre acertando, ainda assim faziam um esforço intelectual no sentido de mudança e compreensão do vivido. A tendência é de sempre olhar isso tudo como uma traição à ortodoxia do marxismo, essa mesma ortodoxia que matou Marx.

Existe muita reação na internet quando se faz uma defesa da Rede, com acusações de que a Rede seria um partido conservador. Diante desse quadro, você diria que há espaço para o pensamento de esquerda dentro do Rede?

Se não houvesse espaço para um pensamento de esquerda dentro da Rede, uma liderança como Heloísa Helena não estaria na Rede, nem o vereador carioca Jefferson Moura, o comunista Martiniano Cavalcanti, o senador Randolfe Rodrigues ou o deputado federal Alessandro Molon. Se não houvesse espaço para um pensamento renovado de esquerda dentro do partido, muita gente da Executiva Nacional, do Elo Nacional e dos Elos Regionais abandonariam a Rede Sustentabilidade. O fato de que essas pessoas estão na Rede é uma prova de que a Rede tem espaço pra um pensamento à esquerda. Essa conversa de que a Rede seria conservadora-liberal é ignorância ou má-fé. Lembramos que Marina Silva, Pedro Ivo e muitos outros companheiros da direção nacional foram militantes do clandestino Partido Revolucionário Comunista (PRC) na década de 1980, no interior do Partido dos Trabalhadores. Chamar esse povo de "direita" é brincadeira.

Mas a Rede é de esquerda ou de direita?

A Marina já expressou, em algumas ocasiões, que a Rede Sustentabilidade não é "nem de esquerda, nem de direita". Que ela é "para frente". Qual o sentido disso? A primeira questão é que essa expressão envolve, na minha leitura, um ideal progressista. Esse seria o sentido de "para frente". Muito mais do que preocupar-se com as etiquetas de esquerda ou de direita, a Rede Sustentabilidade tem como preocupação o progresso social, e que esse progresso se dê dentro do paradigma de sustentabilidade planetária. Portanto, isso nos diz algo sobre economia solidária, nova política, ética global e desenvolvimento não predatório com redução de assimetrias sociais graves. São diversos eixos que se encontram dentro desse paradigma de sustentabilidade progressista que age no aqui-agora com olhos no futuro. Basta conferir o Estatuto da Rede, o seu Manifesto, acompanhar a atuação da Rede Sustentabilidade, os posicionamentos da Executiva Nacional da Rede e agora os posicionamentos da bancada da Rede no Congresso e você irá testemunhar que, de fato, trata-se de uma nova organização progressista. Ainda que não esteja capturada pela lógica tradicional da esquerda e da direita. Portanto, não opera dentro dos critérios de Norberto Bobbio que eu estou usando aqui apenas como orientação. A segunda questão é que a Rede tem claros compromissos ideológicos e programáticos. Não ser de esquerda ou de direita deve ser interpretado apenas como a afirmação de um espaço imagético, teórico e prático que está além da díade na pós-modernidade, sem, contudo, negá-la por completo.

E se tentássemos fazer uma análise externa, pela visão tradicional de um cientista político?

Se nós tentarmos forçar a dicotomia ou a "díade", como chamava Bobbio, talvez possamos dizer que a Rede seja um partido de centro-esquerda ou "esquerda moderada". Ela tenta conjugar mercado e Estado com justiça social e respeito a todas as formas de vida e ao meio ambiente. Um partido que se afasta de uma visão laissez-faire de mercado, mas que também não abraça uma visão tradicional de socialismo onde o "Estado é bom" e deve intervir em todos os aspectos da vida dos indivíduos "para o bem dos indivíduos". Por isso mesmo, a Rede, da forma como vejo, dialoga com uma tradição positiva do liberalismo: defesa das liberdades individuais e civis, das instituições e procedimentos da democracia e do dinamismo do mercado. Mas também dialoga com aquilo que a esquerda e os movimentos socialistas trouxeram de melhor para a humanidade, como a radicalização da democracia e a centralidade do bem-estar social: a defesa da igualdade social, da distribuição equitativa da renda e do direito das minorias contra todas as formas de totalitarismo de maioria. Todas essas são bandeiras da Rede Sustentabilidade. Mas poderíamos dizer também que isso está para além da direita e da esquerda. Poderíamos chamar de razoabilidade democrática.

Fonte: Brasil Post, por Romulo Rodrigues de Carvalho, 01/11/2015

quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Ódio ao feminismo é ódio à liberdade das mulheres

Frase histórica de Beauvoir, publicada em 1949,
provoca grita de conservadores
O texto abaixo foi escrito por um homem, Rogerio Waldrigues Galindo, para o Gazeta do Povo, o que, por si só, demonstra que as polêmicas envolvendo o feminismo não são coisa de guerra dos sexos. Tem mais a ver, a se falar em batalhas, com guerra de mentalidades entre os que entendem a liberdade como um patrimônio para todos e dos que acham que ela deve ser exclusividade do clichê "homem, branco, hétero, burguês e cristão".

Impressionou a todas e todos, que não atravessam a vida pelo vale das sombras do obscurantismo, a indignação ignorante e hipócrita de conservadores com a presença do trecho histórico do livro o Segundo Sexo (1949) de Simone de Beauvoir, na prova do ENEM, onde ela afirmava que ninguém nasce mulher, torna-se. Disse uma obviedade: não é a biologia que determina o comportamento da mulheres em nossa sociedade e sim a cultura, "a construção do feminino é um processo dado pela civilização" (como bem lembrou outro homem, o historiador Leandro Karnal). Outra grita foi contra o tema da redação do ENEM sobre a violência doméstica contra as mulheres. Tal tema seria uma tentativa de doutrinação esquerdista dos adolescentes via prova.



Depois de mais de uma década de uma quase hegemonia da esquerda brasileira, fóssil, anacrônica, agora em decadência, temos a ascensão de uma direita ignorante e reacionária que também ameaça a democracia e os direitos da população. O Rogério disseca as razões para a grita com a suposta doutrinação esquerdista no ENEM com muita propriedade e vai ao cerne da questão: o ódio ao feminismo é o ódio à liberdade das mulheres.Vale a leitura.


Enem mostra que ódio ao feminismo é ódio à liberdade das mulheres

O ódio que o feminismo provoca em muitas pessoas é impressionante. E diz muito sobre a sociedade em que vivemos. Neste fim de semana, as provas do Enem voltaram a causar chiadeira de quem acha que o MEC usa a educação para doutrinar alunos. Tinha duplamente a ver com o feminismo.

Primeiro, uma das questões de Ciências Humanas usava um trecho de “O segundo sexo”, de Simone de Beauvoir. Citava-se o trecho inicial clássico em que a filósofa diz que ninguém “nasce mulher”. A discussão é fascinante: ela defende que as mulheres são o que são na sociedade não por questões biológicas inerentes, mas sim porque o mundo as trata de determinada maneira.

Já seria tolice infinita dizer que usar um clássico na prova era doutrinação. Mas é pior: a pergunta não pedia para que se concordasse sobre o texto, nem para que se discorresse sobre ele, nem nada. Queria apenas que o sujeito fosse capaz de identificar o texto com uma corrente de pensamento. Com o feminismo. A questão era só isso.

Era como colocar um texto de Adam Smith e pedir que se identificasse aquilo com o capitalismo. Ou de Marx e exigir que se soubesse que aquilo tem a ver com comunismo. Ou falar de Martin Luther King e perguntar se aquilo tinha ou não relação com os direitos dos negros. Não se pode fazer isso?

O tema da redação, que pedia um texto sobre “a persistência da violência contra a mulher” no Brasil fez de novo, no domingo, muita gente se exaltar. Como se a violência contra a mulher não fosse um fato, ou como se pedir que os alunos raciocinem sobre isso significasse que a prova é “de esquerda” (como alguém disse por aí, a direita deveria ficar envergonhada de se afastar de um tema como esse, entregando-o de bandeja para seus oponentes).

Mas por que o ódio contra o feminismo? Pode ser que muita gente considere algumas feministas estridentes e exageradas. Não se negue: todo movimento social pode ter exageros e estridências. Mas nesse caso podia haver um questionamento pontual contra certos argumentos, talvez. Não. Há ódio, inclusive de mulheres, às feministas em geral. Ao feminismo em si.

Tempos atrás entrevistei vereadoras e deputadas do Paraná. Só duas se disseram feministas. As outras queriam distância. Dia desses, li um comentário de uma senhora que se dizia revoltada com o feminismo porque, graças às feministas, ela era obrigada a trabalhar fora e não podia ficar em casa com os filhos. Um blogueiro chegou a escrever um texto dizendo que talvez não fosse interessante para as mulheres ganhar o mesmo que os homens no trabalho…

O ódio ao feminismo pode ter origem em certos exageros, mas parece mais que tem a ver com duas outras coisas. Um conservadorismo inerente à nossa sociedade e uma falta de compreensão do que é o feminismo.

O conservadorismo quer que as coisas mudem pouco não só em relação ao que são mas ao que eram. Isso se mudarem. Há conservadores sérios, que querem apenas evitar mudanças bruscas e revolucionárias, e há base para isso. Mas há os que usem isso como pretexto para imobilismo ou até para regressão social.

Um “conservador-fenômeno-de-Facebook” comemorava dez mil assinantes neste fim de semana dizendo que os neófitos não esperassem muito dele como conservador: ele até lavava a louça enquanto a mulher descansava. O que imagina alguém assim que é o conservadorismo? Uma regressão ao século dezoito? Isso, na verdade, já é outra coisa: reacionarismo.

Mas parece que o outro problema é igualmente grave: o desconhecimento do que é o feminismo. Pensam talvez que seja algo de outro mundo, que as mulheres querem odiar aos homens, que querem ser superiores, que querem mais direitos do que os outros. Pode até haver algum exagero do gênero, claro. Sempre há.

Mas feminismo, se for resumir em uma linha, poderia ser o seguinte. Que as mulheres não sejam obrigadas a ter limitações extra simplesmente por serem mulheres.

Quem odeia o feminismo normalmente odeia, de fato, é a liberdade das mulheres.

É pedir demais? É doutrinação falar disso?

Fonte: Gazeta do Povo, 26/10/20015


segunda-feira, 26 de outubro de 2015

O Estado petista: folha de salários da União, fora 142 estatais, passará este ano de R$ 100 bilhões

Estado petista: um enorme cabide de empregos para um bando de parasitas

O jornalista Fernão Lara Mesquita comenta, no texto abaixo, o enorme cabide de empregos em que se transformou o Estado brasileiro nas mãos do PT com seus funcionários públicos donos de salários de até R$152 mil em plena crise econômica. Os dados, retirados de reportagem do O Globo, mostram o quanto o corte em áreas vitais, como saúde e educação, e o aumento de impostos, reivindicado por Dilma, são absurdos.

 A libertação está nos fatos

Poucas vezes terá havido situação semelhante à deste nosso banquete de horrores no qual 90% dos comensais declaram-se com nojo da comida que lhes tem sido servida mas são obrigados a continuar a traga-la simplesmente porque não sabem pedir outro prato.

Na 2a feira, 19, O Globo publicou nova reportagem da série “Cofres Abertos” sobre a realidade do estado petista. O título era “Remuneração em ministério vai até R$ 152 mil”.


Eis alguns dados:

Lula acrescentou 18,3 mil funcionários à folha da União em oito anos. Em apenas quatro Dilma enfiou mais 16,3 mil. Agora são 618 mil, só na ativa. 103.313 têm “cargos de chefia”. Os títulos são qualquer coisa de fascinante. Ha um que inclui 38 palavras. “Chefe de Divisão de Avaliação e Controle de Programas, da Coordenação dos Programas de Geração de Emprego e Renda…” e vai por aí enfileirando outras 30, com o escárnio de referir um acinte desses à “geração de emprego e renda”…

O “teto” dos salários é o da presidente, de R$ 24,3 mil. Mas a grande tribo só de caciques constituída não pelos funcionários concursados ou de carreira mas pelos “de confiança”, com estrela vermelha no peito, ganha R$ 77 mil, somadas as “gratificações” que podem chegar a 37 diferentes. No fim do ano tem bônus “por desempenho”. A Petrobras distribuiu mais de R$ 1 bi aos funcionários em pleno “petrolão”, depois de negar dividendos a acionistas. A Eletronorte distribuiu R$ 2,2 bilhões em “participação nos lucros” proporcionados pelo aumento médio de 29% nas contas de luz dos pobres do Brasil entre os seus 3.400 funcionários. Houve um que embolsou R$ 152 mil.

A folha de salários da União, sem as estatais que são 142, passará este ano de R$ 100 bilhões, 58% mais, fora inflação, do que o PT recebeu lá atrás.


Essa boa gente emite 520 novos “regulamentos” (média) todo santo dia. Existem 49.500 e tantas “áreas administrativas” divididas em 53.000 e não sei quantos “núcleos responsáveis por políticas públicas”! Qualquer decisão sobre água tem de passar pela aprovação de 134 órgãos diferentes. Uma sobre saúde pública pode envolver 1.385 “instâncias de decisão”. Na educação podem ser 1.036. Na segurança pública 2.375!

E para trabalhar no inferno que isso cria? Quanto vale a venda de indulgências?

Essa conversa da CPMF como única alternativa para a salvação da pátria face à “incompressibilidade” dos gastos públicos a favor dos pobres não duraria 10 segundos se fatos como esses fossem sistematicamente justapostos às declarações que 100 vezes por dia, os jornais, do papel à telinha, põem no ar para afirmar o contrário. Se fossem editados e perseguidos pelas televisões com as mesmas minúcia, competência técnica e paixão com que seus departamentos de jornalismo fazem de temas desimportantes ou meramente deletérios verdadeiras guerras-santas, então, a Bastilha já teria caído.

Passados 10 meses de paralisia da nação diante da ferocidade do sítio aos dinheiros públicos e ao que ainda resta no bolso do brasileiro de 2a classe, com a tragédia pairando no ar depois do governo mutilar até à paraplegia todos os investimentos em saúde, educação, segurança pública e infraestrutura, a série do Globo é, no entanto, o único esforço concentrado do jornalismo brasileiro na linha de apontar com fatos e números que dispensam as opiniões de “especialistas” imediatamente contestáveis pelas opiniões de outros “especialistas” para expor a criminosa mentira de que este país está sendo vítima.

Nem por isso deixou de sofrer restrições mesmo “dentro de casa” pois apesar da contundência dos fatos, da oportunidade da denúncia e da exclusividade do que estava sendo apresentado, a 1a página do jornal daquele dia não trazia qualquer “chamada” para o seu próprio “furo” e nem as televisões da casa o repercutiram. O tipo de informação sem a disseminação da qual o Brasil jamais desatolará da condição medieval em que tem sido mantido, tornou-se conhecida, portanto, apenas da ínfima parcela da ínfima minoria dos brasileiros alfabetizados que lê jornal que tenha folheado O Globo inteiro daquele dia até seus olhos esbarrarem nela por acaso e que se deixaram levar pela curiosidade página abaixo.

É por aí que se agarra insidiosamente ao chão essa cultivada perplexidade do brasileiro que, em plena “era da informação”, traga sem nem sequer argumentar aquilo que já não admitia que lhe impingissem 200 anos atrás mesmo que a custa de se fazer enforcar e esquartejar em praça pública.

Do palco à platéia, Brasília vive imersa no seu “infinito particular“. Enquanto o país real, com as veias abertas, segue amarrado ao poste à espera de que a Pátria Estupradora decida quem vai ou não participar da próxima rodada de abusos, os criminosos mandam prender a polícia e a platéia discute apaixonadamente quem deu em quem, entre os atores da farsa, a mais esperta rasteira do dia.

Deter o estupro não entra nas cogitações de ninguém. A pauta da imprensa – e com ela a do Brasil – foi terceirizada para as “fontes” que disputam o comando de um sistema de opressão cuja lógica opõe-se diametralmente à do trabalho. Os fatos, substância da crítica que pode demolir os “factóides“, esses todos querem ocultados.


Perdemos as referências do passado, terceirizamos a “busca da felicidade” no presente, somos avessos à fórmula asiática de sucesso quanto ao futuro. Condenamo-nos a reinventar a roda em matéria de construção de instituições democráticas porque a que foi inventada pela melhor geração da humanidade no seu mais “iluminado” momento e vem libertando povo após povo que dela se serve, está banida das nossas escolas e da pauta terceirizada pela imprensa a quem nos quer para sempre amarrados a um rei e seus barões. Como o resto do mundo resolve os mesmos problemas que temos absolutamente não interessa aos “olheiros” dos nossos jornais e TVs no exterior que, de lá, só nos mostram o que há de pior…

A imprensa nacional está devendo muito mais à democracia brasileira do que tem cobrado aos outros nas suas cada vez mais segregadas páginas de opinião.

Fonte: Vespeiro, por Fernão Lara Mesquita, 24/10/2015

quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Dilma diz ter dado as pedaladas fiscais para atender os mais pobres, mas de fato foi para pagar os mais ricos das grandes empresas

Míriam Leitão demonstra porque, de fato, Dilma não pedalou para atender aos pobres. A maior parte da dívida é com programas da bolsa empresário através dos subsídios para as grandes empresas no Programa de Sustentação do Investimento (PSI) do BNDES.

Ao contrário, Dilma, ao permitir a volta da inflação, provocou queda do poder de compra das famílias brasileiras e encolhimento das vendas, atingindo mais diretamente os mais pobres.  Manter a taxa de inflação sob controle é a primeira política social real a se fazer. Vejam o texto abaixo com os destaques.

Destaque: 

Os governos do ex-presidente Lula e da presidente Dilma adotaram políticas criadas pelo governo militar. Tudo foi refeito: política de escolha de grupos vencedores, dinheiro barato financiado com os impostos do resto da população, fechamento da economia para reduzir a competição, regulação tendenciosa que beneficiava alguns em detrimento de outros. Na economia, nada foi mais parecido com o governo militar do que os governos do PT.
 Agora, Lula e Dilma estão usando mais uma vez o discurso populista para justificar o fato de o governo ter desrespeitado a Lei de Responsabilidade Fiscal, com o argumento de que o fizeram para atender aos pobres. Os números mostram o contrário. Das pedaladas de R$ 40 bilhões, R$ 6 bilhões foram de atrasos à Caixa Econômica para o pagamento de programas como Bolsa Família. A maior parte da dívida é com programas do bolsa empresário.
A quem se destina

por Míriam Leitão
A maior parte das pedaladas fiscais não foi feita para beneficiar os pobres, mas sim os muito ricos através dos subsídios para as grandes empresas no Programa de Sustentação do Investimento (PSI) do BNDES. No Banco do Brasil, os atrasos são dos empréstimos para empresas do agronegócio. Nesses dois bancos se concentra a maior parte da dívida.

O grande empresariado bateu palmas e fez fila para pegar recursos do PSI. O programa gerou essa dívida de R$ 24,5 bilhões acumulada com o BNDES. Mas o custo não é só esse. O PSI é com taxa supersubsidiada. Mas todos os empréstimos do BNDES são com taxas mais baixas do que as que o Tesouro paga. Foram transferidos para o banco, para que ele emprestasse, outros R$ 500 bilhões. Sobre essa dinheirama há custos que continuarão pesando no bolso do contribuinte nos próximos anos, talvez décadas.

As despesas do Tesouro para carregar a dívida contraída para transferir recursos para o BNDES ou as contas da equalização de taxas de juros provam que a política econômica do PT se destinou aos mais ricos. O discurso demagógico de pedalada feita para favorecer os pobres é desmentido pelos fatos. O gasto com as grandes empresas foi infinitamente maior do que com os programas de transferência de renda.

Os governos do ex-presidente Lula e da presidente Dilma adotaram políticas criadas pelo governo militar. Tudo foi refeito: política de escolha de grupos vencedores, dinheiro barato financiado com os impostos do resto da população, fechamento da economia para reduzir a competição, regulação tendenciosa que beneficiava alguns em detrimento de outros. Na economia, nada foi mais parecido com o governo militar do que os governos do PT.

Agora, Lula e Dilma estão usando mais uma vez o discurso populista para justificar o fato de o governo ter desrespeitado a Lei de Responsabilidade Fiscal, com o argumento de que o fizeram para atender aos pobres. Os números mostram o contrário. Das pedaladas de R$ 40 bilhões, R$ 6 bilhões foram de atrasos à Caixa Econômica para o pagamento de programas como Bolsa Família. A maior parte da dívida é com programas do bolsa empresário.

O governo Dilma prejudicou também os mais pobres quando foi leniente com a inflação. Deixou que a taxa ficasse tempo demais perto do teto da meta e segurou artificialmente os preços administrados para elevá-los após as eleições. O resultado foi inflação perto de 10%, queda do poder de compra das famílias brasileiras e encolhimento das vendas.

A inflação sempre atingirá mais diretamente os mais pobres, por isso a primeira política social é manter a taxa sob controle. A estabilização foi um poderoso instrumento de inclusão e permitiu que políticas sociais tivessem resultado, aumentando o movimento de retirada de brasileiros da pobreza. Quando o governo permite uma taxa que chega a este nível calamitoso de agora — com o PIB encolhendo 3% — a consequência direta é retirar renda da população, principalmente dos mais pobres.

Por ação, através dos programas de subsídio às grandes empresas, e por omissão, ao deixar a inflação subir, o governo está fazendo o oposto do que deveria fazer. Está usando mais recursos públicos para os ricos; tirando renda dos mais pobres através da inflação.

Por isso, a conversa do ex-presidente Lula e a nota do Planalto são mais do que demagógicas. São falsas. As pedaladas não foram feitas para pagar os beneficiários do Bolsa Família porque faltou dinheiro. Como já disse aqui, outros programas tiveram, em 2014, por razões eleitorais, um aumento súbito, que foi revogado no ano seguinte. Mas, além disso, os números mostram a quem se destina a maior parte dos subsídios e subvenções pagos pelo Tesouro: às grandes empresas.

A ilusão de que o PT pudesse fazer o ajuste fiscal, corrigindo os erros que cometeu, já se desfez. Os gritos de “fora Levy” na reunião da CUT mostram que não há o que o ministro da Fazenda possa fazer. O partido não aceita ajuda para corrigir a bagunça que fez porque não acredita em responsabilidade fiscal. Foi por isso que a lei foi ferida tantas vezes nos últimos anos. Na opinião emitida por Lula na CUT, o país deve continuar desajustado. Faltou dizer quem paga a conta da desordem petista na economia.

Fonte: O Globo, 15/10/2015

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

A fênix sinistra: PT tenta renascer das cinzas via frente partidária de esquerda para as eleições municipais de 2016

PT quer renascer das cinzas
A serpente e seus ovos
por Ruy Fabiano

Com ou sem impeachment, uma coisa é certa: a Era PT chegou ao fim. O partido não dispõe de quadros para seguir no comando do país. Seus principais líderes ou estão na cadeia ou empenhados em dela escapar, a começar por quem o simboliza, o ex-presidente Lula, de quem Dilma é apenas marionete.

Não quer isso dizer que a estrutura – CUT, MST, UNE, ONGs etc. - e as ideias que se apossaram da máquina estatal, e a lesaram como nunca dantes neste país, largarão o osso com tanta facilidade.

A serpente PT botou ovos. Os partidos-satélites, como PSOL, PSTU, PCdoB e mesmo a Rede Sustentabilidade, de Marina Silva – o maior silêncio da crise -, aí estão para receber os sobreviventes.

O próprio PT, ciente de sua impotência eleitoral, concebe a estratégia de compor uma frente partidária de esquerda para as eleições municipais do ano que vem. Rui Falcão, presidente do partido, já explicou como isso funcionaria.


Quer ocultar a estrela da legenda, hoje amaldiçoada, dissolvendo-a em meio a uma frente “progressista”, que tentará levar adiante as “conquistas sociais” que os petistas juram ter estabelecido, embora a crise econômica, decorrente das políticas que o partido concebeu, se encarregue de desfazê-las uma a uma.

A clientela do Bolsa Família é de mais de 45 milhões de pessoas, que há 17 meses não têm reajuste, o que dispensa comentários. Os “mais de 30 milhões que ascenderam à classe média” – e esses números compõem um discurso, não uma demonstração -, se lá chegaram, já fizeram o caminho de volta, segundo as estatísticas de desemprego.

As pesquisas de opinião mostram o desgaste petista nas classes mais carentes, de que foram gigolôs nas últimas décadas. Enfim, o partido que levou o país à falência econômica, política, social e moral precisa salvar-se do naufrágio nos botes salva-vidas que cuidou de providenciar. E não é difícil identificá-los.

Basta ver o empenho, por exemplo, do PSOL em valer-se de Eduardo Cunha como cortina de fumaça para desviar a atenção de infratores bem mais pesados, alguns deles, como os ministros Edinho Silva e Aloizio Mercadante, dentro do próprio Palácio do Planalto. Se Cunha justifica a indignação – e não há dúvida de que sim -, por que Edinho e Mercadante, e a própria Dilma (citada por seis delatores, enquanto Cunha o foi por dois), não?

A indignação seletiva compõe a tecnologia de sobrevivência da esquerda, hoje ancorada em milhares de ONGs que dependem de verbas do Estado para sustentar a vasta militância, inimiga de uma burguesia fictícia, que ela melhor que ninguém representa.

O silêncio de Marina Silva, que em momento algum exibiu qualquer indignação com a roubalheira da Petrobras – até aqui orçada em R$ 20 bilhões -, e só veio a público para opor-se ao impeachment, não surpreende. Tem coerência biográfica.

Ela já se manifestou reiteradas vezes nostálgica do PT, abraçada à tese de que a proposta original era boa, mas foi distorcida – e Lula teria sido arrastado sem o perceber.

A proposta original, no entanto, era essa mesma – e Lula jamais foi outro. Quando se faz um retrospecto da ação do partido antes de chegar à presidência da República, quando agia apenas no âmbito dos municípios, já estava tudo lá.

O que aconteceu, por exemplo, em Campinas, com o assassinato do prefeito Toninho do PT, e em Santo André, com o de Celso Daniel, ao tempo em que o PT era oposição, dá uma mostra dos métodos que seriam expandidos e aperfeiçoados em Brasília.

Marina é fã de Lula – e Lula é quem hoje sabemos. Não o critica, nem a Dilma, ainda que tenha sido ofendida por ambos, em níveis cruéis, na campanha. Prefere silenciar e recolher a militância sobrevivente em sua Rede. É uma pescaria silenciosa, mas não invisível. Pretende herdar a organicidade e a estrutura de uma máquina que se empenha em dar sequência, em grau menos truculento, a um projeto de poder que estava na gênese do PT.

O impeachment, ainda que não saia – e, dada a crise econômica, é difícil imaginar essa hipótese, mesmo com a visível cumplicidade nos três poderes -, permite que se vislumbre os riscos embutidos no futuro, onde a fênix esquerdista aspira ao renascimento.

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