8 de Março:

A origem revisitada do Dia Internacional da Mulher

Mulheres samurais

no Japão medieval

Quando Deus era mulher:

sociedades mais pacíficas e participativas

Aserá,

a esposa de Deus que foi apagada da História

quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

Boas Festas e Feliz 2014


Nosso blog entra em breve recesso até dia 6 de janeiro, quando volta ao seu ritmo normal. Agradecemos a todas as leitoras e todos os leitores pela companhia em 2013 e desejamos um 2014 pleno de saúde e realizações em todos os aspectos da vida.

 Até 2014. Um abraço!

 Míriam Martinho

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Absurdo: falar mal de filho de Lula mesmo em ambiente privado pode dar processo

Tal pai tal filho
Vamos de mal a pior. Desde quando falar seja o que for seja de quem for em ambiente privado é considerado dano moral? Só podia ser coisa ligada ao petismo, ao filho do puto do Lula. 

O único juiz sensato no caso foi o desembargador Elliot Akel, eleito corregedor-geral da Justiça no começo do mês. Ele votou pela absolvição do empresário, por entender que a conversa com o jornalista ocorreu em âmbito privado. Em tal situação, segundo Akel, “todos são livres para expressar suas opiniões pessoais”, e a condenação impossibilitaria que qualquer pessoa expressasse sua opinião sobre outros cidadãos para terceiros.

Falar mal de terceiro em conversa gravada gera dano moral

Mesmo que não tenham sido publicados, comentários ofensivos à imagem de um cidadão podem render processo por dano moral caso este tenha conhecimento de seu conteúdo. Isso ocorre porque, mesmo que determinada opinião tenha sido proferida em ambiente familiar ou particular, sem repercussão pública, não é possível admitir qualquer comentário ofensivo à dignidade ou ao decoro de um terceiro. Afinal, diz a Constituição, tanto a imagem como a honra da pessoa são invioláveis. A consequência de tal ato deve ser a reparação do mal causado por tais falas. Este entendimento foi adotado, em maioria de votos, pela 1ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo para dar provimento parcial ao recurso de Fábio Luis Lula da Silva, filho do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. São réus no caso o empresário Alexandre Paes dos Santos e o jornalista Alexandre Oltramari, da revista Veja.

Durante diálogo com o jornalista Alexandre Paes dos Santos classificou o filho do ex-presidente como “um primário", “um idiota”, “uma decepção”. Ele também disse que Lulinha (foto) “tem uma disfunção qualquer”, por chamar a presidente Dilma Rousseff de "tia". A conversa não foi publicada na reportagem da revista Veja, mas, foi degravada na ação que Lulinha moveu contra a revista por causa da notícia. Sua degravação e anexação aos autos daquele processo motivou a Ação de Responsabilidade Civil — rejeitada em primeira instância e que chegou ao TJ-SP por meio de Apelação Cível, onde foi aceita.

Defendido pelos advogados Roberto Teixeira e Cristiano Zanin Martins, do Teixeira, Martins & Advogados, Fabio Luis Lula da Silva afirmou que as palavras e exceções são ofensivas por si só, e incompatíveis com sua conduta pessoal e profissional. Relator do caso, o desembargador Alcides Leopoldo e Silva Júnior apontou que Alexandre Paes dos Santos não negou que tenha usado as expressões citadas, afirmando, porém, que os termos não foram publicados e que não é proibido a ninguém manifestar, em diálogo privado, suas opiniões, mesmo que fortes.

Citando precedente do Superior Tribunal de Justiça, o relator definiu injúria como a formulação de “juízos de valor, exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos que importem menoscabo, ultraje ou vilipêndio de alguém”. De acordo com ele, ao usar atributos negativos para descrever Fábio Luis Lula da Silva, o empresário "teve “inequívoca intenção” de ofender a vítima e, mesmo que as opiniões não tenham sido publicadas, o fato de chegarem ao filho do ex-presidente caracteriza dano moral.

Na visão dele, não houve qualquer dano causado pelo jornalista Alexandre Oltramari, pois ele limitou-se a afirmar que “é um garoto que joga videogame”. Mesmo que o filho de Lula tivesse 30 anos à época dos fatos, a afirmação não pode ser ofensiva, afirmou Alcides Leopoldo e Silva Júnior. Ele justificou esta opinião com base em um estudo da Universidade de Denver (EUA) que revela aumento na produtividade pessoal e profissional de quem adere à prática, disseminada entre pilotos, cirurgiões e outros profissionais renomados.

Ele votou pela condenação de Alexandre Paes dos Santos ao pagamento de R$ 5 mil por danos morais, sendo acompanhado pela desembargadora Christiane Santini. Ficou vencido o desembargador Elliot Akel, eleito corregedor-geral da Justiça no começo do mês. Ele votou pela absolvição do empresário, por entender que a conversa com o jornalista ocorreu em âmbito privado. Em tal situação, segundo Akel, “todos são livres para expressar suas opiniões pessoais”, e a condenação impossibilitaria que qualquer pessoa expressasse sua opinião sobre outros cidadãos para terceiros.

Clique aqui para ler o voto vencedor.
Clique aqui para ler o voto de Elliot Akel.

Fonte: Conjur, Gabriel Mandel, 20/12/2013

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

O financiamento público de campanhas obrigará os eleitores a bancar políticos que condenam



Excelente artigo de Demétrio Magnoli sobre a mais nova picaretagem do petismo para realização de seu projeto de poder eterno, desta feita - pasmem - em cumplicidade com a OAB. Destaco:
A OAB alega defender um princípio político, mas, de fato, promove um fim partidário: a instauração do financiamento público de campanha. Nesse passo, a entidade dos advogados rebaixa-se à condição de linha auxiliar do PT e agrava o mal que reivindica combater.
Sem uma reforma política e eleitoral, o vácuo nos cofres partidários gerado pela proibição de doações empresariais empurrará o Congresso à aprovação do financiamento público — coincidentemente, uma proposta do PT que não obteve apoio parlamentar. 
No fim do arco-íris, a ação movida pela OAB completará a estatização dos partidos políticos, tornando-os ainda menos permeáveis à vontade dos cidadãos. O indômito Coelho que invoca a “população nas ruas” serve, efetivamente, aos interesses dos políticos nos gabinetes — e tem especial apreço por certos gabinetes.
No seu principismo seletivo, a OAB ignorou, ainda, o princípio da liberdade de consciência. A substituição do financiamento empresarial de campanha pelo financiamento público, o fruto provável da ação dos ínclitos advogados, agride diretamente o direito dos cidadãos de não contribuírem com partidos que não representam sua visão de mundo. 
Diga-me, Coelho: por que devo transferir dinheiro para um anacrônico defensor da ditadura militar, como Jair Bolsonaro, ou para um partido que celebra figuras condenadas por corrupção no STF, como o PT?
Partidobrás

“As manifestações da população nas ruas mostraram que há uma crise muito profunda no modelo de representatividade. A origem desse mal está no sistema eleitoral”.

Desse diagnóstico, expresso por seu presidente, Marcus Vinicius Coelho, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) extraiu a ação de inconstitucionalidade contra o financiamento empresarial de campanha em julgamento no STF.

A OAB alega defender um princípio político, mas, de fato, promove um fim partidário: a instauração do financiamento público de campanha. Nesse passo, a entidade dos advogados rebaixa-se à condição de linha auxiliar do PT e agrava o mal que reivindica combater.

“O poder emana do povo, não das empresas”, proclamou o eloquente Coelho, argumentando que o financiamento empresarial viola o princípio da igualdade política e inclina as eleições na direção do dinheiro.

Na prática, não é bem assim: os empresários doam para todos os partidos relevantes e são mais generosos com aqueles que ocupam o poder, como evidenciam as prestações de contas do PT nas campanhas de 2006 e 2010. Contudo, em tese, o argumento filosófico tem valor: a sociedade política é constituída por cidadãos, não por companhias.

O problema é que, entre os inúmeros princípios constitucionais violados por nosso sistema eleitoral, a OAB selecionou caprichosamente apenas um — e isso converte em vício a aparente virtude de seu impulso reformista.

Nas eleições de 2010, 98% das receitas de Dilma e Serra originaram-se de pessoas jurídicas. Sem uma reforma política e eleitoral, o vácuo nos cofres partidários gerado pela proibição de doações empresariais empurrará o Congresso à aprovação do financiamento público — coincidentemente, uma proposta do PT que não obteve apoio parlamentar.

No fim do arco-íris, a ação movida pela OAB completará a estatização dos partidos políticos, tornando-os ainda menos permeáveis à vontade dos cidadãos. O indômito Coelho que invoca a “população nas ruas” serve, efetivamente, aos interesses dos políticos nos gabinetes — e tem especial apreço por certos gabinetes.

No seu principismo seletivo, a OAB ignorou o princípio da liberdade partidária. O Brasil tem cerca de três dezenas de partidos, mas não tem liberdade partidária. Por aqui, curiosamente, um tribunal especializado decide sobre a existência legal de um partido com base em regras arcanas sobre números e distribuição geográfica de assinaturas.

A recusa do registro da Rede, de Marina Silva, equivale à cassação da expressão partidária de uma vasta parcela do eleitorado. Coelho não enxerga nesse escândalo uma flagrante inconstitucionalidade. É que os doutos líderes da entidade dos advogados concordam com o traço mais antidemocrático de nosso sistema eleitoral: a natureza compulsoriamente estatal dos partidos políticos.

A Justiça Eleitoral, uma herança do varguismo, cumpre essencialmente a função de oficializar os partidos políticos, um ato que lhes abre as portas para o acesso a recursos públicos (o Fundo Partidário e o horário de propaganda eletrônica). Daí deriva o dinamismo da indústria de criação de partidos, tão ativa quanto a de fundação de sindicatos e igrejas.

Um partido é um negócio, que se faz às custas do bolso de contribuintes indefesos. Mas, na santa indignação de Coelho, a invocação do “povo” não passa de uma estratégia retórica. “O poder emana do Estado e dos partidos, não do povo” — diria o presidente da OAB se ousasse ser sincero.

No seu principismo seletivo, a OAB ignorou, ainda, o princípio da liberdade de consciência. A substituição do financiamento empresarial de campanha pelo financiamento público, o fruto provável da ação dos ínclitos advogados, agride diretamente o direito dos cidadãos de não contribuírem com partidos que não representam sua visão de mundo.

Diga-me, Coelho: por que devo transferir dinheiro para um anacrônico defensor da ditadura militar, como Jair Bolsonaro, ou para um partido que celebra figuras condenadas por corrupção no STF, como o PT?

A OAB ilude os incautos quando alega se insurgir contra o atual sistema eleitoral. De fato, ao empurrar o Congresso para a alternativa do financiamento público, o que faz é completar o edifício político e jurídico da estatização dos partidos.

Nesse passo, os partidos alcançam uma “liberdade” absoluta — isto é, libertam-se inteiramente da necessidade de obter apoio financeiro dos eleitores. Não, Coelho, não venha com esse papo de “povo”: a ação que a OAB patrocina é uma oferenda à elite política e um escárnio do conceito de representação.

Uma reforma democrática do sistema eleitoral solicitaria enfrentar o conjunto das violações de princípios que formam a cena desoladora repudiada pelas “manifestações da população nas ruas”. Intelectualmente, é fácil imaginar um sistema decente.

Elimine-se a Justiça Eleitoral: qualquer grupo de cidadãos deve ter o direito de formar um partido e disputar eleições. Fora com o Fundo Partidário: partidos são entes privados e, portanto, devem se financiar junto a seus apoiadores. Fora com as coligações proporcionais: partidos servem para veicular programas, não para comercializar minutos na televisão. Abaixo as campanhas milionárias: voto distrital misto e limitação obrigatória dos custos de propaganda política. Só nesse contexto seria apropriado proibir o financiamento empresarial de campanha e estabelecer limites razoáveis para contribuições privadas.

Na prática, uma reforma segundo essas linhas enfrenta ferrenha resistência da elite política, que se beneficia das inúmeras distorções de nosso sistema eleitoral. Os políticos não querem abrir mão das benesses estatais e dos truques que lhes permitem escapar do escrutínio dos eleitores.

Meses atrás, o castelo no qual se entrincheiram foi assediado pelas manifestações de rua. Para sorte deles, e azar nosso, a OAB de Coelho decidiu erguer uma paliçada defensiva.

Fonte: O Globo, 20/12/2013

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Dez anos de PT e a saúde pública entrou em colapso


O corredor da morte nos hospitais
Faltam roupas, remédios, leitos. Faltam médicos, anestesistas, enfermeiros. Falta vergonha

Ruth de Aquino

"Aqui, olha, deixam a gente na musiquinha”, disse a recepcionista do Hospital Barra d’Or, no Rio de Janeiro, apontando para o telefone em viva voz. Ela tentava, sem sucesso, autorização do Bradesco Saúde para Hélio Araújo ser atendido na emergência. Hélio tem 91 anos e é meu pai. Sofreu uma queda em casa, e um armário caiu por cima dele. Esperava na cadeira de rodas, a mão enfaixada, pingando sangue no lobby do hospital. Não sabíamos se havia fratura da mão ou um dano no crânio. Meus pais pagam R$ 2.440 por mês ao plano de saúde. A mesma seguradora desde 1978.

“Não autorizaram emergência, só internação. Também não autorizaram tomografia cerebral. Estou tentando o raio-X”, disse a recepcionista. “Então pago tudo particular, depois abro um processo”, disse eu. Só assim ele foi atendido, “no particular”, após horas de incerteza. Ficamos no hospital das 20 horas às 4 horas da manhã. Na saída, surpresa: não foi preciso pagar nada. Mas a recepcionista teve de insistir horas, houve discussão e estresse. É o caso de um paciente de elite, que enfrenta os maus-tratos comuns dos planos.

O buraco é bem mais embaixo na saúde pública do Brasil. Sinto náuseas ao ver multidões de pacientes, de crianças a idosos, dormindo em filas diante dos hospitais, com senhas só para “agendar a consulta”, e não para atendimento. As senhas acabam. As pessoas choram. Estão vulneráveis, doentes, frágeis, sentem-se humilhadas, escorraçadas. Gosto de cachorros, mas acho que a sociedade tem se escandalizado mais com o tratamento dispensado a cães do que a seres humanos.

O estado deprimente e indigno de nossa Saúde é o maior atestado de que a ideologia política de um governo não garante o respeito aos direitos básicos escritos na Constituição brasileira. Temos uma década de governo “de esquerda” – já que o PT se considera um partido do povo. O que existe diante dos hospitais é a fila da vergonha. Nossas emergências e nossos postos de saúde estão em colapso.

No Rio, há 12.500 pacientes à espera de cirurgia em hospitais federais. Alguns esperam há sete anos. Os dados são da semana passada, levantados pela Defensoria Pública da União. Os defensores decidiram processar o Ministério da Saúde. Querem um cronograma oficial de cirurgias no prazo máximo de dois meses. Exigem que o ministério pague uma indenização coletiva aos pacientes, de R$ 1,2 bilhão.

Os doentes morrem na fila da cirurgia. Cirurgias vasculares, cardíacas, neurológicas, ortopédicas, urológicas, oftalmológicas e torácicas. Os médicos se descabelam por falta de tudo. Sem parafusos e placas, idosos não podem ser operados num dos maiores hospitais do Rio. Uns pedem material emprestado a outros. De nada adianta. A precariedade é o artigo mais em alta nos hospitais federais, estaduais e municipais. O jogo de empurra entre as esferas de governo é conhecido. União, Estados e municípios se mostram incompetentes e venais na oferta de serviço de Saúde. Levam pacientes à histeria, pelo sentimento continuado de impotência.

O programa Globo repórter da última sexta-feira 13, chamado “Emergência médica”, equivale a um filme de terror. Só que é tudo verdade. Durante 40 dias, primeiro com câmeras escondidas, depois oficialmente, uma equipe de repórteres e cinegrafistas voltou aos mesmos hospitais e postos de saúde da família denunciados há quase três anos pela TV Globo, para ver o que mudara. Nada. Em Belém ou no entorno de Brasília, não importa, a calamidade na Saúde rima com crueldade.

Pacientes dividem a mesma maca, quando não estão no chão. Um médico de macacão atende pacientes coletivamente, como se estivéssemos em guerra. Em março de 2011, em Belém, uma menina, Ruth, morreu na frente da câmera dos jornalistas. Tinha vindo de uma ilha, com uma leishmaniose que virou pneumonia. Não resistiu à falta de estrutura dos hospitais. Médicos diziam que nada poderiam fazer, não havia material nem esperança. Os jornalistas voltaram agora à casa da família de Ruth. Os parentes nunca receberam indenização. Ninguém é culpado jamais.

Faltam roupas para operar no centro cirúrgico. Faltam leitos. Faltam médicos, anestesistas, enfermeiros. Falta salário. Faltam remédios. Falta vergonha.

Minha empregada, Lindinalva Souza, estimulada pelas campanhas do governo de prevenção de câncer nos seios, foi à Clínica da Família em Campo Grande, Zona Oeste do Rio, pedir uma mamografia. Faz quatro meses. “Quando tiver uma vaga, a gente te chama”, disse a agente de saúde. “Por enquanto, só estamos atendendo diabéticos, hipertensos e grávidas.” Que resposta é essa?

E, assim, brasileiros e brasileiras anônimos somem para sempre no corredor da morte, ignorados pelos governos, que gastam nossos impostos com sei lá o quê.

Fonte: Época, 17/12/2013

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Fundamentalismo religioso: Traficantes evangélicos expulsam candomblé das favelas


Adepta de culto afro em sua nova casa: crença desrespeitada -
Foto: Urbano Erbiste / Agência O Globo

Traficantes proíbem candomblé e até roupa branca em favelas

Pais de santo dizem que perseguição começou após conversão de criminosos a religiões evangélicas

RIO - A roupa branca no varal era o único indício da religião da filha de santo, que, até 2010, morava no Morro do Amor, no Lins de Vasconcelos. Iniciada no candomblé em 2005, ela logo soube que deveria esconder sua fé: os traficantes da favela, frequentadores de igrejas evangélicas, não toleravam a “macumba”. Terreiros, roupas brancas e adereços que denunciassem a crença já haviam sido proibidos, há pelo menos cinco anos, em todo o morro. Por isso, ela saía da comunidade rumo a seu terreiro, na Zona Oeste, sempre com roupas comuns. O vestido branco ia na bolsa. Um dia, por descuido, deixou a “roupa de santo” no varal. Na semana seguinte, saiu do morro, expulsa pelos bandidos, para não mais voltar.

— Não dava mais para suportar as ameaças. Lá, ser do candomblé é proibido. Não existem mais terreiros, e quem pratica a religião faz isso de modo clandestino — conta a filha de santo, que se mudou para a Zona Oeste.

Já há registros na Associação de Proteção dos Amigos e Adeptos do Culto Afro-Brasileiro e Espírita de pelo menos 40 pais e mães de santo expulsos de favelas da Zona Norte pelo tráfico. Em alguns locais, como no Lins e na Serrinha, em Madureira, além do fechamento dos terreiros, também foi proibido o uso de colares afros e roupas brancas. De acordo com quatro pais de santo que passaram pela situação e foram ouvidos pelo jornal “Extra”, o motivo das expulsões é o mesmo: a conversão dos chefes do tráfico a denominações evangélicas.

E a intolerância religiosa não é exclusividade de uma só facção criminosa. Distante 13 quilômetros do Lins e ocupado por um grupo rival, o Parque Colúmbia, na Pavuna, tem realidade parecida: a expulsão dos terreiros, acompanhada de perto pelo crescimento de igrejas evangélicas. Desinformada sobre as “regras locais”, uma mãe de santo tentou fundar ali seu terreiro. Logo recebeu a visita do presidente da associação de moradores, que a alertou: atabaques e despachos eram proibidos ali.

— Tive que sair fugida. Tentei permanecer, só com consultas. Mas eles não gostaram — afirma.

Conselho: UPP é solução

A situação já é do conhecimento de pelo menos um órgão do governo: o Conselho Estadual de Direitos do Negro (Cedine). O presidente do órgão, Roberto dos Santos, diz que já foram encaminhadas denúncias ao Cedine:

— Mas a intolerância armada só pode ser vencida com a chegada do Estado a esses locais, com as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs).

Fernando Gomes de Freitas, o Fernandinho Guarabu, chefe do tráfico no Morro do Dendê, na Ilha do Governador, ostenta no antebraço direito uma tatuagem com o nome de Jesus Cristo. Pela casa, Bíblias por todos os lados. Mas em seus domínios reina o preconceito: enquanto os muros da favela recebiam dizeres bíblicos, os dez terreiros que funcionavam no local deixaram de existir.

Guarabu passou a frequentar a Assembleia de Deus Ministério Monte Sinai em 2006 e se converteu. A partir daí, quem andasse de branco pela favela era “convidado a sair”. A situação se repete na Serrinha, ocupada pela mesma facção criminosa.

Segundo a lei 7.716/89, o crime de intolerância religiosa não prescreve e é punido com pena de um a três anos de detenção.

Fonte: O Globo, RAFAEL SOARES , 10/09/13

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Como se pode esperar bons serviços públicos, se os funcionários não são selecionados por mérito?

Funcionário público joga paciência enquanto povo aguarda atendimento na fila
O artigo é do mês passado, mas nem um pouco defasado. Mais de 80% dos servidores públicos de nível federal não são escolhidos por processo formal baseado em competência. Não por menos os serviços públicos são tão ruins, embora paguemos uma fortuna de impostos para mantê-los. Quando teremos uma mudança de mentalidade no Brasil?Não por menos o PT se mantém no poder e perigas de ficar mais alguns anos.

75% dos órgãos públicos do Brasil não selecionam gestores por mérito, diz pesquisa

De cada quatro órgãos públicos na área federal, três não escolhem seus gestores por processo formal baseado em competência. E apenas dois órgãos de cada quatro estipulam metas de desempenho individual ou de suas equipes.

É o que revela uma auditoria do TCU (Tribunal de Contas da União) feita em 303 órgãos federais de toda a administração, o que inclui ministérios, estatais, agências reguladoras, órgãos do legislativo e do judiciário, envolvendo mais de 80% dos servidores públicos de nível federal.

O trabalho foi realizado ao longo deste ano. Um questionário de 101 perguntas, dividido em oito temas, foi encaminhado aos gestores de cada organização. Vinte e cinco órgãos não responderam os questionamentos e foram retirados da pesquisa.

Entre os questionamentos estava perguntas sobre critérios de escolha de chefes pelo mérito, se havia metas de desempenho, como era o processo sucessório ou se os trabalhadores recebem algum tipo de treinamento, por exemplo.

As respostas dadas pelos gestores para cada pergunta viraram notas de 0 a 10 para cada item pesquisado em cada órgão. Depois, uma nota geral foi dada para cada organização. O tribunal classificou os órgãos em três níveis de qualidade: inicial, com notas de 0 a 4; intermediário, com notas de 4 a 7; e avançado, com notas de 7 a 10.

Segundo a avaliação do órgão de controle, apenas 7% dos órgãos estão no nível avançado, com nota acima de 7. No nível intermediário foram encontrados 37% dos órgãos e os 56% restantes receberam notas abaixo de 4.

Os nomes dos órgãos pesquisados não será divulgado pelo TCU, segundo o ministro relator, Marcos Bemquerer. Segundo ele, para garantir respostas fidedignas dos órgãos, o TCU garantiu aos gestores que as notas dadas ao órgão não seriam reveladas. Mas os gestores vão receber um relatório com sua avaliação para que tomem as providências adequadas para melhorar a qualidade.

"Um gestor veio aqui nos dizer que ele iria contratar uma consultoria para fazer esse trabalho que nós fizemos. Ele disse que vai economizar R$ 1 milhão com isso", disse Bemquerer.

SETORES

As notas foram divulgadas por setor. A área do governo federal que teve as piores notas foi a da Agricultura, onde 83% dos órgãos pesquisados receberam nota até 4. O setor de educação, onde foram pesquisadas as órgãos do ministério da Educação, universidades e institutos federais, teve 63% dos seus unidades com nota até 4. O setor de energia tem o menor índice de órgãos com nota ruim, 22%.

Em relação aos tipos de órgãos públicos, os tribunais foram os piores avaliados, com 71% de suas unidades avaliadas com nota até 4. Das instituições de ensino, 62% ficaram no pior nível de avaliação, o mesmo número das autarquias e agências reguladoras pesquisadas. No caso dos ministérios, 52% ficaram no pior índice de avaliação e nenhum alcançou nota acima de 7.

As estatais, com apenas 34% de seus órgãos com avaliação baixa, e as instituições militares, com nenhuma delas mal avaliadas e todas acima de 7, ficaram com as melhores avaliações.

'ATITUDE ABSURDA'

O presidente do TCU, ministro Augusto Nardes, aproveitou a divulgação dos dados mostrando a má qualidade dos órgãos públicos federais no setor de pessoal para rebater as críticas ao tribunal relativas à sugestão de paralisação de obras feita ao Congresso. A presidente Dilma Rousseff, em entrevista, chamou a atitude do órgão de "absurda".

Nardes citou o caso do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) que, segundo ele, tem 140 obras paradas sendo que apenas duas por determinação do TCU.

"Quem nos critica [por sugerir a paralisação de obras] que faça planejamento, faça uma avaliação da sua gestão no comando de sua instituição e veja se seus funcionários estão bem treinados. É mais fácil acusar o TCU [pelos problemas]", afirmou Nardes.

Fonte: Dimi Amora, Folha de São Paulo, 13/11/2013

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Últimas palavras sobre Mandela e os judeuzinhos comunistas e conspiratórios

Findas as homenagens a Nelson Mandela e a cerimônia de seu sepultamento,cumpre resumir o que escrevi sobre ele. Em Nelson Mandela, admirável mesmo! falei do fla-flu esquerdireitista em torno do grande líder, com os esquerdistas enaltecendo seus tempos de luta armada e os direitistas tentando desmerecê-lo pela mesma razão, acusando-o de comunista e terrorista.

Para provar que era comunista, postaram imagem de Mandela abraçado a Fidel Castro e descontextualizaram historicamente sua luta contra o apartheid, retirando suas ações de sabotagem contra a tirania racista do contexto de terrorismo de Estado mantido pelos afrikaners. Como se fosse possível esquecer que a polícia racista respondia aos atos de desobediência civil pacífica  dos negros metralhando centenas de civis em praça pública (incluindo crianças).

Entretanto, qualquer pessoa minimamente honesta sabe que ter simpatia pelo socialismo ou comunismo, antes da década do muro de Berlim e do colapso dos regimes comunistas no início da década de 90, tem uma conotação totalmente distinta de se dizer simpatizante desta ideologia nos dias de hoje. Pra ficar só em termos de Brasil, muitos dos neocons tupiniquins, alguns que inclusive tentaram desmerecer Mandela por suas tendências marxistas, foram, no mesmo período histórico, também partidários das vertentes vermelhas. O hoje ultraconservador Olavo de Carvalho foi militante comunista. Reinaldo Azevedo foi trotskista, membro do Liberdade e Luta (Libelu), embora sobre a figura de Mandela tenha feito um artigo respeitoso, ainda que realista. E não seria difícil achar outros que passaram do extremismo de esquerda para o de direita.

Em outras palavras, tentar desconstruir Mandela por seu passado de luta armada e sua ligação com o partido comunista africano, postando fotozinhas dele com líderes comunistas, é desonestidade intelectual da grossa. Para apontá-la, fiz a montagem acima onde posiciono, ao lado da foto de Mandela com Fidel, usada para "incriminá-lo como comunista", foto do líder conservador Winston Churchill ao lado de, nada mais nada menos, Joseph Stálin, um dos maiores genocidas que o comunismo produziu. Durante a Segunda Guerra Mundial, para derrotar Hitler, Churchill teria feito aliança com o líder da então União Soviética por ser brilhante estrategista e não ter outra saída.

Essa história, contudo, parece ser mais uma daquelas mal contadas. Segundo artigo postado no Instituto Mises, Rethinking Churchill, o primeiro-ministro britânico via Stálin como mais do que simplesmente um grande sapo a engolir. Nutriu por ele simpatia e o abraçou como amigo, chamava-o de Tio Joe, dizia publicamente que o apreciava e chegou a presenteá-lo com uma espada de cruzado durante a Conferência de Teerã (1943). Lendo esse artigo sobre Churchill, de um insuspeito site de direita, pode-se concluir que, embora Churchill tenha tido papel importante no combate ao nazismo, sua trajetória política foi bem mais controversa do que a de Mandela.

Mandela foi um homem pragmático que buscou vencer o apartheid pelas vias possíveis, nos diferentes momentos de sua vida, muitas vezes de forma aparentemente contraditória. Foi um nacionalista negro e um não-racialista, um adepto das ações não-violentas e um integrante da luta armada, às vezes cabeça quente, às vezes o mais calmo dos homens, simpatizante de ideias marxistas e admirador das democracias ocidentais, parceiro íntimo dos comunistas e, durante sua presidência, igualmente parceiro íntimo dos mais poderosos capitalistas da África do Sul.

Dessa forma, Bill Keller, do New York Times, definiu Mandela, em seu artigo Nelson Mandela, Communist. Disse também que, durante um de seus inúmeros julgamentos, perguntado se era comunista, Mandela respondeu de forma a um tempo elusiva e perfeitamente clara:
Se, por comunista, você quer dizer um membro do Partido Comunista, uma pessoa que acredita na teoria de Marx, Engels, Lênin e Stálin e aderiu estritamente à disciplina  do partido, eu não me tornei comunista.
Obviamente, repetindo meu primeiro artigo sobre o líder sul-africano, as homenagens que o mundo prestou a Mandela não foram baseadas em sua trajetória de adepto da luta armada e por suas inclinações esquerdistas. O mundo o homenageou exatamente pela superação de tudo isso em prol da democratização e da integração racial da África do Sul. Após 27 anos de cadeia, o homem saiu da prisão disposto a transcender sua tragédia pessoal em benefício de seu povo e de seu país. Todas as pessoas de bom senso e sensibilidade política reconheceram nisso sua grandeza, exemplo raro de político no mundo inteiro, sem contudo deixar de apontar seus humanos erros e contradições. Apenas os neocons, em seu fanatismo e cegueira ideológica, procuraram defenestrá-lo e a todos que o homenagearam por sua trajetória excepcional.

Nesse sentido inclusive, registro até que ponto chegaram os adeptos dessa seita, pois o evento muito me impressionou. Tratou-se de caso envolvendo o jornalista Caio Blinder, do Manhattan Connection, que foi agredido, por uma conservadora histérica, em sua coluna da Veja, com a seguinte frase: "Você é um judeuzinho muito asqueroso, mesmo! Assim como os outros da sua laia, todos comunistas e conspiratórios!" Reproduzo o original abaixo.
Érica Medeiros-08/12/2013 às 23:01 
Você é um judeuzinho muito asqueroso, mesmo! Assim como os outros da sua laia, todos comunistas e conspiratórios!
Publicado com fins educacionais, CaioPS- lição encerrada e fracassada. Eu pediria aos leitores que não contestassem esta pessoa, pois não publicarei os comentários a respeito. Tampouco, os comentários dela doravante, abs, Caio
Ele a citou, em uma de suas postagens sobre Mandela, e, após identificar a pérola antissemita, deu-lhe o devido bloqueio. Repassou também o link do artigo que citei sobre o "comunismo" de Mandela, declarando:
Foi uma luta (a de Mandela) complexa e com contradições, algo que funde a cabeça de absolutistas que preferem simplificar ou rotular. Uma leitora da coluna criou celeuma com alguns comentários esbaforidos e infelizes. Disse, entre outras coisas, que sou mancomunado com a aristocracia esquerdista de Nova York. Para ser coerente, ofereço a todos um texto de um príncipe do New York Times, Bill Keller, ex-editor-chefe do jornal e ex-correspondente em Moscou e Johanesburgo. O artigo é sofisticado e não permite avaliações simplórias sobre o prontuário de Mandela, os motivos e nos brinda com um final de história intrigante. Boa leitura.

Exatamente: a  luta de Mandela foi complexa e com contradições, algo que funde a cabeça de absolutistas que preferem simplificar ou rotular. E como os absolutistas andam em voga no Brasil de hoje! Antes tínhamos só os socialistas bolivarianos patrulhando e demonizando todo o mundo que simplesmente não concorda com eles. Agora temos também os neocons fazendo a mesmíssima coisa, mostrando como todos os autoritários são no fundo farinha do mesmo saco. 

Mais uma razão, portanto, para celebrar pessoas como Mandela que se caracterizou por construir pontes sobre o impossível em vez de levantar ou reforçar muros intransponíveis ao futuro. Que seu exemplo sirva para o Brasil de hoje tão povoado de estúpidos antagonismos. Descanse em paz, Madiba! Mesmo! 

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Mais um questiona o esquerdireitismo: Sou de esquerda ou de direita?

Contardo Calligaris
Contardo Calligaris (psicanalista, doutor em psicologia clínica e escritor) escreveu o ótimo artigo abaixo, Sou de Esquerda ou de Direita?, para sua coluna de ontem (12/12/13), na Folha de São Paulo, questionando essa divisão maniqueísta, pela qual muitos se batem, mas que está longe de ter uma definição precisa. 

Só não concordo quando diz que a direita nos EUA era libertária (como se espera da direita, ela não gostava que o governo se metesse na vida da gente) mas hoje adora tutelar os cidadãos (todos vulneráveis e meio incapazes, não é?) e tenta promover leis que regrem o comportamento de todos segundo seus "princípios".

Mesmo, nos EUA, os conservadores sempre integraram a direita (aliás, a direita nasce com eles na época da Revolução Francesa), e eles sempre adoraram e continuando adorando querer reger o comportamento de todos segundo seus "princípios". Pessoalmente, acho que os libertários (como, aliás, vem acontecendo) devem deixar a direita para os conservas e seguir um caminho independente. A escritora Ayn Rand já alertava sobre a contraproducência desse enlace para quem de fato defende a liberdade 
 não só econômica mas também individual.

No mais, o texto é ótimo e mostra bem o quanto é confuso, para qualquer pessoa mais exigente, essa polarização esquerda-direita neste início de século XXI.

Sou de esquerda ou de direita?

Li a pesquisa do Datafolha publicada na Folha de domingo passado, e tentei entender se sou de esquerda ou de direita. Não consegui concluir. As frases propostas à apreciação dos entrevistados me deixam hesitante; sempre preciso completá-las (com adversativas e reservas) para poder concordar ou discordar.

Por exemplo, o "governo deve ser o maior responsável por investir para a economia crescer". É uma ideia que deveria seduzir meu lado esquerdo. Mas não sei se houve uma época da minha vida em que eu não desconfiasse da intervenção do Estado na vida da gente. No Brasil de hoje, então, nem se fala: qualquer aumento da presença do governo agita visões pavorosas de corrupções crônicas e de burocracias acomodadas e ineficientes.

Em geral, a geração à qual pertenço, a dos baby boomers, não gosta de Estados e governos. Alguns de nós (uma pequena minoria) cresceram e militaram num isolamento cultural que os deixou à margem da revolução libertária dos anos 60 --isso, sobretudo em países que, na época, eram dominados por ditaduras, como o Brasil. Mas, para a grande maioria dos baby boomers, sonhar com justiça e dignidade para todos nunca significou confiar em Estados, governos, entidades coletivas, partidos e opiniões dominantes.

Conheci de perto (apesar do cheiro) alguns moradores de rua de Paris e Nova York que não se deixam levar para um abrigo nem nas piores noites do inverno, porque não aceitam ter que ouvir um sermão ou uma missa em troca de calor, sopa e colchão. Eles são meus heróis. Nossa tendência é outra: aceitamos facilmente a tutela moral de Estados e governos, como se fosse normal retribuir assim os benefícios da social-democracia.

Regra: o Estado que parece pagar a conta (embora ele pague com nossos impostos) sempre se sente autorizado a expandir sua tutela moral sobre nós. E eu tenho repulsa por qualquer tipo de tutela. Nisso e por isso, sou libertário. Como isso funciona com direita e esquerda?

Houve uma época em que, nos EUA, a direita era libertária (como se espera da direita, ela não gostava que o governo se metesse na vida da gente). Por exemplo, a direita libertária podia detestar gays e lésbicas, mas não por isso reconheceria ao Estado o direito de dizer o que se pode e o que não se pode na vida sexual e afetiva das pessoas.

Isso acabou: a direita de hoje adora tutelar os cidadãos (todos vulneráveis e meio incapazes, não é?) e tenta promover leis que regrem o comportamento de todos segundo seus "princípios".

Será que a esquerda, então, herdou o antigo espírito libertário da direita? Nem um pouco. Quando a direita começou a querer transformar suas crenças em legislação, a esquerda fez a mesma coisa, com um agravante: ela se tornou hipócrita (ela sempre declara querer o bem de todos, até dos que ela persegue).

Um exemplo. Hoje o Brasil recebe François Hollande, presidente da França. O governo (de esquerda) de Hollande é responsável por uma recente proposta de lei pela qual 1) é preciso abolir a prostituição e 2) o jeito é penalizar os clientes das prostitutas, com multas e prisão (leis parecidas já foram tentadas na Suécia e na Noruega, com resultados pífios e sinistros para as prostitutas).

Sugiro que nossa presidente ofereça a seu colega francês o livro de Adriana Piscitelli, "Trânsitos - Brasileiras nos Mercados Transnacionais do Sexo" (Uerj).

Além de ser um bom exemplo da qualidade de nossas pesquisas, o livro lembraria a Hollande que somos menos hipócritas que seu governo: sabemos que o verdadeiro problema que o governo francês quer resolver não é a prostituição (e ainda menos a prostituição forçada), mas a imigração de mulheres, que tentam ser livres trabalhadoras do sexo e que, em geral, não são vítimas nem de traficantes, nem de cafetões, nem de seus clientes.

Cher M. Hollande, bem-vindo ao Brasil. A França pode tomar decisões erradas, como todo mundo, mas, pela cultura e pelas ideias que ela representa sobretudo nos últimos dois séculos, ela não pode, não deve se permitir ser ridícula. Merci.

Agora, uma palavra, em aparte, a Dilma Rousseff: Presidente, pode ser que a gente já tenha decidido comprar os Rafales, mas os franceses não sabem disso. Será que poderíamos negociar? Vamos comprar seus caças, mas vocês deixem suas prostitutas em paz? Seria generoso, e alguns brasileiros e brasileiras na França agradeceriam.

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Dracula Episódio nº: 4: From darkness to light (Das sombras à luz)



Grayson decide que é hora de ganhar o coração de Lady Jayne. Enquanto isso, Lucy esconde, em meio aos planos entusiasmados de organização da festa de noivado de Mina e Harker, seus sentimentos pela amiga. Greyson utiliza um velho amigo para seus planos de vingança. Já os esforços para Dracula conquistar a luz do Sol avançam, mas logo enfrentam um obstáculo. As pesquisas de Van Helsing para permitir que Grayson ande sob a luz do dia encontra como obstáculo o fato do vampiro não ter coração.

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

"Tempestade perfeita" dos economistas significa que nosso bolso pode passar por séria crise


Economistas discutem a chamada "tempestade perfeita" que, resumidamente, segundo a economista Claudia Safatle, é o
Mercado externo praticamente fechado para novos créditos a países emergentes, economia da China em franca desaceleração, aperto do crédito doméstico pelos bancos privados, famílias endividadas, queda da produção industrial, fim do crescimento acelerado do emprego, inflação resistente e juros em alta. (A tempestade perfeita)
Abaixo também texto de Celso Ming e o áudio do Globo News Painel, deste último sábado, sobre o tema, com os economistas Luiz Gonzaga Beluzzo, da Facamp, Monica de Bolle, sócia-diretora da Galanto Consultoria e professora da PUC-RJ e Samuel Pessoa, sócio da Reliance Consultoria e pesquisador do Ibre/FGV.

Para nós, leigos, significa que podem vir raios e trovoadas para nossos bolsos. Um pouco de paciência com o tal do Beluzzo, chatinho mesmo, porque o áudio vale a pena.

Tempestade perfeita

Celso Ming - O Estado de S.Paulo

O ex-ministro da Fazenda Delfim Netto vem advertindo, como na entrevista publicada nesta edição na página B4, que a economia brasileira corre o risco de ter de enfrentar uma tempestade perfeita se a presidente Dilma não der um passo decisivo para a recuperação da confiança.

A desconfiança é fato repisado, ainda que o governo a todo tempo tente desqualificá-la como obra de pessimistas profissionais. Mas não dá para negar os problemas. O crescimento econômico é insatisfatório, como ainda ontem atestou o IBC-Br, do Banco Central (veja o Confira): o governo federal gasta mais do que pode; as contas externas estão em deterioração e os dólares continuam saindo mais do que entrando; a inflação anual continua no sexto andar e por aí vai. Nesse ambiente pouco animador, o empresário trava seus investimentos por aqui e começa a sair do Brasil.

A tempestade perfeita, para o ex-ministro Delfim Netto, acontecerá se esse clima persistir na temporada de reversão da política monetária, fortemente expansionista, empreendida pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos). À medida que menos dólares forem emitidos (hoje são à proporção de US$ 85 bilhões por mês) e que a oferta de moeda estrangeira escassear, o câmbio interno poderá passar pelas turbulências já conhecidas.

Outro rombo que se abriria no casco do navio seria o rebaixamento da qualidade da dívida brasileira pelas agências de qualificação de risco, fator que provocaria rejeições de títulos e outros ativos do Brasil. Mas não precisaria tudo isso. Efeito parecido com esse poderia ser causado pelo simples rebaixamento da dívida da Petrobrás, que teria alto poder de contaminação na economia.

Para Delfim, bastaria que a presidente Dilma assumisse o compromisso firme de que o governo fará uma economia de 2% do PIB (cerca de R$ 96 bilhões) por ano, destinada a amortizar a dívida (superávit primário), para que a política econômica começasse a passar firmeza e, nessas condições, a tempestade poderia ser enfrentada sem avarias de monta para o navio. Nesse caso, teria de basear-se em cálculo transparente das contas públicas, sem os truques contábeis inventados em 2012 pelo secretário do Tesouro, Arno Augustin, o mesmo que vem denunciando a existência de ataques especulativos contra as finanças do governo.

A outra ideia destinada a aumentar a credibilidade do governo, sugerida também por Delfim, seria a aprovação da Lei Complementar que desse autonomia ao Banco Central. Mas a presidente Dilma tratou de esvaziar esse balão.

Se não por outras razões, pelo menos por ser trunfo eleitoral não desprezível, a presidente Dilma parece mesmo precisada de um par de asas que pudesse ser proporcionado por uma nova Carta ao Povo Brasileiro, o compromisso solene feito em 2002 pelo então candidato Lula à Presidência da República. Por enquanto, não há sinais disso. Mas, se os serviços de meteorologia confirmarem a formação da tal tempestade perfeita, o governo será pressionado a fazer alguma coisa.

Fonte: Estadão, 15 de novembro de 2013

Ouça abaixo o Globo News Painel, 07/12/2013

Economistas falam sobre o andamento e sobre o futuro da economia brasileira Debate com William Waack e três economistas: Luiz Gonzaga Beluzzo, da Facamp, Monica de Bolle, sócia-diretora da Galanto Consultoria e professora da PUC-RJ e Samuel Pessoa, sócio da Reliance Consultoria e pesquisador do Ibre/FGV.

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Dois textos contra o esquerdireitismo: Tempo de radicais e Párias do Bom senso

Ser extremista é fácil porque não exige muito esforço intelectual. Basta tratar as coisas na base do preto ou branco, arrumar algum bode-expiatório, para culpar pelas mazelas do país e da vida, e sair combatendo esse suposto inimigo. Nesses tempos de guerra, também não há lugar para dubiedades, vacilos. Então, quem não estiver do seu lado estará contra você. Incluindo aí a realidade. Daí que melhor acabar com ela.

Assim se encontra a situação em que vivemos no Brasil de hoje: como sempre digo, um fla-flu permanente entre esquerdistas e direitistas, onde “ou se torce apenas pelo cordão vermelho ou pelo cordão azul”. Sério que faz tempo não via tanta gente estúpida assim reunida. Até as recentes celebrações pela vida e obra de Nelson Mandela viraram pretexto para as duas torcidas vomitaram seu besteirol infindável.

Felizmente, contudo, há luz no fim do túnel: cada vez mais pessoas de bom senso se dão conta desse fla-flu e buscam, ainda tateando, uma saída para o contexto preocupante. Cito dois textos que questionam essa tendência de polarização imbecil. Tempo de radicais é do Pedro Doria e Párias do bom senso do Luiz Caversan. Apreciem, nesse caso, sem moderação. 

Tempo de radicais

O diálogo político se tornou impossível. Ninguém mais busca o meio termo. E parte da culpa é da internet

O incômodo é visível. Em sua coluna na Folha de S. Paulo, o veterano jornalista Luiz Caversan anunciou que pretendia tirar férias de Facebook. O radicalismo das pessoas na rede está intolerável. Em um artigo recente, Frei Betto foi outro a se queixar dos radicais à esquerda e à direita. Cá no GLOBO, ontem, Ricardo Noblat desdenhou do país onde, on-line, “se torce apenas pelo cordão vermelho ou pelo cordão azul”. Míriam Leitão foi uma das primeiras, uns domingos atrás. Os radicais, em sua opinião, pioram a qualidade do debate. A polarização política é um fenômeno muito mais nocivo do que parece. Não é um fenômeno apenas brasileiro. E, não à toa, coincide com a popularização da internet. A tendência, aliás, é de que piore.

Em Israel, a esquerda foi sufocada e o governo de direita se radicalizou como nunca na história do país. Na Espanha, da virada do século para cá, o espaço de diálogo entre eleitores do socialista PSOE e do PP praticamente se extinguiu. Idem nos EUA, onde republicanos e democratas não se entendem desde o dolorido embate eleitoral que culminou com a questionável eleição de George W. Bush, em 2000. Este período, entre finais dos anos 1990 e o início da década seguinte é marcado pelo surgimento dos blogs e, com eles, as caixas de comentários. A partir daí, o crescimento das redes sociais. Não há coincidência.

Polarização não ocorre apenas quando o centro desaparece. A coisa é mais complexa. É natural que todos tenhamos paixões por certos temas. Pode ser o casamento gay para um, educação para outro, política econômica na cabeça do terceiro. Duas ou três questões costumam nos ser caras. Para as outras, na maioria das vezes somos ambivalentes, no máximo simpáticos a uma opção.

Quando o ambiente se polariza, porém, as pessoas se alinham a um ou outro grupo ideológico. Sentem-se na obrigação de defender até aquilo que não lhes é caro. O resultado é que as possibilidades de diálogo desaparecem. Afinal, quando tudo é muito importante, ninguém cede. Acordos tornam-se inviáveis.

Jogue “polarização política” no Google, porém, e poucos artigos científicos aparecerão. O tema mais definidor da política brasileira no momento é pouco estudado. Talvez porque, polarizadas, as pessoas que se interessam por política andam mais preocupadas em derrotar o outro lado do que dar um passo atrás e perceber que há algo de errado.

Nos EUA, onde o número de cientistas é inacreditável e tudo se estuda, já há pistas fartas. A primeira é que, para a maioria das pessoas, nada mudou. A população continua onde sempre esteve, não se radicalizou. Quem se radicalizou foi o pequeno grupo de eleitores que mais acompanha política. Como é para este grupo que políticos costuram seus discursos, também eles tornam-se mais radicais. Um estudo do professor Markus Prior, da Universidade de Princeton, avaliou se houve mudança na imprensa nas últimas décadas. Não a descobriu na imprensa tradicional: a cobertura dos fatos, nos EUA, se dá por um ponto de vista de centro. Nas páginas editoriais há uma tendência ligeira à esquerda, mas pouca. Não é assim, lá, para a imprensa que surgiu mais recentemente: canais a cabo de notícias, por exemplo, além de sites e blogs. Aí é tudo extremo, à direita ou à esquerda.

A internet cria o que o ativista Eli Pariser, autor do livro The Filter Bubble, chama de bolha. Lá, as pessoas procuram apenas aqueles sites onde lerão o que reitera suas crenças. Quando comentam em comunidades nas quais todos concordam, só há uma maneira de se destacar. Ou seja, sendo mais puro ideologicamente.

Na opinião de Pariser, aquela que já é uma tendência humana é amplificada pela maneira como a internet contemporânea funciona. Facebook e Google aprendem com aquilo que curtimos, clicamos, lemos, comentamos. Como querem nos ajudar a encontrar o que nos interessa, mostram mais do mesmo. E mais do mesmo é a reiteração da bolha. Lemos tanta gente com quem concordamos que o diálogo com os outros vai ficando mais difícil.

É uma febre. Depende de cada um escolher alimentá-la ou buscar o diálogo com quem discorda.

Fonte: Pedro Doria, O Globo, 26/11/2013

Párias do bom senso

No tempo de faculdade, em plena ditadura militar, havia, como se sabe, o que se convencionou chamar de movimento estudantil: diversas agremiações de tendências também diversas, mas todas pendendo à esquerda do espectro político, que faziam o que podiam (muito pouco na verdade) para se opor à opressão política, cultural, comportamental imposta pelo regime militar.

Você tinha que pertencer a alguma desses grupos (Libelu, Refazendo, Caminhando, outras menores e mais radicais...), caso contrário era identificado ou como inocente útil, jargão que definia quem ingenuamente se permitia ser manipulado pela ditadura, ou adesista mesmo, um perigo, posto que poderia eventualmente ser um delator, condição abominável quando pessoas eram mortas nos porões da polícia política.

De outro lado, os agentes da repressão, infiltrados ou não, entendiam que todos os que não fossem fiéis à ideologia fardada que regia o país eram subversivos em potencial, portanto precisavam ser identificados, monitorados, eventualmente punidos.

Não havia como querer ter um posicionamento público e ao mesmo tempo ser neutro, pensar diferente, procurar algo novo para você mesmo, era preto ou branco, ou o Brasil do AI-5 ou o Brasil do sonho revolucionário.

Quer dizer, até havia o comportamento derivado contracultura, que passou pelos movimentos beatnik, hippies e pós hippie, com pitadas do punk inglês então nascente e algum anarquismo. Era a pegada com a mais me identificava, embora fosse simpático e apoiasse tantas das posições dos grupos de esquerda, mas me recusasse a me alinhar incontinenti.

Grosso modo, quem não pertencia a nenhum dos grupos do movimento estudantil nem era adepto da ditadura, mas mantinha posições político-ideológica independentes acabava sendo tratado mais ou menos como pária.

Não adiantava você ser simpático a algumas posições da Libelu, mas gostar de certas propostas da Caminhando, tampouco frequentar ambientes do Refazendo sem levantar suspeitas.
Neste contexto, o bom senso cedia inexoravelmente ao "centralismo democrático", no qual você tinha que fazer o que a direção do grupo decidia. Ponto. Ou então vai ser de direita na vida, meu filho.

Em maior ou menos escala dependendo do grupo era assim, e talvez tivesse mesmo que ser assim, porque, como disse, do outro lado estava a farda, o camburão, o pau de arara, tortura, desaparecimentos, mortes.

Estou falando aqui de 1974/1980, ou seja, quase 40 anos atrás.

Nestas décadas que se seguiram houve de um tudo: o regime se abriu, a anistia chegou, os militares se foram, os exilados voltaram, houve a Constituinte, as eleições tornaram-se novamente diretas e legais, os comunistas também, acabou o bipartidarismo, teve Collor, teve impeachment, teve a transição mineira do Itamar, teve Sir-Ney, teve oito anos de tucanos, mais tantos anos de lulismo, o Brasil cresceu, a inflação de incontáveis dígitos se foi, veio o rótulo de emergente Bric, vive-se o estado democrático de direito tão sonhado durante tanto tempo.

PETRALHAS E TUCANÓIDES

Este resumo infiel e impreciso serve apenas para descrever um desalento, uma tristeza de constatar que depois de tudo isso cá estamos nós a viver sem nuances, sem meios termos, em meio a iras inconformadas, estimuladas sobretudo pela proteção covarde oferecida pelas redes sociais.

Mais uma vez, é preto ou é branco, é contra ou a favor, governo ou oposição, Dilma heroína, Dilma pulha.

Se você elogia qualquer coisa que o governo faça ou proponha, pobre de ti, será escorraçado como adesista, lulista, dilmista, petralha, canalha.

Se você faz crítica a alguma falha deste governo, danou-se: fascista, burguês, coxinha, tucanóide, daí para baixo.

Os ambientes de debate público, do botequim ao Face, tornaram-se o tanque onde se lava a roupa suja de uma história mal resolvida e de um percurso em que aparentemente muito pouco se aprendeu.

Assim como nos anos 70, quem ousa discordar é colocado à margem, como se fosse obrigado ou a ser revolucionário ou a ser fascista.

Não basta ter bom senso, não basta ser a favor do Brasil.

Mas a luta continua!

Fonte: Luiz Caversan, Folha de São Paulo, 28/09/2013

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Músicas em homenagem a Nelson Mandela


Lista de músicas em homenagem a Nelson Mandela. Fora a música tema do filme Invictus que já publiquei anteriormente, desta leva abaixo, a mais bonita, para mim é a Mandela Day do Simple Minds (de 1989). Seguem a letra e a música abaixo. Publico também a lista do Sérgio Martins (VEJA) das melhores homenagens musicais ao líder sul-africano.

Mandela Day
It was 25 years they take that man away
Now the freedom moves in closer every day
Wipe the tears down from your saddened eyes
They say Mandela's free so step outside
Oh oh oh oh Mandela day
Oh oh oh oh Mandela's free

It was 25 years ago this very day
Held behind four walls all through night and day
Still the children know the story of that man
And I know what's going on right through your land

25 years ago
Na na na na Mandela day
Oh oh oh Mandela's free

If the tears are flowing wipe them from your face
I can feel his heartbeat moving deep inside
It was 25 years they took that man away
And now the world come down say Nelson Mandela's free

Oh oh oh oh Mandela's free

The rising suns sets Mandela on his way
Its been 25 years around this very day
From the one outside to the ones inside we say
Oh oh oh oh Mandela's free
Oh oh oh set Mandela free

Na na na na Mandela day
Na na na na Mandela's free

25 years ago
What's going on
And we know what's going on
Cos we know what's going on

Fonte:Vagalume

U2: “Ordinary Love”



 The Specials: “Free Nelson Mandela”

 Hugh Masakela: “Mandela (Bring him back home)”

Santana: “Mandela”


Youssou N’Dour: “Nelson Mandela” 

Tracy Chapman: “Freedom Now” 

Simple Minds: “Mandela Day”


Johnny Clegg: “Asimbonanga” 


Invictus


Fonte da compilação: Amo la Musica, 06/12/2013

Lista de Sérgio Martins das melhores homenagens musicais ao líder sul-africano

Nelson Mandela, admirável mesmo e muito além do fla-flu esquerdireitista

Nélson Mandela
Atualização: Enquanto o mundo chora a morte da figura excepcional que foi Nelson Mandela, ocorrida ontem (05/12/2013), no Brasil do atraso eterno, o fla-flu esquerdireitista profana a imagem do grande líder.

Extremesquerdistas acham que se deve exortar Mandela por seus tempos de luta armada contra o apartheid e suas tendências comunistas e não por suas - segundo eles, claro - impotentes exortações morais de combate bem comportado, disciplinado e conciliador ao racismo (sic).  Para esses tipos, como Mandela acabou com o apartheid sem guerra civil, sua vitória de fato foi um fracasso.

Os direitistas extremistas, por sua vez, acham que Mandela não merece todas as comemorações que agora recebe porque foi comunista e promoveu ações violentas e sabotagens contra a tirania racista, razão pela qual foi preso e condenado à prisão perpétua.

Primeiro que faz diferença ter acreditado em "comunismo" antes e depois da Queda do Muro de Berlim. Muita gente boa acreditou no socialismo antes de se dar conta de seu fracasso social, político e econômico. Segundo, tendo ou não mantido alguma crença nessa canoa furada, o importante é que, ao sair da cadeia, Mandela chegou ao poder e instalou, em seu país, uma democracia constitucional e não uma tirania comunista ou uma ditadura personalista (e ele tinha a faca e o queijo na mão para se perpetuar no poder).

Sobretudo, ele promoveu a conciliação racial em seu país, abdicando de buscar justiça ou revanche contra os que lhe roubaram metade da vida, em prol da pacificação da África do Sul. Só para exemplificar, durante os 27 anos que passou na cadeia em condições deploráveis, ele teve tuberculose e câncer, além de problemas nos canais lacrimais por causa do trabalho forçado nas pedreiras. Transcender todo esse dano pessoal e a justa revolta por tantos anos de sofrimento em prol da paz e da justiça é para os raros e os muito bons. Se Mandela não foi herói - o que não quer dizer santo e perfeito - ninguém mais foi.

Que os esquerdireitistas não enxerguem isso, cada um com sua cegueira particular, só mostra, mais uma vez, como no fundo são tão parecidos.

Elogios a Mandela

O Nobel de Literatura, Mario Vargas Llosa, escreveu o texto Elogios a Mandela, na edição do Estadão de 21/07/03, que merece registro não só porque resgata resumidamente a história do grande líder sul-africano como também porque o personagem merece mesmo todas as honras. Destaco o trecho:

Mandela é o melhor exemplo que temos - aliás muito raro nos nossos dias - de que a política não é apenas a tarefa suja e medíocre que tantos imaginam, da qual os malandros se valem para enriquecer e os vagabundos para sobreviver sem fazer nada, mas uma atividade que pode também melhorar a vida, substituir o fanatismo pela tolerância, o ódio pela solidariedade, a injustiça pela justiça, o egoísmo pelo bem comum, e que alguns políticos, como o estadista sul-africano, tornam o seu país, e o mundo, muito melhor do que como o encontraram.

Deixo também, ao fim do texto, a música e a letra do filme Invictus (veja a resenha), de Clint Eastwood, que também narra a trajetória de Mandela e suas estratégias para unir um país desfacelado pelos anos do famigerado apartheid.  Após 27 anos de prisão, Mandela poderia ter saído da cadeia desejoso de vingança contra os que o injustiçaram tão brutalmente, mas preferiu outro caminho, caminho que somente poucos e os muito bons conseguem trilhar. Imperdíveis o texto de Llosa e o filme de Eastwood.

Elogios a Mandela

Nelson Mandela, o político mais admirável destes tempos tumultuados, segue em um hospital de Pretória, após completar 95 anos na quinta-feira. Poderemos ter a certeza de que todos os elogios feitos a ele são justos, pois o estadista sul-africano transformou a história do seu país de uma maneira que ninguém imaginava concebível, e demonstrou com sua inteligência, habilidade, honestidade e coragem que, no campo da política, às vezes, os milagres são possíveis. 

Tudo isso foi sendo gestado, antes mesmo que na história, na solidão de uma consciência, na desolada prisão de Robben Island, onde Mandela ingressou, em 1964, para cumprir pena de prisão perpétua e trabalhos forçados. As condições em que o regime do apartheid mantinha seus presos políticos na ilha rodeada de um mar traiçoeiro e tubarões, em frente à Cidade do Cabo, eram atrozes. Uma cela tão minúscula que parecia um nicho ou o covil de uma fera, uma esteira de palha, uma sopa de milho três vezes ao dia, mudez obrigatória, visitas de meia hora de duração a cada seis meses, e o direito de receber e escrever somente duas cartas ao ano, nas quais jamais deveriam ser mencionados temas políticos nem da atualidade. Em tal isolamento, ascetismo e solidão transcorreram os primeiros nove anos dos 27 que Mandela passou na ilha.

Cela onde Nelson Mandela cumpriu pena
(Robben Island, Cape Town, Western Cape Province)
Em vez de suicidar-se ou enlouquecer, como muitos companheiros de prisão, nos nove anos Mandela meditou, reviu suas próprias ideias e ideais, fez uma autocrítica radical de suas convicções e atingiu aquela serenidade e sabedoria que a partir de então guiariam todas as suas iniciativas políticas. Embora nunca tenha compartilhado das teses dos resistentes que propunham uma 'África para os africanos' e queriam atirar ao mar todos os brancos da União Sul Africana, em seu partido, o Congresso Nacional Africano, Mandela, assim como Sisulu e Tambo, os dirigentes mais moderados, estavam convencidos de que o regime racista e totalitário só seria derrotado mediante ações armadas, sabotagens e outras formas de violência, e para tanto formou um grupo de comandos ativistas chamado Umkhonto we Sizwe, que enviava para Cuba, à China Popular, à Coreia do Norte e à Alemanha Oriental jovens militantes para que se adestrassem.

Deve ter levado muito tempo - meses, anos - para convencer-se de que toda essa concepção da luta contra a opressão e o racismo na África do Sul era equivocada e ineficaz, e era preciso renunciar à violência e optar por métodos pacíficos, ou seja, buscar uma negociação com os dirigentes da minoria branca - equivalente a cerca de 12% do país, que explorava e discriminava de maneira iníqua os 88% restantes - e convencê-la de que permanecera no país porque a convivência entre as duas comunidades era possível e necessária, quando a África do Sul fosse uma democracia governada pela maioria negra.

Naquela época, final dos anos 60 e início dos 70, pensar semelhante coisa era um exercício mental distante da realidade. A brutalidade irracional com que a maioria negra era reprimida e os esporádicos atos terroristas com que os resistentes respondiam à violência do Estado haviam criado um clima de rancor e ódio que fazia prever, mais cedo ou mais tarde, um desenlace de dimensões cataclísmicas no país.

A liberdade só poderia significar o desaparecimento ou o exílio para a minoria branca, particularmente para os africâners, os verdadeiros donos do poder. É espantoso pensar que Mandela, perfeitamente consciente das vertiginosas dificuldades que encontraria no caminho que traçara para si, decidiria empreendê-lo, e, mais ainda, que perseveraria nele sem sucumbir ao desalento um só instante, e, 27 anos mais tarde, concretizaria aquele sonho impossível: uma transição pacífica do apartheid para a liberdade, enquanto a maior parte da comunidade branca permanecia no país ao lado dos milhões de negros e mulatos sul-africanos que, convencidos por seu exemplo e suas razões, haviam esquecido os insultos e os crimes do passado, e perdoado.

Seria preciso recorrer à Bíblia, àquelas histórias exemplares do catecismo que nos contavam quando éramos crianças, para tentar entender o poder de convicção, a paciência, a vontade inquebrantável e o heroísmo que Nelson Mandela deve ter demonstrado durante todos aqueles anos para persuadir, primeiramente seus próprios companheiros de Robben Island, depois seus correligionários do Congresso Nacional Africano e, por último, os próprios governantes e a minoria branca, de que não era impossível que a razão substituísse o medo e o preconceito, que uma transição sem violência era igualmente factível e ela assentaria as bases de uma convivência humana em lugar do sistema cruel e discriminatório imposto à África do Sul por séculos. Creio que Nelson Mandela é ainda mais digno de reconhecimento por esse trabalho extremamente lento, hercúleo, interminável, graças ao qual suas ideias e convicções foram contagiando os seus compatriotas como um todo, do que pelos extraordinários serviços que prestaria depois, já no governo, aos seus concidadãos e à cultura democrática.

Formação. É preciso lembrar que o homem que assumiu essa admirável tarefa era um prisioneiro político, o qual, até o ano de 1973, quando foram abrandadas as condições carcerárias em Robben Island, vivia praticamente confinado numa minúscula cela e com apenas uns poucos minutos diários para trocar algumas palavras com os outros presos, quase privado de toda comunicação com o mundo exterior. Contudo, sua tenacidade e sua paciência tornaram possível o impossível. Enquanto na prisão já menos inflexível dos anos 70, pôde estudar e formar-se em Direito, suas ideias foram rompendo pouco a pouco os preconceitos totalmente legítimos que existiam entre os negros e mulatos sul-africanos e começou a ser aceita sua tese de que a luta pacífica na busca de uma negociação seria mais eficaz e permitiria alcançar a liberdade mais rapidamente.

Mas foi ainda mais difícil convencer de tudo isso a minoria que detinha o poder e julgava ter o direito divino de exercê-lo com exclusividade e para sempre. Esses eram os pressupostos da filosofia do apartheid proclamada por seu mentor intelectual, o sociólogo Hendrik Verwoerd, na Universidade de Stellenbosch, em 1948, e adotada de modo quase unânime pelos brancos nas eleições daquele mesmo ano. Como convencê-los de que estavam equivocados, de que deviam renunciar não apenas a semelhantes ideias, mas também ao poder, e resignar-se a viver numa sociedade governada pela maioria negra?

O esforço durou muitos anos, mas, no final, como a gota persistente que fura a pedra, Mandela foi abrindo portas na cidadela de desconfiança e temor, e, um dia, o mundo inteiro descobriu estupefato que o líder do Congresso Nacional Africano saía às vezes de sua prisão para ir tomar civilizadamente o chá das cinco com os que seriam os dois últimos mandatários do apartheid, Botha e de Klerk.

Quando Mandela subiu ao poder, sua popularidade na África do Sul havia se tornado indescritível, tanto na comunidade negra quanto na branca (lembro ter visto, em janeiro de 1998, na Universidade de Stellenbosch, o berço do apartheid, uma parede coberta de fotos de alunos e professores recebendo a visita de Mandela com entusiasmo delirante).

MARIO VARGAS LLOSA - O Estado de S.Paulo
Esse tipo de devoção popular mitológica costuma atordoar quem a recebe e fazer dele - como no caso de Hitler, Stalin, Mao, Fidel Castro - um demagogo e um tirano. Mas Mandela não se deixou envaidecer; continuou sendo o homem simples, austero e honesto que sempre foi e, para surpresa do mundo todo, negou-se a permanecer no poder, como seus compatriotas pediam. Aposentou-se e foi passar os seus últimos anos na aldeia indígena de onde se originara sua família.

Mandela é o melhor exemplo que temos - aliás muito raro nos nossos dias - de que a política não é apenas a tarefa suja e medíocre que tantos imaginam, da qual os malandros se valem para enriquecer e os vagabundos para sobreviver sem fazer nada, mas uma atividade que pode também melhorar a vida, substituir o fanatismo pela tolerância, o ódio pela solidariedade, a injustiça pela justiça, o egoísmo pelo bem comum, e que alguns políticos, como o estadista sul-africano, tornam o seu país, e o mundo, muito melhor do que como o encontraram. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA

Invictus Theme Song

Out of the night, that covers me
I'm unafraid, I believe
Beyond this place of wrath and tears
Beyond the hours that turned to years
I thank whatever, whatever gods may be

9000 days were set aside
9000 days of destiny
9000 days to thank gods wherever they maybe

It matters not, the circumstance
We rise above, we took a chance
And I thank whatever, whatever gods maybe

9000 days were set aside
9000 days of destiny
9000 days to thank gods, wherever they may be

A broken heart that turned to stone
Can break a man, but not his soul
9000 days were set aside
9000 days of destiny
9000 days to thank gods,
wherever they may be
I thank whatever, whatever gods may be

Ver resenha do filme Invictus e o poema de mesmo nome que foi fonte de inspiração para Mandela. 

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Passeando através de diferentes décadas através da dança

Dois filmes e um vídeo sobre dança que retratam, através de diferentes ritmos, períodos da história humana. Em O Baile, de 1983, de Ettora Scola, passeia-se por diferentes épocas, começando em 1920 e seguindo pelos 50 anos seguintes, através da trilha sonora, da maneira de dançar e do figurino dos personagens. Guardadas às devidas proporções, o mesmo se passa com o comercial do shopping londrino que mostra cem anos de moda em cem segundos de imagens. 

Ainda por essa via segue o filme Chega de Saudade (2008), de Laís Bodansky, onde, via flashbacks, o passado e  o presente convivem num mesmo local, através da música brasileira de diferentes gerações e da dança entre os casais, com cada personagem tendo uma música-tema que remete a situações vividas no salão de baile. Para apreciar sem moderação.
  

100 years of fashion in 100 seconds from aneel on Vimeo.
100 years of East London style in 100 seconds. Sept 13th 1911 - Sept 13th 2011.

http://veja.abril.com.br/blog/augusto-nunes/feira-livre/imagens-em-movimento-a-7a-arte-vai-ao-baile/#more-816037

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Drácula - Episódio 03 – Goblin Merchant Men


Grayson busca descobrir se Lady Jane é uma caçadora de vampiros da Ordem do Dragão. Lucy tenta remendar o coração partido de Mina com absinto, romance e um inebriante passeio pela vida boêmia de Londres. As maquinações de Grayson custam a vida de Lord Laurent e lhe dão um novo e poderoso inimigo. 

 

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