8 de Março:

A origem revisitada do Dia Internacional da Mulher

Mulheres samurais

no Japão medieval

Quando Deus era mulher:

sociedades mais pacíficas e participativas

Aserá,

a esposa de Deus que foi apagada da História

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Mentores dos Black Bostas vêm de agrupamentos de extrema-esquerda da década de 70 na Itália e na Alemanha!

Black Bostas: excesso de hormônios, escassez de neurônios

Nas franjas do Black Bloc

Demétrio Magnoli, O Globo

“Muitos dos jovens que estão usando essa estratégia da violência nas manifestações vieram das periferias brasileiras. Eles já são vítimas da violência cotidiana por parte do Estado e por isso os protestos violentos passam a fazer sentido para eles”.

Rafael Alcadipani Silveira, autor do diagnóstico que equivale a uma celebração do vandalismo, não é um músico punk, mas um docente da FGV-SP. O seu (preconceituoso) raciocínio associa “violência” a “periferia” — como se esse sujeito abstrato (a “periferia”) fosse portador de uma substância inescapável (a “violência”).

Por meio do conhecido expediente de atribuir a um sujeito abstrato (a “periferia”) as ideias, as vontades e os impulsos dele mesmo, Silveira oculta os sujeitos concretos que produzem um “sentido” para “protestos violentos”. Tais sujeitos nada têm a ver com a “periferia”: são acadêmicos-ativistas engajados na reativação de um projeto político que arruinou as vidas de uma geração de jovens na Alemanha e na Itália.

No DNA humano estão inscritas as “pegadas” da evolução dos seres vivos. Nas obras de arte, encontram-se os sinais de uma extensa cadeia de influências que as interligam à história da arte. Similarmente, pode-se identificar nos textos políticos uma genealogia doutrinária, que se manifesta em modelos argumentativos típicos e expressões estereotipadas.

O professor da FGV menciona a “violência cotidiana por parte do Estado”. Nas páginas eletrônicas dos Black Blocs, pipoca a expressão “Estado policial”. Bruno Torturra, o Mídia Ninja ligado a Marina Silva, definiu os Black Blocs como “uma estética” e defendeu a “ação direta”, desde que “dirigida aos bancos”.

Pablo Ortellado, filósofo e ativista, elogiou a “ação simbólica” de destruição de uma agência bancária que, interpretada “na interface da política com a arte”, simularia a ruína do capitalismo. Eu já li essas coisas — e sei onde.

Tudo isso foi escrito na década de 1970, pelos intelectuais italianos que lideraram os grupos autonomistas Potere Operaio, Lotta Continua e Autonomia Operaia. Eles mencionavam as qualidades exemplares da “ação direta” e a eficiência da “violência simbólica”.

Toni Negri pregava a violência como ferramenta para defender os “espaços” criados pelas “ações de massa” e exaltava o “efeito terrível que qualquer comportamento subversivo, mesmo se isolado, causa sobre o sistema”.

Avançando um largo passo, Franco Piperno clamava pela “combinação” da “potência geométrica da Via Fani” (referência ao sequestro de Aldo Moro pelas Brigadas Vermelhas, em Roma, no 16 de março de 1978) “com a maravilhosa beleza do 12 de março” (alusão ao assassinato de um policial, em Turim, pelo grupo extremista Prima Linea, em 1977).

Depois do assassinato de Moro, Negri e Piperno foram processados e injustamente condenados a cumprir sentenças de prisão, que acabaram sendo revertidas. Intelectuais, de modo geral, não sujam as próprias mãos. Os líderes autonomistas não integravam as Brigadas Vermelhas ou a Prima Linea — e, portanto, não deram as ordens que resultaram em atos de terror.

Eles apenas ensinaram a seus jovens seguidores, alguns dos quais viriam a militar nas organizações terroristas, que a violência é necessária, eficaz e bela. A responsabilidade deles não era criminal, mas política e moral, algo que jamais tiveram a decência de reconhecer.

Onde fica a fronteira entre a violência “simbólica” e a violência “real”? Na noite de 2 de abril de 1968 bombas incendiárias caseiras explodiram em duas lojas de departamentos de Frankfurt, que já estavam fechadas. A ação pioneira do grupo Baader-Meinhof, inscrita “na interface da política com a arte”, foi cuidadosamente planejada para não matar ninguém. Era a violência “só contra coisas”, não “contra pessoas”, na frase de Ortellado para justificar as ações dos Black Blocs.

O primeiro cadáver do Baader-Meinhof, um guarda penitenciário, surgiu na operação de resgate de Andreas Baader, em maio de 1970. Depois, vieram outros cadáveres, de chefes de polícia, juízes, promotores ou empresários. Tais personalidade seriam “símbolos” do “sistema” — isto é, segundo uma interpretação possível, “coisas”, não “pessoas”.

A tragédia alemã precedeu a tragédia italiana, mas não a evitou. No “Outono Alemão” de 1977, um jovem radical desiludido escreveu uma carta amarga, irônica, indagando sobre os critérios para decidir quem tinha mais responsabilidade pela opressão capitalista — e, portanto, deveria ser selecionado como alvo. “Por que essa política de personalidades? Não poderíamos sequestrar junto uma cozinheira? Não deveríamos pôr um foco maior nas cozinheiras?”

Os nossos alegres teóricos dos Black Blocs aplaudem o incêndio “simbólico” de uma agência bancária, mas ainda não se pronunciaram sobre o valor artístico da vandalização de edifícios empresariais, shopping-centers, delegacias, palácios de governo ou residências. Por que esse “foco” nos bancos?

Eugênio Bucci — ele também! — usou a palavrinha “estética” quando escreveu sobre a suposta novidade do “esporte radical e teatral de jogar coquetel molotov contra os escudos da tropa fardada”. Não existe, porém, novidade.

Ortellado publicou um artigo sobre as fontes da “tática” dos Black Blocs, evidenciando suas conexões com os movimentos autonomistas de “ação direta” na Alemanha e Itália dos anos 1970 e 1980, cujos destacamentos de choque servem de modelo aos nossos encapuzados.

Ele não diz com clareza, mas as teses políticas que reativam o culto da manifestação violenta originam-se precisamente de alguns dos acadêmicos-ativistas daquele tempo, hoje repaginados como mestres grisalhos do movimento antiglobalização.

Os Black Blocs anunciam um “badernaço nacional” para o 7 de setembro. Mas o “badernaço” intelectual começou antes, na forma dessas piscadelas cúmplices para idiotas vestidos de preto que rebobinam um desastroso filme antigo.

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Democracia e liberalismo

Denis Lerrer Rosenfield
Bom texto do filósofo Denis Lerrer Rosenfield sobre os liberticidas bolivarianos e islâmicos e a funesta relação do governo brasileiro com essa gente que absurdamente busca atribuir ao liberalismo um viés antidemocrático, quando democracia de fato é exatamente a liberal. Destaco os seguintes trechos do texto, mas ele todo vale a leitura:

Nos países bolivarianos a "democracia" está sendo instrumentalizada para a implementação de seu projeto socialista, destroçando as liberdades, destruindo as instituições, tornando as oposições inviáveis, calando os meios de comunicação e implantando a dominação do "líder máximo" e de seu partido. Embora ditos não religiosos, sua ideologia se caracteriza por concepções teológico-políticas. 

Acrescentem-se as restrições infligidas pelos que buscam impor normas religiosas ao conjunto da população, pelo controle absoluto dos costumes, atingindo mulheres e homossexuais, para que se tenha uma melhor visão de como a democracia é, dessa forma, pervertida. Ou seja, os que dissociam democracia de liberalismo, dizendo defender aquela, têm forte pendor liberticida. Mascaram-no, porém, ao atribuírem ao liberalismo um viés não democrático. 

Eis o contexto ideológico em que se move a diplomacia brasileira, acatando todas as medidas liberticidas dos países bolivarianos e islâmicos, conivente com seus desmandos de subversão da democracia por meios democráticos. O País acaba se alinhando à escória mundial em nome da democracia - e os mais afoitos, em nome da luta contra o neoliberalismo. O Foro de São Paulo é a sua celebração!

Democracia e liberalismo

Denis Lerrer Rosenfield

O uso equivocado ou dúbio de palavras não só dificulta a compreensão, como é potente fator de desorientação da ação humana. Quanto pior conceitualizamos um evento, tanto menos somos capazes de entender o que está acontecendo. Os juízos moral e político ficam sem parâmetros, ziguezagueando ao sabor das conveniências ideológicas.

Um caso particularmente relevante concerne ao modo como o dito "golpe" egípcio é avaliado e, para além dele, como a diplomacia brasileira "compreende" o que vêm a ser os "progressos" da América Latina em sua vertente socialista, bolivariana. Ainda recentemente o Brasil sediou o Foro de São Paulo, entidade esquerdista latino-americana que se caracteriza por seu apreço a toda política liberticida, em nome - pasmem! - de uma nova "democracia". Eles gostam mesmo é de uma "boa" ditadura. Os representantes ideológicos do passado procuram travestir-se com um manto politicamente aceitável, para enganar os incautos.

A propósito do juízo político sobre os eventos no Egito, alguns analistas fizeram um uso muito curioso dos conceitos de "democracia" e "liberalismo", como se lá tivesse ocorrido uma colisão entre ambos. Mais comezinhamente, deveríamos dizer que lá ocorreu um divórcio entre um resultado eleitoral e os que defendem direitos e liberdades, que vinham sendo usurpados por um governo islamista. Este foi sufocando as liberdades, impondo sua particular interpretação dos valores islâmicos, os defendidos pela Irmandade Muçulmana. Convém não esquecer que essa mesma organização religiosa foi a responsável pelo assassinato do presidente egípcio Anuar Sadat, participou da fundação da Al-Qaeda e apoia o terrorismo do Hamas na Faixa de Gaza. Aliás, o atual líder da Al-Qaeda é egresso da mesma Irmandade Muçulmana. As credenciais "democratas" desse "partido" são, portanto, de difícil aceitação!

Há um problema conceitual de monta aqui envolvido. A democracia, assim entendida, viria a significar exclusivamente a realização de eleições e a adesão incondicional aos eleitos, como se daí em diante tivessem eles o "direito" de tudo fazer, ficando a sociedade submetida ao seu arbítrio. A democracia seria mero instrumento de conquista do poder, que uma vez garantido asseguraria a seus detentores a prerrogativa de tudo decidir, sendo soberanos no sentido ilimitado do termo. Nenhuma lei os limitaria, salvo a de fachada que eles mesmos se outorgam. O próprio Poder Judiciário torna-se um mero joguete em suas mãos, nada decidindo verdadeiramente, devendo subordinar-se aos ditames do Executivo.

Logo, os direitos individuais são abolidos - valores burgueses, no dizer bolivariano; valores ocidentais, para os islamistas. As liberdades são progressivamente sufocadas em nome desses "outros" valores socialistas/islamistas, conforme o caso, com o Estado vedando todos os poros por onde uma sociedade respira. Normalmente seus alvos mais diretos são os grupos de mídia e imprensa, porque quem procura impor seus valores e ideias tem como objetivo eliminar toda liberdade de expressão. Não espanta, pois, que advoguem por uma "democratização dos meios de comunicação", forma velada de controlar a mente das pessoas e, por intermédio delas, a sociedade em geral. Ainda no Foro de São Paulo o presidente da Bolívia, Evo Morales, julgou - na ausência de juízo que o caracteriza - que "sobra" liberdade de imprensa na América Latina. Ou seja, o que "sobra" é o que ainda não conseguiram eliminar. Teve a adesão dos "companheiros".

Se a democracia é definida apenas em termos eleitorais, ela é reduzida a uma de suas condições, eliminando todas as outras. E a alternância no poder termina por não se concretizar, porque os que detêm as rédeas de comando da máquina do Estado eliminam tal possibilidade. Medidas arbitrárias são tomadas contra os opositores, tratados como se criminosos fossem. São comuns os processos contra os que se rebelam contra essa situação, pois tidos como inimigos a serem aniquilados.

A liberdade de imprensa, condição fundamental de toda sociedade livre, vê-se afrontada por restrições crescentes, como na Venezuela, onde empresas são fechadas ou vendidas a "empresários" amigos. Observe-se, nesse sentido, a nova lei de controle da imprensa e dos meios de comunicação, recém-aprovada no Equador: doravante eles serão submetidos ao governo, que passará a agir por intermédio de "censores legais".

Nos países bolivarianos a "democracia" está sendo instrumentalizada para a implementação de seu projeto socialista, destroçando as liberdades, destruindo as instituições, tornando as oposições inviáveis, calando os meios de comunicação e implantando a dominação do "líder máximo" e de seu partido. Embora ditos não religiosos, sua ideologia se caracteriza por concepções teológico-políticas. No caso do presidente Nicolás Maduro não lhe falta nem sua comunicação espiritual com o ex-protoditador Hugo Chávez, que "fala" com ele através de uma "pomba". É um homem abençoado, particularmente bem-aventurado!

Acrescentem-se as restrições infligidas pelos que buscam impor normas religiosas ao conjunto da população, pelo controle absoluto dos costumes, atingindo mulheres e homossexuais, para que se tenha uma melhor visão de como a democracia é, dessa forma, pervertida. Ou seja, os que dissociam democracia de liberalismo, dizendo defender aquela, têm forte pendor liberticida. Mascaram-no, porém, ao atribuírem ao liberalismo um viés não democrático. 

Eis o contexto ideológico em que se move a diplomacia brasileira, acatando todas as medidas liberticidas dos países bolivarianos e islâmicos, conivente com seus desmandos de subversão da democracia por meios democráticos. O País acaba se alinhando à escória mundial em nome da democracia - e os mais afoitos, em nome da luta contra o neoliberalismo. O Foro de São Paulo é a sua celebração!

Denis Lerrer Rosenfield é professor de filosfia na UFRGS. E-MAIL: denisrosenfield@terra.com.br

Fonte: Estado de São Paulo, 12/08/2013

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Drácula com Jonathan Rhys Meyers (The Tudors) estreia em outubro e promete


Começa a ser exibida nos EUA, no dia 25 de outubro, a série Drácula, da NBC, com Jonathan Rhys Meyer (The Tudors) no papel do famoso conde da Transilvânia, sedento de sangue e vingança.

Nesta versão da mais do que fértil saga vampiresca iniciada por Bram Stoker, com seu romance Drácula, a história ocorre no final do século 19, quando o vampiro-mór chega a Londres se passando por um empresário americano, Alexander Grayson. que quer modernizar a sociedade vitoriana com os avanços da ciência. Ele tenciona investir na nova tecnologia da energia elétrica que promete iluminar a noite (sem queimar vampiros como o faz a luz do sol). 


Na realidade, contudo, o real objetivo de Drácula é se vingar da sociedade secreta, a Ordem do Dragão, que séculos antes, havia assassinado sua esposa enquanto pilhava sua vila, além de tê-lo amaldiçoado com a imortalidade (quem me dera essa maldição).

Para tal, Drácula contará com a ajuda de Renfield, que nessa versão é apenas o valete do vampiro e não mais "o maluco comedor de aracnídeos em algum hospício" da versão original. E contará também com uma ajuda insólita: Van Helsing. O célebre caçador de Drácula e de vampiros em geral se junta ao conde sanguinolento (de fato Van Helsing é quem exuma Drácula nesta história) pelo objetivo comum de se vingar da Ordem do Dragão, também responsável pela execução de sua família (de Helsing). Van Helsing dispõe dos meios para vingar-se, mas precisa da força e da ferocidade do vampiro para implementá-los.

Fora essa parceria herética, igualmente temos Jonathan Harker como um repórter (não mais corretor de imóveis) que se envolve com os negócios de Grayson e Mina Murray, como sua namorada, que no entanto estuda para ser médica. Só a personagem Lucy permanece próxima da história original como uma impetuosa alpinista social.

Os planos de vingança de Drácula, porém, serão conturbados pela paixão que  desenvolve por Mina Murray (Jessica De Gouw), uma espécie de reencarnação de sua falecida esposa. No elenco, além de Meyer, outros rostos conhecidos como Victoria Smurfit (About a Boy), Thomas Kretschmann (King Kong), Jessica De Gouw (Arrow), Oliver Jackson-Cohen (Mr. Selfridge), Nonso Anozie (Game of Thrones) e Katie McGrath (Merlin). O roteiro é de Daniel Knauf (Carnival), que também é produtor-executivo em parceria com Tony Krantz (24 Horas), Colin Callender e Gareth Neame (Downton Abbey).

A série promete porque, entre outras coisas, o belo Jonathan Rhys Meyer tem o physique du rôle perfeito para o papel, além de ser bom ator (combinação pouco comum nos intérpretes das célebres criaturas da noite). E, pelo que se pode observar pelos trailers abaixo e as imagens já liberadas, a produção parece ser caprichada. 

Agora é orar para que também chegue ao Brasil. Nos EUA vai passar depois do Grimm. Por que não aqui também? Com o fim um tanto melancólico de True Blood (decaiu um bocado nas últimas duas temporadas), seria ótimo poder contar com uma recriação perversa, sofisticada e sexy da clássica história de Bram Stoker, provando que algumas coisas nunca morrem mesmo.

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Reação conservadora contra os direitos das mulheres já preocupa


É certo que algumas manifestações feministas descambam para o exagero, como no caso da ocorrida na Marcha das Vadias, no Rio, durante a visita do Papa, quando, em protesto contra a Igreja, quebraram-se imagens de santos católicos, simulando inclusive atos libidinosos com elas. Entretanto, é certo também que vem ocorrendo uma escalada de reações conservadoras contra os direitos das mulheres em todo o mundo. Uma prova disto está nas ameaças de estupro e morte sofrida por feministas inglesas pela simples reivindicação de ter a imagem da famosa escritora Jane Austen, a autora de Orgulho e Preconceito, estampada nas notas de 10 libras.

Aqui, no Brasil, fora os ataques da bancada religiosa a projetos como o da pílula do dia seguinte, para evitar gravidez decorrente de estupro, quem frequenta as redes sociais percebe a multiplicação de perfis e páginas antifeministas - atacando o feminismo em geral - e até declaradamente misóginas, de ódio mesmo às mulheres (incluindo páginas supostamente escritas por mulheres). O ressentimento dos conservadores com sua perda de privilégios e de sua capacidade de moldar as sociedades ao seus "valores" é o responsável por esse surto de reacionarismo. Melhor cuidar para que eles não ganhem mais espaço - evitando as apelações como as ocorridas durante a visita do Papa - para evitar um mal maior.

Sem orgulho, só preconceito
Feministas são alvos de ameaças pelo mundo no Twitter

por Helena Celestino

“Eu vou estuprar você às 9 da noite”. O tweet não foi mandado por um talibã para uma jovem indefesa do Afeganistão; chegou na conta de uma deputada trabalhista do Parlamento inglês, Stella Creasy. Posts semelhantes inundaram o celular de Caroline Criado-Perez , blogueira e feminista, na assustadora velocidade de um por minuto. A ameaça, via Twitter, para quatro colunistas de jornais ingleses importantes era: “vou botar uma bomba na sua casa”. Todas essas pessoas têm em comum o envolvimento - maior ou menor - em inofensivas manifestações exigindo do Banco Central britânico manter a foto de uma mulher em qualquer das notas da libra. Esta campanha de ódio está acontecendo estes dias, pleno século XXI, numa das capitais do mundo. Repete cenas de misoginia cada vez mais comuns pelo mundo, dos EUA ao Brasil, Paquistão e Dubai.

Nas ruas londrinas, a história começou leve, com mulheres fantasiadas de personagens históricas: umas três foram de Rosalind Franklin - pioneira da biologia molecular na década de 20 -, outra foi vestida como a escritora do século XIX George Eliot, (pseudônimo de Mary Ann Evans), uma jornalista preferiu sair de “lésbica estilo anos 30”. Protestavam contra a decisão do ex-primeiro-ministro Winston Churchill de substituir na nota de 5 libras Elizabeth Fry, uma inglesa chamada de “o anjo das prisões” no século XVII. Todas achavam inaceitável só homens terem suas imagens reproduzidas nas notas de libra, um indiscutível símbolo de reconhecimento de sucesso, poder ou legado, visto por todos, praticamente todos os dias. Recolheram mais de 30 mil assinaturas e foram bem acolhidas pelo novo presidente do Banco da Inglaterra. Ele fez uma escolha blindada contra polêmicas: no lugar de Charles Darwin, a imagem da nota de 10 libras será, a partir do próximo mês, Jane Austen, a autora de “Orgulho e Preconceito”, uma unanimidade nacional.

Ou, pelo menos, achava-se, até tudo virar uma amarga discussão sobre estupro, poder e liberdade de expressão nas mídias sociais. A polícia já prendeu um homem de 21 anos - liberado sob fiança -, aconselhou às jornalistas que fiquem fora de casa e, neste início de investigações, acha que as ameaças vêm de várias pessoas postando anonimamente, ou seja, trollando. A violência das ameaças não combina com o tom bem comportado da campanha, mas as mulheres contam que são alvos frequentes de abusos semelhantes. A colunista Catlin Moran - também autora do livro Como ser uma mulher, editado pela Companhia das Letras no Brasil - iniciou um movimento para criar no Twitter um botão denunciando assédio, bullying ou ameaças, conquistando 120 mil assinaturas imediatamente.

“Nós estamos lidando com uma direita estabelecida e abertamente antifeminista”, diz Suzane Moore, em coluna no “Guardian” sexta-feira.

Nenhuma dúvida que mulheres são players no mundo contemporâneo, mas o absurdo teima em acontecer. No Brasil, as meninas da Marcha das Vadias também viraram alvo de ameaças no Twitter, e a presidente Dilma enfrentou pressões para não assinar a lei garantindo a pílula do dia seguinte em hospitais públicos às vítimas de violência sexual. Na moderna Dubai, meca da arquitetura e arte contemporâneas, uma norueguesa de 24 anos foi condenada a 16 meses de cadeia ao tentar fazer registro do estupro que sofrera. Nos Estados Unidos, a maluquice é igual ou maior: Ariel Castro, o homem condenado à prisão perpétua por manter em cárcere privado três mulheres em Cleveland, requereu o direito de ser visitado pela filha resultado de estupro.

Estas histórias não são pequenos incidentes isolados, aos poucos vão fazendo parecer “aceitáveis” crimes sexuais e redução de direitos. A nova estrela da política americana é Wendy Davis, a senadora do Texas, famosa nacionalmente após discursar na tribuna durante 21 horas seguidas para evitar a aprovação de uma lei que praticamente bane o aborto no estado. Para ficar em pé tanto tempo foi escorada por mulheres, todas de laranja, alternando-se na ajuda à senadora, lotando as galerias e pressionando os republicanos. Não adiantou: o governador de extrema-direita, Rick Perry, convocou uma sessão extra e aprovou a lei, adicionando mais uma restrição às 43 que entraram em vigor no ano passado.

A gente já viu que este ano é dos gays - vitoriosos na luta pelo direito de casar - mas tomara que 2013 não marque também um retrocesso na igualdade entre homens e mulheres, sejam elas héteros ou homos.

Fonte: O Globo, 04/08/2013

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