quarta-feira, 10 de maio de 2017

Sheryl Sandberg: "A batalha do feminismo ainda não acabou"

Sheryl Sandberg: "A batalha do feminismo ainda não acabou"
 ( Erin Lubin/Bloomberg/Getty Images )


Publiquei, em junho de 2011, uma matéria, de março daquele ano, intitulada Executivas 'neofeministas' dos EUA pregam ascensão agressiva. Nela, duas executivas americanas, Sheryl Sandberg (Facebook) e Marissa Mayer (Yahoo) foram destaque no debate sobre o avanço da mulher no mercado de trabalho e os obstáculos que permanecem à sua ascensão. No dia 09/11, a VEJA publicou entrevista com a Sheryl Sandberg dando conta de que o livro da executiva Faça Acontecer – Mulheres, Trabalho e a Vontade de Liderar está na lista dos mais vendidos nos EUA e também no Brasil.

O feminismo de Sandberg busca, no comportamento das próprias mulheres, sem negar os fatores externos naturalmente, a origem dos problemas femininos de ascensão no trabalho. Sem mimimi, procura incentivar as mulheres a serem mais assertivas em busca do sucesso profissional. Naturalmente, faltou falar, na entrevista, da raiz do problema das desigualdades entre os sexos: a educação diferenciada, uma educação mutiladora da individualidade de mulheres e homens desde o berço. Mas também aí já é querer demais.

Entretanto, apesar de ser um livro que busca a melhoria das condições de vida das mulheres na área do trabalho, neste ano de 2017,  organizadoras da marcha comemorativa do 8 de março, nos EUA, resolveram se opor a ele e seu feminismo empresarial que representaria apenas 1% das mulheres. O título do manifesto foi exatamente Para além do “faça acontecer”: por um feminismo dos 99% e uma greve internacional militante em 8 de março. Porque o feminismo que não é anticapitalista seria fauxminismo (feminismo falso) e outros blá-blá-blás.  

Entretanto, fauxminismo, feminismo falso, é somente aquele que fica apenas paparicando homem na Internet e alhures, passando pano para macho, no jargão atual das jovens feministas, e metendo o pau em outras correntes feministas, sem efetivamente fazer nada de concreto pelas mulheres. Infelizmente, é o caso de muitas feministas ditas liberais em nosso país, mas não o de Sandberg, uma mulher rica que tem a vida ganha e não precisaria estar se incomodando com a ascensão profissional de outras mulheres. Fora que essa história de que seu feminismo empresarial só representaria 1% das mulheres não corresponde aos fatos. Aqui no Brasil mesmo, as mulheres já são donas de 43% das empresas, e o número de empreendedoras não para de crescer. Então, mesmo neste nosso fim de mundo machista, Sandberg não está falando para somente 1% das mulheres. 

As brigas entre correntes feministas são um pé no peito descomunal e só demonstram que, mesmo feministas, não conseguem superar a educação para a rivalidade feminina que lhes é incutida desde o berço pela nossa cultura machista. Este caso da marcha do 8 de março americano mostra bem isso, refletindo inclusive uma grande incoerência das organizadoras. Enquanto resolviam fazer marcha atacando uma corrente feminista particular, de uma mulher de fato, convocavam mulheres de fachada, de fato homens (as tais trans), para participar do evento. Diga-se de passagem as mesmas trans que, na marcha anterior feita em protesto contra a eleição de Trump, deram um verdadeiro show de sexismo, querendo que as participantes não usassem cartazes com imagens de órgãos femininos porque isso as ofenderia.

Então, outra boa definição para fauxminismo é "aquele que tem mais solidariedade com homens personificando mulheres do que com mulheres de fato e de direito". Pessoalmente, sou totalmente favorável ao empreendedorismo, uma forma bastante concreta de empoderamento das mulheres reais dentro da realidade em que vivemos. 

Segue abaixo a entrevista e vídeo com palestra de Sandberg sobre o tema de seu livro.


Sheryl Sandberg: a paladina das mulheres

Em entrevista exclusiva, a COO do Facebook diz que as mulheres deveriam ocupar metade dos postos de liderança de governos e empresas. Esse é o tema de seu livro 'Faça Acontecer'

A executiva americana Sheryl Sandberg se consagrou neste ano como a principal porta-voz de uma espécie de feminismo revisado. Em seu best-seller Faça Acontecer – Mulheres, Trabalho e a Vontade de Liderar (Companhia das Letras; 272 páginas; 34,50 reais, ou 24 reais na versão digital), ela apresenta o problema:
“Faz mais de vinte anos que estou no mercado de trabalho, e muita coisa continua igual. É hora de encarar o fato: nossa revolução empacou. Promessa de igualdade e igualdade de fato são coisas diferentes.” E a solução? “Um mundo de fato igualitário seria aquele em que as mulheres comandassem metade dos países e das empresas e os homens dirigissem metade dos lares.”
Ela dá cara autobiográfica ao livro para mostrar como mulheres podem e devem alcançar a liderança em empresas. Além de suas palavras, o currículo de Sheryl, que há pouco completou 44 anos, é exemplar por si só. Formada em administração pela Universidade Harvard, ela trabalhou no Banco Mundial, foi chefe da equipe do secretário do Tesouro americano e vice-presidente do Google. Mas ganhou fama mesmo – e se tornou uma das mulheres mais influentes dos Estados Unidos –, ao assumir como COO (chefe do departamento de operações, na sigla em inglês; um dos cargos mais altos da companhia) do Facebook em 2008. Tornou-se uma famosa advogada dos direitos das mulheres dois anos depois, em 2010, ao apresentar uma inspiradora palestra sobre o assunto (confira o vídeo abaixo). Papel que se fortificou com a publicação de seu livro neste ano – que figurou nas listas de mais vendidos nos Estados Unidos e no Brasil. Na entrevista que Sheryl concedeu a VEJA, ela não quis se aprofundar nos negócios do Facebook, mas muito disse sobre o papel das mulheres como líderes globais.

Por que é importante ter mais mulheres em cargos de liderança?
Não há país no mundo com mais de 5% de suas empresas sob o comando de mulheres. Na América Latina, o porcentual é ainda menor, de menos de 2%. Mas temos 50% da população mundial de mulheres. Isso mostra o quanto não sabemos aproveitar o potencial e o talento dessa população. Warren Buffet [investidor americano e quarto homem mais rico do mundo] uma vez disse que só foi tão bem-sucedido por ter competido apenas com metade da população, a formada pelos homens. Imagine o aumento em produtividade que teríamos se homens e mulheres trabalhassem como iguais, dividindo postos de liderança. Também veríamos ambientes familiares mais saudáveis se homens repartissem com mulheres as tarefas domésticas.

No passado havia mais feministas, como você. O que mudou?
Na geração anterior à minha a batalha pelos direitos das mulheres era intensa. Mas minha geração começou a sentir, de forma falsa, que o trabalho estava feito. A vida me fez uma feminista quando vi que as mulheres ainda não são iguais no mercado de trabalho. Foi aí que reparei que a batalha não acabou.

O que as mulheres podem fazer para conquistar mais cargos de liderança?
Homens costumam se sentir mais confiantes no trabalho do que as mulheres. Vi isso em todos os lugares onde já fui fazer negócios no mundo. Em uma reunião, homens tendem a se sentar no centro da mesa ou na ponta dela. Mulheres, mesmo as de mesmo nível hierárquico que eles, escolhem cadeiras em posições desfavoráveis. Nas reuniões, homens falam mais e são mais ouvidos. Mulheres são interrompidas continuamente. Minhas dicas para as mulheres são: sente-se no melhor lugar da mesa, você merece, e fale com confiança. Para homens, digo: se você notar que a fala de uma mulher foi interrompida, pare a reunião e explique que ela deve continuar a falar. Nesse cenário, as empresas também têm de se adequar para compreender os desafios que as mulheres têm pela frente.

No Facebook as mulheres são mais participativas do que os homens. Isso pode indicar que elas são mais ouvidas agora do que no passado?
Esse não é o ponto. A questão é que mulheres têm de ser ouvidas no poder, no corpo executivo de uma empresa, em governos. Vemos muito mais homens do que mulheres nessas mesas. O Brasil tem uma mulher na presidência. E Dilma Rousseff conseguiu multiplicar por três a presença de mulheres em cargos de comando do governo, se comparado com a administração anterior. É algo bom, mas as mulheres ainda representam apenas um terço do gabinete de Dilma. Por que não 50%? Nos Estados Unidos foi tido como uma grande notícia o anúncio de que 20% do Senado seria composto por mulheres. Isso não é ideal. Novamente, precisamos de 50%.

O mundo digital é muitas vezes visto como sexista. No livro The Boy Kings (Os Reis Garotos, em tradução livre), Katherine Losse, uma ex-funcionária do Facebook, conta como se sentia num ambiente hostil às mulheres dentro da empresa e como via Mark Zuckerberg como um machista. Você sente isso no Facebook?
Não vou comentar esse livro. Mas considero o Facebook um grande lugar para as mulheres. Temos direitos de licença maternidade e paternidade iguais para mulheres e homens que trabalham no Facebook. E, o principal, falamos abertamente dos problemas que envolvem as questões de gênero. Trabalho com o Mark faz cinco anos e ele me dá todo o apoio para debater esse assunto.

Alguns podem achar que é mais fácil para você, uma executiva de sucesso, falar sobre o assunto do que para uma mulher pobre em um país como o Brasil ou de uma nação muçulmana onde reprimem as mulheres.
Sou sortuda por ter tido boas oportunidades na vida. Mas também tive de encarar problemas. Certa vez falei que escolho sair do trabalho às cinco e meia da tarde para ficar com meus filhos. A reação foi extremamente negativa por parte de muitos executivos. Mas eu ter mostrado que isso é possível e saudável agora ajuda muitos a poder tomar a mesma decisão. Por ter tido sucesso, vejo que tenho a responsabilidade de ajudar as mulheres a perceber as oportunidades pelas quais elas devem lutar.

Qual é sua opinião sobre mulheres que abandonam suas carreiras para se dedicar à família?
Acho que as mulheres têm de ter o poder de decidir sobre suas vidas. Se elas querem trabalhar, devem trabalhar. Se elas querem cuidar da família, é isso que devem fazer. Se querem fazer os dois, há essa opção. Temos de acabar com estereótipos. Mulheres podem trabalhar e chegar à liderança. Assim como homens devem ter a opção de abandonar suas carreiras para administrar tarefas domésticas. Ou ambos podem dividir ambas as responsabilidades.

Fonte: Veja, Vida Digital, 09/11/2013


Publicado originalmente em 11/11/2013

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