sexta-feira, 31 de março de 2017

Nas sociedades atuais, corremos o risco de fazer da censura a resposta padrão para qualquer opinião que nos ofenda

Julie Bindel é escritora, jornalista e feminista inglesa
Julie Bindel é a polêmica escritora, jornalista e feminista inglesa que mantém coluna no jornal britânico The Guardian. No vídeo abaixo, ela fala de como o "ofendidismo" vem se tornando um instrumento de censura contra todas as pessoas que contradizem a opinião dos chamados "guerreiros da justiça social" ou "politicamente corretos". Como ela reflete, não é possível banir tudo que nos ofende. Vale mais a pena ouvir os argumentos de quem discordamos não só para expandir nosso conhecimento, com outras visões de mundo, como para estabelecer estratégias racionais de resistência contra o que repudiamos.

Fiz uma edição da transcrição do vídeo, realizada pelo pessoal do site Fronteiras do Pensamento, de onde retirei o texto que se segue, para melhor compreensão.  

Julie Bindel: "Desculpe, mas não podemos banir tudo que lhe ofende"

Bloqueado nas mídias por amigos ou páginas? Teve comentários apagados de sites? Teve fotos removidas do Facebook? E perfis banidos? Encontrou problemas ao tentar discutir pontos de vista na faculdade ou com colegas de trabalho?

Há quem diga que o grande desafio atual é aprender a se sentir ofendido, pois seria este o ponto de partida para compreender outras visões de mundo. É o caso dos escritores Salman Rushdie, Ian McEwan ou Julie Bindel, que argumenta, nesta fala ao The Guardian, que “estamos rapidamente nos tornando uma sociedade em que a censura é o novo normal".

Veja abaixo a transcrição e o polêmico vídeo sobre censura e liberdade de expressão na contemporaneidade:


"Lamento, mas não podemos banir tudo que lhe ofende.

Em janeiro, mais de meio milhão de pessoas assinaram um abaixo-assinado para impedir a entrada de Donald Trump no Reino Unido.

Em 2015, a Conferência da União Nacional de Mulheres Estudantes  debateu banir o “cross-dressing (vestir-se com roupas do sexo oposto)" como fantasia, já que poderia ofender pessoas transgênero.

Eu tenho sido proibida de participar de debates pelos sindicatos de estudantes de todo o país. Em um debate, estudantes furiosos afirmaram que ficariam traumatizados se forçados a repetir minhas terríveis opiniões transfóbicas. Acontece que nenhum deles leu nada do meu trabalho.

O que aconteceu com a liberdade de expressão? Estamos rapidamente nos tornando uma sociedade na qual a censura é o novo normal.

Movimentos políticos, como os dos direitos civis dos negros americanos e o feminista, fizeram enormes progressos pois foram capazes de responsabilizar as pessoas por suas falas e atos.

Impedir as pessoas de manifestar publicamente suas opiniões não faz com que essas opiniões desapareçam.

Banir Donald Trump do Reino Unido não vai impedir os americanos de votarem nele.

Impedir Roosh V (escritor masculinista e antifeminista americano) de entrar no país... [áudio Roosh V: “Se legalizarmos o estupro, as mulheres terão maior cuidado com seus corpos...] ...não muda em nada o fato de que, no Reino Unido, uma média de 85 mil mulheres são estupradas e 400 mil abusadas sexualmente todo ano. Censurá-lo só nos cega sobre a existência das ideias que ele articula.

Vamos ouvir os argumentos defendidos por aqueles de quem discordamos para que possamos expandir nosso conhecimento e demonstrar uma resistência racional a eles.

Esse problema da censura está ficando cada vez pior e pior. Corremos o risco de fazer da censura a resposta padrão para qualquer opinião que nos ofenda.

A não ser que alguém esteja infringindo a lei, por incitar o crime com suas palavras, acredito que crime de fato seja não escutá-lo.


Fonte: Fronteiras do Pensamento, por Julie Bindel/The Guardian, 12/02/2016

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