quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

Arquitetas ensinam mulheres da periferia a construir suas próprias casas

Nas oficinas, as mulheres aprendem juntas os princípios básicos
de construção civil. 
Foto: Facebook / Arquitetura da Periferia

Projeto “Arquitetura na Periferia” ensina mulheres a construir suas próprias casas

Em 2017, Cheyenne Pereira Miguel, a coordenadora do MLB (Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas), se mudou para a Ocupação Paulo Freire, em Belo Horizonte, e com a ajuda de seus irmãos, construíram sozinhos uma casa de madeirite – estrutura alinhada com a realidade das ocupações comunitárias, onde a população carece de assistência profissional de um engenheiro ou arquiteto.

Após concluírem a construção do último cômodo, Cheyenne já almejava melhorar a estrutura física da casa.
Queria aprender como fazer para não gastar tanto com mão de obra na minha casa.”
Com a ajuda da vizinha, Eliana Silva, a modelo fotográfica e limpadora de vidros descobriu o projeto Arquitetura na Periferia.

Foto: Facebook / Arquitetura da Periferia

Mulheres ensinando mulheres

O Arquitetura na Periferia surgiu em 2014 a partir de uma tese de mestrado da então estudante de arquitetura Carina Guedes. A iniciativa oferecia capacitação e assistência técnica para as mulheres de territórios com déficit de habitação e infraestrutura – como favelas, comunidades periféricas e ocupações.
Trabalhamos para que as mulheres tenham o máximo de autonomia no processo de tomada de decisões envolvendo a melhoria de suas casas”, diz Carina.
A cúpula do projeto é toda composta por mulheres, desde Carina, que deu origem à iniciativa, às suas colegas de trabalho – Marina Bornel, arquiteta, e as engenheiras civis Tereza Barros e Rafaela Dias.

O projeto Arquitetura na Periferia começou a atuar nas ocupações Paulo Freire e Eliana Silva, demonstrando que, embora as mulheres estejam, muitas vezes, à frente das lutas civis, “na construção civil e nas decisões de como a casa vai ser a maioria relata que suas vontades não são respeitadas, e algumas nem sequer são consultadas. São o pai, tio, marido ou pedreiro que decidem. Isso traz consequências ruins na vida das mulheres que, além do trabalho, cuidam da manutenção da casa, tais como: cozinhas sem ventilação, escadas estreitas, torneiras onde não se consegue enfiar o balde”, afirma a arquiteta.
Com oficinas de aprendizado com 4 a 6 meses de duração, as aulas começam com princípios de desenhos e croquis, noções básicas de finanças (para saber como lidar com o empréstimo recebido pelo projeto), matemática e como comprar os materiais necessários de construção.
É muito legal ver a transformação delas durante este processo: líderes comunitárias já reconhecidas nesse espaço de luta, mas não no doméstico, passam a ver que têm igualmente a mesma capacidade, e que a elas só falta o acesso à informação”, diz Carina.
O papel social da arquitetura

Apesar de nunca ter tido experiência pregressa à área de construção civil, Cheyenne já se vê pondo em prática tudo que aprendeu nas oficinas, como elétrica, alvenaria, assentamentos de pisos e até hidráulica.
Para um mulher militante de ocupação, esse aprendizado vai além da construção. Ele representa liberdade e conquista.”
Carina, mulher por trás do projeto, afirma que o Arquitetura na Periferia tem um importante cunho social: retirar a pecha de que a arquitetura se destina apenas à construção e melhoria de áreas ricas e privilegiadas, reconhecendo e reagindo às enormes desigualdades do Brasil.
Uma vez, fazendo uma pesquisa com uma moradora da Ocupação Dandara, vi que já havia um projeto de arquitetura para ela. Ela dizia que era lindo, mas quando perguntei porque não construiu, ela falou: ‘Não é para mim’. Do que adianta um projeto bonito se ele vai ficar na gaveta? O importante da assessoria técnica é reconhecer os hábitos e o desejo de quem mora”.
Fonte: ArchDaily, 02/02/2019

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