sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Movimento Homossexual Brasileiro ou LGBT e as esquerdas: MR-8 não queria as lésbicas em congresso de mulheres

Hoje integrantes do Movimento Revolucionário 8 de outubro (MR-8) estão nos Ministérios das Comunicações (Franklin Martins) e da Cultura (Juca Ferreira) e endossaram o chamado Programa Nacional de Direitos Humanos III, do governo Lula, onde os direitos homossexuais aparecem mesclados a seus velhos sonhos de implantar um regime autoritário de esquerda no Brasil.

Em 1981, contudo, o MR-8 era uma organização proscrita pelo regime militar que considerava as questões específicas das mulheres como luta menor e as lésbicas como não-mulheres que não deveriam participar dos encontros feministas, encontros estes que desejavam aparelhar para a luta de classes e contra a ditadura.

Ao contrário da situação atual, tanto o movimento feminista quanto o incipiente Movimento Homossexual buscavam autonomia em relação às organizações da política tradicional e a afirmação de suas especificidades como luta tão importante quanto a luta geral. Antes como hoje, organizações como o MR-8 não viam essa independência com bons olhos e a atacavam em seu jornal Hora do Povo:

No seu número de 6 de fevereiro de 1981, um artigo atacava as ‘autonomistas’ do movimento feminista: grã-finas desorientadas, lideradas por lésbicas! Acima do artigo, uma charge assinada por Maringoni em que apareciam, entre outras mulheres, duas lésbicas, uma tendo um ataque histérico ao ver mulheres do povo, enquanto a outra, caricaturalmente ‘machona’, tenta levá-la para casa. (MACRAE, 1983, p. 58)

As militantes do MR-8 não queriam a participação das lésbicas no III Congresso da Mulher Paulista, e uma de suas integrantes chegou a declarar à Folha de S. Paulo que ‘a lésbica nega a sua própria condição de mulher, e não pode fazer parte de um movimento feminino’.” (TELES, 1993, p. 124).

O jornal Lampião da Esquina também registrou o embate entre as lésbicas do Grupo Lésbico-Feminista e as integrantes do Hora do Povo: “De tímidas participantes o ano passado, as lésbicas emergiram para a crista da onda neste 3º CMP, ao se tornarem alvo predileto do grupo HP , para quem a coisa se colocava assim: de um lado as lésbicas, de outro o povo brasileiro.” (Lampião da Esquina, ano 3, n. 35. Rio de Janeiro, ago. 1981, p. 12).

O próprio grupo registrou essa experiência em seu boletim ChanacomChana:

Aprendemos realmente muito sobre ‘organização’ neste Congresso, pois passada a euforia do nosso aparecimento no Movimento Feminista, tivemos que nos deparar não só com os insultos proferidos pelas militantes do jornal Hora do Povo, porta voz do proscrito MR-8 (Movimento Revolucionário 8 de Outubro) que procurou tumultuar no que pode a elaboração do evento, como também com a falta de solidariedade das outras feministas. Enquanto as ‘HPistas’ nos acusavam de imitar os homens no que eles têm de mais caricatural, de não assumirmos nossa ‘condição de mulheres’ e de comprometermos a representatividade do Movimento porque éramos ‘sapatões’, por outro lado, um dos mais conceituados e tradicionais dos grupos feministas de São Paulo ameaçava sair da organização do Congresso por considerarem haver um excesso de lésbicas na ocasião. (ChanacomChana, n. 3. São Paulo, maio 1983, p. 3)

Durante toda a década de oitenta até os primeiros anos da década de noventa, até mais precisamente 1993, a organização LGBT brasileira manteve sua autonomia em relação a essas instâncias da esquerda ortodoxa, inclusive  porque elas entraram em declínio com a redemocratização do país e o colapso dos regimes comunistas no Leste Europeu e em alguns países da Ásia. Depois, essas forças se rearticularam, através da entidade Foro de São Paulo (fundada por Lula e Fidel Castro em 1990) e, sobretudo o PT, através de seus núcleos de gays e lésbicas,  foi progressivamente tomando espaço e acabando com a autonomia do movimento. Com a chegada de Lula ao poder, de 2003 em diante, o MHB/MLGBT foi totalmente cooptado e aparelhado pelo glpetistas e outros integrantes da esquerda autoritária, tanto que jocosamente o movimento é chamado de LGPT.

Na verdade, as esquerdas ortodoxas que, na época da ditadura militar (1964-1984), lutaram basicamente em nome da democracia (hoje se sabe que de fato apenas disputavam com a direita extremista o direito de instalar sua ditadura) e da classe trabalhadora contra a burguesia (na chamada luta de classes), com o passar do tempo, perceberam que era mais útil engrossar seu rol de "oprimidos" com os movimentos filhos da contracultura, da esquerda libertária, como o negro, feminista, ecológico e homossexual. Feministas deixaram então de ser burguesas desocupadas e homossexuais um produto do capitalismo decadente para se tornar os novos oprimidos do sistema capitalista, patriarcal e homofóbico.

Hoje esses movimentos funcionam como correias de transmissão do partido e de seu afã de instalar uma ditadura populista no Brasil. Não por menos deram apoio a versão petista do Programa Nacional de Direitos Humanos III em que os direitos homossexuais (bem como os direitos de outros movimentos) aparecem como cobertura para o recheio autoritário do governo, onde se leem propostas de controle da imprensa, do fim do direito de propriedade (que só estaria protegida se tivesse função social, função esta definida pelo governo e seus "movimentos sociais") e outras tantas coisas de arrepiar os cabelos.

De qualquer forma, é ilusório supor que a população LGBT, caso nos aconteça a tragédia da vitória de Dilma Roussef (continuidade do atual governo), venha a ter muitas regalias na sonhada ditadura dessa gente. As liberdades individuais, das quais a vivência da homossexualidade depende, nunca se deram bem com regimes comunistas ou afins. Haverá apenas os pelegos homossexuais do partido posando para as fotos oficiais enquanto a maioria da população é reprimida como até hoje acontece em Cuba e na China. Para a Conferência da ILGA-LAC*, que agora acontece em Curitiba (26 a 30/01), até última informação, ativistas cubanos não haviam tido permissão para vir ao Brasil e participar do evento. Perigas de eles tentarem escapar e ficar por aqui se esbaldando nos horrores do mundo capitalista, não é mesmo?

E leia mais sobre a esquerda e os homossexuais nessa postagem do blog Q-Libertários

*(versão latino-americana da conferência da Associação Internacional de Gays e Lésbicas - ILGA)

6 comentários:

Realmente Míriam é muita hipocrisia dessa gente que posa de "democrática" mas que, lá no passado, pegou em armas e tentou impor uma ditadura de esquerda no Brasil.
Já ouviu falar que a esquerda comunista e a direita facista são como as extremidades de uma ferradura? Embora "distantes" estão mais próximas do que se imagina.
Sobre essa questão de homofobia em grupos feministas, você já assistiu ao filme Desejo Proibido? É um filme sobre lésbicas em três momentos: 1961, 1972 e 2000. No segmento de 1972, um grupo formado por quatro estudantes lésbicas é expulso dum núcleo feminista pelo fato das quatro serem lésbicas. Tem nomes de peso como Michelle Williams, Ellen DeGeneres e Sharon Stone. Se você ainda não viu, vale a pena ver. Abraços!

Miriam, gostaria de saber sua opinião sobre o regime militar. A pergunta que eu faço é uma só: a ditadura perseguiu ou não homossexuais?

Pelo que tenho estudado, os militares literalmente pacificaram o país, já que não somente os esquerdistas já estavam atuando com guerrilha desde 1962, como também paralelamente o governador de SP e RJ estavam recrutando pessoas para formar uma milicia para-militar. Ao chegar o regime, os militares se ocuparam de rechaçar a esquerdas, sem esquecer também de desarmar a direita. Uma vez que esta não tinha mais necessidade de se preocupar com política, acabou-se os militantes de rua (das direitas). Sob esse aspecto não me pareceu o regime uma coisa de "extrema-direita", já que no cinema tinha filmes pornográficos e alguns lugares de encontro gay começando a surgir (ao que me parece).

Quanto mais eu estudo o assunto, me parece que o regime militar pouco se importou com os gays.

Em 2004, numa entrevista de João Silvério Trevisan p/ a TvTudo, o mesmo argumenta que "havia muita homofobia durante a ditadura" e deu como exemplo uma vez que foi intimado a comparecer numa delegacia para prestar esclarecimentos sobre o jornal Lampião e Grupo Somos. Foi interrogado, causou boa impressão no delegado, saiu e foi embora. O processo que se tinha interesse em mover contra o Lampião e seus editores foi arquivado.

Numa entrevista disponibilizada no site do Luiz Mott, o mesmo argumenta que no Brasil, segundo ele, não houve perseguição homossexual, pelo menos não como na Venezuela e no Chile...

A impressão que eu tenho, como gay de 28 anos que não viveu o período é de que o período na verdade "nem fedeu e nem cheirou", e os casos de homofobia ocorridos eram mais próprios do carater do agressor do que da "cultura capitalista e militar" da época, tal como hoje a esquerda tenta impingir nas pessoas. Veja os casos que citei, e gostaria de estudar mais a respeito, embora não tenha obtido mto exito em encontrar material sobre o assunto, mas quando se fala em "homofobia da ditadura" as pessoas tem impressão de que os gays eram assassinados como atividade "esportiva", eram levados às delegacias onde tinhamd dentes arrancados, enfim, a imaginação entra em ação... Afinal, como ativista que viveu na época, como era as coisas?

Desculpa o tamanho do meu comentário e acrescento que o post seu está ótimo!

O seu post é de grande qualidade.
Os meus parabéns.

Q-Libertários!

Ótima imagem essa da ferradura.De fato, é aquela história dos extremos que se tocam, os de direita e de esquerda. Na minha opinião, só mudam os pretextos para os abusos que ambos cometem.
Em relação ao Desejo Proibido, sim, eu o assisti há tempos. Bem legal. Abraço,

Gays de direita,

primeiro a ditadura militar era de direita, mas, no caso, empreguei a palavra extremista mais pelo fato de os militares terem partido para um regime autoritário. De fato, a expressão extrema-direita se refere mais ao nazi-fascismo. A ditadura brasileira não chegou a ter caracterítiscas tão radicais, mas era um regime antidemocrático.
Agora, quanto à questão da homofobia, desconheço algum plano específico de repressão endereçado à população homossexual durante os anos de chumbo. Acontece que a ditadura militar era também moralmente conservadora, adepta da moral e dos bons costumes, e botava no mesmo saco de gatos desde a barriga grávida da Leila Dinis até a guerrilha do Araguaia.
Esse conservadorismo nos costumes naturalmente afetava a população homossexual. Aqui em São Paulo houve os casos de repressão especificamente dirigida à população LGBT com o famigerado delegado Richetti que prendia travestis, lésbicas e gays pelo simples fato de serem homossexuais. E como não havia liberdade de expressão, reclamar era difícil.
Mas esse clima de sufoco não tem a ver com o capitalismo. Como sabe, em países comunistas, no mesmo período, a situação era ainda pior.Abs,

tramadas,

agradecida pelo comentário. Venha sempre por aqui. Bjk.

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