sábado, 6 de agosto de 2011

A palhaçada do orgulho hétero!

Cale-se bom senso! by Carlos Apolinário
Venho da esquerda, da chamada nova esquerda no seu aspecto libertário, contracultural (comuna nunca, que sempre achei isso pra lá de brega, entre outras coisas negativas), mas hoje me afino com as ideias liberais, embora, especificamente com os liberais-liberais e não, no geral,  com os liberais-conservadores, muito menos com os conservadores (que considero, aliás, com raras exceções, bem pouco democráticos). Como hoje está na moda passar primeiro as credenciais ideológicas antes de ir aos finalmentes, eu diria que continuo libertária, em teoria, e social-liberal na prática.


Dito posto, vou direto ao assunto em pauta, ou seja, a aprovação do projeto do dia do orgulho heterossexual da lavra do deputado evangélico Carlos Apolinário que, como não poderia deixar de ser, está rendendo a maior polêmica  Enviei inclusive carta ao prefeito Gilberto Kassab procurando sensibilizá-lo a vetar o projeto dado seu caráter de escárnio da luta pela igualdade de direitos entre as pessoas.

Apoiei minha posição no conceito que historicamente fundamenta os dias de orgulho da população homossexual. Disse que não entende o orgulho LGBT quem nunca sentiu na pele a vergonha que a sociedade preconceituosa incute aos homossexuais por conta de sua visão estigmatizadora da homossexualidade. O orgulho gay não é orgulho da orientação sexual mas sim  orgulho de se ter coragem de se viver abertamente uma condição da qual  muita gente limitada  acha que se deveria ter vergonha e levar às escondidas. O orgulho gay é uma espécie de antídoto contra essa vergonha, contra essa imputação antidemocrática que impõe uma série de obstáculos aos indivíduos.

O orgulho hétero, porém, não tem qualquer fundamento, já que a sociedade é heterossexual, confere à heterosexualidade inclusive o status de norma. Ninguém é estigmatizado por ser hétero, ninguém tem direitos restringidos por ser hétero, ninguém é induzido a ter vergonha de ser hétero. Então, orgulho hétero de quê? Como disse a princípio, o projeto do Apolinário é apenas um escárnio da luta pela igualdade de direitos, inclusive porque ele tenta dar à heterossexualidade também o monopólio da virtude.

Como essa questão dos "orgulhos" costuma trazer à tona o igualmente polêmico tema das políticas identitárias, resumo minha posição sobre elas. A questão identitária se configura como faca de dois gumes:  necessária porque é preciso haver um sujeito social a partir do qual reivindicar direitos; perigosa quando vai além da funcionalidade e vira uma espécie de natureza, submergindo a individualidade das pessoas numa suposta coletividade de mesmas caracterítiscas. Como lidar com essa arma branca sem provocar ferimentos tem sido um dilema constante, ainda sem solução.

Por fim, espero que, no futuro, quando houver igualdade de fato entre as pessoas e detalhes como cor, gênero e orientação sexual não mais restrinjam as oportunidades de ninguém na vida, todas essas identidades simbólicas e seus orgulhos caiam por terra e reste apenas o valor e os valores de cada indivíduo. Todavia, porém, contudo, ainda não chegamos lá, e essas estratégias afirmativas, apesar dos pesares,  permanecem válidas.

P.S. Este post é baseado em um comentário que fiz a propósito de uma postagem do jornalista Reinaldo Azevedo sobre o mesmo tema.

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